Controlando o aquecimento global. - Fundação Visconde de Cairu
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CONTROLANDO O<br />
AQUECIMENTO GLOBAL<br />
COMO REDUZIR EM 30% AS EMISSÕES DE<br />
GASES ESTUFA ATÉ 2030<br />
SAMUEL VIDAL
Índice<br />
Capítulo 1: O <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong><br />
Capítulo 2: A origem das emissões <strong>de</strong> gases estufa<br />
Capítulo 3: As dificulda<strong>de</strong>s para substituir a matriz<br />
energética fóssil<br />
Capítulo 4: As previsões internacionais acerca das<br />
emissões mundiais <strong>de</strong> CO2 e do aumento da temperatura<br />
da Terra nos próximos anos<br />
Capítulo 5: Como reduzir em 30% as emissões mundiais<br />
<strong>de</strong> gases estufa até 2030<br />
Capítulo 6: A viabilida<strong>de</strong> política da proposta da<br />
Mckinsey<br />
Capítulo 7: O setor <strong>de</strong> carbono terrestre: silvicultura e<br />
agricultura<br />
Capítulo 8: A redução <strong>de</strong> emissões na Amazônia<br />
Capítulo 9: O sequestro geológico <strong>de</strong> CO2<br />
Capítulo 10: Fontes energéticas limpas<br />
Capítulo 11: Eficiência Energética
Capítulo 12: Conclusão
Capítulo 1: O <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong><br />
O planeta Terra corre sério risco <strong>de</strong> sofrer nas próximas décadas<br />
um aumento <strong>de</strong> temperatura que provocará mudanças climáticas<br />
expressivas e que ameaçará a existência humana. O fenômeno é<br />
conhecido como <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>. O livro busca <strong>de</strong>finir o que é esse<br />
fenômeno e apontar soluções com viabilida<strong>de</strong> temporal e econômica<br />
para o problema. O título “<strong>Controlando</strong> o Aquecimento Global” se<br />
refere à tentativa <strong>de</strong> se limitar o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> em 2°C, valor<br />
consi<strong>de</strong>rado seguro pelos cientistas para que as mudanças climáticas<br />
sejam brandas. Uma redução <strong>de</strong> 30% das emissões <strong>de</strong> gases estufa até<br />
2030, e a continuação <strong>de</strong>sse ritmo <strong>de</strong> redução nas décadas seguintes,<br />
permitirá que os níveis <strong>de</strong> gases estufa se estabilizem num patamar que<br />
possa garantir o controle do <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> <strong>de</strong>ntro dos 2°C <strong>de</strong><br />
aumento. Essa curva <strong>de</strong> redução foi <strong>de</strong>fendida pelos cientistas do quarto<br />
Painel Internacional <strong>de</strong> Mudanças Climáticas <strong>de</strong> 2007, o IPCC 1.<br />
Inicialmente precisamos enten<strong>de</strong>r o aumento do efeito estufa, o<br />
causador do <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>. O efeito estufa é um fenômeno natural<br />
do planeta Terra, que consiste na retenção pela atmosfera <strong>de</strong> uma parte<br />
do calor gerado pela radiação solar. Essa retenção <strong>de</strong> calor é feita pelos<br />
gases do efeito estufa (GEE). Entre eles se <strong>de</strong>stacam o vapor d'água<br />
(H2O), o dióxido <strong>de</strong> carbono (CO2) e o metano (CH4). O termo estufa se<br />
refere à retenção <strong>de</strong> calor do sol similar a retenção provocada pelo vidro<br />
numa estufa <strong>de</strong> plantas. O efeito estufa é responsável pelo <strong>aquecimento</strong><br />
natural do planeta. Esse fenômeno climático é provavelmente o mais<br />
importante para a manutenção da vida na Terra. Sem ele a temperatura<br />
média do globo seria <strong>de</strong> -18°C, contra os 15°C atuais. O gran<strong>de</strong><br />
problema que estamos enfrentando é o aumento artificial <strong>de</strong>sse<br />
fenômeno <strong>de</strong>vido à influência do homem. O crescimento econômico nos<br />
últimos dois séculos da nossa socieda<strong>de</strong> foi incentivado pela Revolução<br />
Industrial com a queima intensiva <strong>de</strong> combustíveis fósseis e com o uso<br />
do solo em larga escala (agropecuária e <strong>de</strong>smatamento). O elemento<br />
químico carbono presente no petróleo, gás natural e carvão, na queima<br />
1 O IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change) foi estabelecido em<br />
1988 pela organização Metereológica Mundial e o Programa das Nações<br />
Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) para fornecer informações científicas,<br />
técnicas e sócio-econômicas relevantes para o entendimento das mudanças<br />
climáticas.
<strong>de</strong>sses combustíveis, passou a ser lançado na atmosfera na forma <strong>de</strong><br />
dióxido <strong>de</strong> carbono (CO2), um dos gases que provocam o efeito estufa.<br />
As concentrações <strong>de</strong> CO2 passaram <strong>de</strong> 280ppm (partes por milhão) para<br />
377ppm ao longo do século XX. Esse aumento <strong>de</strong> concentração já<br />
causou uma elevação média <strong>de</strong> 0,8°C na temperatura da Terra e já está<br />
provocando mudanças climáticas sérias. O aumento da quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
CO2 também aumenta o efeito estufa provocado pelo vapor d’água. Se<br />
você esquenta um pouco que seja o ar, ao adicionar a ele uma<br />
quantida<strong>de</strong> extra <strong>de</strong> dióxido <strong>de</strong> carbono, esse ar então reterá muito mais<br />
vapor d'água. Esta quantida<strong>de</strong> extra <strong>de</strong> vapor d'água age como um gás<br />
do efeito estufa e aquece o ar ainda mais, quase dobrando o efeito que<br />
esses gases produziriam se agissem sozinhos 2 . Se as emissões <strong>de</strong> gases<br />
do efeito estufa se mantiverem nos níveis atuais, calcula-se que haverá<br />
um aumento mínimo <strong>de</strong> 5°C na temperatura média da Terra, variação<br />
similar à ocorrida <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a última era glacial até os dias <strong>de</strong> hoje.<br />
O aumento da temperatura do globo po<strong>de</strong> provocar alterações<br />
climáticas drásticas que ameaçarão a nossa qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida, o nosso<br />
padrão sócio-econômico e até mesmo a nossa existência. As principais<br />
conseqüências serão:<br />
1- Aumento do nível dos oceanos. Com o aumento da temperatura no<br />
mundo, está em curso o <strong>de</strong>rretimento das calotas polares. Ao aumentar o<br />
nível da águas dos oceanos, po<strong>de</strong> ocorrer, futuramente, a submersão <strong>de</strong><br />
muitas cida<strong>de</strong>s litorâneas. A subida do mar <strong>de</strong>verá inclusive inundar<br />
países inteiros. Tuvalu, com apenas 9 mil habitantes, é atualmente um<br />
dos menores dos cinco países localizados em atóis, e que em breve<br />
<strong>de</strong>ixarão <strong>de</strong> existir. Os outros são: Kiribati, irmã <strong>de</strong> Tuvalu no mesmo<br />
grupo <strong>de</strong> atóis, com uma população <strong>de</strong> 78 mil habitantes; as ilhas<br />
Marshal, com 58 mil; a pequena Tokelau (2 mil habitantes, um território<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte da Nova Zelândia); e as Maldivas, o maior e mais<br />
<strong>de</strong>nsamente povoado <strong>de</strong> todos os grupos insulares com 268 mil<br />
habitantes. Somado à população <strong>de</strong>slocada das áreas litorâneas <strong>de</strong> outras<br />
ilhas, que não constituem atóis, isso já totaliza cerca <strong>de</strong> meio milhão <strong>de</strong><br />
pessoas que repentinamente divorciadas da sua cultura e <strong>de</strong> suas<br />
origens, terão <strong>de</strong> procurar novos lares 3 ;<br />
2 Gabrielle Walker e Sir David King. Como combater o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> e<br />
manter as luzes acesas. Página 24, 2008.<br />
3 Mark Lynas. Seis graus: o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> e o que você po<strong>de</strong> fazer para<br />
evitar uma catástrofe. Página 60, 2008.
2- Crescimento e surgimento <strong>de</strong> <strong>de</strong>sertos. O aumento da temperatura<br />
provoca a morte <strong>de</strong> várias espécies animais e vegetais, <strong>de</strong>sequilibrando<br />
vários ecossistemas. As florestas <strong>de</strong> países tropicais como Brasil, Congo<br />
e Indonésia, po<strong>de</strong>m se "savanizar" e savanas po<strong>de</strong>m se tornar áreas<br />
<strong>de</strong>sérticas. Isso afetará a produção <strong>de</strong> alimentos prejudicando<br />
principalmente as populações mais pobres que não po<strong>de</strong>rão pagar por<br />
alimentos mais caros e escassos. Os conflitos por água e alimentos<br />
aumentarão;<br />
3- O <strong>de</strong>sequilíbrio nos ecossistemas trará novas pragas e doenças para o<br />
convívio humano. Um exemplo é a malaria. Ela é transmitida por<br />
mosquitos, que em temperatura quentes toleráveis amadurecem mais<br />
rápido e se multiplicam. A umida<strong>de</strong> também ajuda a espalhar a doença.<br />
As mudanças climáticas levarão a malária para o norte e para as regiões<br />
montanhosas se outros fatores ecológicos não impedirem 4 . Situações<br />
como essa po<strong>de</strong>m se multiplicar;<br />
4- Aumento <strong>de</strong> furacões, tufões e ciclones. O aumento da temperatura<br />
faz com que ocorra maior evaporação das águas dos oceanos,<br />
potencializando estes tipos <strong>de</strong> catástrofes climáticas. Os furacões tipo 4<br />
e 5(os furacões <strong>de</strong> maior intensida<strong>de</strong>) só se formam quando a água do<br />
mar atinge <strong>de</strong>terminada temperatura elevada;<br />
5- Ondas <strong>de</strong> calor. As regiões <strong>de</strong> temperaturas amenas têm sofrido com<br />
as ondas <strong>de</strong> calor. No verão europeu, tradicionalmente, muitas famílias<br />
saem para viajar <strong>de</strong> férias e <strong>de</strong>ixam os parentes idosos sozinhos em casa.<br />
Muitos idosos acabaram morrendo <strong>de</strong>vido aos picos <strong>de</strong> temperatura<br />
nunca vistos em algumas cida<strong>de</strong>s européias, como ocorreu em 2003. O<br />
forte calor na Espanha, França, Holanda, Itália, Portugal e Reino Unido<br />
em 2003 provocou 35 mil mortes 5. Esse fenômeno ten<strong>de</strong> a se intensificar<br />
cada vez mais;<br />
6- Degelo do permafrost, os solos permanentemente congelados da<br />
Região Ártica. Estima-se que cerca <strong>de</strong> 500 bilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong><br />
4 Kirstin Dow e Thomas E. Downing. O Altas da Mudança Climática – O<br />
Mapeamento Completo do Maior Desafio do Planeta. Página 61, 2006.<br />
5 Kirstin Dow e Thomas E. Downing. O Altas da Mudança Climática – O<br />
Mapeamento Completo do Maior Desafio do Planeta. Página 21, 2006.
carbono estejam encerradas nesses solos 6. Esse processo expõe ao ar<br />
várias camadas <strong>de</strong> <strong>de</strong>jetos animais e outros tipos <strong>de</strong> matéria orgânica<br />
<strong>de</strong>ixados pelas criaturas que habitavam a tundra no passado. Isso<br />
propicia a <strong>de</strong>composição por bactérias <strong>de</strong>ssa matéria orgânica, que<br />
acabam "arrotando" dióxido <strong>de</strong> carbono e metano para atmosfera, dois<br />
gases causadores do efeito estufa. O efeito estufa inicial causado pelas<br />
emissões dos combustíveis fósseis e do <strong>de</strong>smatamento gerará, portanto<br />
uma reação em ca<strong>de</strong>ia. Então po<strong>de</strong>remos assistir a formação <strong>de</strong> uma<br />
bomba <strong>de</strong> calor que aquecerá o planeta <strong>de</strong> uma forma incontrolável no<br />
longo prazo.<br />
Todas essas previsões têm feito a comunida<strong>de</strong> internacional se<br />
movimentar. Nos anos 70 e 80 as primeiras reuniões e conferências<br />
governamentais sobre mudanças climáticas ocorreram. Mas o tema só se<br />
tornou central na agenda dos países na década <strong>de</strong> 90. Em 1990, o<br />
primeiro informe com base na colaboração científica <strong>de</strong> nível<br />
internacional foi o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança<br />
Climática, em inglês), on<strong>de</strong> os cientistas advertiram que para estabilizar<br />
os crescentes níveis <strong>de</strong> dióxido <strong>de</strong> carbono (CO2) – o principal gásestufa<br />
– na atmosfera, seria necessário reduzir as emissões <strong>de</strong> 1990 em<br />
60%. Dois anos <strong>de</strong>pois, mais <strong>de</strong> 160 governos assinam a Convenção<br />
Marco sobre Mudança Climática na ECO-92, na cida<strong>de</strong> do Rio <strong>de</strong><br />
Janeiro. O objetivo era evitar interferências antropogênicas perigosas no<br />
sistema climático. Isso <strong>de</strong>veria ser feito rapidamente para po<strong>de</strong>r proteger<br />
as fontes alimentares, os ecossistemas e o <strong>de</strong>senvolvimento social.<br />
Também foi incluída uma meta para que os países industrializados<br />
mantivessem suas emissões <strong>de</strong> gases estufa, em 2000, nos níveis <strong>de</strong><br />
1990. Em 1997 é assinado no Japão o Protocolo <strong>de</strong> Kyoto, um novo<br />
componente da Convenção ocorrida na ECO-92. O acordo internacional<br />
foi assinado por representantes <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 160 países. O objetivo do<br />
Protocolo é reduzir a concentração dos gases causadores do efeito estufa<br />
(GEE) na atmosfera. Por isso, os países industrializados se<br />
comprometeram a reduzir as emissões <strong>de</strong> GEE a media combinada <strong>de</strong><br />
5,2% em relação aos níveis <strong>de</strong> 1990, durante o período a partir do ano<br />
<strong>de</strong> 2008 até 2012. Para os países em <strong>de</strong>senvolvimento, como o Brasil, o<br />
protocolo não previu compromissos <strong>de</strong> reduções <strong>de</strong> GEE.<br />
6 Mark Lynas. Seis graus: o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> e o que você po<strong>de</strong> fazer para<br />
evitar uma catástrofe. Página 182, 2008.
Dentro do Protocolo surgiu um dispositivo chamado <strong>de</strong><br />
mecanismo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento limpo, ou simplesmente MDL, que<br />
permite aos países <strong>de</strong>senvolvidos compensarem suas emissões <strong>de</strong> gases<br />
causadores do efeito estufa por meio <strong>de</strong> projetos que diminuam as<br />
emissões <strong>de</strong> países em <strong>de</strong>senvolvimento. Essencialmente, para ser<br />
aprovado, o projeto precisa efetuar mudanças reais, mensuráveis e <strong>de</strong><br />
longo prazo para a mitigação da mudança do clima. O exigente processo<br />
<strong>de</strong> aprovação inclui dois critérios fundamentais: adicionalida<strong>de</strong> e<br />
sustentabilida<strong>de</strong>. O primeiro requer que o proponente comprove que seu<br />
projeto é realmente importante para <strong>de</strong>sacelerar o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>,<br />
<strong>de</strong>monstrando como era a situação sem o MDL e como passa a ser com<br />
ele. Para ser elegível, é preciso ainda que haja contribuição efetiva para<br />
o <strong>de</strong>senvolvimento sustentável local, promovendo benefícios sócioeconômicos.<br />
O poluidor compra créditos <strong>de</strong> carbono das empresas que<br />
fazem o projeto <strong>de</strong> MDL. Exemplos <strong>de</strong> MDL são projetos <strong>de</strong><br />
reflorestamento, <strong>de</strong> geração <strong>de</strong> biogás em aterros sanitários e <strong>de</strong> energia<br />
eólica. Uma empresa poluidora da Alemanha que teria um custo muito<br />
elevado para diminuir a sua poluição no seu próprio país compra<br />
créditos <strong>de</strong> carbono <strong>de</strong> um projeto <strong>de</strong> reflorestamento no Brasil, capaz<br />
<strong>de</strong> absolver CO2 da atmosfera por um custo muito menor.<br />
O Protocolo <strong>de</strong> Kyoto tem sua importância histórica, apesar das<br />
críticas. Os governos do mundo ratificaram uma legislação que criava<br />
metas <strong>de</strong> redução para os gases do efeito estufa. No entanto, o maior<br />
poluidor do planeta, os Estados Unidos, não ratificou o Protocolo. Esse<br />
veto limitou bastante a abrangência, juntamente com a não inclusão <strong>de</strong><br />
metas para os países emergentes como Brasil, China e Índia. Os países<br />
em <strong>de</strong>senvolvimento crescem economicamente num ritmo mais<br />
acelerado do que os países ricos e nos próximos 20 anos se tornarão o<br />
gran<strong>de</strong> grupo poluidor do planeta. No cumprimento das metas, os países<br />
do Leste Europeu estão atingindo as metas com folga, já que em 1990<br />
eles ainda eram países socialistas com uma indústria muito poluente, e<br />
durante a transição para o capitalismo nos anos 90 tiveram quedas<br />
severas nas suas economias. A maioria dos <strong>de</strong>mais países está tendo<br />
dificulda<strong>de</strong>s para cumprir as metas. Entre esses países que apresentam<br />
dificulda<strong>de</strong>s, alguns como a Alemanha e o Reino Unido estão próximos<br />
da meta <strong>de</strong>vido a soluções interessantes. A Alemanha investiu pesado<br />
em energia eólica, e o Reino Unido vem aumentando a participação das<br />
usinas a gás natural menos poluentes. Alguns grupos ambientalistas<br />
criticam os projetos <strong>de</strong> MDL, afirmando que se trata <strong>de</strong> uma forma <strong>de</strong> os
icos pagarem para poluir. Discordo <strong>de</strong>ssa idéia, pois se há um resultado<br />
concreto (diminuição <strong>de</strong> emissão ou absolvição <strong>de</strong> carbono), ele <strong>de</strong>ve<br />
ser incentivado. É claro que os projetos <strong>de</strong> MDL são paliativos, não são<br />
a solução final, mas são uma parcela da solução.<br />
A maioria absoluta da comunida<strong>de</strong> científica concorda que o<br />
<strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> é causado pelo homem. No total, o relatório IPCC<br />
afirma que mais <strong>de</strong> 29 mil dados <strong>de</strong> observação espalhados em 75<br />
estudos mostram mudanças significativas em sistemas físicos e<br />
biológicos em todo o mundo. E 90% <strong>de</strong>sses dados são exatamente o que<br />
se esperaria <strong>de</strong> um cenário <strong>de</strong> <strong>aquecimento</strong>. E mais: as regiões em que<br />
as alterações estão acontecendo coinci<strong>de</strong>m com as regiões em que um<br />
maior <strong>aquecimento</strong> foi registrado 7. Com isso, a discussão central hoje é<br />
a viabilida<strong>de</strong> econômica ou não da diminuição <strong>de</strong> emissões dos gases do<br />
efeito estufa (GEE). O ex-presi<strong>de</strong>nte americano Bush não ratificou o<br />
Protocolo <strong>de</strong> Kyoto afirmando que ele diminuiria a lucrativida<strong>de</strong> das<br />
empresas americanas. Alguns países em <strong>de</strong>senvolvimento não aceitam<br />
metas <strong>de</strong> redução dos GEE, por afirmarem que o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong><br />
vem sendo intensificado pelas emissões lançadas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a Revolução<br />
Industrial no século XVIII pelos países que atualmente são ricos. Então<br />
argumentam que se os países ricos poluíram para se <strong>de</strong>senvolver, os<br />
países emergentes também tem esse direito, <strong>de</strong>vendo haver metas <strong>de</strong><br />
redução <strong>de</strong> poluição apenas para os países ricos. De fato, estima-se que<br />
cerca <strong>de</strong> 1/3 do CO2 emitido ao longo dos últimos 200 anos ainda está<br />
concentrado na atmosfera, sendo responsável por boa parte do efeito<br />
estufa atual. No entanto, a responsabilida<strong>de</strong> é <strong>de</strong> todos nós, pois com o<br />
aumento da participação na poluição <strong>global</strong> por parte dos países em<br />
<strong>de</strong>senvolvimento, qualquer acordo <strong>de</strong> criação <strong>de</strong> metas <strong>de</strong> poluição sem<br />
a presença <strong>de</strong>sses países, não conterá o <strong>aquecimento</strong> planetário. A<br />
maioria dos governantes do mundo discursa a favor do meio-ambiente e<br />
<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m verbalmente metas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> emissões no longo prazo.<br />
No entanto, são árduos inimigos do planeta na prática, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ndo um<br />
suposto pragmatismo econômico e não aceitando metas <strong>de</strong> redução no<br />
curto prazo. Contra essa posição estão a comunida<strong>de</strong> científica, os<br />
ambientalistas e uma classe emergente <strong>de</strong> novos políticos, que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m<br />
uma transição rápida da nossa matriz energética viciada em carbono<br />
para uma matriz limpa e renovável. A pergunta principal é: Quanto<br />
7 Gabrielle Walker e Sir David King. Como combater o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> e<br />
manter as luzes acesas. Página 50, 2008
dinheiro temos que gastar para estabilizar a temperatura do planeta ou<br />
mantê-la num patamar aceitável (até 2°C <strong>de</strong> aumento)? A resposta é<br />
controversa, pois cada especialista <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> uma forma diferente <strong>de</strong><br />
conter o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>. Mas todos convergem para a necessida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> investirmos entre 1 e 2% do PIB Mundial para evitar uma<br />
hecatombe climática e econômica no longo prazo. Parte do valor<br />
investido trará retorno econômico na forma <strong>de</strong> economia no consumo <strong>de</strong><br />
energia. Esse investimento é viável tecnicamente, mas evi<strong>de</strong>ntemente<br />
gerará uma pequena diminuição na taxa <strong>de</strong> crescimento econômico<br />
mundial no curto prazo, que os <strong>de</strong>fensores do aumento <strong>de</strong> riqueza a<br />
qualquer custo não querem abrir mão.
Capítulo 2: A origem das emissões <strong>de</strong> gases estufa<br />
O Quarto Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima<br />
(IPCC), <strong>de</strong> 2007, congregou os maiores especialistas do tema<br />
<strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>. Segundo o painel, precisamos diminuir entre 50% e<br />
85% as nossas emissões <strong>de</strong> gases do efeito estufa até 2050, em relação<br />
às emissões <strong>de</strong> 2000. Dessa forma po<strong>de</strong>remos limitar o aumento <strong>de</strong><br />
temperatura do planeta em 2°C, limite consi<strong>de</strong>rado seguro pelos<br />
cientistas para que as conseqüências ambientais sejam brandas. Uma<br />
redução <strong>de</strong> 30% das emissões <strong>de</strong> gases estufa até 2030, e a continuação<br />
<strong>de</strong>sse ritmo <strong>de</strong> redução até 2050, é necessária para se atingir o objetivo.<br />
O primeiro passo é quantificar as emissões planetárias. Para isso<br />
usaremos os dados do IPCC <strong>de</strong> 2007. No ano <strong>de</strong> 2004 o mundo emitiu<br />
49 bilhões <strong>de</strong> toneladas equivalentes <strong>de</strong> CO2. O leitor po<strong>de</strong> perguntar: o<br />
que isso significa? Isso significa que o <strong>aquecimento</strong> provocado pela<br />
soma <strong>de</strong> todos os tipos <strong>de</strong> gases estufa emitidos no ano <strong>de</strong> 2004 equivale<br />
ao <strong>aquecimento</strong> provocado por 49 bilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong> CO2, levandose<br />
em conta o tempo que os diferentes gases permanecem na atmosfera.<br />
No gráfico seguinte temos a distribuição das emissões <strong>de</strong> GEE<br />
mundiais 8 :<br />
8 Fonte do gráfico: IPCC 2007, grupo <strong>de</strong> trabalho 3, capítulo I. O gráfico po<strong>de</strong><br />
ser encontrado no site em inglês: http://www.ipcc.ch/pdf/assessmentreport/ar4/wg3/ar4-wg3-chapter1.pdf
O gás metano (CH4) é o segundo gás estufa com maior<br />
quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> emissões em toneladas equivalentes <strong>de</strong> CO2,<br />
representando 14,3% das emissões totais. Elas estão concentradas no<br />
setor <strong>de</strong> agricultura e no setor <strong>de</strong> resíduos. No setor agrícola as<br />
principais fontes emissoras são o arroto dos animais (ex. vacas, porcos)<br />
e o cultivo <strong>de</strong> arroz. No setor <strong>de</strong> resíduos os gran<strong>de</strong>s lançadores são os<br />
lixões das gran<strong>de</strong>s cida<strong>de</strong>s. Uma tonelada <strong>de</strong> metano emitida equivale a<br />
21 toneladas <strong>de</strong> dióxido <strong>de</strong> carbono, quanto ao nível <strong>de</strong> <strong>aquecimento</strong> da<br />
atmosfera. Muitos projetos <strong>de</strong> MDL <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> emissões do gás<br />
metano queimam o gás e geram energia elétrica através do calor obtido<br />
da reação. A reação também gera dióxido <strong>de</strong> carbono, diminuindo o<br />
nível <strong>de</strong> poluição, já que como foi citado acima o <strong>aquecimento</strong> da<br />
atmosfera provocado pelo dióxido <strong>de</strong> carbono é menor do que o<br />
<strong>aquecimento</strong> provocado pelo metano. O óxido nitroso (N2O) é o terceiro<br />
gás estufa com maior quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> emissões em toneladas equivalentes<br />
<strong>de</strong> CO2, representando 7,9% das emissões totais. Elas estão<br />
concentradas em sua maioria no setor agrícola, sendo lançadas<br />
principalmente pelos solos agrícolas, após o uso indiscriminado <strong>de</strong><br />
fertilizantes nitrogenados.<br />
Os gases-F representam apenas 1,1% das emissões totais em<br />
toneladas equivalentes <strong>de</strong> CO2. Elas estão concentradas principalmente<br />
no setor industrial. Em geral 1 tonelada <strong>de</strong>sses gases apresenta um<br />
potencial <strong>de</strong> <strong>aquecimento</strong> centenas <strong>de</strong> vezes ou até milhares <strong>de</strong> vezes<br />
maior do que 1 tonelada <strong>de</strong> dióxido <strong>de</strong> carbono. Como exemplo po<strong>de</strong>-se<br />
citar o SF6 (Hexafluoreto <strong>de</strong> enxofre), que tem uma capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
<strong>aquecimento</strong> do planeta 22200 vezes maior que o CO2 e é usado como<br />
isolante térmico, condutor <strong>de</strong> calor e agente refrigerante. No mercado <strong>de</strong><br />
crédito <strong>de</strong> carbono, um MDL que evita o lançamento do SF6, po<strong>de</strong><br />
ven<strong>de</strong>r para uma empresa poluidora 1 tonelada <strong>de</strong> SF6 evitada por<br />
220000 9 dólares. Isso torna a transição para uma indústria limpa nesses<br />
setores altamente lucrativa. Não por acaso, 25% dos projetos redutores<br />
<strong>de</strong> emissões no período 2004-2005 foram <strong>de</strong> eliminação <strong>de</strong> HFCs 10 .<br />
9 Se evitarmos o lançamento <strong>de</strong> 1 tonelada <strong>de</strong> SF6, estaremos anulando 22200<br />
toneladas <strong>de</strong> CO2 emitidas ( 22200 x 10 dólares). Os 10 dólares se referem ao<br />
preço médio <strong>de</strong> 1 tonelada <strong>de</strong> CO2 evitada no mercado <strong>de</strong> créditos <strong>de</strong> carbono.<br />
10 Kirstin Dow e Thomas E. Downing. O Altas da Mudança Climática – O<br />
Mapeamento Completo do Maior Desafio do Planeta. Página 75, 2006.
As emissões mundiais <strong>de</strong> dióxido <strong>de</strong> carbono (CO2) são<br />
compostas basicamente da queima <strong>de</strong> combustíveis fósseis e do<br />
<strong>de</strong>smatamento. Temos 4 "torneiras" <strong>de</strong> carbono que precisam ser<br />
fechadas: gás natural, petróleo, carvão e <strong>de</strong>smatamento. As emissões <strong>de</strong><br />
CO2 foram responsáveis por 76,7% do <strong>aquecimento</strong> provocado pelos<br />
gases estufa lançados artificialmente em 2004. Isso evi<strong>de</strong>ncia que o<br />
nível <strong>de</strong> emissões <strong>de</strong> CO2 em quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> toneladas emitidas em<br />
relação aos outros gases estufa é muito superior, já que mesmo sendo<br />
menos poluente por tonelada emitida, o CO2 é o gás estufa que mais<br />
influencia no <strong>aquecimento</strong> planetário. O <strong>de</strong>smatamento, concentrado nas<br />
florestas tropicais remanescentes, é incentivado pela expansão da<br />
agricultura e da pecuária em busca <strong>de</strong> novas terras baratas e pela<br />
exploração predatória <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira. Os combustíveis fósseis lançadores<br />
<strong>de</strong> CO2 respon<strong>de</strong>m por 56,6% das emissões totais <strong>de</strong> gases estufa e por<br />
81% da matriz energética mundial, sustentando a produção econômica<br />
mundial. Essa <strong>de</strong>pendência energética é incentivada pelos custos<br />
elevados das outras fontes <strong>de</strong> energia. O gráfico 11 abaixo nos mostra a<br />
participação <strong>de</strong> cada fonte primária na matriz energética mundial:<br />
Apesar da li<strong>de</strong>rança do petróleo, em relação aos outros dois<br />
combustíveis fósseis, não po<strong>de</strong>mos esquecer que o carvão mineral é<br />
mais poluente que o petróleo por unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> energia, sendo as emissões<br />
11 Os dados estão na edição 2007 do “World Energy Outlook” da Agência<br />
Internacional <strong>de</strong> Energia. O relatório está no site em inglês:<br />
http://www.iea.org/textbase/nppdf/free/2007/weo_2007.pdf
totais dos 2 combustíveis muito próximas. O gás natural é o que<br />
apresenta menor quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> emissões por unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> energia e<br />
menor participação na matriz energética entre os três fósseis. Também é<br />
importante especificar quais tipos <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s econômicas mais<br />
contribuem para o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>. O gráfico abaixo nos mostra a<br />
participação dos principais setores da economia mundial nas emissões<br />
globais <strong>de</strong> gases <strong>de</strong> efeito estufa em 2004 12 :<br />
Esse gráfico não se refere apenas as emissões <strong>de</strong> CO2. As<br />
emissões da agricultura são compostas basicamente dos gases metano<br />
(CH4) e óxido nitroso (N2O). Na indústria uma parcela pequena das<br />
emissões é <strong>de</strong> óxido nitroso, gases-F e metano. As emissões dos setores<br />
<strong>de</strong> edifícios, <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> energia elétrica, <strong>de</strong> produção industrial e <strong>de</strong><br />
transportes são compostas na maioria <strong>de</strong> CO2 produzido pelos<br />
combustíveis fósseis. As emissões dos edifícios são li<strong>de</strong>radas pelo<br />
petróleo. Exemplos do uso do petróleo nesse setor são o cozimento <strong>de</strong><br />
alimentos e o <strong>aquecimento</strong> <strong>de</strong> água com o gás liqüefeito <strong>de</strong> petróleo<br />
(GLP). Os 7,9% <strong>de</strong> participação das emissões dos edifícios não<br />
computam as emissões provenientes do consumo <strong>de</strong> energia elétrica dos<br />
edifícios. Se adicionarmos as emissões provenientes do consumo <strong>de</strong><br />
energia elétrica nos edifícios (que estão incluídas na categoria<br />
“produção <strong>de</strong> energia“), as emissões dos edifícios chegam<br />
aproximadamente a 18% do total. O gás natural e o carvão mineral<br />
12 Fonte do gráfico: IPCC 2007, grupo <strong>de</strong> trabalho 3, capítulo I. O gráfico<br />
po<strong>de</strong> ser encontrado no site em inglês:<br />
http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar4/wg3/ar4-wg3-chapter1.pdf
li<strong>de</strong>ram as emissões <strong>de</strong> CO2 e a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> energia produzida na<br />
geração <strong>de</strong> energia elétrica e <strong>de</strong> energia primária na indústria, os setores<br />
com as maiores emissões. Abaixo temos um gráfico com a participação<br />
<strong>de</strong> cada fonte na geração <strong>de</strong> energia elétrica mundial 13 :<br />
Origem da energia elétrica consumida pela economia mundial em 2005.<br />
(Agência Internacional <strong>de</strong> Energia, WEO-2007)<br />
A geração <strong>de</strong> eletricida<strong>de</strong> através das fontes hidráulica e nuclear<br />
não libera gases estufa em quantida<strong>de</strong> significativa. Os lí<strong>de</strong>res carvão e<br />
gás são muito baratos e o carvão especificamente é abundante. O<br />
petróleo em contrapartida é caro e apresenta uma participação pequena<br />
<strong>de</strong> 6,6% do total e <strong>de</strong> 9,9% se contarmos apenas a geração com<br />
combustíveis fósseis. Sempre que se fala em fim do petróleo, se associa<br />
a sua substituição às fontes <strong>de</strong> energias renováveis como energia eólica<br />
e solar, mas essas fontes limpas estacionárias <strong>de</strong>verão substituir na<br />
maioria dos casos o carvão mineral e o gás natural. Quanto ao custo do<br />
petróleo, uma termelétrica a diesel por exemplo, gera energia muito<br />
mais cara do que uma similar a gás ou carvão. Então porque sendo tão<br />
caro, o petróleo é tão importante e valioso para o setor energético?<br />
Porque ele é o combustível portátil que sustenta o setor <strong>de</strong> transportes<br />
no mundo. Todos os processos econômicos atuais <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m <strong>de</strong> uma<br />
re<strong>de</strong> <strong>de</strong> transportes terrestres, marítimos e aéreos. O abastecimento do<br />
setor <strong>de</strong> transportes pelo carvão mineral, que é sólido, não é viável<br />
13 Os dados estão na edição 2007 do “World Energy Outlook” da Agência<br />
Internacional <strong>de</strong> Energia. O relatório está no site em inglês:<br />
http://www.iea.org/textbase/nppdf/free/2007/weo_2007.pdf
econômicamente na maioria dos casos, apesar <strong>de</strong> o carvão po<strong>de</strong>r<br />
tecnicamente ser transformado em combustível líquido. O combustível<br />
sintético do carvão aten<strong>de</strong> meta<strong>de</strong> da <strong>de</strong>manda por gasolina e diesel da<br />
África do Sul, e com os altos preços do petróleo mundial, os<br />
combustíveis sintéticos <strong>de</strong> carvão estão se tornando competitivos em<br />
outras partes do mundo. A liquefação do carvão produz muito mais CO2<br />
do que o refinamento convencional do petróleo 14 . O gás natural<br />
necessita <strong>de</strong> uma gigantesca re<strong>de</strong> <strong>de</strong> abastecimento para ser implantado,<br />
sendo mais viável para geração <strong>de</strong> energia próximo a reserva num lugar<br />
fixo. Temos abaixo um gráfico com a parcela <strong>de</strong> cada matriz no setor <strong>de</strong><br />
transportes 15 :<br />
Origem da energia consumida pelo setor <strong>de</strong> transportes da economia<br />
mundial em 2005. (AIE, WEO-2007)<br />
A li<strong>de</strong>rança do petróleo é avassaladora. O alto valor do petróleo<br />
acaba tornando o mercado <strong>de</strong> energia do petróleo superior<br />
economicamente ao mercado <strong>de</strong> energia do gás natural e do carvão<br />
mineral. Uma alternativa ao uso do petróleo no setor <strong>de</strong> transportes,<br />
seria usar um carro elétrico abastecido na re<strong>de</strong> <strong>de</strong> energia elétrica com<br />
energia proveniente <strong>de</strong> uma termelétrica a carvão ou mesmo <strong>de</strong> uma<br />
usina hidrelétrica que é limpa. Um carro elétrico gasta em dinheiro até 3<br />
vezes menos para rodar do que um carro a gasolina, apresentando uma<br />
eficiência <strong>de</strong> 65% na conversão <strong>de</strong> energia contra 20% do carro a<br />
gasolina, que <strong>de</strong>sperdiça a maior parte da energia gerando calor. O<br />
problema é que as baterias tem uma <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> energética muito inferior<br />
14 Mark Lynas. Seis graus: o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> e o que você po<strong>de</strong> fazer para<br />
evitar uma catástrofe. Página 251, 2008.<br />
15 Os dados estão na edição 2007 do “World Energy Outlook” da Agência<br />
Internacional <strong>de</strong> Energia. O relatório está no site em inglês:<br />
http://www.iea.org/textbase/nppdf/free/2007/weo_2007.pdf
a <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um tanque <strong>de</strong> gasolina, o que diminui drasticamente a<br />
autonomia do carro elétrico, além do abastecimento que <strong>de</strong>mora<br />
algumas horas.<br />
O petróleo e o gás natural tem reservas comprovadas para<br />
aproximadamente mais 50 anos <strong>de</strong> consumo atual, enquanto o carvão<br />
mineral tem reservas para sustentar o consumo mundial atual por mais<br />
<strong>de</strong> 200 anos. O carvão mineral po<strong>de</strong> sustentar a matriz energética<br />
mundial no futuro, abastecendo os carros elétricos(com as limitações já<br />
citadas) através da energia proveniente das termelétricas, ou através do<br />
caro carvão líquido. No entanto ele é o combustível fóssil mais<br />
poluente, emitindo até 150% mais CO2 que o gás natural e 50% mais<br />
CO2 que o diesel, com a mesma energia gerada. O uso intensivo do<br />
carvão mineral acelerará mais ainda o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>. Temos<br />
portanto, duas crises no setor <strong>de</strong> energia. Uma crise ambiental, pois<br />
todos os setores <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m da geração <strong>de</strong> energia fóssil, que aumenta o<br />
<strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>, e uma crise econômica restrita ao setor <strong>de</strong><br />
transportes <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do petróleo e que enfrenta a sua escassez.
Capítulo 3: As dificulda<strong>de</strong>s para substituir a matriz<br />
energética fóssil<br />
Vimos no capítulo passado que os combustíveis fósseis<br />
representam a expressiva participação <strong>de</strong> 56,6% nas emissões mundiais<br />
<strong>de</strong> gases estufa. Temos <strong>de</strong> lado um combustível caro e portátil, que<br />
representa a maior fatia do mercado <strong>de</strong> energia no mundo entre os<br />
fósseis, como o petróleo, e do outro lado o carvão mineral e o gás<br />
natural mais baratos e predominantemente não portáteis. Uma menor<br />
participação <strong>de</strong>ssa matriz energética fóssil é essencial para alcançarmos<br />
a meta <strong>de</strong> 30% <strong>de</strong> diminuição <strong>de</strong> gases estufa até 2030. No entanto,<br />
existem muitas problemas que dificultam esse processo. O principal<br />
chama-se tempo. As termelétricas fósseis, por exemplo, possuem uma<br />
vida útil <strong>de</strong> até 40 anos, sendo portanto a substituição por novas usinas<br />
lenta. Além disso, as empresas do setor planejam investimentos com<br />
anos <strong>de</strong> antecedência, principalmente em pesquisa. No caso do<br />
transporte rodoviário, que representa a maioria das emissões do setor <strong>de</strong><br />
transportes, ocorre um cenário parecido. Os carros e caminhões novos<br />
têm uma vida útil <strong>de</strong> 20 anos. Temos uma infra-estrutura <strong>de</strong><br />
fornecimento (ex. postos <strong>de</strong> gasolina) <strong>de</strong> <strong>de</strong>rivados <strong>de</strong> petróleo (diesel,<br />
querosene, gasolina) com vida útil longa. No parque industrial, o<br />
problema também se repete quanto ao tempo <strong>de</strong> vida útil. Um país que<br />
<strong>de</strong>cretasse o fechamento <strong>de</strong> todas termelétricas nos próximos 20 anos<br />
teria que arcar com os custos <strong>de</strong> implantação <strong>de</strong> novas usinas <strong>de</strong> geração<br />
<strong>de</strong> energia limpa, mais caras do que as usinas fósseis, e com os custos <strong>de</strong><br />
in<strong>de</strong>nização das empresas proprietárias das usinas e <strong>de</strong> seus respectivos<br />
acionistas. Uma proibição <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> novas usinas termelétricas<br />
também po<strong>de</strong> esbarrar nos lobbys políticos das empresas donas das<br />
gran<strong>de</strong>s jazidas <strong>de</strong> carvão, gás e petróleo, que não aceitam per<strong>de</strong>r<br />
bilhões <strong>de</strong> dólares em patrimônio na forma <strong>de</strong> reservas sem uma justa<br />
in<strong>de</strong>nização. Uma ponto dramático que piora a situação é o crescimento<br />
econômico acelerado acima <strong>de</strong> 7% ao ano da India e da China, com<br />
populações somadas <strong>de</strong> quase 2,5 bilhões <strong>de</strong> habitantes e que tem o<br />
carvão barato, o combustível mais poluente do mundo, como a principal<br />
fonte energética. Uma solução plausível seria os governos agirem nos<br />
mercados com incentivos para as empresas renováveis ou com a<br />
taxação <strong>de</strong> impostos sobre as termelétricas poluidoras, a fim <strong>de</strong> diminuir<br />
gradativamente no <strong>de</strong>correr dos próximos anos a participação das
termelétricas nas novas plantas <strong>de</strong> geração <strong>de</strong> energia elétrica. No<br />
entanto não po<strong>de</strong>mos esquecer <strong>de</strong> um <strong>de</strong>talhe: a elasticida<strong>de</strong> dos preços<br />
dos combustíveis fósseis, tanto no mercado <strong>de</strong> geração <strong>de</strong> energia<br />
elétrica, quanto no mercado <strong>de</strong> transportes. Se as energias renováveis se<br />
tornarem mais baratas do que os combustíveis sujos através dos<br />
incentivos dos governos ou <strong>de</strong> avanços tecnológicos restará ainda aos<br />
fornecedores <strong>de</strong> combustíveis baixarem os preços para se manterem<br />
dominantes do mercado. Não se <strong>de</strong>ve subestimar a capacida<strong>de</strong> da<br />
indústria fóssil <strong>de</strong> reduzir os preços numa concorrência direta com as<br />
energias renováveis. Com a queda drástica do preço do petróleo na crise<br />
financeira <strong>de</strong> 2008, por exemplo, se reduziu o interesse do consumidor<br />
americano por carros híbridos. Essa redução não foi intencional, mas<br />
po<strong>de</strong> se tornar no futuro para manter a soberania do petróleo, por<br />
exemplo. O custo <strong>de</strong> exploração da maioria das jazidas <strong>de</strong> petróleo no<br />
mundo é muito inferior as valores <strong>de</strong> mercado do líquido. O valor <strong>de</strong><br />
mercado elevado só se justifica pela escassez <strong>de</strong> jazidas e pelo<br />
monopólio das jazidas em poucas mãos. Os preços são controlados pela<br />
OPEP, a Organização dos Países Exportadores <strong>de</strong> Petróleo. Uma<br />
fornecedora <strong>de</strong> petróleo por exemplo que lucra com um barril a 80<br />
dólares nos dias atuais, po<strong>de</strong> continuar lucrando com um barril a 40<br />
dólares e sofrendo expressivas taxações <strong>de</strong> impostos. Empresas extraem<br />
petróleo com sucesso econômico no longícuo Alasca americano com<br />
pesadas taxações <strong>de</strong> impostos.<br />
Apenas as leis do mercado não resolverão o problema. A solução<br />
passa inicialmente pelo incentivo governamental ao aumento da<br />
eficiência energética na indústria e na produção <strong>de</strong> energia elétrica,<br />
possibilitando uma diminuição na <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> combustíveis fósseis e<br />
consequentemente uma redução no aumento <strong>de</strong> emissões. Na produção<br />
<strong>de</strong> energia o incentivo às fontes limpas através <strong>de</strong> subsídios <strong>de</strong>ve ser<br />
acompanhada <strong>de</strong> uma forte regulação que possa impedir que os cartéis<br />
dos combustíveis fósseis imponham temporariamente preços<br />
artificialmente baixos para manter o domínio do mercado. Também se<br />
faz importante o incentivo a um mix <strong>de</strong> fontes limpas (eólica, solar,<br />
biomassa, nuclear, hidrelétrica), para que cada uma contribua no limite<br />
do seu potencial. Uma alternativa seria os governos criarem cotas<br />
estabelecendo que uma parcela consi<strong>de</strong>rável das novas plantas <strong>de</strong><br />
energia sejam obrigatoriamente <strong>de</strong> fontes energéticas limpas.
No setor <strong>de</strong> transportes é importante inicialmente a expansão <strong>de</strong><br />
tecnologias que já são viáveis economicamente hoje como o carro<br />
híbrido e o carro a álcool. O álcool é limpo e renovável porque o CO2<br />
emitido na combustão do carro é anulado pelo CO2 foi absolvido no<br />
crescimento da plantação <strong>de</strong> cana ou milho. Ele po<strong>de</strong> ser usado<br />
individualmente ou misturado numa proporção <strong>de</strong> até 24% 16 na<br />
gasolina. A melhor alternativa são os carros flex que po<strong>de</strong>m rodar com<br />
álcool e gasolina com um aumento mínimo dos custos <strong>de</strong> produção.<br />
Esses carros rodam com um combustível renovável e limpo e protegem<br />
o consumidor <strong>de</strong> um possível <strong>de</strong>sabastecimento do álcool, com a opção<br />
da gasolina. Os carros flex são sucesso no Brasil, constituindo a maioria<br />
absoluta da frota <strong>de</strong> carros novos. O álcool po<strong>de</strong> substituir<br />
a<strong>de</strong>quadamente até 20% da <strong>de</strong>manda mundial <strong>de</strong> gasolina. As limitações<br />
se referem a falta <strong>de</strong> terras para plantar cana-<strong>de</strong>-açúcar ou milho e<br />
abastecer a população mundial <strong>de</strong> alimentos simultaneamente. Além<br />
disso, o álcool não substitui o diesel usado nos caminhões, ônibus, trens<br />
e navios que tem motores com uma vida útil muito superior. O<br />
biodiesel, o substituto biológico do diesel, ainda tem um custo muito<br />
elevado. O carro híbrido tem um motor a gasolina e outro elétrico. O<br />
motor elétrico aproveita parte da energia <strong>de</strong>sperdiçada pelo motor a<br />
gasolina que é armazenada numa bateria (ex: energia dos freios).<br />
Quando o carro está parado num sinal ele funciona exclusivamente<br />
como o motor elétrico e quando se movimenta os dois motores po<strong>de</strong>m<br />
funcionar simultaneamente. Um carro híbrido tem uma diminuição <strong>de</strong><br />
consumo <strong>de</strong> gasolina entre 25% e 50%. Por outro lado ele é mais caro<br />
<strong>de</strong> se produzir que um carro exclusivamente a gasolina. Se estima que<br />
em até 8 anos esse custo extra se paga. Além da expansão das<br />
tecnologias viáveis, um caminho vigoroso <strong>de</strong> substituição gradual do<br />
petróleo no setor <strong>de</strong> transportes precisa incentivar melhorias <strong>de</strong><br />
eficiência energética e incentivar tecnologias que hoje ainda não são<br />
viáveis como os biocombustíveis <strong>de</strong> 2ª geração.<br />
Nesse contexto <strong>de</strong> dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> substituição da matriz fóssil,<br />
um ângulo interessante a ser avaliado é a posição dos países produtores<br />
<strong>de</strong> petróleo. O seleto grupo <strong>de</strong> países produtores <strong>de</strong> petróleo não quer<br />
abrir mão da prosperida<strong>de</strong> em nome do meio-ambiente. No caso do<br />
Brasil, um novo integrante do grupo, a socieda<strong>de</strong> comemorou as<br />
16 Proporção <strong>de</strong> álcool presente na gasolina brasileira.
<strong>de</strong>scobertas <strong>de</strong> petróleo na camada do pré-sal 17 , que tornaram o país<br />
dono <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 80 bilhões <strong>de</strong> barris <strong>de</strong> reservas estimadas. A<br />
<strong>de</strong>scoberta acelerará o crescimento econômico do Brasil nas próximas<br />
décadas através da exportação do petróleo. A Petrobrás, a estatal <strong>de</strong><br />
petroleo do Brasil, projeta investimentos em gigantescas refinarias <strong>de</strong><br />
petroleo em estados pobres como Ceará, Pernambuco e Maranhão. Os<br />
governadores e as populações <strong>de</strong>sses estados vêem o refino do petróleo<br />
do pré-sal como a chegada <strong>de</strong>finitiva da prosperida<strong>de</strong> econômica. Se<br />
comemora o crescimento econômico mas se esquece dos bilhões <strong>de</strong><br />
toneladas <strong>de</strong> CO2 que os bilhões <strong>de</strong> barris <strong>de</strong> petróleo po<strong>de</strong>rão lançar<br />
nos próximos 40 anos. A paixão brasileira pelo petróleo também ocorre<br />
em outros países produtores. Por outro lado a questão das emissões<br />
passadas <strong>de</strong> gases estufa volta à tona. Os Estados Unidos cresceram<br />
economicamente com a ajuda do petróleo. A Noruega é atualmente o<br />
país mais rico da Europa <strong>de</strong>vido principalmente a exportação <strong>de</strong><br />
petróleo. Então por que a pobre Angola na África <strong>de</strong>veria parar <strong>de</strong><br />
exportar petróleo ou o Brasil não <strong>de</strong>veria explorar o pré-sal para<br />
melhorar os indicadores sociais <strong>de</strong> suas regiões pobres? A melhor<br />
opção é que os países produtores tenham liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> produção e<br />
exportação, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que cada um assuma metas internas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong><br />
emissões <strong>de</strong> gases estufa. O controle do volume <strong>de</strong> exportações e<br />
conseqüentemente <strong>de</strong> consumo dos países importadores ficaria a cargo<br />
dos países consumidores. Felizmente os países que representam a maior<br />
fatia da economia mundial (Estados Unidos, China, Japão, gran<strong>de</strong> parte<br />
da Europa Oci<strong>de</strong>ntal) são importadores <strong>de</strong> petróleo e por isso tem<br />
gran<strong>de</strong> interesse na redução do consumo. Um acordo <strong>de</strong> redução <strong>de</strong><br />
emissões <strong>de</strong> gases estufa ratificado por todos os países geraria uma<br />
redução no consumo do petróleo e uma redução natural e gradual no<br />
volume das exportações dos países produtores <strong>de</strong> petróleo sem severas<br />
imposições.<br />
As variáveis do problema da substituição da matriz fóssil citadas<br />
nesse capítulo apontam para a viabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma transição possível<br />
para uma matriz limpa, mas que precisa ser custeada por incentivos<br />
estatais e que precisa ser gradual para evitar custos econômicos<br />
excessivos. Os incentivos governamentais precisam <strong>de</strong> apoio político<br />
17 Camada que fica a até 7000 metros <strong>de</strong> profundida<strong>de</strong> na plataforma<br />
marítima brasileira abaixo da camada <strong>de</strong> sal, on<strong>de</strong> foram encontradas<br />
recentemente vultuosas reservas <strong>de</strong> pétroleo e gás natural.
para sair do papel. No entanto, em geral os governos não estão dispostos<br />
a colaborar, trocando uma parte do crescimento econômico no curto<br />
prazo por sustentabilida<strong>de</strong> ambiental no longo prazo. Um presi<strong>de</strong>nte <strong>de</strong><br />
um país, com uma reeleição complicada, acredita que a troca<br />
investimentos na construção <strong>de</strong> estradas e geração <strong>de</strong> empregos por<br />
investimentos que evitem emissões <strong>de</strong> CO2, lhe tirará votos. Mudanças<br />
tecnológicas em direção a tecnologias mais limpas na maioria dos casos<br />
só são implementadas quando os custos são mínimos. Um exemplo<br />
disso é a tecnologia dos catalisadores em automóveis. Quando um carro<br />
realiza combustão ele lança basicamente CO2 e uma pequena fração <strong>de</strong><br />
monóxido <strong>de</strong> carbono (CO), enxofre e outros poluentes, frutos da<br />
combustão incompleta da gasolina. Essa pequena fração <strong>de</strong> gases são<br />
altamente venenosos e provocam todos anos milhares <strong>de</strong> mortes por<br />
doenças respiratórias no mundo. O catalisador evita a emissão <strong>de</strong>sses<br />
poluentes, tornando os carros até 40 vezes menos poluentes que nos<br />
anos 70. No entanto essa poluição se refere apenas aos gases que fazem<br />
mal diretamente a saú<strong>de</strong> do homem. O CO2, que é a maioria absoluta<br />
das emissões, não faz mal a saú<strong>de</strong> quando é lançado na atmosfera mas é<br />
responsável pelo <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>. Ele só representa um perigo a<br />
saú<strong>de</strong> em níveis altíssimos, geralmente só encontrados em ambientes<br />
fechados. Então é sempre importante discernir os gases venenosos<br />
(monóxido <strong>de</strong> carbono, enxofre e outros) causadores das doenças<br />
respiratórias, do CO2 que não faz mal à saú<strong>de</strong> mas interfere no clima.<br />
Os gases venenosos estão diminuindo gradativamente nas gran<strong>de</strong>s<br />
cida<strong>de</strong>s por conta da frota com catalisadores, mas o CO2 está crescendo<br />
<strong>de</strong>vido ao aumento do número <strong>de</strong> veículos, sendo a emissão<br />
proporcional ao consumo <strong>de</strong> gasolina.<br />
Por último uma alternativa que po<strong>de</strong>ria inesperadamente mudar a<br />
rota provável <strong>de</strong> transição energética lenta seria um choque tecnológico<br />
que reduzisse drasticamente os custos da energia, que os tornasse mais<br />
baratos do que os custos <strong>de</strong> produção dos combustíveis fósseis. Quanto<br />
a esse choque, a fonte revolucionária mais promissora é a fusão nuclear,<br />
a energia das estrelas. A energia gerada pelo Sol, por exemplo, provém<br />
da fusão nuclear. A fusão nuclear é diferente da fissão nuclear, usada<br />
nas usinas atômicas convencionais. Tanto a fusão quanto a fissão<br />
baseiam-se em reações nucleares, não em reações químicas como a<br />
combustão. Uma reação química envolve apenas a eletrosfera dos<br />
átomos: os núcleos atômicos permanecem intocados. Já em uma reação<br />
nuclear, como a própria expressão indica, os núcleos atômicos
interagem e são transformados, em processos físicos que envolvem<br />
muito mais energia do que nas reações químicas. A diferença entre as<br />
duas formas básicas <strong>de</strong> liberação <strong>de</strong> energia nuclear é que, na fissão,<br />
núcleos pesados (como o dos átomos <strong>de</strong> urânio) são divididos em<br />
núcleos menores, enquanto na fusão núcleos leves (como o dos átomos<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>utério) são soldados e formam um único núcleo mais pesado. A<br />
fusão nuclear tem vantagens importantes sobre a fissão, pois emite baixa<br />
poluição radioativa e possui baixo risco <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>ntes. O problema é que<br />
um gerador <strong>de</strong> energia com fusão nuclear ainda não foi viabilizado<br />
tecnicamente e os especialistas acreditam que dificilmente isso será<br />
possível nas próximas décadas. A fusão nuclear ocorre apenas a<br />
temperaturas muito altas, nas quais a matéria se encontra em um estado<br />
conhecido como plasma (que não é líquido, sólido, nem gasoso). O<br />
controle da reação <strong>de</strong> fusão <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> do confinamento <strong>de</strong>sse plasma no<br />
interior <strong>de</strong> um reator, que possa transformar a energia gerada em alguma<br />
forma aproveitável economicamente. Este confinamento do plasma tem<br />
sido a principal dificulda<strong>de</strong> no <strong>de</strong>senvolvimento dos reatores <strong>de</strong> fusão.
Capítulo 4: As previsões internacionais acerca das<br />
emissões mundiais <strong>de</strong> CO2 e do aumento da temperatura<br />
da Terra nos próximos anos<br />
A Agência Internacional <strong>de</strong> Energia prevê em seus relatórios um<br />
aumento das emissões ligadas aos combustíveis fósseis até 2030. Eles<br />
são baseados no seu "World Energy Mo<strong>de</strong>l" (Mo<strong>de</strong>lo da Energia<br />
Mundial), um sofisticado mo<strong>de</strong>lo matemático <strong>de</strong> simulação do<br />
comportamento dos mercados mundiais <strong>de</strong> energia, com cerca <strong>de</strong> 16.000<br />
equações, que incorpora a extensiva base <strong>de</strong> dados da AIE sobre a<br />
produção, comércio e consumo mundiais <strong>de</strong> energia, além <strong>de</strong> estudos<br />
sobre o crescimento econômico mundial, investimentos no setor<br />
energético, novas tecnologias e políticas energéticas. A AIE projeta dois<br />
tipos <strong>de</strong> cenários: o cenário <strong>de</strong> referência e o cenário <strong>de</strong> políticas<br />
alternativas 18 . O primeiro é consi<strong>de</strong>rado o cenário mais provável. Nele a<br />
agência assume que haverá avanços tecnológicos tanto no consumo<br />
como na produção <strong>de</strong> energia e que estas mudanças serão incrementais,<br />
por conta das longas vidas úteis dos equipamentos <strong>de</strong> conversão<br />
envolvidos. Algumas tecnologias que hoje estão ainda em fase<br />
experimental <strong>de</strong>verão se difundir nas próximas três décadas. Assim<br />
como foi <strong>de</strong>fendido no capítulo anterior <strong>de</strong>ste livro, a AIE acredita que<br />
existe uma gran<strong>de</strong> dificulda<strong>de</strong> para substituir a matriz energética fóssil.<br />
A Agência adota como premissa em seu cenário <strong>de</strong> referência que a<br />
quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> energia necessária para prover uma dada quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
serviço <strong>de</strong> energia, <strong>de</strong>verá continuar evoluindo no mesmo ritmo das<br />
últimas três décadas. No cenário <strong>de</strong> referência, entre 2004 e 2030,<br />
prevê-se um crescimento <strong>de</strong> 55% das emissões <strong>de</strong> dióxido <strong>de</strong> carbono<br />
(CO2) relacionadas com a energia, isto é, uma taxa <strong>de</strong> crescimento <strong>de</strong><br />
1,7% por ano. No cenário <strong>de</strong> políticas alternativas, a AIE simula o<br />
impacto <strong>de</strong> políticas que já estão sendo analisadas pelos governos,<br />
sobretudo dos países da OCDE, mas que ainda não tinham sido<br />
implementadas até 2004. As tendências no cenário <strong>de</strong> referência não são<br />
imutáveis. Os governos po<strong>de</strong>m tomar medidas mais vigorosas para<br />
alterar o curso do sistema energético, o <strong>de</strong>sviando para um caminho<br />
18 Os dois cenários estão na edição 2006 do “World Energy Outlook” da<br />
Agência Internacional <strong>de</strong> Energia. O relatório está no site em inglês:<br />
http://www.iea.org/textbase/nppdf/free/2006/weo2006.pdf
mais sustentável. No cenário <strong>de</strong> políticas alternativas, presume-se que os<br />
governos implementarão as políticas e medidas para melhorar a<br />
segurança energética e reduzir as emissões <strong>de</strong> CO2. Nele se prevê um<br />
crescimento <strong>de</strong> 29% nas emissões <strong>de</strong> CO2 em 2030, em relação a 2004.<br />
No Cenário <strong>de</strong> Políticas Alternativas os investimentos adicionais na<br />
geração <strong>de</strong> energia limpa e no aumento da eficiência energética são<br />
pagos com sobra pela economia <strong>de</strong> energia gerada. Usaremos como<br />
bússola o Cenário <strong>de</strong> Referência da AIE, on<strong>de</strong> as emissões aumentarão<br />
55% até 2030.<br />
Enquanto a AIE fez projeções do crescimento das emissões <strong>de</strong><br />
CO2 provenientes dos combustíveis fósseis se baseando em projeções<br />
econômicas, o IPCC fez projeções científicas sobre o impacto do<br />
crescimento das emissões <strong>de</strong> todos os gases estufa no clima. O 4°<br />
Relatório do IPCC <strong>de</strong> 2007 (o já citado Painel Intergovernamental <strong>de</strong><br />
Mudanças Climáticas) avaliou 177 cenários <strong>de</strong> estabilização das<br />
concentrações <strong>de</strong> gases do efeito estufa, e conseqüentemente da<br />
temperatura. Eles foram agrupados em 6 categorias, <strong>de</strong> acordo com os<br />
valores finais das concentrações <strong>de</strong> gases estufa e com os valores da<br />
temperatura após a estabilização. As 6 categorias 19 <strong>de</strong> estabilização são:<br />
19 Fonte da tabela: IPCC 2007, grupo <strong>de</strong> trabalho 3, capítulo III. A tabela<br />
po<strong>de</strong> ser encontrada no site em inglês:<br />
http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar4/wg3/ar4-wg3-chapter3.pdf
Categoria<br />
Aumento da<br />
temperatura<br />
<strong>global</strong> média<br />
acima dos<br />
níveis préindustriais<br />
(°C)<br />
Ano <strong>de</strong> pico<br />
das<br />
emissões <strong>de</strong><br />
CO2<br />
Mudança nas<br />
emissões<br />
globais <strong>de</strong><br />
gases estufa<br />
em 2050 em %<br />
das emissões<br />
<strong>de</strong> 2000<br />
Número<br />
<strong>de</strong><br />
cenários<br />
avaliados<br />
I 2,0 - 2,4 2000 - 2015 -85 a -50 6<br />
II 2,4 - 2,8 2000 - 2020 -60 a -30 18<br />
III 2,8 - 3,2 2010 - 2030 -30 a +5 21<br />
IV 3,2 - 4,0 2020 - 2060 +10 a +60 118<br />
V 4,0 - 4,9 2050 - 2080 +25 a +85 9<br />
VI 4,9 - 6,1 2060 - 2090 +90 a +140 5<br />
Segundo a comunida<strong>de</strong> científica, aumentos da temperatura<br />
acima <strong>de</strong> 2,4°C são reconhecidamente perigosos. A categoria I, que<br />
correspon<strong>de</strong> à faixa "pru<strong>de</strong>nte" <strong>de</strong> perturbação do sistema climático,<br />
exige que as emissões parem <strong>de</strong> crescer até 2015, e que em 2050 elas<br />
sejam entre 50% e 85% daquelas do ano 2000. Esqueceremos as outras<br />
categorias <strong>de</strong> estabilização e tomaremos como cenário <strong>de</strong> referência a<br />
categoria I. Nosso objetivo é reduzir em 30% as emissões anuais <strong>de</strong><br />
gases estufa em 2030, em relação aos níveis <strong>de</strong> 2005, começando a<br />
redução em 2010. Esse nível <strong>de</strong> redução até 2030 e a continuação <strong>de</strong>sse<br />
ritmo <strong>de</strong> redução até 2050 tem gran<strong>de</strong> potencial para atingir o objetivo<br />
final <strong>de</strong> estabilização climática pru<strong>de</strong>nte. Assim temos:
Categoria<br />
Aumento da<br />
temperatura<br />
<strong>global</strong> média<br />
acima dos<br />
níveis préindustriais<br />
(°C)<br />
Ano <strong>de</strong> pico<br />
das<br />
emissões <strong>de</strong><br />
CO2<br />
Mudança nas<br />
emissões<br />
globais <strong>de</strong><br />
gases estufa<br />
em 2050 em<br />
% das<br />
emissões <strong>de</strong><br />
2000<br />
Número <strong>de</strong><br />
cenários<br />
avaliados<br />
I 2,0 - 2,4 2000 - 2015 -85 a -50 6
Capítulo 5: Como reduzir em 30% as emissões mundiais<br />
<strong>de</strong> gases estufa até 2030<br />
Diante das dificulda<strong>de</strong>s apresentadas pelas previsões dos órgãos<br />
internacionais po<strong>de</strong>-se pensar que o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> dificilmente<br />
será controlado. No entanto existem várias alternativas para mudar o<br />
curso das emissões. A diminuição das emissões mundiais <strong>de</strong> gases<br />
estufa começará a ser explicada neste capítulo. A situação é:<br />
-Temos um cenário provável <strong>de</strong> crescimento <strong>de</strong> emissões <strong>de</strong> CO2 no<br />
setor <strong>de</strong> energia da or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> 55% até 2030, em relação ao ano <strong>de</strong> 2004,<br />
segundo a AIE;<br />
- Mesmo no cenário <strong>de</strong> políticas alternativas, teremos um crescimento<br />
<strong>de</strong> emissões <strong>de</strong> CO2 da or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> 29% até 2030, em relação ao ano <strong>de</strong><br />
2004, segundo a AIE;<br />
- Precisamos que as emissões parem <strong>de</strong> crescer até 2015, segundo o<br />
IPCC;<br />
- Em 2050 as emissões precisam ser entre 50% e 85% menores do que<br />
as emissões do ano 2000, segundo o IPCC;<br />
- Segundo as duas gran<strong>de</strong>s referências climáticas e energéticas do<br />
planeta (IPCC e AIE), estamos caminhando para não alcançar a<br />
estabilização do aumento <strong>de</strong> temperatura do planeta <strong>de</strong>ntro dos 2°C<br />
consi<strong>de</strong>rados seguros e brandos para o clima;<br />
-Esse cenário levará a humanida<strong>de</strong> a sofrer graves conseqüências<br />
ambientais e econômicas.<br />
A consultoria McKinsey e Company, referência mundial em<br />
consultoria empresarial, empreen<strong>de</strong>u um esforço <strong>global</strong> num estudo<br />
sobre as soluções técnicas existentes para controlar o <strong>aquecimento</strong><br />
<strong>global</strong> e o respectivo custo <strong>de</strong>ssas soluções. O estudo lançado no<br />
começo <strong>de</strong> 2009 se chama “Caminhos para uma economia <strong>de</strong> baixo<br />
carbono – versão 2” 20 . No estudo a consultoria estimou em 45,9 bihões<br />
<strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong> CO2 equivalente emitidas pelo mundo em 2005. O valor<br />
é um pouco inferior aos 49 bilhões estimados pelo IPCC 2007 emitidos<br />
20 O estudo po<strong>de</strong> ser encontrado no site:<br />
http://www.mckinsey.com/clientservice/ccsi/pathways_low_carbon_econo<br />
my.asp
pelo mundo em 2004. A pequena diferença é justificada no estudo pelo<br />
uso <strong>de</strong> instituições distintas do IPCC como referência no cálculo das<br />
emissões. No entanto o importante é que os valores são bem próximos<br />
dos valores do IPCC 2007.<br />
A consultoria Mckinsey <strong>de</strong>senvolveu uma projeção <strong>de</strong> evolução<br />
<strong>de</strong> emissões entre 2005 e 2030 se baseando em previsões <strong>de</strong> instituições<br />
como a AIE. Nesse cenário, chamado <strong>de</strong> caso base, as emissões<br />
passarão <strong>de</strong> 46 bilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong> CO2 equivalente emitidas em<br />
2005 para 70 bilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong> CO2 equivalente em 2030, um<br />
crescimento <strong>de</strong> 52% nas emissões. Essa curva <strong>de</strong> crescimento <strong>de</strong><br />
emissões é consi<strong>de</strong>rada pelo estudo a mais provável projeção <strong>de</strong><br />
crescimento <strong>de</strong> emissões. Evi<strong>de</strong>ntemente, externalida<strong>de</strong>s não previstas<br />
pelo mo<strong>de</strong>lo da consultoria po<strong>de</strong>rão alterar a projeção <strong>de</strong> crescimento. O<br />
estudo abrangeu todas as emissões mundiais <strong>de</strong> gases estufa e não<br />
somente as emissões lançadas pelos combustíveis fósseis como foi feito<br />
pelos relatórios da AIE. O gráfico a seguir mostra a distribuição das<br />
emissões por setores econômicos em 2005 e a estimativa <strong>de</strong> emissões<br />
<strong>de</strong>sses setores segundo o caso base em 2030:
Além <strong>de</strong> projetar o caso base, a consultoria mapeou 200<br />
iniciativas, em 10 gran<strong>de</strong>s ativida<strong>de</strong>s econômicas, com potencial <strong>de</strong><br />
reduzir as emissões <strong>de</strong> 70 bilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong> CO2 equivalente para<br />
32 bilhões <strong>de</strong> toneladas em 2030. Todas as iniciativas apresentam um<br />
custo inferior a 60 euros por tonelada <strong>de</strong> CO2 equivalente evitada. A<br />
diminuição <strong>de</strong> 38 bilhões <strong>de</strong> toneladas emitidas representa uma redução<br />
<strong>de</strong> 55% em relação ao caso base. Se compararmos com as emissões <strong>de</strong><br />
2005 teremos uma redução <strong>de</strong> 30%, passando <strong>de</strong> 46 bilhões para 32<br />
bilhões em 2030. Essa redução é tomada como referência no subtítulo<br />
do livro: “Como reduzir em 30% as emissões mundiais <strong>de</strong> gases estufa<br />
até 2030”. A proposta <strong>de</strong> redução ( linha marrom contínua) é explicitada<br />
no gráfico a seguir:
A Mckinsey também avaliou oportunida<strong>de</strong>s com custo entre 60 e<br />
100 euros, com potencial <strong>de</strong> abatimento <strong>de</strong> 9 bilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong><br />
CO2 equivalente. No entanto o foco do estudo foram as oportunida<strong>de</strong>s<br />
com custo inferior a 60 euros por tonelada <strong>de</strong> CO2 equivalente. No<br />
cenário on<strong>de</strong> essas iniciativas com custo inferior a 60 euros serão<br />
implementadas as emissões atingirão 32 bilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong> CO2<br />
equivalente em 2030. Nele o pico da concentração <strong>de</strong> gases estufa na<br />
atmosfera será <strong>de</strong> 510ppm e a estabilização dos gases estufa atingirá<br />
450ppm <strong>de</strong> concentração <strong>de</strong> CO2 equivalente. Nesse cenário a<br />
expectativa <strong>de</strong> aumento médio da temperatura do planeta segundo o<br />
IPCC é <strong>de</strong> 2°C. Esse valor é suficiente para evitar mudanças climáticas<br />
bruscas. No gráfico abaixo temos o potencial <strong>de</strong> abatimento <strong>de</strong> 38<br />
bilhões <strong>de</strong> toneladas emitidas em 2030 em relação ao caso base dividido<br />
por setor econômico:<br />
Na proposta <strong>de</strong> diminuição <strong>de</strong> emissões, as iniciativas <strong>de</strong>vem ser<br />
implementadas entre 2010 e 2030. Os investimentos incrementais<br />
necessários nas iniciativas crescerão gradualmente passando <strong>de</strong> 317<br />
bilhões <strong>de</strong> euros anuais no período 2011-2015 para 811 bilhões <strong>de</strong><br />
dólares anuais no período 2026-2030. Esses valores representariam um
acréscimo aos valores <strong>de</strong> investimentos normais estimados no caso base.<br />
O custo <strong>de</strong> investimento para construir uma usina solar, por exemplo, é<br />
mais elevado do que o custo <strong>de</strong> investimento para construir uma<br />
termelétrica a carvão. Esse investimento adicional, acima do valor <strong>de</strong><br />
construção da termelétrica é consi<strong>de</strong>rado como o investimento<br />
incremental na iniciativa citada. No entanto parte dos investimentos se<br />
pagará, pois iniciativas <strong>de</strong> incentivo à eficiência energética<br />
economizarão energia. O custo líquido médio das iniciativas durante o<br />
período 2011-2030 será aproximadamente 4 euros por tonelada <strong>de</strong> CO2<br />
equivalente evitada. O custo líquido anual atingirá 150 bilhões <strong>de</strong> euros<br />
anuais em 2030. A consultoria também avaliou outros custos adicionais,<br />
como os custos transacionais e os custos dos programas <strong>de</strong><br />
implementação <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> emissões. Os programas <strong>de</strong><br />
implementação po<strong>de</strong>m ser caros ou não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo da forma escolhida<br />
pelos agentes. Um programa <strong>de</strong> incentivo à eficiência energética, por<br />
exemplo, po<strong>de</strong> ser implantado através <strong>de</strong> uma campanha educativa<br />
(forma cara e pouco intrusiva) ou através da imposição <strong>de</strong> uma<br />
legislação obrigatória (forma barata e muito intrusiva). Os custos<br />
adicionais foram avaliados entre 40 bilhões e 200 bilhões <strong>de</strong> euros em<br />
2030. Somando o custo líquido das iniciativas (150 bilhões <strong>de</strong> euros)<br />
com os custos adicionais (entre 40 bilhões e 200 bilhões <strong>de</strong> euros), o<br />
custo total é estimado entre 200 bilhões e 350 bilhões <strong>de</strong> euros anuais<br />
em 2030. A McKinsey estimou o PIB mundial em 60 trilhões <strong>de</strong> euros<br />
anuais em 2030 21 . Então o custo líquido total po<strong>de</strong> representar menos <strong>de</strong><br />
0,4% do PIB <strong>global</strong> em 2030, um valor muito baixo se compararmos<br />
com os prejuízos que o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> po<strong>de</strong> causar.<br />
O estudo da Consultoria McKinsey não é contraditório com os<br />
relátorios da AIE, que prevêem mesmo no cenário <strong>de</strong> políticas<br />
alternativas um aumento <strong>de</strong> 29% nas emissões <strong>de</strong> CO2 dos combustíveis<br />
fósseis. Além <strong>de</strong> o estudo da consultoria ser mais completo englobando<br />
oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> abatimento baratas nas emissões <strong>de</strong> CO2 provenientes<br />
da silvicultura e nas emissões <strong>de</strong> outros gases estufa, ele assume que<br />
haverá um custo líquido para reduzir as emissões, enquanto no Cenário<br />
<strong>de</strong> Políticas Alternativas da AIE, os investimentos se pagarão tornando<br />
o custo líquido negativo. Outro ponto para se salientar é o fato que as<br />
21 No estudo da Mckinsey se utilizou uma taxa <strong>de</strong> câmbio <strong>de</strong> 1,5 dólar por<br />
euro. Além disso, todos os custos estão expressos em euros reais corrigidos<br />
pela inflação <strong>de</strong> 2005.
emissões <strong>de</strong> CO2 lançadas pelos combustíveis fósseis representaram<br />
56,6% do total <strong>de</strong> emissões <strong>de</strong> gases estufa lançadas em 2004, segundo<br />
o IPCC 2007. Os outros 43,6% não foram objeto <strong>de</strong> estudo da AIE.
Capítulo 6: A viabilida<strong>de</strong> política da proposta da<br />
Mckinsey<br />
No capítulo 4 se comentou sobre as previsões científicas do<br />
IPCC 2007 quanto ao impacto das emissões <strong>de</strong> gases estufa no clima<br />
<strong>global</strong>. A conclusão do Painel Intergovernamental é que as emissões<br />
precisam parar <strong>de</strong> crescer ate 2015 e a partir daí <strong>de</strong>clinar linearmente até<br />
serem entre 50% e 85% menores no ano 2050 em relação às emissões<br />
do ano 2000, para que se evitem mudanças climáticas perigosas. Por<br />
outro lado, a Agência Internacional <strong>de</strong> Energia e a Consultoria<br />
McKinsey, baseando-se em previsões populacionais e econômicas,<br />
afirmam que se nada for feito, a tendência é que as emissões <strong>de</strong> gases<br />
estufa cresçam enormemente entre 2005 e 2030. A Consultoria<br />
McKinsey propõe o investimento em 200 iniciativas para mudar essa<br />
situação, gerando um cenário <strong>de</strong> emissões <strong>de</strong> gases estufa capaz <strong>de</strong><br />
limitar o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> <strong>de</strong>ntro dos 2°C seguros para o planeta.<br />
Temos então previsões científicas e econômicas sobre o <strong>aquecimento</strong><br />
<strong>global</strong>. Temos também uma proposta <strong>de</strong> controle do <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong><br />
nos próximos 20 anos com um <strong>de</strong>terminado custo econômico. Agora a<br />
questão principal é respon<strong>de</strong>r a seguinte pergunta: Existe viabilida<strong>de</strong><br />
política para se implementar a proposta da Consultoria McKinsey que<br />
busca diminuir as emissões <strong>de</strong> gases estufa?<br />
A existência <strong>de</strong> viabilida<strong>de</strong> política passa pelos custos<br />
econômicos <strong>de</strong> implementação. O custo líquido anual <strong>de</strong>ve representar<br />
menos <strong>de</strong> 0,4% do PIB <strong>global</strong> em 2030, um valor muito atrativo. No<br />
entanto a implementação das iniciativas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> gases estufa<br />
<strong>de</strong>mandará gran<strong>de</strong>s investimentos no período 2011-2030 que<br />
aumentarão gradativamente e atingirão 811 bilhões <strong>de</strong> euros em 2030, o<br />
que representa aproximadamente 1,35% do PIB <strong>global</strong> estimado em<br />
2030. Existem gran<strong>de</strong>s problemas à vista. Os políticos dos países em<br />
<strong>de</strong>senvolvimento po<strong>de</strong>m preferir colocar a culpa do <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong><br />
nos países <strong>de</strong>senvolvidos e não assumirem nenhum tipo <strong>de</strong> meta <strong>de</strong><br />
redução <strong>de</strong> emissões, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ndo <strong>de</strong>magogicamente que precisam<br />
combater a pobreza nos seus países. Os países <strong>de</strong>senvolvidos têm<br />
condições <strong>de</strong> custearem os investimentos nos seus próprios países, mas<br />
o custeio completo dos países em <strong>de</strong>senvolvimento por parte dos países
<strong>de</strong>senvolvidos nas iniciativas será muito difícil. Os países em<br />
<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong>verão ter crescimento econômico mais rápido do<br />
que os países <strong>de</strong>senvolvidos nas próximas décadas e em 2030 po<strong>de</strong>rão<br />
representar mais <strong>de</strong> 50% da economia mundial. Dessa forma o<br />
financiamento das iniciativas feito exclusivamente pelos países<br />
<strong>de</strong>senvolvidos está con<strong>de</strong>nado ao fracasso, já que um grupo <strong>de</strong> países<br />
com menor fatia da economia <strong>global</strong> teria que financiar a si e a outro<br />
grupo <strong>de</strong> países com a maior fatia da economia <strong>global</strong>. Os países<br />
<strong>de</strong>senvolvidos já terão dificulda<strong>de</strong>s políticas para obter recursos a fim <strong>de</strong><br />
financiar as iniciativas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> emissões <strong>de</strong>ntro dos seus próprios<br />
territórios, imagine financiar iniciativas mais dispendiosas em outros<br />
países. A solução <strong>de</strong>sse problema passa por uma responsabilida<strong>de</strong><br />
compartilhada quanto ao financiamento das iniciativas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong><br />
emissões nos países em <strong>de</strong>senvolvimento. Os países <strong>de</strong>senvolvidos<br />
financiariam as iniciativas no seu próprio território e financiariam<br />
meta<strong>de</strong> dos recursos necessários nas iniciativas localizadas nos países<br />
em <strong>de</strong>senvolvimento. Os países em <strong>de</strong>senvolvimento financiariam a<br />
outra meta<strong>de</strong> <strong>de</strong> recursos necessários nas iniciativas <strong>de</strong>ntro dos seus<br />
próprios territórios. Com a economia <strong>de</strong> dinheiro através dos ganhos <strong>de</strong><br />
eficiência energética e com o financiamento <strong>de</strong> apenas 50% dos recursos<br />
necessários nas iniciativas, o custo líquido total <strong>de</strong> se combater o<br />
<strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> seria negativo para os países em <strong>de</strong>senvolvimento,<br />
ou seja, haveria ganhos econômicos reais ao invés <strong>de</strong> custos. Isso<br />
dissiparia a tese que afirma que os países em <strong>de</strong>senvolvimento ao<br />
combaterem o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>, estão <strong>de</strong>ixando <strong>de</strong> combater a<br />
pobreza.<br />
Todas as 200 iniciativas distribuídas em 10 setores que visam<br />
reduzir as emissões <strong>de</strong> gases estufa são fundamentais para controlar o<br />
<strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> <strong>de</strong>ntro do limite <strong>de</strong> 2°C consi<strong>de</strong>rados seguros para o<br />
planeta. Entre elas po<strong>de</strong>mos apontar algumas “barganhas” no relatório<br />
da McKinsey, aquelas iniciativas e aqueles setores que apresentam<br />
maior potencial econômico <strong>de</strong> implementação e conseqüentemente <strong>de</strong><br />
apoio político. As 200 iniciativas po<strong>de</strong>m ser divididas 3 gran<strong>de</strong>s<br />
categorias: carbono terrestre, eficiência energética e suprimento <strong>de</strong><br />
energia <strong>de</strong> baixo carbono. As gran<strong>de</strong>s barganhas são o grupo <strong>de</strong><br />
iniciativas associadas ao carbono terrestre e o grupo <strong>de</strong> iniciativas<br />
associadas à eficiência energética. O carbono terrestre engloba os<br />
setores <strong>de</strong> agricultura e <strong>de</strong> silvicultura que apresentam baixo custo<br />
líquido total e que necessitam <strong>de</strong> baixo investimento. Exemplos <strong>de</strong>
iniciativas nesses setores são a recuperação <strong>de</strong> solos <strong>de</strong>gradados e o<br />
combate ao <strong>de</strong>smatamento tropical. Mais <strong>de</strong> 90% das oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
abatimento estão localizadas nos países em <strong>de</strong>senvolvimento. Os<br />
investimentos necessários do setor <strong>de</strong> silvicultura e <strong>de</strong> agricultura<br />
representarão apenas 5% dos investimentos totais durante o período<br />
2011-2030 e serão responsáveis aproximadamente por 31,5% da<br />
redução total anual (12 bilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong> CO2 equivalente) <strong>de</strong><br />
emissões em 2030. O grupo <strong>de</strong> iniciativas associadas à eficiência<br />
energética está distribuído em sua maioria nos setores <strong>de</strong> edificações e<br />
<strong>de</strong> transporte. Exemplos <strong>de</strong> iniciativas nesses setores são a construção<br />
<strong>de</strong> edifícios que exigem menos climatização e o incentivo ao uso <strong>de</strong><br />
carros híbridos. As iniciativas <strong>de</strong> eficiência energética são aquelas que<br />
precisam dos maiores investimentos iniciais, mas no longo prazo esses<br />
investimentos são pagos pela economia <strong>de</strong> energia, apresentando custo<br />
líquido negativo. Elas têm potencial <strong>de</strong> abatimento <strong>de</strong> 14 bilhões <strong>de</strong><br />
toneladas <strong>de</strong> CO2 equivalente anual em 2030, aproximadamente 37% do<br />
potencial total <strong>de</strong> 38 bilhões <strong>de</strong> toneladas. O terceiro grupo, associado<br />
ao suprimento <strong>de</strong> energia <strong>de</strong> baixo carbono, engloba iniciativas que<br />
requerem em sua maioria alto nível <strong>de</strong> investimento e um alto custo<br />
líquido total. Exemplos <strong>de</strong>ssas iniciativas são as energias renováveis<br />
como a energia solar e a energia eólica e o seqüestro geológico <strong>de</strong><br />
carbono. Apesar do custo líquido alto, todas as iniciativas apresentam<br />
custo inferior a 60 euros por tonelada <strong>de</strong> CO2 equivalente evitada. As<br />
iniciativas estão concentradas principalmente nos setores energético e<br />
industrial e tem potencial <strong>de</strong> abatimento <strong>de</strong> 12 bilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong><br />
CO2 equivalente anual em 2030, 31,5% do potencial total. Então temos<br />
praticamente 70% da redução <strong>de</strong> emissões concentradas em iniciativas<br />
(carbono terrestre e eficiência energética) que possuem um potencial<br />
econômico extraordinário <strong>de</strong> implementação. A falta <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> política<br />
<strong>de</strong> implementação <strong>de</strong>ssas iniciativas baratas representará uma falta <strong>de</strong><br />
conhecimento técnico dos governantes do mundo.<br />
O custo das iniciativas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> emissões também po<strong>de</strong> ser<br />
avaliado por setor econômico. No gráfico a seguir temos a quantida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> investimento necessário nas iniciativas com potencial <strong>de</strong> abatimento<br />
dividido por setores econômicos em dois períodos diferentes, segundo o<br />
estudo da Mckinsey:
Nesse gráfico po<strong>de</strong>m-se evi<strong>de</strong>nciar em números alguns dados<br />
citados anteriormente como a baixa necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> investimentos nos<br />
setores <strong>de</strong> agricultura e silvicultura e a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s<br />
investimentos nos setores <strong>de</strong> edificação e transporte, on<strong>de</strong> a maioria das<br />
oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> eficiência energética está concentrada. Evi<strong>de</strong>ntemente<br />
que os investimentos em eficiência energética serão pagos pela<br />
economia <strong>de</strong> energia.<br />
Mesmo com o custo líquido total <strong>de</strong> menos <strong>de</strong> 0,4% do PIB <strong>global</strong><br />
para se controlar o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>, o senso comum <strong>de</strong> uma gran<strong>de</strong><br />
parcela dos políticos do mundo difere da avaliação que evitar o<br />
<strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> <strong>de</strong>scontrolado é viável. Sem os conhecimentos<br />
técnicos a<strong>de</strong>quados, muitos acreditam que controlar o <strong>aquecimento</strong><br />
exigirá vultosos investimentos que diminuirão fortemente o crescimento<br />
econômico e que estipular metas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> emissões<br />
individualmente é uma atitu<strong>de</strong> típica <strong>de</strong> falta <strong>de</strong> pragmatismo e visão<br />
realista do cenário econômico. Para eles, o mais inteligente é colocar a
culpa nos outros países, afirmar verbalmente que combatem o<br />
<strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> (sem combater <strong>de</strong> fato) e estipular metas <strong>de</strong> redução<br />
<strong>de</strong> emissões <strong>de</strong> longo prazo que serão pagas por outros governantes. A<br />
mudança <strong>de</strong>ssas opiniões só ocorrerá se uma nova forma <strong>de</strong> “ven<strong>de</strong>r a<br />
idéia” do combate ao <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> for gerada. O estudo da<br />
Consultoria McKinsey tem gran<strong>de</strong> importância nessa mudança. Ele não<br />
representa um relatório conclusivo, já que trabalha com cenários que<br />
po<strong>de</strong>m não se confirmar, mas representa uma referência robusta<br />
importante a ser seguida, além <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r posicionamentos que<br />
coinci<strong>de</strong>m com outros estudos anteriores <strong>de</strong> combate ao <strong>aquecimento</strong><br />
planetário. Posicionamentos como a <strong>de</strong>fesa do incentivo às iniciativas <strong>de</strong><br />
eficiência energética, que por economizarem energia futuramente,<br />
geram ganhos econômicos líquidos ou como o discernimento que evitar<br />
o lançamento <strong>de</strong> CO2 provocado pelo <strong>de</strong>smatamento é mais barato do<br />
que investir em energias alternativas. Essas direções ajudam no<br />
momento <strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir a forma <strong>de</strong> convencer os políticos e os governos a<br />
combaterem o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>. Alguns argumentos, não<br />
necessariamente ligadas ao estudo da McKinsey, são fundamentais para<br />
“ven<strong>de</strong>r a idéia” aos governantes mundiais:<br />
1- O custo líquido anual <strong>de</strong> menos <strong>de</strong> 0,4% do PIB <strong>global</strong> para<br />
combater o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> representará um peso econômico baixo<br />
nas economias nacionais em relação aos benefícios climáticos <strong>de</strong> longo<br />
prazo ocasionados pelas iniciativas;<br />
2- O custo das iniciativas po<strong>de</strong> ser encarado como um seguro contra<br />
catástrofes naturais financiado pelos governos. A indústria <strong>de</strong> seguros<br />
movimenta cifra bilionárias no mundo, sendo que gran<strong>de</strong> parte dos<br />
prêmios pagos se referem a eventos naturais como enchentes, furacões,<br />
incêndios e terremotos. Se os governos não combaterem o <strong>aquecimento</strong><br />
<strong>global</strong>, as companhias <strong>de</strong> seguros aumentarão os seus valores cobrados<br />
no longo prazo, tendo em vista que as catástrofes naturais terão maior<br />
probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acontecer. Isso significará um custo extra para a<br />
socieda<strong>de</strong> que po<strong>de</strong>rá ser maior do que o custo das iniciativas;<br />
3- A quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> investimentos necessários para custear as iniciativas<br />
representará um valor próximo <strong>de</strong> 1% do PIB <strong>global</strong> estimado no<br />
período 2011-2015 e aproximadamente 1,35% do PIB <strong>global</strong> no período<br />
2026-2030, um nível relativamente elevado. No entanto, as iniciativas<br />
<strong>de</strong> incentivo a eficiência energética, aquelas que precisam do maior
volume <strong>de</strong> investimentos, garantem benefícios imediatos a socieda<strong>de</strong>,<br />
proporcionais aos benefícios ocasionados por investimentos em<br />
iniciativas não ambientais. Os governos po<strong>de</strong>m subsidiar na forma <strong>de</strong><br />
redução <strong>de</strong> impostos a fabricação <strong>de</strong> carros híbridos, tornando os seus<br />
preços iguais aos carros comuns. Com esse incentivo, os proprietários<br />
dos carros terão durante toda a vida útil do veículo a condição <strong>de</strong> andar<br />
gastando até meta<strong>de</strong> do combustível consumido por um carro comum.<br />
Esse benefício econômico é proporcional ao obtido caso o dinheiro<br />
fosse aplicado na construção <strong>de</strong> uma nova estrada, por exemplo. Assim<br />
como as iniciativas comuns, as iniciativas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> emissões<br />
po<strong>de</strong>m gerar benefícios a socieda<strong>de</strong> e conseqüentemente benefícios<br />
eleitorais para os políticos;<br />
4- Com a responsabilida<strong>de</strong> compartilhada dos investimentos localizados<br />
nos países em <strong>de</strong>senvolvimento 22 , esses países menos ricos só<br />
financiarão 50% dos investimentos feitos no seu território, fazendo com<br />
que as iniciativas tenham um custo líquido negativo. Então ao invés <strong>de</strong><br />
representar um peso econômico, as iniciativas gerarão um pequeno<br />
aumento das taxas <strong>de</strong> crescimento econômico dos países em<br />
<strong>de</strong>senvolvimento;<br />
5- As iniciativas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> emissões po<strong>de</strong>m significar um seguro<br />
energético contra os altos preços dos combustíveis fósseis no futuro. O<br />
estudo da McKinsey assume um preço médio <strong>de</strong> 60 dólares o barril <strong>de</strong><br />
petróleo no período <strong>de</strong> redução, seguindo projeções da AIE. No entanto<br />
também foi avaliado o impacto do preço médio <strong>de</strong> 120 dólares o barril<br />
no custo das iniciativas. Nesse cenário haveria uma economia adicional<br />
<strong>de</strong> 700 bilhões <strong>de</strong> euros em 2030 (19 euros por tonelada <strong>de</strong> CO2<br />
equivalente), tornando o custo total líquido das iniciativas negativo.<br />
Antes da crise mundial <strong>de</strong> 2008, houve uma gran<strong>de</strong> especulação no<br />
mercado internacional <strong>de</strong> petróleo, com os preços variando entre 50<br />
dólares e 150 dólares o barril num período inferior a um ano. O preço do<br />
petróleo é <strong>de</strong>finido pelo cartel da OPEP e não segue regras <strong>de</strong> mercado<br />
na fixação <strong>de</strong> preços. A concentração da maioria das reservas em poucos<br />
países e a esgotabilida<strong>de</strong> do combustível em poucas décadas favorecem<br />
essa <strong>de</strong>finição. Quando um país <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> continuar <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo<br />
fortemente do petróleo no setor <strong>de</strong> energia, ele se sujeita ao humor da<br />
especulação <strong>de</strong> li<strong>de</strong>res políticos instaurados em regimes instáveis como<br />
22 Proposta <strong>de</strong>fendida neste capítulo do livro
Arábia Saudita, Irã, Iraque, Venezuela, Nigéria e Líbia. No momento<br />
em que o petróleo sobe <strong>de</strong>mais, corre-se o risco <strong>de</strong> se sofrer choques<br />
econômicos que só po<strong>de</strong>rão ser aliviados em alguns anos através da<br />
introdução <strong>de</strong> programas <strong>de</strong> eficiência energética, pois a infra-estrutura<br />
energética não consegue sobreviver no curto prazo sem petróleo, ou<br />
mesmo com menos petróleo. A primeira crise mundial do petróleo nos<br />
anos 70, por exemplo, incentivou os Estados Unidos a fabricarem carros<br />
mais econômicos. A prevenção <strong>de</strong> uma crise energética através da<br />
diminuição da <strong>de</strong>pendência dos combustíveis fósseis é a melhor<br />
alternativa para evitar choques econômicos. O investimento nas<br />
iniciativas <strong>de</strong> diminuição <strong>de</strong> emissões po<strong>de</strong> cumprir esse papel. No<br />
entanto também há o outro lado da moeda. Se todas as iniciativas <strong>de</strong><br />
redução <strong>de</strong> emissões forem implementadas, isso po<strong>de</strong> provocar um<br />
choque <strong>de</strong> excesso <strong>de</strong> oferta, reduzindo os preços do barril do petróleo.<br />
Há a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> nesse cenário o cartel da OPEP tornar os preços<br />
do petróleo artificialmente baixos temporariamente, no momento em<br />
que se sentir ameaçado na posição <strong>de</strong> lí<strong>de</strong>r do mercado energético<br />
mundial. As empresas tomam <strong>de</strong>cisões econômicas com anos <strong>de</strong><br />
antecedência e num cenário <strong>de</strong> preço do petróleo muito baixo, po<strong>de</strong>m<br />
preferir continuar investindo em infra-estruturas que <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m do<br />
combustível fóssil, temendo per<strong>de</strong>r vantagens competitivas contra outras<br />
empresas do seu setor econômico no futuro. Nesse momento entra uma<br />
importante palavra para evitar esse processo: regulação. Quando um<br />
país tem uma infra-estrutura <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do petróleo e acontece um<br />
choque <strong>de</strong> preços elevados, não há alternativa, senão suportar o choque<br />
econômico. Mas quando o preço baixa muito a melhor alternativa é<br />
evitar que as empresas do país tomem como referência esse valor que é<br />
temporariamente ilusório. Essa é uma <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> estratégia que evita a<br />
sedução por preços <strong>de</strong> petróleo baratos e o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>ssa <strong>de</strong>cisão está<br />
inteiramente nas mãos dos países consumidores. A regulação através da<br />
fixação <strong>de</strong> preços mínimos garante a implantação da infra-estrutura<br />
energética <strong>de</strong> baixo carbono sem que as empresas temam uma<br />
concorrência <strong>de</strong>sleal contra a infra-estrutura <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do carbono. A<br />
consultoria McKinsey avaliou a influência do preço médio do petróleo a<br />
40 dólares o barril, no custo líquido das iniciativas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong><br />
emissões. Em 2030 esse valor baixo do petróleo representaria um<br />
aumento <strong>de</strong> 4,5 euros por tonelada <strong>de</strong> CO2 equivalente no custo médio<br />
das iniciativas, pois apesar <strong>de</strong> o custo das iniciativas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong><br />
emissões continuar o mesmo, ele ficaria mais caro quando comparado<br />
com a infra-estrutura <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> carbono. Praticamente se dobraria o
preço da tonelada <strong>de</strong> CO2 equivalente evitada. Mas como sabemos o<br />
valor médio do petróleo a 40 dólares o barril é ilusório. Alguns analistas<br />
acreditam que o petróleo po<strong>de</strong> atingir mais <strong>de</strong> 200 dólares o barril nas<br />
próximas 2 décadas, se mantido o ritmo atual <strong>de</strong> crescimento do<br />
consumo. Portanto implementar as iniciativas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> emissões<br />
representará um escudo contra ataques especulativos nos preços do<br />
petróleo, garantindo a estabilida<strong>de</strong> econômica dos países;<br />
6- O mesmo princípio que se aplica ao petróleo (citado no item anterior)<br />
se aplica ao gás natural. Os dois combustíveis fósseis têm reservas<br />
suficientes para suportar o consumo mundial atual por mais 50 anos<br />
aproximadamente. No entanto se o consumo continuar subindo esse<br />
tempo po<strong>de</strong> diminuir. A maioria das reservas mundiais está concentrada<br />
em poucos países. No caso do gás natural a Rússia, o Irã e o Qatar<br />
possuem mais <strong>de</strong> 50% das reservas mundiais. A forte <strong>de</strong>pendência do<br />
gás natural po<strong>de</strong> provocar no futuro um choque econômico causado pelo<br />
aumento do preço do combustível. A Europa <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> fortemente do gás<br />
natural russo. Se a Rússia resolver, por exemplo, aumentar o preço do<br />
gás natural no inverno (época em que a <strong>de</strong>manda energética aumenta),<br />
restará a Europa escolher entre pagar mais caro pelo gás ou literalmente<br />
congelar. A “Rússia sul-americana” é a Bolívia, o país mais pobre do<br />
continente e que possui as maiores reservas <strong>de</strong> gás natural. O Brasil<br />
sofreu no passado recente uma grave crise energética provocada por<br />
problemas <strong>de</strong> suprimento do gás natural boliviano. As iniciativas <strong>de</strong><br />
redução <strong>de</strong> emissões também têm o potencial <strong>de</strong> reduzir o risco <strong>de</strong> crises<br />
econômicas provocadas pelo mercado do gás natural;<br />
7- Cada vez mais políticos per<strong>de</strong>rão eleições se não investirem em<br />
iniciativas <strong>de</strong> combate ao <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>. Em 2005 o furacão<br />
Katrina <strong>de</strong>vastou a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> New Orleans nos Estados Unidos. Esse<br />
evento prejudicou a popularida<strong>de</strong> do ex-presi<strong>de</strong>nte Bush, pois o furacão<br />
foi associado ao <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>, e o ex-presi<strong>de</strong>nte era um árduo<br />
inimigo <strong>de</strong> iniciativas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> emissões. Nas eleições <strong>de</strong> 2008, o<br />
candidato republicano John Maccain per<strong>de</strong>u a eleição presi<strong>de</strong>ncial<br />
<strong>de</strong>vido principalmente a impopularida<strong>de</strong> do presi<strong>de</strong>nte Bush, do seu<br />
partido. Gran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong>ssa impopularida<strong>de</strong> veio da sua posição<br />
ambiental e o furacão Katrina se tornou um símbolo <strong>de</strong>ssa posição. Na<br />
realida<strong>de</strong> provar que o furacão Katrina foi provocado pelo <strong>aquecimento</strong><br />
<strong>global</strong> é cientificamente difícil. O cientificamente mais correto é<br />
associar uma série <strong>de</strong> mudanças climáticas distintas, que são explicadas
pelo <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> e não associar somente um evento climático.<br />
No entanto a opinião pública reage a cada catástrofe natural histórica<br />
como um efeito do <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>, e para azar dos políticos essas<br />
catástrofes se tornarão cada vez mais freqüentes justamente por causa<br />
das mudanças climáticas. Por esse motivo os eventos naturais<br />
influenciaram as eleições da maior economia do mundo. Esse fenômeno<br />
eleitoral já aconteceu recentemente e vai acontecer novamente com mais<br />
força no futuro. O furacão Katrina acabou se tornando “o furacão<br />
Bush”. Os políticos que não aceitarem as iniciativas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong><br />
emissões terão que conviver com o ônus <strong>de</strong> terem sua popularida<strong>de</strong><br />
ameaçada por eventos naturais que não po<strong>de</strong>m ser controlados,<br />
configurando um verda<strong>de</strong>iro “terrorismo climático”.<br />
As iniciativas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> emissões <strong>de</strong>verão ser custeadas<br />
pelos governos na forma <strong>de</strong> subsídios ou obtidas através <strong>de</strong> taxações <strong>de</strong><br />
empresas emissoras <strong>de</strong> gases estufa. Os incentivos governamentais<br />
precisam ser amparados por regulações <strong>de</strong> longo prazo que garantam<br />
segurança jurídica para os investidores. Outro ponto importante é a<br />
implementação <strong>de</strong> normas e padrões mínimos <strong>de</strong> eficiência energética<br />
em equipamentos. As iniciativas localizadas nos setores <strong>de</strong> silvicultura e<br />
agricultura, fortemente concentradas em países em <strong>de</strong>senvolvimento,<br />
<strong>de</strong>vem proporcionar <strong>de</strong>senvolvimento econômico, <strong>de</strong>sincentivando<br />
práticas ambientalmente insustentáveis.<br />
O estudo da Consultoria McKinsey avaliou individualmente com<br />
aprofundamento as iniciativas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> emissões dividindo-as em<br />
10 setores econômicos. No entanto nos capítulos seguintes utilizaremos<br />
a divisão explicitada no capítulo anterior: carbono terrestre,<br />
suprimento <strong>de</strong> energia <strong>de</strong> baixo carbono e eficiência energética. Essa<br />
divisão também é abordada no estudo, mas sem aprofundamento. No<br />
capítulo 7 se abordará o setor <strong>de</strong> carbono terrestre. No capítulo 8 se<br />
comentará especificamente sobre a região amazônica, importante fonte<br />
<strong>de</strong> emissões do setor <strong>de</strong> carbono terrestre. As iniciativas <strong>de</strong> suprimento<br />
<strong>de</strong> energia <strong>de</strong> baixo carbono serão explicadas em 2 capítulos: os<br />
capítulos 9 e 10. No capítulo 9 se falará sobre o seqüestro geológico <strong>de</strong><br />
carbono, que torna as fontes emissoras <strong>de</strong> CO2 em fontes limpas através<br />
do envio do CO2 para o subsolo. No capítulo 10 se comentará sobre as<br />
principais fontes <strong>de</strong> energia limpas, distintas das fontes do capítulo 9, já<br />
que não há lançamentos <strong>de</strong> CO2 efetivos, nem mesmo para o subsolo.<br />
No capítulo 11 se comentará sobre um grupo <strong>de</strong> soluções <strong>de</strong> eficiência
energética. Esses 5 capítulos farão uma abordagem geral das principais<br />
formas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> emissões (energia eólica, energia solar, energia<br />
nuclear, carros híbridos, combate ao <strong>de</strong>smatamento tropical, etc)<br />
focando nas potencialida<strong>de</strong>s e gargalos <strong>de</strong> cada tecnologia ou solução.<br />
Os dados do estudo da McKinsey ajudarão na abordagem, mas não<br />
serão a principal fonte <strong>de</strong> informação.
Capítulo 7: O setor <strong>de</strong> carbono terrestre: silvicultura e<br />
agricultura<br />
O setor <strong>de</strong> carbono terrestre engloba as emissões <strong>de</strong> gases estufa<br />
não ligadas ao consumo <strong>de</strong> combustíveis fósseis. Ele é composto <strong>de</strong> dois<br />
setores econômicos: a silvicultura e a agricultura. As emissões da<br />
silvicultura são compostas basicamente do <strong>de</strong>smatamento tropical, da<br />
<strong>de</strong>gradação da biomassa após o <strong>de</strong>smatamento, da drenagem <strong>de</strong> áreas <strong>de</strong><br />
turfa e da queima <strong>de</strong> solos turfosos. As emissões da agricultura são<br />
compostas da ativida<strong>de</strong> agrícola propriamente dita (exemplo: emissões<br />
provenientes dos solos agrícolas) e também da pecuária (exemplo:<br />
fermentação entérica dos animais). O setor <strong>de</strong> carbono terrestre é o que<br />
provavelmente apresenta maior viabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mitigação <strong>de</strong> emissões,<br />
pois tanto o custo líquido das iniciativas é baixo, quanto à necessida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> investimentos. No entanto também existem dificulda<strong>de</strong>s como a<br />
fragmentação dos emissores e a concentração da maioria absoluta das<br />
emissões nos países em <strong>de</strong>senvolvimento. Enquanto poucas empresas<br />
são responsáveis pelas emissões das termelétricas no mundo, milhões <strong>de</strong><br />
proprietários rurais são responsáveis pelas emissões do setor <strong>de</strong> carbono<br />
terrestre. Essa fragmentação <strong>de</strong>manda uma forte fiscalização<br />
acompanhada <strong>de</strong> incentivos <strong>de</strong> práticas sustentáveis, para que as<br />
iniciativas <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> emissões tenham êxito. A redução das<br />
emissões nos países em <strong>de</strong>senvolvimento precisa ser financiada em<br />
parte pelos países <strong>de</strong>senvolvidos. Países como Brasil e Indonésia que<br />
li<strong>de</strong>ram as emissões do setor <strong>de</strong> silvicultura no mundo, não possuem<br />
apoio político interno para financiarem sozinhos as iniciativas. No caso<br />
brasileiro a consultoria McKinsey estimou em 17 bilhões <strong>de</strong> reais 23<br />
anuais o custo para zerar o <strong>de</strong>smatamento na Amazônia. Esses<br />
problemas não inviabilizam a redução <strong>de</strong> emissões no setor <strong>de</strong> carbono<br />
terrestre. Na maioria dos casos reduzir as emissões tem uma viabilida<strong>de</strong><br />
econômica muito alta, pois as práticas agrícolas e florestais predatórias<br />
geram um baixo ganho econômico em relação a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> gases<br />
estufa gerado, se comparadas as ativida<strong>de</strong>s do setor <strong>de</strong> energia. A<br />
Consultoria McKinsey estima em 15 bilhões <strong>de</strong> euros anuais em 2015 e<br />
em 43 bilhões <strong>de</strong> euros anuais em 2030 a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> investimentos<br />
necessários para tornar o setor <strong>de</strong> silvicultura neutro em carbono em<br />
23 A quantia equivale a 5,5 bilhões <strong>de</strong> euros em valores <strong>de</strong> 2005
2030. Quanto ao setor agrícola a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> investimentos é<br />
consi<strong>de</strong>rada insignificante, já que a maioria das iniciativas é constituída<br />
<strong>de</strong> mudanças <strong>de</strong> práticas agrícolas, que po<strong>de</strong>m se tornar sustentáveis<br />
sem investimentos adicionais. Ao total com apenas 5% dos<br />
investimentos necessários em todas as iniciativas durante o período <strong>de</strong><br />
redução 2011-2030, o setor <strong>de</strong> carbono terrestre po<strong>de</strong> ser responsável<br />
por 31,5% das reduções totais em 2030, uma relação custo-benefício<br />
muito alta.<br />
O setor agrícola foi responsável por 14% das emissões mundiais<br />
<strong>de</strong> gases estufa em 2005, ou 6,2 bilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong> CO2<br />
equivalente. Os principais responsáveis são as emissões <strong>de</strong> metano<br />
provenientes da fermentação entérica por parte do animais (38% do<br />
total), a emissão <strong>de</strong> metano proveniente do cultivo <strong>de</strong> arroz (13% do<br />
total) e a emissão <strong>de</strong> óxido nitroso (N2O) dos solos agrícolas (37% do<br />
total). Temos, portanto três grupos bem <strong>de</strong>finidos que necessitam ter<br />
suas emissões reduzidas.<br />
As emissões <strong>de</strong> metano (CH4) através da fermentação entérica são<br />
oriundas <strong>de</strong> animais como vacas, ovelhas e cabras, que pertencem à<br />
classe dos ruminantes. Os ruminantes têm quatro estômagos e digerem<br />
seu alimento em seus estômagos ao invés <strong>de</strong> seus intestinos, como<br />
fazem os humanos. Os ruminantes comem o alimento, expelem-no<br />
como bolo alimentar para a boca e tornam a comê-lo.No rúmen, o<br />
primeiro estômago dos animais, ocorre a fermentação entérica do<br />
alimento ingerido através <strong>de</strong> um processo anaeróbico (sem a presença <strong>de</strong><br />
ar) realizado por bactérias. Nesse processo há a produção <strong>de</strong> metano. O<br />
metano produzido é posteriormente arrotado pelas narinas e pela boca<br />
dos animais. Também há produção <strong>de</strong> metano através da flatulência dos<br />
animais, mas em menor quantida<strong>de</strong> que o arroto. A redução das<br />
emissões lançadas pela fermentação entérica tem sido tentada através do<br />
uso <strong>de</strong> aditivos alimentares, pílulas e vacinas. Pesquisas com aditivos<br />
alimentares como gordura <strong>de</strong> coco, linhaça, sementes <strong>de</strong> girassol, alho e<br />
óleo <strong>de</strong> peixe tem obtido reduções entre 20% e 50% na geração <strong>de</strong><br />
metano através da inibição da proliferação <strong>de</strong> bactérias responsáveis<br />
pela produção do gás. Outra opção é o uso <strong>de</strong> pílulas. Cientistas na<br />
Alemanha <strong>de</strong>senvolveram uma pílula que acompanhada <strong>de</strong> uma dieta<br />
especial com algumas restrições alimentares é capaz <strong>de</strong> reduzir a<br />
emissão <strong>de</strong> metano através da conversão do gás em glicose. Por último,
vacinas contra bactérias metanogênicas estão sendo <strong>de</strong>senvolvidas, mas<br />
ainda não estão disponíveis comercialmente.<br />
As plantações <strong>de</strong> arroz também são ambientes propícios para a<br />
liberação <strong>de</strong> metano na atmosfera. O arroz é cultivado em áreas alagadas<br />
e com gran<strong>de</strong> presença <strong>de</strong> matéria orgânica. Esse ambiente pobre em<br />
oxigênio favorece a <strong>de</strong>composição da matéria orgânica por bactérias<br />
anaeróbicas produtoras <strong>de</strong> metano. O gás po<strong>de</strong> ser liberado através <strong>de</strong><br />
bolhas <strong>de</strong>ntro da água até a atmosfera quando se encontra em altas<br />
concentrações, mas o principal responsável pelas emissões é o<br />
transporte difuso pelo aerênquima, um tecido vascular presente nas<br />
plantas <strong>de</strong> arroz. O aerênquima permite a circulação <strong>de</strong> ar no interior da<br />
planta, levando o oxigênio da atmosfera até as raízes. Essa circulação <strong>de</strong><br />
ar facilita a liberação do metano. As plantas <strong>de</strong> arroz facilitam até 10<br />
vezes mais o escape <strong>de</strong> metano para a atmosfera 24 em comparação com<br />
solos inundados sem cultivo <strong>de</strong> arroz. Fatores como a temperatura, a<br />
radiação solar, o tipo <strong>de</strong> adubação, a espécie <strong>de</strong> arroz e o nível <strong>de</strong><br />
inundação influenciam na produção <strong>de</strong> metano. O metano resultante do<br />
cultivo <strong>de</strong> arroz irrigado po<strong>de</strong> reduzir-se significativamente<br />
introduzindo alterações nos sistemas <strong>de</strong> irrigação e drenagem ou através<br />
do uso <strong>de</strong> fertilizantes. Cerca <strong>de</strong> 50% do total das terras <strong>de</strong>dicadas no<br />
mundo aos arrozais é irrigada. O arroz irrigado libera mais metano do<br />
que o arroz <strong>de</strong> sequeiro. A drenagem <strong>de</strong> um campo <strong>de</strong> arroz irrigado em<br />
momentos específicos durante o ciclo <strong>de</strong> cultivo po<strong>de</strong> reduzir<br />
drasticamente as emissões <strong>de</strong> metano sem diminuir os rendimentos da<br />
colheita. Outras opções técnicas para reduzir as emissões <strong>de</strong> metano<br />
consistem em agregar sulfato <strong>de</strong> sódio ou carboneto <strong>de</strong> cálcio aos<br />
fertilizantes com base em uréia, ou substituir a uréia por sulfato <strong>de</strong><br />
amônio como fonte <strong>de</strong> nitrogênio para os cultivos <strong>de</strong> arroz.<br />
A principal origem das emissões <strong>de</strong> óxido nitroso (N2O)<br />
advindas dos solos agrícolas é a aplicação indiscriminada <strong>de</strong><br />
fertilizantes nitrogenados sintéticos nos cultivos. As emissões ocorrem<br />
<strong>de</strong>vido à <strong>de</strong>snitrificação a partir do nitrogênio mineral. A <strong>de</strong>snitrificação<br />
consiste na redução microbiana dos nitratos (N3O) às formas<br />
intermediárias <strong>de</strong> nitrogênio e então às formas gasosas (NO, N2O e N2)<br />
que são perdidas para a atmosfera. As emissões <strong>de</strong> óxido nitroso<br />
24<br />
http://w3.ufsm.br/ppgcs/congressos/CBCS_Gramado/Arquivos%20trabalho<br />
s/Efluxo%20<strong>de</strong>%20metano_Fabio%20G..pdf
originadas do setor agrícola po<strong>de</strong>m minimizar-se com novos<br />
fertilizantes e práticas <strong>de</strong> fertilização. Aumentando-se a eficiência com a<br />
qual os cultivos utilizam o nitrogênio, é possível reduzir a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
fertilizantes necessária para produzir uma <strong>de</strong>terminada quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
alimento ou reduzir as emissões <strong>de</strong> N2O lançada por uma <strong>de</strong>terminada<br />
quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> fertilizante. As principais práticas que aumentam a<br />
eficiência no uso do nitrogênio são: ajuste <strong>de</strong> taxas <strong>de</strong> aplicação com<br />
base em estimativas precisas das necessida<strong>de</strong>s da cultura (ou seja,<br />
agricultura <strong>de</strong> precisão); uso <strong>de</strong> fertilizantes <strong>de</strong> liberação lenta ou<br />
controlada ou inibidores <strong>de</strong> nitrificação (que <strong>de</strong>saceleram processos<br />
microbianos que levam à formação <strong>de</strong> N2O); aplicação <strong>de</strong> nitrogênio<br />
quando a perda for menos provável, geralmente logo antes do consumo<br />
(melhor programação); ou aplicação do nitrogênio <strong>de</strong> forma mais<br />
precisa no solo, para torná-lo mais acessível às raízes.<br />
O setor agrícola também po<strong>de</strong> ajudar a mitigar as emissões <strong>de</strong><br />
CO2 através do seqüestro <strong>de</strong> carbono pelos solos. Os solos são um<br />
importante reservatório <strong>de</strong> carbono e <strong>de</strong>sempenham um importante<br />
papel no ciclo do carbono <strong>global</strong>. Historicamente, os solos per<strong>de</strong>ram<br />
muito carbono <strong>de</strong>vido à intervenção do homem, mas uma parte <strong>de</strong>sse<br />
carbono po<strong>de</strong> ser readquirido através <strong>de</strong> manejo aprimorado, retirando<br />
assim CO2 da atmosfera. A quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> carbono orgânico no solo é o<br />
resultado do balanço entre dois processos: a) <strong>de</strong>posição <strong>de</strong> resíduos<br />
(serapilheira e raízes) <strong>de</strong> plantas que originalmente obtiveram seu<br />
carbono do CO2 atmosférico através da fotossíntese; b) <strong>de</strong>composição<br />
dos resíduos <strong>de</strong>positados, resultando no lançamento <strong>de</strong> CO2 25 . O<br />
primeiro processo aumenta o carbono no solo enquanto o segundo<br />
diminui. Práticas agrícolas <strong>de</strong> baixa sustentabilida<strong>de</strong> ambiental como a<br />
aração excessiva, a gra<strong>de</strong>ação e os <strong>de</strong>smatamentos, aumentam a<br />
<strong>de</strong>composição do carbono orgânico, lançando CO2 para a atmosfera e<br />
diminuindo a fertilida<strong>de</strong> dos solos. Além disso, fatores como a<br />
fertilização ina<strong>de</strong>quada, a queima <strong>de</strong> restos culturais e o cultivo<br />
intensivo das terras, contribuem para o aumento <strong>de</strong>ssa <strong>de</strong>gradação dos<br />
solos. Práticas sustentáveis po<strong>de</strong>m restaurar tanto áreas <strong>de</strong> cultivos<br />
agrícolas quanto pastos <strong>de</strong> criação <strong>de</strong> gado, reduzindo essas perdas e<br />
fixando carbono no solo. Os solos po<strong>de</strong>m ter sua fertilida<strong>de</strong> restaurada<br />
25<br />
http://www.cnpab.embrapa.br/pesquisas/fol<strong>de</strong>rs/fol<strong>de</strong>r_sequestro_carbono.p<br />
df
através da correção <strong>de</strong> nutrientes com fertilizantes, da aplicação <strong>de</strong><br />
adubos orgânicos, do cultivo com plantio direto e da retenção <strong>de</strong><br />
resíduos agrícolas. Solos mais férteis aumentam a produção agrícola e<br />
conseqüentemente aumentam a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> restos culturais que<br />
acabam ficando no solo após a colheita. Para garantir que esse carbono<br />
dos restos culturais seja fixado no solo é preciso evitar a aração das<br />
terras. A terra arada por tratores no cultivo tradicional acelera a<br />
<strong>de</strong>composição da matéria orgânica porque <strong>de</strong>strói os agregados do solo<br />
que protegem a matéria orgânica da ação microbiana, gerando<br />
significativas emissões <strong>de</strong> CO2 para a atmosfera, que são ignoradas por<br />
não serem visíveis a olho nu como as queimadas. No plantio direto há o<br />
cultivo sobre a palha <strong>de</strong>ixada pela cultura anterior, sem a necessida<strong>de</strong> da<br />
remoção do solo através da aração. No plantio direto esse carbono que<br />
seria liberado para atmosfera pela aração da terra é fixado no solo.<br />
A expansão do setor agrícola também influencia as emissões do<br />
outro gran<strong>de</strong> setor econômico associado ao carbono terrestre: o setor <strong>de</strong><br />
silvicultura. O setor <strong>de</strong> silvicultura emitiu em 2005, segundo a<br />
consultoria McKinsey, 7,4 bilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong> CO2 equivalente,<br />
sendo 5,4 bilhões provenientes do <strong>de</strong>smatamento e 2 bilhões<br />
provenientes da drenagem <strong>de</strong> áreas <strong>de</strong> turfa e da queima <strong>de</strong> áreas <strong>de</strong><br />
turfa. Acredito que a melhor estimativa das emissões das áreas <strong>de</strong> turfa<br />
(drenagem e queima <strong>de</strong> solos) seja superior à apontada pela consultoria.<br />
Num estudo mais recente 26 e mais abrangente, realizado pelos mesmos<br />
pesquisadores que são citados na bibliografia do relatório da McKinsey,<br />
as emissões das áreas <strong>de</strong> turfa são estimadas em 3 bilhões <strong>de</strong> toneladas<br />
anuais.<br />
O <strong>de</strong>smatamento tropical é o gran<strong>de</strong> emissor do setor <strong>de</strong><br />
silvicultura, já que 88% das emissões do <strong>de</strong>smatamento são oriundas das<br />
florestas tropicais localizadas em países em <strong>de</strong>senvolvimento. No<br />
mundo todo o processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>smatamento <strong>de</strong> florestas tropicais ocorre<br />
basicamente por três razões: a alta lucrativida<strong>de</strong> da ativida<strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ireira,<br />
a expansão irracional da agropecuária e a ausência do Estado. O Brasil,<br />
26 A publicação “Fact book for UN-FCCC policies on peat carbon emissions”<br />
com os dados po<strong>de</strong> ser encontrada no site www.wetlands.org, no link<br />
específico:<br />
http://<strong>global</strong>.wetlands.org/LinkClick.aspx?fileticket=mGqAyxnvFJw%3d&tabi<br />
d=56
o país com maior índice mundial <strong>de</strong> <strong>de</strong>smatamento anual, é uma<br />
referência para a questão. O <strong>de</strong>smatamento <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>terminada área em<br />
poucos meses oferece uma lucrativida<strong>de</strong> que só será obtida através da<br />
agropecuária num prazo <strong>de</strong> muitos anos. Com pouca fiscalização<br />
ambiental, esse filão é bem aproveitado pelas ma<strong>de</strong>ireiras ilegais.<br />
Depois vem a agropecuária. A agricultura <strong>de</strong> alta produtivida<strong>de</strong> está<br />
localizada nas terras mais caras e próximas das gran<strong>de</strong>s cida<strong>de</strong>s. A<br />
necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aumentar a produção impulsiona a compra <strong>de</strong> terras mais<br />
distantes, on<strong>de</strong> se pratica uma agricultura menos intensiva, que <strong>de</strong>vido a<br />
isso se transfere para áreas ocupadas pela pecuária extensiva. A pecuária<br />
extensiva por sua vez inva<strong>de</strong> a floresta. O aumento da produção em<br />
áreas que praticam uma agricultura menos intensiva e o aumento da<br />
criação <strong>de</strong> gado extensiva também acelera essa invasão da floresta. O<br />
problema é que essa invasão é <strong>de</strong>snecessária. Existem terras já<br />
<strong>de</strong>smatadas suficientes pra multiplicar a criação <strong>de</strong> gado. Na Amazônia<br />
brasileira, se cria 0,7 bois por hectare em terras <strong>de</strong>smatadas, on<strong>de</strong> se<br />
po<strong>de</strong>ria criar 3 cabeças por hectare, sem uso <strong>de</strong> ração externa. No<br />
entanto isso não acontece. Gran<strong>de</strong> parte das áreas em processo <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>smatamento são terras públicas sem ocupação e controle on<strong>de</strong> quem<br />
<strong>de</strong>smata <strong>de</strong> forma predatória e ocupa a terra com gado bovino se torna<br />
dono. Conquistar uma terra <strong>de</strong> graça se torna um gran<strong>de</strong> estímulo para<br />
se <strong>de</strong>rrubar a floresta. Sai mais barato <strong>de</strong>smatar, do que investir na<br />
criação intensiva em terras já <strong>de</strong>smatadas. No entanto não é apenas a<br />
pecuária que é responsável pelo processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>smatamento. Alguns<br />
cultivos agrícolas como a soja no Brasil e a palma na Indonésia também<br />
são responsáveis, com o agravante <strong>de</strong> serem ativida<strong>de</strong>s com maior<br />
lucrativida<strong>de</strong> por área do que a pecuária, dificultando a substituição por<br />
uma ativida<strong>de</strong> sustentável que precisa ter no mínimo o mesmo nível <strong>de</strong><br />
lucrativida<strong>de</strong>. A união do lucro da ativida<strong>de</strong> predatória com a falta <strong>de</strong><br />
intervenção estatal justifica plenamente o <strong>de</strong>smatamento tropical no<br />
mundo.<br />
O outro forte emissor <strong>de</strong> CO2 na atmosfera no setor <strong>de</strong><br />
silvicultura são as turfeiras. A turfa é um material orgânico <strong>de</strong> coloração<br />
preto-amarronzada composto por restos parcialmente <strong>de</strong>compostos <strong>de</strong><br />
vegetais, encontrado geralmente em pântanos e em áreas frias como as<br />
tundras. Em todos os ecossistemas terrestres, as plantas convertem CO2<br />
atmosférico em biomassa vegetal que após a morte se <strong>de</strong>compõem<br />
rapidamente sob a influência <strong>de</strong> oxigênio. Nas turfeiras, a planta morta<br />
fica molhada, num ambiente <strong>de</strong> baixo oxigênio on<strong>de</strong> a <strong>de</strong>composição é
muito mais lenta. Há um equilíbrio entre o CO2 lentamente absolvido<br />
pela biomassa vegetal e o CO2 lentamente lançado pelas turfeiras. Se a<br />
turfeira entra em contato com o ar pela ação humana, esse equilíbrio é<br />
perdido e a turfeira acaba sendo <strong>de</strong>composta e lançada rapidamente para<br />
atmosfera na forma <strong>de</strong> CO2. Os solos turfosos representam 3% da<br />
superfície da Terra. Um estudo recente conduzido pela ONG Wetlands<br />
juntamente com a Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Greifswald, concluiu que as<br />
emissões provenientes da turfa chegam a 3 bilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong> CO2<br />
anuais sendo que 2/3 estão concentradas em 4 países do Su<strong>de</strong>ste<br />
Asiático: Brunei, Indonésia, Malásia e Papua Nova Guiné. Entre as<br />
emissões do Su<strong>de</strong>ste Asiático, cerca <strong>de</strong> 600 milhões <strong>de</strong> toneladas são<br />
lançadas pela <strong>de</strong>composição dos solos <strong>de</strong> turfa drenados e outras 1,4<br />
bilhão <strong>de</strong> toneladas provém da queima <strong>de</strong> áreas <strong>de</strong> turfa 27 . A diminuição<br />
das emissões advindas do <strong>de</strong>smatamento tropical no Su<strong>de</strong>ste Asiático e<br />
das emissões advindas dos solos turfosos constituem um objetivo<br />
comum, pois a maioria das emissões dos solos turfosos na região são<br />
causados pelos incêndios florestais, com o objetivo <strong>de</strong> plantar palma e<br />
outros produtos agrícolas. Esses incêndios acabam se alastrando e<br />
queimando as camadas <strong>de</strong> solos turfosos riquíssimas em matéria<br />
orgânica. O cultivo <strong>de</strong> palma, um dos gran<strong>de</strong>s causadores dos incêndios,<br />
tem o objetivo <strong>de</strong> produzir biodiesel, que é vendido como um<br />
combustível limpo no mercado internacional, pois o CO2 lançado pelo<br />
combustível na queima foi absolvido pela planta no momento do<br />
cultivo. No entanto, está se cometendo um gran<strong>de</strong> crime ambiental na<br />
prática. Vão ser necessários <strong>de</strong>zenas ou até centenas <strong>de</strong> anos para que o<br />
CO2 absolvido pelo cultivo <strong>de</strong> palma compense o CO2 emitido pela<br />
queima dos solos turfosos e pela queima da floresta tropical.<br />
O ciclo <strong>de</strong> crimes ambientais e falta <strong>de</strong> presença do Estado, que<br />
causam as emissões do setor <strong>de</strong> silvicultura, po<strong>de</strong> ser revertido através<br />
<strong>de</strong> investimentos em práticas sustentáveis e atuação governamental em<br />
fiscalização. O problema é que as florestas tropicais remanescentes<br />
estão em áreas <strong>de</strong> países em <strong>de</strong>senvolvimento (Brasil, Indonésia e<br />
Congo são exemplos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s <strong>de</strong>smatadores) on<strong>de</strong> a preocupação<br />
27 A publicação “Fact book for UN-FCCC policies on peat carbon emissions”<br />
com os dados po<strong>de</strong> ser encontrada no site www.wetlands.org, no link<br />
específico:<br />
http://<strong>global</strong>.wetlands.org/LinkClick.aspx?fileticket=mGqAyxnvFJw%3d&tabi<br />
d=56
principal dos governos é o crescimento econômico e a redução da<br />
pobreza, ficando o meio-ambiente num plano secundário. Não se<br />
controla o <strong>de</strong>smatamento porque não há ganho econômica imediato com<br />
isso, existindo áreas fora do controle estatal. Esses países alegam que os<br />
países ricos <strong>de</strong>smataram suas florestas para se <strong>de</strong>senvolverem e não<br />
po<strong>de</strong>m exigir moralmente metas <strong>de</strong> redução dos países em<br />
<strong>de</strong>senvolvimento, e que só <strong>de</strong>vem existir metas <strong>de</strong> redução para o<br />
consumo <strong>de</strong> combustíveis fósseis dos países ricos. Alguns países ricos<br />
<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m que os governos dos países <strong>de</strong>smatadores precisam cumprir<br />
metas <strong>de</strong> redução. Nessa disputa todos estão errados, porque <strong>de</strong>vemos<br />
pensar como "nós" e não como "eu". Um país como o Brasil, que possui<br />
a 8ª economia do mundo, por exemplo, po<strong>de</strong> diminuir fortemente o<br />
<strong>de</strong>smatamento na Amazônia sem recursos externos. Por outro lado os<br />
países ricos também po<strong>de</strong>m contribuir com uma fração ínfima das suas<br />
riquezas. Essa disputa não po<strong>de</strong> impedir que o mundo aproveite uma das<br />
formas <strong>de</strong> diminuição <strong>de</strong> emissões <strong>de</strong> gases estufa com melhor custobenefício.<br />
A solução passa pela já citada responsabilida<strong>de</strong><br />
compartilhada, on<strong>de</strong> os países <strong>de</strong>senvolvidos contribuem com 50% dos<br />
recursos financeiros necessários para financiar as iniciativas do setor <strong>de</strong><br />
silvicultura e os países em <strong>de</strong>senvolvimento contribuem com os outros<br />
50% necessários para financiar as iniciativas <strong>de</strong>ntro dos seus territórios.<br />
Iniciativas como o incentivo a práticas sustentáveis (exemplo: extração<br />
sustentável da ma<strong>de</strong>ira da floresta), gerarão ganhos econômicos que<br />
compensarão os investimentos feitos pelos países em <strong>de</strong>senvolvimento.<br />
O fim do <strong>de</strong>smatamento tropical <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma gran<strong>de</strong> mudança<br />
<strong>de</strong> mentalida<strong>de</strong> na exploração das florestas. Até hoje o <strong>de</strong>smatamento<br />
das florestas foi visto como fonte <strong>de</strong> progresso econômico inesgotável<br />
através da exploração da ma<strong>de</strong>ira e da conquista <strong>de</strong> novas terras para o<br />
cultivo agrícola. Diante do <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>, on<strong>de</strong> as emissões do<br />
setor <strong>de</strong> silvicultura são responsáveis por quase 20% do efeito estufa, da<br />
esgotabilida<strong>de</strong> das florestas e <strong>de</strong> outros papéis ambientais como a<br />
responsabilida<strong>de</strong> pela formação <strong>de</strong> chuvas, as florestas tropicais<br />
apresentarão um melhor custo-benefício no longo prazo para a<br />
socieda<strong>de</strong> se forem mantidas em pé. No curto prazo são necessárias<br />
alternativas para manutenção dos benefícios econômicos trazidos pela<br />
exploração predatória. Ao invés <strong>de</strong> se <strong>de</strong>smatar novas terras para<br />
expandir a pecuária extensiva, a melhor alternativa é aumentar a criação<br />
<strong>de</strong> gado nas mesmas terras. A exploração sustentável da ma<strong>de</strong>ira da<br />
floresta, on<strong>de</strong> é <strong>de</strong>smatada apenas a parcela da floresta que possui valor
comercial, po<strong>de</strong> substituir com sucesso o <strong>de</strong>smatamento predatório. A<br />
palavra chave <strong>de</strong>sse processo é COMPATIBILIZAÇÃO. Precisamos<br />
compatibilizar a preservação da floresta com a manutenção <strong>de</strong><br />
ativida<strong>de</strong>s econômicas lucrativas. Mesmo que essa compatibilização<br />
consiga ser implementada com sucesso na maioria dos países, parece<br />
pouco razoável que o mundo acabe completamente com o<br />
<strong>de</strong>smatamento, pois mesmo que os gran<strong>de</strong>s focos acabem o<br />
<strong>de</strong>smatamento ocorrerá difusamente com baixa intensida<strong>de</strong> em qualquer<br />
parte do globo. No entanto há um gran<strong>de</strong> aliado para zerar e até mesmo<br />
tornar negativa as emissões do setor <strong>de</strong> silvicultura: o reflorestamento.<br />
O reflorestamento em áreas <strong>de</strong>gradadas já vem sendo feito como forma<br />
<strong>de</strong> neutralizar as emissões <strong>de</strong> CO2. Enquanto uma floresta adulta e<br />
madura consome e emite uma quantida<strong>de</strong> similar <strong>de</strong> CO2, uma floresta<br />
jovem e em crescimento consome muito mais CO2 do que emite. Ela<br />
fixa carbono na forma <strong>de</strong> tronco, galhos, folhas e emite oxigênio para a<br />
atmosfera. Essa capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumir CO2 po<strong>de</strong> anular a emissão <strong>de</strong><br />
uma usina ou <strong>de</strong> um carro que lança CO2 em qualquer parte do mundo.<br />
No caso do setor <strong>de</strong> silvicultura, o reflorestamento po<strong>de</strong> neutralizar as<br />
pequenas emissões difusas por <strong>de</strong>smatamento ao redor do planeta.<br />
tropical.<br />
Para se reduzir as emissões do setor <strong>de</strong> silvicultura até se atingir<br />
emissões neutras ou negativas em 2030 basicamente 4 soluções<br />
precisam ser implementadas:<br />
1)Reflorestamento <strong>de</strong> matas tropicais<br />
O reflorestamento em áreas <strong>de</strong>gradadas já vem sendo feito como<br />
forma <strong>de</strong> neutralizar as emissões <strong>de</strong> CO2 como instrumento <strong>de</strong><br />
conscientização ambiental, Exemplos <strong>de</strong>se processo são as<br />
neutralizações <strong>de</strong> eventos, produtos e programas <strong>de</strong> televisão.<br />
Precisamos aumentar exponencialmente o tamanho das áreas <strong>de</strong><br />
reflorestamento <strong>de</strong> matas nativas. No mundo já existem áreas<br />
significativas <strong>de</strong> reflorestamento para fins comerciais como produção <strong>de</strong><br />
carvão vegetal, papel e ma<strong>de</strong>ira. No entanto essas áreas não <strong>de</strong>vem ser<br />
usadas como neutralizadores <strong>de</strong> outras emissões externas, pois o<br />
carbono sequestrado po<strong>de</strong> ser lançado posteriormente na atmosfera na<br />
queima <strong>de</strong> carvão vegetal por exemplo. O reflorestamento com espécies<br />
nativas além <strong>de</strong> neutralizar outras emissões reecria a biodiversida<strong>de</strong> que<br />
foi perdida no momento do <strong>de</strong>smatamento da área. O estudo da
McKinsey estima em 2,4 bilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong> CO2 equivalente o<br />
potencial <strong>de</strong> sequestro <strong>de</strong> carbono em 2030 através do reflorestamento<br />
<strong>de</strong> áreas <strong>de</strong>gradadas e <strong>de</strong> áreas marginais <strong>de</strong> pastos e terras agrícolas.<br />
Para isso será necessário o plantio nos próximos 20 anos <strong>de</strong> uma área <strong>de</strong><br />
3,3 milhões <strong>de</strong> km², configurando um sequestro aproximado médio por<br />
hectare <strong>de</strong> 7,2 toneladas anuais <strong>de</strong> CO2, o que equivale a um sequestro<br />
<strong>de</strong> 2 toneladas <strong>de</strong> carbono anuais. Existem regiões como a floresta<br />
amazônica que apresentam um potencial muito maior <strong>de</strong> sequestro <strong>de</strong><br />
CO2 por hectare. Um hectare reflorestado na Amazônia po<strong>de</strong> fixar entre<br />
6 e 9 toneladas <strong>de</strong> carbono por ano 28 . Outro ponto é que quando se<br />
refloresta uma <strong>de</strong>terminada área, esse seqüestro anual <strong>de</strong> carbono se<br />
mantém por 20, 30 anos, ou seja, enquanto a mata vai crescendo. Então<br />
o seqüestro <strong>de</strong> CO2 através do reflorestamento continuará por mais<br />
alguns anos após 2030.<br />
Alguns ambientalistas questionam se há terra suficiente para<br />
fazer reflorestamentos tão extensos e ao mesmo tempo aumentar a<br />
produção agrícola sem <strong>de</strong>smatar novas áreas. No mundo existem 25<br />
milhões <strong>de</strong> km² <strong>de</strong> área agricultáveis sem a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> novos<br />
<strong>de</strong>smatamentos. Essa área <strong>de</strong>ve aumentar um pouco mais nas próximas<br />
2 décadas, mesmo no cenário <strong>de</strong> controle do <strong>de</strong>smatamento, já que a<br />
diminuição ocorrerá gradativamente ao longo dos anos. O<br />
<strong>de</strong>smatamento tropical, mesmo que num ritmo menor, gerará novas<br />
áreas para a produção agrícola. Dos 25 milhões <strong>de</strong> km², 14 milhões <strong>de</strong><br />
km² (56% do total) estão sendo usados para agricultura ou para pecuária<br />
e 11 milhões ainda po<strong>de</strong>m ser aproveitadas. Em 1960, a humanida<strong>de</strong><br />
usava uma quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> terra similar a atual para alimentar 3 bilhões<br />
<strong>de</strong> pessoas, com uma dieta <strong>de</strong> 2400 calorias diárias. Hoje essa<br />
quantida<strong>de</strong> terra é capaz <strong>de</strong> alimentar 6 bilhões <strong>de</strong> pessoas com uma<br />
dieta <strong>de</strong> 3000 calorias diárias. Uma gran<strong>de</strong> parte da população<br />
abandonou o campo e foi para a cida<strong>de</strong> nesse período, mas o aumento<br />
explosivo da produtivida<strong>de</strong> agrícola conseguiu quase que triplicar a<br />
produção, com menos trabalhadores e a mesma quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> terra. Nas<br />
próximas 4 décadas a taxa <strong>de</strong> crescimento populacional e a taxa <strong>de</strong><br />
crescimento da ingestão calórica serão menores. Por isso o aumento da<br />
28 Revista Scientific American Brasil, edição 6, novembro <strong>de</strong> 2002, versão<br />
eletrônica, reportagem “a Amazônia e o carbono Atmosférico”. A reportagem<br />
na íntegra está no site:<br />
http://www2.uol.com.br/sciam/reportagens/a_amazonia_e_o_carbono_atmosfer<br />
ico_imprimir.html
produção agrícola não será tão gran<strong>de</strong> quanto foi no período 1960-2008.<br />
Através da continuação do aumento da produtivida<strong>de</strong> agrícola e <strong>de</strong> uma<br />
boa utilização dos 11 milhões <strong>de</strong> km² restantes <strong>de</strong> terras agricultáveis,<br />
po<strong>de</strong>remos entre 2011 e 2030 aumentar a produção agrícola, diminuir<br />
fortemente o <strong>de</strong>smatamento tropical e reflorestar gran<strong>de</strong>s áreas com<br />
espécies nativas.<br />
O reflorestamento <strong>de</strong> matas nativas tem potencial <strong>de</strong> neutralizar<br />
qualquer emissão em qualquer setor econômico, não somente as<br />
emissões residuais do <strong>de</strong>smatamento tropical. Uma excelente alternativa<br />
é a neutralização <strong>de</strong> combustível nos postos <strong>de</strong> gasolina. Sabe-se que 1<br />
litro <strong>de</strong> gasolina emite 2,3 kg <strong>de</strong> CO2 na atmosfera. A quantificação <strong>de</strong><br />
emissões <strong>de</strong> um consumidor <strong>de</strong> gasolina ou <strong>de</strong> um posto é muito mais<br />
fácil e precisa do que a quantificação <strong>de</strong> emissões <strong>de</strong> uma empresa que<br />
necessita <strong>de</strong> cálculos complexos e muitas vezes imprecisos. Existe uma<br />
empresa <strong>de</strong> distribuição <strong>de</strong> combustível no Brasil que está realizando a<br />
neutralização do combustível consumido no posto <strong>de</strong> gasolina. Os<br />
postos Ipiranga, uma re<strong>de</strong> que é responsável pela distribuição <strong>de</strong> 14<br />
bilhões <strong>de</strong> litros <strong>de</strong> combustível no Brasil, criou um cartão <strong>de</strong> fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong><br />
chamado cartão Ipiranga Carbono Zero 29 . O consumidor que abastece o<br />
carro com o cartão tem o seu combustível neutralizado, através do<br />
reflorestamento <strong>de</strong> matas nativas em 3 estados brasileiros (São Paulo,<br />
Rio <strong>de</strong> Janeiro, Paraná) . Inicialmente a distribuidora financiou o plantio<br />
<strong>de</strong> uma área suficiente para neutralizar 5 mil toneladas <strong>de</strong> CO2. Apenas<br />
uma pequena parcela <strong>de</strong> combustível da distribuidora está sendo<br />
neutralizada, referente exclusivamente ao combustível pago com o<br />
Ipiranga Carbono Zero, mas a idéia tem um gran<strong>de</strong> potencial <strong>de</strong><br />
ampliação. Fazendo uma comparação, os cartões <strong>de</strong> Fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong><br />
tradicionais da re<strong>de</strong> Ipiranga oferecem um <strong>de</strong>sconto <strong>de</strong> 4 centavos <strong>de</strong><br />
real por litro <strong>de</strong> combustível consumido, enquanto o Cartão Carbono<br />
Zero não oferece <strong>de</strong>scontos no combustível, somente o ganho ambiental.<br />
Isso evi<strong>de</strong>ncia que os consumidores po<strong>de</strong>m estar dispostos a trocar um<br />
pequeno ganho econômico pela possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> melhorar o clima do<br />
planeta. O programa <strong>de</strong> neutralização está sendo validado pela Bureau<br />
Veritas Certification, uma empresa certificadora presente em mais <strong>de</strong><br />
140 países. Veja a foto do cartão:<br />
29 O site do cartão é: http://www.cartaoipirangacarbonozero.com.br/
O custo <strong>de</strong> 4 centavos por litro que o consumidor paga é muito<br />
baixo, além <strong>de</strong> ser um valor próximo das estimativas do relatório da<br />
McKinsey. O estudo afirma que o custo médio para se evitar a emissões<br />
no período 2011-2030 no setor <strong>de</strong> silvicultura é <strong>de</strong> 9 euros por tonelada<br />
<strong>de</strong> CO2, o que equivale a um custo <strong>de</strong> 27 reais. São necessários a queima<br />
<strong>de</strong> 434 litros <strong>de</strong> gasolina para se emitir 1 tonelada <strong>de</strong> CO2. Aplicando-se<br />
o custo <strong>de</strong> 27 reais por tonelada evitada, o custo para se neutralizar 1<br />
litro <strong>de</strong> gasolina é <strong>de</strong> 6,2 centavos <strong>de</strong> real (27 : 434). No caso da<br />
gasolina brasileira o custo ainda é menor porque há uma adição <strong>de</strong> 24%<br />
<strong>de</strong> álcool, que tem suas emissões neutralizadas pelo crescimento da<br />
cana-<strong>de</strong>-açúcar. Um custo entre 4 e 6 centavos <strong>de</strong> real diante <strong>de</strong> um<br />
preço final da gasolina que ultrapassa 2 reais por litro no caso brasileiro<br />
é plenamente viável <strong>de</strong> ser pago pelo consumidor final até mesmo <strong>de</strong><br />
forma voluntária.<br />
2) Fortalecimento das instituições<br />
Combater o <strong>de</strong>smatamento tropical no mundo exige um<br />
aumento da participação estatal no controle do uso da terra. Sem<br />
presença dos governos, as áreas <strong>de</strong> <strong>de</strong>smatamento se tornam terras sem<br />
lei, on<strong>de</strong> quem <strong>de</strong>smata predatoriamente e posteriormente a ocupa se<br />
torna dono. Na Amazônia brasileira, por exemplo, menos <strong>de</strong> 10% das<br />
terras têm títulos <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> claros. O primeiro passo é fazer a<br />
regularização fundiária, dando títulos <strong>de</strong> terra para os posseiros que já se<br />
estabeleceram a um <strong>de</strong>terminado tempo em regiões que foram<br />
<strong>de</strong>smatadas no passado e que hoje <strong>de</strong>senvolvem ativida<strong>de</strong>s<br />
agropecuárias. O segundo passo é a ocupação efetiva das gran<strong>de</strong>s áreas<br />
<strong>de</strong> florestas preservadas por parte dos governos e a posterior concessão<br />
<strong>de</strong>ssas terras para empresas que realizem a extração sustentável da
ma<strong>de</strong>ira. Outra opção é a transformação <strong>de</strong>ssas áreas <strong>de</strong> florestas<br />
preservadas em parques nacionais com gran<strong>de</strong> presença <strong>de</strong> guardas<br />
florestais na fiscalização. O importante é separar as áreas <strong>de</strong>smatadas<br />
das áreas preservadas, garantindo segurança jurídica para as terras e<br />
atraindo empresas formais e sérias para o campo. Impor que áreas<br />
<strong>de</strong>smatadas no passado sejam reflorestadas pelos posseiros com recursos<br />
próprios, como alguns ambientalistas <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m, geraria um impacto<br />
econômico tão negativo que inviabilizaria no campo político a<br />
implementação das ações. Após o estabelecimento da regularização<br />
fundiária se faz necessário o investimento em recursos policiais e<br />
judiciários que garantirão a manutenção da segurança jurídica no<br />
campo.<br />
3)Monitoramento e fiscalização<br />
Um gran<strong>de</strong> aliado no combate do <strong>de</strong>smatamento tropical é o<br />
monitoramento via satélite das áreas efetivamente <strong>de</strong>smatadas. No<br />
entanto é preciso que agentes ambientais <strong>de</strong> campo efetivem na floresta<br />
a fiscalização. Os moradores das comunida<strong>de</strong>s locais também po<strong>de</strong>m<br />
ajudar no trabalho <strong>de</strong> fiscalização através <strong>de</strong> incentivos financeiros.<br />
Além dos agentes que combatem o <strong>de</strong>smatamento, se faz necessário o<br />
aumento <strong>de</strong> fiscais que controlem as ativida<strong>de</strong>s predatórias que se<br />
sustentam do <strong>de</strong>smatamento. Nesse processo é muito importante a<br />
rastreabilida<strong>de</strong> dos rebanhos e dos produtos agrícolas, garantindo a<br />
obrigatorieda<strong>de</strong> que a produção não provenha <strong>de</strong> áreas <strong>de</strong>smatadas. A<br />
participação do consumidor nacional e internacional, exigindo a origem<br />
ambiental do produto, completa o monitoramento.<br />
4)Incentivos econômicos para ativida<strong>de</strong>s sustentáveis<br />
Simplesmente apertar as causas do <strong>de</strong>smatamento não resolve o<br />
problema. As ativida<strong>de</strong>s associadas ao <strong>de</strong>smatamento são fundamentais<br />
para o funcionamento das economias locais. Se faz necessário criar<br />
incentivos para que novas ca<strong>de</strong>ias produtivas sejam criadas e que as<br />
ca<strong>de</strong>ias tradicionais sejam aperfeiçoadas. O <strong>de</strong>smatamento predatório<br />
po<strong>de</strong> ser substituído pelo manejo sustentável da floresta através da<br />
concessão <strong>de</strong> uso para empresas privadas certificadas. Enquanto no<br />
<strong>de</strong>smatamento convencional se tira a ma<strong>de</strong>ira que a indústria precisa e<br />
se queima o resto da floresta, no <strong>de</strong>smatamento com manejo se retira<br />
apenas a ma<strong>de</strong>ira com valor comercial e se <strong>de</strong>ixa o resto da floresta<br />
quase intacta. Depois <strong>de</strong> alguns anos as árvores com valor comercial
crescem e po<strong>de</strong>m ser extraídas novamente. Essa alternativa resolve com<br />
sucesso a extração da ma<strong>de</strong>ira, mas as ativida<strong>de</strong>s agropecuárias almejam<br />
aumentar sua produção através do aumento das áreas <strong>de</strong> plantio. Para<br />
aumentar a produção sem precisar aumentar a área <strong>de</strong> produção é<br />
necessário principalmente tornar a pecuária mais intensiva (a ativida<strong>de</strong><br />
que mais ocupa terras) e reaproveitar áreas <strong>de</strong>gradadas. Um exemplo <strong>de</strong><br />
sucesso é o sistema <strong>de</strong> criação <strong>de</strong>senvolvido na Embrapa (Empresa<br />
Brasileira <strong>de</strong> Pesquisa Agropecuária) on<strong>de</strong> há uma integração entre<br />
lavoura e pecuária 30 . O produtor cria 3 bois por hectare ao invés da<br />
criação <strong>de</strong> 0,7 bois por hectare extensiva. A técnica consiste em plantar<br />
milho e outros grãos em uma área separada, para alimentar o rebanho. O<br />
gado ocupa menos pasto e as terras são adubadas pela alternância entre<br />
bois e lavoura. Além <strong>de</strong> reduzir os custos com a recuperação das áreas<br />
<strong>de</strong>gradadas, essa técnica aumenta os ganhos do produtor. A produção da<br />
pecuária po<strong>de</strong>rá crescer por décadas sem <strong>de</strong>smatamento ao mesmo<br />
tempo em que parte das áreas <strong>de</strong> pecuária é substituída pela produção<br />
agrícola <strong>de</strong> grãos como a soja. Outra forma <strong>de</strong> manter a floresta em pé é<br />
pagar uma espécie <strong>de</strong> bolsa-floresta para que proprietários <strong>de</strong> terra e<br />
ribeirinhos moradores da floresta conservem as matas. Por último é<br />
importante <strong>de</strong>sincentivar ativida<strong>de</strong>s predatórias através da proibição <strong>de</strong><br />
créditos governamentais e da maior taxação <strong>de</strong> impostos sobre essas<br />
ativida<strong>de</strong>s.<br />
Diante do custo mais baixo para efetivar as soluções <strong>de</strong> mitigação<br />
<strong>de</strong> emissões no setor <strong>de</strong> Silvicultura em comparação com os setores<br />
econômicos <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes dos combustíveis fósseis, a ONU estuda uma<br />
forma <strong>de</strong> incluir a preservação <strong>de</strong> florestas entre as categorias <strong>de</strong><br />
projetos <strong>de</strong> MDL em 2013, na próxima fase do Protocolo <strong>de</strong> Kyoto.<br />
Esse tipo <strong>de</strong> crédito <strong>de</strong> carbono será chamado <strong>de</strong> Redd (Emissões<br />
Reduzidas do Desmatamento e da Degradação). As nações ricas<br />
comprariam créditos <strong>de</strong> carbono das comunida<strong>de</strong>s e regiões que<br />
evitassem o <strong>de</strong>smatamento ilegal a fim <strong>de</strong> cumprir suas metas<br />
obrigatórias <strong>de</strong> emissão. Um gran<strong>de</strong> risco é que se pague para preservar<br />
30<br />
Um estudo interessante sobre o Sistema integrado lavoura-pecuária po<strong>de</strong> ser<br />
encontrado no link:<br />
http://www.cpatu.embrapa.br/publicacoes_online/documentos-<br />
1/2008/diagnostico-e-mo<strong>de</strong>lagem-da-integracao-lavoura-pecuaria-naregiao-<strong>de</strong>-paragominas-pa/at_download/PublicacaoArquivo
uma <strong>de</strong>terminada área e que isso empurre o <strong>de</strong>smatamento para outras<br />
regiões, os chamados “vazamentos”. O importante é que não apenas se<br />
exija o cumprimento das iniciativas nos mol<strong>de</strong>s dos projetos <strong>de</strong> MDL<br />
tradicionais, mas que se exijam também metas nacionais <strong>de</strong> redução <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>smatamento dos países recebedores dos créditos.<br />
Além <strong>de</strong> conter as emissões <strong>de</strong> CO2, a diminuição do<br />
<strong>de</strong>smatamento tropical po<strong>de</strong> evitar outro tipo <strong>de</strong> mudança climática.<br />
Graças a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> evaporar enormes volumes <strong>de</strong> água, as florestas<br />
servem para manter fria e úmida a região que as abriga, revestindo-a<br />
com nuvens que refletem calor e trazem a chuva que as sustenta. Mais<br />
do que isso as gran<strong>de</strong>s florestas tropicais são parte do resfriamento do ar<br />
da Terra. O <strong>de</strong>smatamento já causou o <strong>de</strong>saparecimento <strong>de</strong> 65% das<br />
florestas naturais. Mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> computador prevêem que se 70% das<br />
árvores do planeta forem <strong>de</strong>rrubadas, o sistema regulador <strong>de</strong><br />
temperatura que elas proporcionam per<strong>de</strong>rá a sua eficiência 31 . Sem isso<br />
o <strong>aquecimento</strong> é inevitável. Outro serviço ambiental importante são os<br />
chamados “Rios Voadores” 32 , on<strong>de</strong> regiões que estão longe da floresta<br />
tropical, são beneficiadas com chuvas que se formam nas regiões<br />
florestais. No Brasil, as regiões Centro-Oeste e Su<strong>de</strong>ste, celeiros<br />
agrícolas do Brasil e do Mundo <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m fortemente da Floresta<br />
Amazônica para formação <strong>de</strong> chuvas. Então o combate ao<br />
<strong>de</strong>smatamento também proporciona essa estabilização climática como<br />
bônus, aumentando ainda mais a sua importância.<br />
A socieda<strong>de</strong> <strong>global</strong> <strong>de</strong>ve <strong>de</strong>cidir como usar o espaço terrestre<br />
racionalmente. Se nós precisamos <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento<br />
diferente (sustentável nas florestas tropicais restantes e nas áreas<br />
agrícolas) do mo<strong>de</strong>lo tradicional até hoje realizado, se os países<br />
<strong>de</strong>smatadores estão dispostos a receber dinheiro em troca <strong>de</strong>sse mo<strong>de</strong>lo<br />
e se é mais fácil e barato mudar as ativida<strong>de</strong>s econômicas marginais que<br />
<strong>de</strong>stroem a floresta do que mudar as ativida<strong>de</strong>s econômicas principais<br />
do mundo para conter o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>, se faz necessário que os<br />
países <strong>de</strong>senvolvidos e os países em <strong>de</strong>senvolvimento em conjunto<br />
paguem por essa preservação.<br />
31 Revista Aquecimento Global, Ano 1, nº 2, Editora Online, página 22.<br />
32 O termo se refere as correntes <strong>de</strong> ar que carregam umida<strong>de</strong> e vapor d'água
Capítulo 8: A redução <strong>de</strong> emissões na Amazônia<br />
Neste capítulo venho ressaltar a importância da Amazônia no<br />
cenário <strong>de</strong> reduções <strong>de</strong> gases estufa. As emissões da Amazônia<br />
obviamente estão incluídas no setor <strong>de</strong> silvicultura, abordado no<br />
capítulo anterior, mas a dimensão da floresta e das suas respectivas<br />
emissões merece uma análise mais específica. O Brasil <strong>de</strong>tém mais da<br />
meta<strong>de</strong> da área <strong>de</strong> florestas tropicais remanescentes do mundo, num<br />
total <strong>de</strong> 4,6 milhões <strong>de</strong> km², sendo que a maioria absoluta <strong>de</strong>ssas áreas<br />
está na Amazônia. Isso representa um patrimônio colossal <strong>de</strong><br />
biodiversida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> estabilida<strong>de</strong> climática e <strong>de</strong> recursos naturais não só<br />
para o Brasil, mas para o mundo inteiro. No entanto esse patrimônio<br />
vem sendo ameaçado nas últimas décadas. A taxa <strong>de</strong> <strong>de</strong>smatamento<br />
brasileira atingiu uma média <strong>de</strong> 19 mil km² entre 1996 e 2005. O<br />
<strong>de</strong>smatamento brasileiro emitiu na média dos últimos anos 1,2 bilhão <strong>de</strong><br />
toneladas <strong>de</strong> CO2 anualmente, sendo 0,8 bilhão somente no bioma<br />
amazônico. O Brasil sozinho é responsável por 22% das emissões<br />
advindas do <strong>de</strong>smatamento no mundo.<br />
A <strong>de</strong>struição da floresta amazônica é realizada através <strong>de</strong> uma<br />
simbiose entre as ma<strong>de</strong>reiras e os pecuaristas. O processo começa com a<br />
extração da ma<strong>de</strong>ira. As ma<strong>de</strong>ireiras retiram apenas as árvores <strong>de</strong> valor<br />
comercial que estão dispersas na mata. Mas, para cada árvore retirada,<br />
outras 27 são danificadas. Com as estradas, uma ma<strong>de</strong>ireira predatória<br />
<strong>de</strong>grada 60% da floresta. Os pecuaristas, geralmente associados às<br />
ma<strong>de</strong>ireiras, <strong>de</strong>rrubam o que sobrou da mata e plantam capim para o<br />
gado. Criados livres no campo, sem ração, os bois precisam todo ano <strong>de</strong><br />
novas áreas <strong>de</strong>rrubadas para a formação <strong>de</strong> pasto. O pasto é abandonado<br />
em pouco tempo. Cerca <strong>de</strong> 30% das pastagens duram menos que cinco<br />
anos. Nas terras abandonadas, a floresta não se recupera porque o solo<br />
foi compactado pelos bois e empobrecido pelo fogo. Resta uma<br />
vegetação rala, com arbustos. Dos 72 milhões <strong>de</strong> hectares já <strong>de</strong>vastados<br />
na Amazônia, cerca <strong>de</strong> 56 milhões <strong>de</strong> hectares são ocupados por uma<br />
pecuária <strong>de</strong> baixa produtivida<strong>de</strong> e outros 16,5 milhões <strong>de</strong> hectares <strong>de</strong><br />
áreas foram abandonados pelo empobrecimento do solo.<br />
Felizmente, a taxa <strong>de</strong> <strong>de</strong>smatamento caiu fortemente na<br />
Amazônia Legal nos ano <strong>de</strong> 2008 e 2009. Em 2008 foram <strong>de</strong>smatados<br />
12,9 mil km² enquanto que em 2009 foram <strong>de</strong>smatados 7 mil km².No
entanto o <strong>de</strong>smatamento no ano <strong>de</strong> 2009 não po<strong>de</strong> ser utilizado como<br />
referência <strong>de</strong>finitiva. Ao contrário da indústria dos combustíveis fósseis,<br />
que apresenta pequenas variações <strong>de</strong> emissões <strong>de</strong> um ano para outro, o<br />
<strong>de</strong>smatamento tropical apresenta gran<strong>de</strong>s variações. Num ano <strong>de</strong> crise<br />
econômica como 2009 on<strong>de</strong> a economia mundial esteve em recessão, há<br />
pouca <strong>de</strong>manda por novas áreas para a agropecuária, enquanto num ano<br />
<strong>de</strong> vigoroso crescimento econômico há um gran<strong>de</strong> aumento na <strong>de</strong>manda<br />
por terras. Por isso os esforços precisam aumentar para que a redução<br />
continue. O Fundo Amazônia 33 po<strong>de</strong> ser um gran<strong>de</strong> aliado nessa tarefa<br />
<strong>de</strong> redução permanente. Ele é um fundo criado pelo governo brasileiro<br />
que tem a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> captar doações para investimentos nãoreembolsáveis<br />
em ações <strong>de</strong> prevenção, monitoramento e combate ao<br />
<strong>de</strong>smatamento, e <strong>de</strong> promoção da conservação e do uso sustentável das<br />
florestas no bioma amazônico. Essas doações po<strong>de</strong>m vir <strong>de</strong> governos,<br />
instituições multilaterais, organizações não governamentais e empresas.<br />
O primeiro contrato do Fundo Amazônia foi celebrado em 2009 com o<br />
Governo da Noruega, on<strong>de</strong> foram doados US$ 100 milhões.<br />
A consultoria McKinsey, ciente da importância da Amazônia,<br />
realizou o mais abrangente estudo já feito para quantificar o custo <strong>de</strong> se<br />
zerar o <strong>de</strong>smatamento na região. No estudo “Caminhos para uma<br />
economia <strong>de</strong> baixa emissão <strong>de</strong> carbono no Brasil” 34 houve uma atenção<br />
especial para quantificar esse <strong>de</strong>safio. O custo total foi estimado em 17<br />
bilhões <strong>de</strong> reais (5,5 bilhões <strong>de</strong> euros) anuais nos próximos 20 anos.<br />
Desse valor 7,2 bilhões <strong>de</strong> reais se referem ao combate do<br />
<strong>de</strong>smatamento propriamente dito, investindo em iniciativas <strong>de</strong><br />
fortalecimento das instituições, <strong>de</strong> fiscalização, <strong>de</strong> monitoramento e <strong>de</strong><br />
incentivos econômicos a ativida<strong>de</strong>s sustentáveis. Outros 10 bilhões <strong>de</strong><br />
reais anuais foram estimados como necessários para criar empregos<br />
urbanos com maior valor agregado nas pequenas cida<strong>de</strong>s e aumentar o<br />
investimento em dimensões básicas como saú<strong>de</strong> e educação na região<br />
Amazônica e <strong>de</strong>ssa forma melhorar os índices <strong>de</strong> <strong>de</strong>sempenho humano<br />
da população, trazendo esses índices para o patamar nacional. A<br />
McKinsey salientou que esse custo adicional po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado como<br />
um gasto do País necessário para trazer os Estados do bioma Amazônia<br />
ao patamar da média nacional, ou incluído no balanço geral do custo <strong>de</strong><br />
33 http://www.fundoamazonia.gov.br/<br />
34 O estudo po<strong>de</strong> ser acessado no link:<br />
http://www.mckinsey.com.br/sao_paulo/carbono.pdf
edução do <strong>de</strong>smatamento. Acredito que os financiadores (governos,<br />
empresas) nacionais e internacionais do combate ao <strong>de</strong>smatamento na<br />
Amazônia <strong>de</strong>vem custear apenas os 7,2 bilhões <strong>de</strong> reais anuais iniciais.<br />
O investimento adicional <strong>de</strong> 10 bilhões <strong>de</strong> reais por ano para melhorar<br />
os indicadores sociais e econômicos da região não é imprescindível para<br />
se zerar o <strong>de</strong>smatamento. No custo inicial estimado <strong>de</strong> 7,2 bilhões <strong>de</strong><br />
reais anuais já estão incluídos investimentos em ativida<strong>de</strong>s sustentáveis<br />
no campo como a exploração sustentável da floresta, a pecuária<br />
intensiva sem ração externa e a concessão <strong>de</strong> bolsa-floresta para manter<br />
a floresta em pé, que po<strong>de</strong>rão substituir com sucesso a agropecuária e o<br />
<strong>de</strong>smatamento predatórios. Quanto aos empregos urbanos e a melhoria<br />
da saú<strong>de</strong> e da educação na região, eles <strong>de</strong> fato aceleram a redução do<br />
<strong>de</strong>smatamento porque absolvem mão-<strong>de</strong>-obra <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s<br />
predatórias, mas po<strong>de</strong>m ser fomentados por investimentos na construção<br />
<strong>de</strong> hidrelétricas na região que não precisam <strong>de</strong> incentivos econômicos<br />
para se concretizarem.<br />
O Brasil precisa aumentar a sua capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> geração <strong>de</strong> energia<br />
elétrica para suprir o crescimento econômico das próximas décadas. A<br />
produção através das usinas hidrelétricas surge como a melhor<br />
alternativa, já que apresenta o menor custo econômico <strong>de</strong> produção,<br />
inferior ao custo dos combustíveis fósseis e das fontes alternativas.<br />
Além disso, a energia hidrelétrica elétrica representa uma forma <strong>de</strong><br />
obtenção <strong>de</strong> energia limpa. Apenas 25% do potencial hidrelétrico<br />
brasileiro está sendo aproveitado. A gran<strong>de</strong> maioria do potencial não<br />
aproveitado está localizado na Amazônia. O governo brasileiro tem<br />
<strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> projetos <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s hidrelétricas na região,<br />
mas tem sofrido gran<strong>de</strong>s pressões ambientais que têm dificultado a<br />
implementação dos projetos, principalmente através <strong>de</strong> embargos<br />
judiciais. Os grupos ambientalistas afirmam que as hidrelétricas<br />
<strong>de</strong>struirão a biodiversida<strong>de</strong> das áreas alagadas e mudarão o curso natural<br />
dos rios. Por outro lado o Brasil quer a energia barata da Amazônia e os<br />
moradores da região querem os vultosos investimentos na construção<br />
das usinas. O investimento <strong>de</strong> 20 bilhões <strong>de</strong> reais nas usinas<br />
hidrelétricas <strong>de</strong> Jirau e Santo Antonio, por exemplo, mudarão o perfil<br />
econômico do estado <strong>de</strong> Rondônia localizado na Amazônia brasileira.<br />
Apesar dos possíveis impactos ambientais, temos que analisar<br />
prioritariamente a proporcionalida<strong>de</strong> entre os benefícios econômicos e<br />
os impactos ambientais. As hidrelétricas projetadas são usinas fios<br />
d'água, que apresentam lagos artificiais pequenos. Enquanto a usina <strong>de</strong>
Jirau, que será construída no rio Ma<strong>de</strong>ira, alagará 0,08 km² por cada<br />
MW gerado, a média nacional das usinas existentes é <strong>de</strong> 0,57 km²<br />
alagado por cada MW gerado. Mesmo esse pequeno alagamento<br />
proporcional gerará pesadas compensações ambientais (exemplo:<br />
reflorestamentos) que serão custeadas pelos construtores das<br />
hidrelétricas. Se compararmos o impacto ambiental das hidrelétricas<br />
com o impacto ambiental da pecuária extensiva na Amazônia, os valores<br />
chegam a ser ridículos. Enquanto 1 MW <strong>de</strong> energia po<strong>de</strong> abastecer uma<br />
cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> 50 mil pessoas, inundando uma área <strong>de</strong> 8 hectares, nessa<br />
mesma área se cria apenas 5 cabeças <strong>de</strong> gado através da pecuária<br />
extensiva. Uma área centenas <strong>de</strong> vezes maior é necessária para que a<br />
pecuária forneça o mesmo resultado econômico das hidrelétricas. Tornase<br />
uma gran<strong>de</strong> ilusão acreditar que a humanida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> viver com<br />
impacto ambiental zero, que a Amazônia precisa virar um santuário<br />
virgem intocado. O que precisamos é <strong>de</strong>senvolver ativida<strong>de</strong>s<br />
econômicas com BAIXO impacto ambiental. As hidrelétricas po<strong>de</strong>m se<br />
tornar na realida<strong>de</strong> protetoras da floresta amazônica gerando<br />
<strong>de</strong>senvolvimento econômico nas zonas urbanas através dos<br />
investimentos <strong>de</strong> construção num momento inicial e posteriormente<br />
através dos ganhos dos estados amazônicos com os royalties e os<br />
impostos arrecadados no momento <strong>de</strong> funcionamento. O<br />
<strong>de</strong>senvolvimento econômico po<strong>de</strong>rá absolver mão-<strong>de</strong>-obra que<br />
atualmente se encontra <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> alto impacto<br />
ambiental como o <strong>de</strong>smatamento predatório e a pecuária extensiva,<br />
enquanto a arrecadação <strong>de</strong> impostos e <strong>de</strong> royalties po<strong>de</strong>rá financiar a<br />
melhoria dos indicadores <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e educação da população que resi<strong>de</strong><br />
na Amazônia.<br />
Com o investimento <strong>de</strong> 7,2 bilhões <strong>de</strong> reais anuais, o equivalente<br />
a 2,4 bilhões <strong>de</strong> euros, o <strong>de</strong>smatamento da Amazônia brasileira cessará e<br />
a floresta será preservada para as futuras gerações. Temos nas próximas<br />
2 páginas um resumo das iniciativas propostas 35 pela McKinsey para a<br />
Amazônia com os respectivos custos <strong>de</strong> cada uma em euros, inclusive<br />
com as iniciativas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento econômico e social que foram<br />
consi<strong>de</strong>radas dispensáveis. Veja as iniciativas na próxima página:<br />
35 Essas iniciativas propostas estão no estudo “ Caminhos para uma economia<br />
<strong>de</strong> baixa emissão <strong>de</strong> carbono no Brasil”
Capítulo 9: O sequestro geológico <strong>de</strong> CO2<br />
O sequestro geológico <strong>de</strong> CO2 transforma as fontes fósseis em<br />
fontes <strong>de</strong> suprimento <strong>de</strong> energia <strong>de</strong> baixo carbono. Ele consiste no<br />
princípio <strong>de</strong> <strong>de</strong>volver ao subsolo o carbono retirado, que antes estava<br />
presente na forma <strong>de</strong> petróleo, carvão mineral e gás natural. O CO2<br />
emitido por termelétricas, refinarias e indústrias é capturado,<br />
transportado e armazenado em campos <strong>de</strong> petróleo antigos, camadas <strong>de</strong><br />
carvão, ou aquíferos salinos. As fontes fósseis que sequestram<br />
geologicamente o CO2 diferem das fontes limpas não emissoras <strong>de</strong> gases<br />
estufa porque produzem um passivo ambiental. O CO2 estocado precisa<br />
ser monitorado para se evitar possíveis vazamentos. A diminuição <strong>de</strong><br />
emissões via armazenamento geológico possibilitará uma transição<br />
ambientalmente segura no processo <strong>de</strong> substituição das fontes fosseis<br />
por fontes renováveis limpas.<br />
Com a temática do <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> cada vez mais presente<br />
na socieda<strong>de</strong>, as indústrias sujas estão como "a fera acuada". Enquanto<br />
parte da opinião pública <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> o fechamento <strong>de</strong>las, essas empresas<br />
procuram uma forma <strong>de</strong> se tornarem ambientalmente sustentáveis e bem<br />
vistas pela socieda<strong>de</strong>. O sequestro geológico é avaliado como única<br />
forma <strong>de</strong> sobrevivência no longo prazo. O armazenamento <strong>de</strong> líquidos e<br />
gases em reservatórios geológicos é uma ativida<strong>de</strong> exercida a décadas<br />
pela indústria do petróleo 36 . A injeção <strong>de</strong> CO2 em campos petrolíferos<br />
tem a função <strong>de</strong> extrair o petróleo <strong>de</strong> difícil extração. O CO2 injetado se<br />
dissolve no petróleo, diminuindo a sua viscosida<strong>de</strong> e aumentando a sua<br />
mobilida<strong>de</strong>, propiciando a extração <strong>de</strong> até 40% do petróleo não extraído<br />
<strong>de</strong> forma convencional. Essa tecnologia já é empregada <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a década<br />
<strong>de</strong> 60 nos Estados Unidos e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a década <strong>de</strong> 80 no Brasil. Então a<br />
tecnologia <strong>de</strong> armazenamento geológico <strong>de</strong> CO2 não foi inventada<br />
recentemente, apenas adaptada para a mitigação <strong>de</strong> emissões<br />
atmosféricas. O sequestro geológico <strong>de</strong> CO2 para essa finalida<strong>de</strong>, já foi<br />
<strong>de</strong>monstrado em projetos <strong>de</strong> pequena escala, que injetam menos <strong>de</strong> 10<br />
milhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong> CO2 por ano. O principal projeto <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>monstração no mundo é o Sleipner, operado <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1996 pela<br />
36 Fonte: http://www.pucrs.br/cepac/download/CEPAC_FOLHETO.pdf<br />
O CEPAC é o Centro <strong>de</strong> Excelência em Pesquisa sobre Armazenamento <strong>de</strong><br />
Carbono, localizada na PUCRS, estado do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul, Brasil.
petrolífera norueguesa StatoilHydro, que injeta CO2 separado <strong>de</strong> gás<br />
natural na formação Utsira, um aquífero salino situado a 900m abaixo<br />
do leito do Mar do Norte. O projeto In Salah, na Argélia, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2004<br />
injeta CO2 em um aquífero salino a 2km <strong>de</strong> profundida<strong>de</strong> abaixo da<br />
superfície do <strong>de</strong>serto do Saara. O que ainda falta é o uso comercial em<br />
massa do armazenamento geológico <strong>de</strong> CO2, mas a tecnologia já existe.<br />
Nos próximos anos haverá o amadurecimento comercial do processo.<br />
Veja a imagem 37 com a injeção <strong>de</strong> CO2 no subsolo:<br />
Fgfffg<br />
dgfgjfgjf<br />
O processo <strong>de</strong> sequestro geológico <strong>de</strong> CO2 começa com a<br />
captura do gás nas fontes estacionárias como indústrias e termelétricas.<br />
A captura é feita basicamente por 4 tipos <strong>de</strong> tecnologia: pós-combustão,<br />
pré-combustão, oxi-combustão e processos industriais. Na pós-<br />
37 A imagem está no site:<br />
http://www.pucrs.br/cepac/download/SemanaAca<strong>de</strong>micaQuimica_RSI.pps
combustão e nos processos industriais o CO2 é extraído dos gases <strong>de</strong><br />
exaustão. No processo <strong>de</strong> pré-combustão, o carbono é extraído da sua<br />
combustão antes da sua queima, sendo produzido o gás <strong>de</strong> síntese,<br />
composto por hidrogênio e monóxido <strong>de</strong> carbono. Depois o gás <strong>de</strong><br />
síntese reage com água para a transformação <strong>de</strong> CO (monóxido <strong>de</strong><br />
carbono) em CO2. No processo <strong>de</strong> oxi-combustão, o combustível é<br />
queimado com alto teor <strong>de</strong> oxigênio ao invés <strong>de</strong> ar, obtendo CO2<br />
praticamente puro como gás <strong>de</strong> exaustão 38 .<br />
Após a captura, o CO2 precisa ser comprimido e transportado<br />
até o seu local <strong>de</strong> injeção em formações geológicas apropriadas. O<br />
transporte <strong>de</strong> CO2 po<strong>de</strong> ser realizado através <strong>de</strong> carbodutos ou através <strong>de</strong><br />
navios tanques.<br />
O armazenamento geológico do CO2 po<strong>de</strong> ser feito <strong>de</strong> forma<br />
segura em três tipos <strong>de</strong> reservatórios: campos <strong>de</strong> petróleo, aqüíferos<br />
salinos e camadas <strong>de</strong> carvão. Os campos <strong>de</strong> petróleo são reservatórios<br />
geológicos, que abrigam petróleo e gás, que ficaram aprisionados<br />
naturalmente por milhões <strong>de</strong> anos. Muitos <strong>de</strong>sses reservatórios foram<br />
exauridos pelo consumo humano, e o espaço po<strong>de</strong> ser aproveitado para<br />
armazenamento <strong>de</strong> CO2. Segundo a Agência Internacional <strong>de</strong> Energia,<br />
os campos <strong>de</strong> petróleo do mundo po<strong>de</strong>m armazenar 1 trilhão <strong>de</strong><br />
toneladas <strong>de</strong> CO2. Os aqüíferos salinos consistem em reservatórios <strong>de</strong><br />
água subterrânea com alta salinida<strong>de</strong>, por vezes similar ou maior que a<br />
água do mar, e que não po<strong>de</strong>m ser usadas para consumo humano. A<br />
injeção <strong>de</strong> CO2 em aqüíferos salinos <strong>de</strong>ve ocorrer em profundida<strong>de</strong>s<br />
superiores a 800m, para que o CO2 esteja em estado supercrítico, isto é,<br />
um gás com <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> similar a <strong>de</strong> líquidos. Esses reservatórios<br />
possuem a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> armazenar 10 trilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong> CO2 no<br />
mundo. As camadas <strong>de</strong> carvão po<strong>de</strong>m aprisionar CO2 em seus espaços<br />
porosos, sendo o armazenamento preferencialmente realizado em<br />
camadas profundas, isto é, camadas cuja exploração convencional não é<br />
economicamente viável. Estima-se que 200 bilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong> CO2<br />
po<strong>de</strong>m ser armazenados em camadas <strong>de</strong> carvão no mundo inteiro. Veja a<br />
foto 39 <strong>de</strong> um aqüífero salino:<br />
38 Fonte: http://www.pucrs.br/cepac/download/CEPAC_FOLHETO.pdf<br />
39 Fonte: http://www.pucrs.br/cepac/download/CEPAC_FOLHETO.pdf
Fotomicrografia <strong>de</strong> uma rocha reservatório<br />
Após o armazenamento, vem a fase <strong>de</strong> monitoramento da<br />
eficiência com que a formação geológica é capaz <strong>de</strong> reter o CO2 e,<br />
portanto, evitar vazamentos para a superfície ou outras unida<strong>de</strong>s<br />
geológicas. Estima-se que o risco <strong>de</strong> operação <strong>de</strong> injeção <strong>de</strong> CO2 seja<br />
similar ao risco <strong>de</strong> outras ativida<strong>de</strong>s da indústria do petróleo. Do ponto<br />
<strong>de</strong> vista geológico, a eficiência das formações para o aprisionamento <strong>de</strong><br />
fluidos po<strong>de</strong> ser atestada pela ocorrência natural <strong>de</strong> campos <strong>de</strong> dióxido<br />
<strong>de</strong> carbono. O CO2 injetado em formações geológicas po<strong>de</strong> ser<br />
precisamente monitorado, medido e verificado periodicamente através<br />
<strong>de</strong> tecnologias já maduras e disponíveis comercialmente. Dentre as<br />
técnicas mais avançadas encontra-se a sísmica 4D, que permite a<br />
obtenção <strong>de</strong> uma imagem do sub-solo, on<strong>de</strong> é possível verificar<br />
diretamente a presença do CO2, acompanhar o eventual <strong>de</strong>slocamento<br />
do CO2 injetado através da rocha, bem como medir o volume<br />
armazenado. A prática <strong>de</strong> monitoramento constante do armazenamento<br />
permite antecipar o comportamento do CO2 em sub-superfície e<br />
eventualmente promover ações <strong>de</strong> remediação.<br />
Mesmo com todas as medidas preventivas, alguns críticos<br />
questionam a segurança do processo <strong>de</strong> armazenamento geológico,<br />
quanto à possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vazamento. Eles afirmam que em 1986, 1700<br />
camaroneses morreram asfixiados <strong>de</strong>vido a uma erupção natural <strong>de</strong> CO2<br />
no lago Nyos. No entanto não se po<strong>de</strong> comparar as emissões naturais <strong>de</strong><br />
um lago <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma cratera <strong>de</strong> um vulcão, que se encontra na<br />
superfície, com o CO2 armazenado a quilômetros <strong>de</strong> profundida<strong>de</strong> em
áreas propícias para o armazenamento. O inci<strong>de</strong>nte no Lago Nyos é na<br />
verda<strong>de</strong> mais parecido com a erupção <strong>de</strong> um vulcão, um fenômeno<br />
natural que não po<strong>de</strong> ser evitado pelo homem. O que mais garante<br />
segurança para o processo <strong>de</strong> armazenamento geológico <strong>de</strong> CO2 é a<br />
reativida<strong>de</strong> do gás no subsolo. Quando ele é lançado num aqüífero<br />
salino ou num campo <strong>de</strong> petróleo, começam a ocorrer reações químicas<br />
com as rochas porosas <strong>de</strong>sses locais. O reservatório passa a sofrer uma<br />
acidificação. O gás carbônico reage com os minerais presentes no<br />
aqüífero salino, formando carbonatos. Então o dióxido <strong>de</strong> carbono acaba<br />
se transformando em substâncias inofensivas e sólidas. Enquanto o lixo<br />
atômico po<strong>de</strong> levar <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> milhares <strong>de</strong> anos para se tornar<br />
inofensivo, o CO2 vai reagindo nas décadas seguintes ao<br />
armazenamento e se tornando inofensivo. Isso é um diferencial a favor<br />
do armazenamento geológico <strong>de</strong> CO2. A seguir temos a reação química<br />
que forma a calcita e alguns exemplos 40 <strong>de</strong> outros carbonatos que o CO2<br />
forma no subsolo:<br />
calcita<br />
CaCO 3<br />
dawsonita<br />
NaAl(CO 3)(OH) 2<br />
magnesita<br />
MgCO 3<br />
si<strong>de</strong>rita<br />
FeCO 3<br />
dolomita<br />
(Ca,Mg)CO 3<br />
ankerita<br />
Ca(Fe,Mg,Mn)(CO 3 ) 2<br />
40 A imagem está no site:<br />
http://www.pucrs.br/cepac/download/SemanaAca<strong>de</strong>micaQuimica_RSI.pps
A consultoria McKinsey estima que em 2030 o uso do seqüestro<br />
geológico <strong>de</strong> carbono nos setores energético e industrial tem o potencial<br />
<strong>de</strong> abater entre 3,3 e 4,1 bilhões <strong>de</strong> toneladas anuais <strong>de</strong> CO2 equivalente<br />
a um custo entre 30 e 45 euros por tonelada <strong>de</strong> CO2 equivalente evitada.<br />
O custo líquido estimado em 2030 é ligeiramente superior ao custo <strong>de</strong><br />
fontes limpas como a energia solar e a energia eólica. O seqüestro<br />
geológico po<strong>de</strong> ser muito útil para neutralizar emissões <strong>de</strong> usinas<br />
termelétricas já em funcionamento on<strong>de</strong> a opção <strong>de</strong> fechá-las<br />
significaria um gran<strong>de</strong> prejuízo financeiro, já que a vida útil da infraestrutura<br />
é longa. Apesar <strong>de</strong> adaptar uma usina em funcionamento para<br />
o seqüestro ser mais caro do que construir uma infra-estrutura <strong>de</strong><br />
seqüestro numa usina nova, esse custo não é o mais relevante. O custo<br />
<strong>de</strong> implementação do seqüestro geológico tanto em usinas novas quanto<br />
em usinas velhas é inferior a 10 euros por tonelada <strong>de</strong> CO2 equivalente<br />
evitada. A maior parte dos custos se refere ao consumo <strong>de</strong> energia<br />
necessária para separação do dióxido <strong>de</strong> carbono dos <strong>de</strong>mais gases <strong>de</strong><br />
exaustão, po<strong>de</strong>ndo se requerer até 25% da eficiência final das plantas,<br />
um custo <strong>de</strong> manutenção do sistema. Outra boa opção é a associação<br />
entre fontes renováveis e fontes fósseis novas com seqüestro geológico<br />
<strong>de</strong> carbono. Fontes renováveis como o a energia solar e a energia eólica<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m <strong>de</strong> fatores naturais, por isso não funcionam com a mesma<br />
intensida<strong>de</strong> 24 horas por dia. Nos horários <strong>de</strong> menor vento incidindo nos<br />
aerogeradores, por exemplo, po<strong>de</strong>m-se ligar usinas termelétricas com<br />
seqüestro geológico <strong>de</strong> carbono, principalmente termelétricas a gás<br />
natural que po<strong>de</strong>m funcionar <strong>de</strong> forma flexível durante o dia com alta<br />
eficiência. Por fim termelétricas novas movidas a carvão com seqüestro<br />
geológico <strong>de</strong> carbono po<strong>de</strong>m ser uma boa opção para fornecer energia<br />
24 horas por dia com um baixo índice <strong>de</strong> emissões.<br />
O seqüestro geológico tem potencial para se tornar um<br />
importante passo na transição das fontes fósseis para as fontes<br />
renováveis limpas. Os combustíveis fósseis estão se esgotando,<br />
principalmente o petróleo e o gás natural. O estabelecimento da<br />
obrigatorieda<strong>de</strong> do seqüestro geológico nas próximas décadas em<br />
gran<strong>de</strong>s fontes fósseis garantirá que uma parcela consi<strong>de</strong>rável <strong>de</strong>sses<br />
combustíveis não lance CO2 na atmosfera. A solução i<strong>de</strong>al para<br />
controlar o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> até 2030 e também nas décadas<br />
posteriores é aproveitar um mix <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s que inclui as fontes<br />
renováveis limpas e o seqüestro geológico <strong>de</strong> carbono.
Capítulo 10: Fontes energéticas limpas<br />
As energias limpas constituirão o futuro energético do planeta.<br />
Isso se <strong>de</strong>ve ao crescente aumento da <strong>de</strong>manda energética humana<br />
impulsionada pelo crescimento econômico, a esgotabilida<strong>de</strong> das fontes<br />
fósseis e a crise climática ocasionada pelas emissões humanas <strong>de</strong> gases<br />
estufa. A gran<strong>de</strong> dúvida se refere a velocida<strong>de</strong> <strong>de</strong> transição da matriz<br />
fóssil para a matriz limpa. O estudo da Consultoria McKinsey estimou o<br />
potencial <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> emissões através do suprimento <strong>de</strong> energia <strong>de</strong><br />
baixo carbono em 12 bilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong> CO2 equivalente anual em<br />
2030, implementando apenas iniciativas com custo inferior a 60 euros<br />
por tonelada <strong>de</strong> CO2 equivalente. Desse valor entre 3,3 e 4,1 bilhões <strong>de</strong><br />
toneladas po<strong>de</strong>rão vir <strong>de</strong> fontes fósseis com seqüestro geológico e<br />
aproximadamente 8 bilhões através <strong>de</strong> fontes limpas, que são o assunto<br />
<strong>de</strong>ste capítulo. A principal contribuição através das fontes limpas é o<br />
uso <strong>de</strong> energias renováveis (energia solar, eólica, geotérmica, biomassa)<br />
no setor <strong>de</strong> energia elétrica com um potencial <strong>de</strong> abatimento <strong>de</strong> 4<br />
bilhões <strong>de</strong> toneladas anuais em 2030. Em segundo plano está o uso da<br />
energia nuclear no setor <strong>de</strong> energia elétrica com potencial <strong>de</strong> abatimento<br />
<strong>de</strong> 2 bilhões <strong>de</strong> toneladas anuais e o uso <strong>de</strong> biocombustíveis no setor <strong>de</strong><br />
transportes com potencial <strong>de</strong> abatimento <strong>de</strong> 500 milhões <strong>de</strong> toneladas<br />
anuais. Salienta-se novamente que todas as contribuições são sempre um<br />
acréscimo ao caso base, ou seja, estima-se, por exemplo, um certo nível<br />
<strong>de</strong> consumo <strong>de</strong> biocombustíveis em 2030 sem incentivos e po<strong>de</strong>remos<br />
aumentar esse nível <strong>de</strong> consumo esperado através <strong>de</strong> incentivos<br />
financeiros. Esse acréscimo no caso dos biocombustíveis no setor <strong>de</strong><br />
transporte tem potencial <strong>de</strong> abatimento <strong>de</strong> 500 milhões <strong>de</strong> toneladas<br />
anuais em 2030.<br />
As iniciativas <strong>de</strong> redução através das fontes energéticas limpas<br />
necessitam <strong>de</strong> maiores investimentos e apresentam maior custo líquido<br />
do que as iniciativas do setor <strong>de</strong> carbono terrestre (silvicultura e<br />
agricultura). Na comparação com as iniciativas <strong>de</strong> eficiência energética<br />
o investimento é menor, mas o custo líquido no longo prazo é maior, já<br />
que as iniciativas <strong>de</strong> eficiência energética economizam dinheiro através<br />
da economia <strong>de</strong> energia. Mesmo com custos maiores, as fontes<br />
energéticas limpas constituem um pilar fundamental no combate ao<br />
<strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>, pois além <strong>de</strong> um importante potencial <strong>de</strong><br />
abatimento <strong>de</strong> emissões entre 2011 e 2030, se olharmos no horizonte
além <strong>de</strong> 2030, os setores <strong>de</strong> carbono terrestre e <strong>de</strong> eficiência energética<br />
apresentam um potencial que atingirá um certo limite. A humanida<strong>de</strong><br />
continuará crescendo economicamente e consumindo energia e quando<br />
ela se tornar em algumas décadas muito eficiente no consumo <strong>de</strong><br />
energia, a única solução plausível será investir em fontes energéticas<br />
limpas para aumenta a geração <strong>de</strong> energia. A seguir temos as fontes<br />
energéticas limpas mais promissoras:<br />
10.1 Energia Eólica<br />
A energia eólica é a energia que provém do vento. Ela tem sido<br />
aproveitada <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a antigüida<strong>de</strong> para mover os barcos impulsionados<br />
por Parque velas Eólico, ou para na cida<strong>de</strong> fazer funcionar <strong>de</strong> Fortaleza, a engrenagem Brasil.<br />
<strong>de</strong> moinhos, ao mover<br />
as suas pás. Na atualida<strong>de</strong> utiliza-se a energia eólica para mover<br />
aerogeradores - gran<strong>de</strong>s turbinas colocadas em lugares <strong>de</strong> muito vento.<br />
Essas turbinas têm a forma <strong>de</strong> um cata-vento ou um moinho. Esse<br />
movimento através <strong>de</strong> um gerador produz energia elétrica. A energia<br />
eólica é renovável, limpa e amplamente distribuída <strong>global</strong>mente. Em<br />
alguns países, a energia elétrica gerada a partir do vento representa<br />
significativa parcela da <strong>de</strong>manda. Na Dinamarca ela já representa 25%<br />
da produção e aproximadamente 10% na Alemanha. Os avanços nos<br />
<strong>de</strong>senhos das turbinas reduziram os custos da eletricida<strong>de</strong>. No início dos
anos 80, a energia eólica custava cerca <strong>de</strong> US$ 0,30 por kWh. Já em<br />
2006, a energia eólica custava em média <strong>de</strong> US$ 0,04 a 0,10. Essa<br />
redução <strong>de</strong> custos propiciou o crescimento <strong>de</strong> 25% ao ano do mercado<br />
<strong>de</strong> energia eólica, tornando-a a energia renovável mais barata e a com<br />
maior participação na matriz energética mundial. No entanto a energia<br />
eólica ainda é mais cara que a energia fóssil, principalmente se<br />
comparada com o carvão. Os aerogeradores não consomem<br />
combustíveis, mas apresentam um custo <strong>de</strong> instalação inicial alto. Em<br />
2030 eles estarão mais baratos <strong>de</strong>vido aos ganhos aerodinâmicos e a<br />
redução <strong>de</strong> custos nos materiais através da nanotecnologia 41 . As usinas<br />
eólicas não produzem energia durante todo tempo nem com a mesma<br />
intensida<strong>de</strong> porque <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m da velocida<strong>de</strong> dos ventos. Cientistas e<br />
empresários americanos encontraram uma solução criativa para superar<br />
esse gargalo. O excesso <strong>de</strong> energia obtido nos momentos <strong>de</strong> vento mais<br />
forte, alimenta enormes compressores <strong>de</strong> ar, que enviam ar comprimido<br />
para camadas <strong>de</strong> arenito a 1000 metros <strong>de</strong> profundida<strong>de</strong>. Quando falta<br />
vento ou o consumo <strong>de</strong> energia aumenta muito (horário <strong>de</strong> pico), o arcomprimido<br />
armazenado é usado para gerar energia juntamente com<br />
uma fonte extra <strong>de</strong> gás natural. O ar-comprimido consegue elevar o<br />
rendimento da turbina movida a gás natural em até 60%, em relação a<br />
uma turbina que não usa o ar-comprimido. Outra a<strong>de</strong>quação inteligente<br />
da energia eólica está sendo projetada no Brasil. A maior parte da<br />
energia elétrica brasileira é gerada por usinas hidrelétricas, que barram<br />
rios muito volumosos como o São Francisco e o Paraná. Esses rios<br />
diminuem a vazão nos anos <strong>de</strong> baixa precipitação <strong>de</strong> chuvas, afetando a<br />
segurança energética do sistema. Justamente nesses anos se registra as<br />
maiores intensida<strong>de</strong>s dos ventos. Então haverá uma complementarida<strong>de</strong><br />
entre as duas fontes. Parques eólicos construídos nas regiões Nor<strong>de</strong>ste e<br />
Sul do Brasil evitarão que os lagos artificiais das hidrelétricas lancem<br />
muita água nas turbinas das usinas na estação seca, economizando água<br />
para geração <strong>de</strong> energia futura e água para consumo humano.<br />
41 A nanotecnologia é a aplicação da ciência em sistemas que tratam <strong>de</strong><br />
objetos mensurados em nanômetros. Um nanômetro (nm) é um bilionésimo<br />
<strong>de</strong> metro, ou um milionésimo <strong>de</strong> milímetro.
10.2 Energia solar<br />
A energia produzida pelo do Sol é lançada na Terra e po<strong>de</strong> ser<br />
captada e transformada em alguma forma utilizável pelo homem, seja<br />
diretamente para <strong>aquecimento</strong> <strong>de</strong> água ou ainda como energia elétrica<br />
ou mecânica. A energia solar é abundante e permanente, renovável a<br />
cada dia, não polui e nem prejudica o ecossistema. Ela soma<br />
características vantajosamente positivas para o sistema ambiental, pois o<br />
Sol, trabalhando como um imenso reator à fusão irradia na terra todos os<br />
dias um potencial energético extremamente elevado e incomparável a<br />
qualquer outro sistema <strong>de</strong> energia, sendo a fonte básica e indispensável<br />
para praticamente todas as fontes energéticas utilizadas pelo homem.<br />
A transformação da luz solar em energia elétrica, através do<br />
efeito fotovoltaico, é consi<strong>de</strong>rada a aplicação mais promissora da<br />
energia solar. Placa formadas <strong>de</strong> materiais semicondutores (como na<br />
foto acima) produzem eletricida<strong>de</strong> após a absorção da luz. Como o sol<br />
não brilha 24 horas por dia, para se ter abastecimento o dia inteiro, é<br />
preciso uma forma <strong>de</strong> armazenar o excesso <strong>de</strong> energia durante o dia em<br />
baterias. A energia solar tem potencial ilimitado <strong>de</strong> aproveitamento, é<br />
silenciosa e tem baixo custo <strong>de</strong> manutenção. No entanto, os custos para<br />
armazenar a energia na forma <strong>de</strong> baterias e os custos elevados para<br />
produzir placas solares tornam o custo <strong>de</strong> instalação muito elevado,<br />
mesmo tendo havido reduções importantes nas últimas décadas. A<br />
energia solar custa em média entre US$ 0,17 e US$0,32 por kWh <strong>de</strong><br />
energia gerado, um valor mais elevado que a energia eólica. A energia
solar é a solução i<strong>de</strong>al para áreas afastadas e ainda não eletrificadas, que<br />
estão longe da re<strong>de</strong> <strong>de</strong> energia. Em 2030 a energia solar fotovoltáica<br />
<strong>de</strong>ve baratear consi<strong>de</strong>ravelmente, fruto do surgimento <strong>de</strong> novos<br />
materiais com maior eficiência na conversão da luz solar em energia<br />
elétrica. Quanto ao armazenamento para uso noturno, a solução passa<br />
pela construção <strong>de</strong> usinas que armazenem durante o dia o excesso <strong>de</strong><br />
energia na forma <strong>de</strong> ar-comprimido em cavernas 42 , <strong>de</strong> forma similar ao<br />
armazenamento do excesso <strong>de</strong> energia produzido por aerogeradores nos<br />
momentos <strong>de</strong> muito vento. A redução <strong>de</strong> custos aumentará imensamente<br />
a participação da energia solar nas próximas décadas.<br />
Outra forma <strong>de</strong> aproveitamento da energia solar muito difundida<br />
é o <strong>aquecimento</strong> <strong>de</strong> fluídos (líquidos ou gasosos) através do calor do sol.<br />
Coletores concentradores ou planos absolvem o calor do sol e o<br />
transmitem para reservatórios termicamente fechados. O calor é<br />
aproveitado para aplicações como água quente para banho, ar quente<br />
para secagem <strong>de</strong> grãos, ou <strong>aquecimento</strong>s <strong>de</strong> piscinas. Essa aplicação da<br />
fonte solar proporciona redução <strong>de</strong> gastos com energia elétrica e isso<br />
tem impulsionado o uso comercial da tecnologia. Geralmente os<br />
sistemas se pagam entre 2 e 5 anos após a implantação. O calor do sol<br />
também é utilizado para gerar energia elétrica. Coletores concentram o<br />
calor do sol, que aquece um fluído. O vapor do fluído move uma turbina<br />
gerando energia <strong>de</strong> forma similar a uma termelétrica convencional,<br />
apenas não usando combustíveis fósseis. Nessas usinas solares térmicas<br />
uma forma <strong>de</strong> armazenamento <strong>de</strong> energia, distinta do armazenamento <strong>de</strong><br />
ar-comprimido em cavernas, está sendo tentada. A usina PS10, próxima<br />
a Sevilla na Espanha, funciona com uma tecnologia engenhosa. Ela<br />
utiliza o calor dos raios solares, refletidos por espelhos e captados por<br />
uma torre receptora. Esse calor é usado para aquecer um fluido,<br />
geralmente sal liquefeito, que permanece estocado em um reservatório<br />
com alta temperatura, como café quente numa garrafa térmica 43 . Quando<br />
há <strong>de</strong>manda por eletricida<strong>de</strong>, o fluido é conduzido até um gerador, e o<br />
vapor que ele <strong>de</strong>spren<strong>de</strong> move uma turbina, produzindo eletricida<strong>de</strong>. Por<br />
42 Revista Scientific American Brasil, edição 69, fevereiro <strong>de</strong> 2008,<br />
reportagem “Perspectivas para a energia solar”.<br />
43 Mais informações po<strong>de</strong>m ser encontradas no site da empresa <strong>de</strong>tentora da<br />
usina:<br />
http://www.abengoasolar.com/corp/web/es/nuestros_proyectos/plataforma_solu<br />
car/ps10/in<strong>de</strong>x.html
enquanto, ela consegue armazenar o calor produzido durante meia hora.<br />
Quando novas tecnologias já em <strong>de</strong>senvolvimento forem utilizadas, a<br />
nova geração <strong>de</strong> usinas térmicas como a PS10 será capaz <strong>de</strong> estocar o<br />
calor por até vinte horas. Veja a usina 44 :<br />
Usina PS10, em Sevilla na Espanha.<br />
44 A imagem está no link:<br />
http://www.abengoasolar.com/corp/export/sites/solar/resources/pdf/PS10.pdf
10.3 Biocombustíveis <strong>de</strong> 1ª geração e <strong>de</strong> 2° geração<br />
Os biocombustíveis são os combustíveis biológicos <strong>de</strong>rivados<br />
<strong>de</strong> produtos agrícolas e matéria orgânica, que não tem origem fóssil.<br />
Exemplos <strong>de</strong> biocombustíveis são o biodiesel, o álcool (já comentado<br />
anteriormente) e o biogás. Assim como os combustíveis fósseis, os<br />
biocombustíveis produzem CO2 quando geram energia. O diferencial é<br />
que o CO2 lançado foi seqüestrado no momento em que as plantas<br />
cultivadas estavam crescendo. A produção é praticamente neutra em<br />
carbono e renovável. Os principais biocombustíveis são o substituto<br />
biológico do diesel (biodiesel) e o substituto biológico da gasolina<br />
(álcool). O biodiesel, produzido através <strong>de</strong> plantas como soja, mamona,<br />
<strong>de</strong>ndê e pinhão manso, ainda é no mínimo 30% caro que o diesel fóssil.<br />
Quanto ao álcool, produzido com plantas como a beterraba, o milho e o<br />
trigo, a produção comercial só se sustenta através <strong>de</strong> fortes subsídios<br />
governamentais. O único biocombustível viável na atualida<strong>de</strong><br />
ambientalmente e economicamente é o álcool brasileiro proveniente da<br />
cana-<strong>de</strong>-açúcar, com um custo <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> US$ 0,22 por litro. Um<br />
hectare <strong>de</strong> cana produz 7500 litros <strong>de</strong> álcool e necessita apenas <strong>de</strong> 1<br />
unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> energia fóssil para produzir 8,3 unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> energia<br />
renovável. A maioria da frota brasileira <strong>de</strong> carros po<strong>de</strong> funcionar tanto<br />
com gasolina quanto com álcool. O baixo preço do álcool chega a<br />
pressionar os preços da gasolina para níveis mais baixos. Em países<br />
como os Estados Unidos e em alguns países europeus a taxa <strong>de</strong><br />
importação imposta ao etanol brasileiro evita que o consumo <strong>de</strong> álcool<br />
barato proveniente do Brasil se expanda.<br />
Todos os biocombustíveis citados até agora são conhecidos<br />
como biocombustíveis <strong>de</strong> 1ª geração. O principal problema <strong>de</strong>sses<br />
biocombustíveis é a falta <strong>de</strong> terras disponíveis para substituir todo o<br />
consumo <strong>de</strong> combustíveis fósseis do mundo. Teríamos que usar gran<strong>de</strong><br />
parte dos 25 milhões <strong>de</strong> km² <strong>de</strong> terras agricultáveis para produção <strong>de</strong><br />
biocombustíveis, gerando um gran<strong>de</strong> aumento do preço das terras e<br />
inflacionando o preço dos alimentos. Uma alternativa seria <strong>de</strong>smatar<br />
florestas para produzir biocombustíveis, mas o resultado ambiental seria<br />
<strong>de</strong>cepcionante. Se lançaria até 700 toneladas <strong>de</strong> CO2 na atmosfera ao se<br />
<strong>de</strong>smatar 1 hectare <strong>de</strong> floresta tropical e se evitaria apenas a emissão <strong>de</strong><br />
10,8 toneladas <strong>de</strong> CO2 por hectare/ano, ao se substituir a gasolina pelo<br />
álcool. No entanto, a limitação <strong>de</strong> terras não inviabiliza que os<br />
biocombustíveis <strong>de</strong> 1ª geração possam substituir a<strong>de</strong>quadamente até
20% do consumo mundial <strong>de</strong> combustíveis fósseis no setor <strong>de</strong><br />
transportes, sem gran<strong>de</strong>s pressões inflacionárias nos alimentos, e<br />
possam ter relevância na matriz energética futura.<br />
Os biocombustíveis <strong>de</strong> 2ª geração não competem fortemente por<br />
terras com a produção agrícola. Alguns apresentam uma altíssima<br />
produtivida<strong>de</strong> por hectare plantado, não necessitando <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s áreas<br />
<strong>de</strong> cultivo, enquanto outros utilizam restos agrícolas como matériaprima.<br />
Eles não apresentam os gargalos dos biocombustíveis <strong>de</strong> 1ª<br />
geração. Quando forem viabilizados comercialmente po<strong>de</strong>rão substituir<br />
todo o consumo mundial <strong>de</strong> combustíveis fósseis sem gran<strong>de</strong>s impactos<br />
ambientais, representando uma revolução energética. Os dois<br />
biocombustíveis <strong>de</strong> 2ª geração mais promissores são o biodiesel<br />
produzido a partir <strong>de</strong> algas e o etanol produzido a partir da celulose.<br />
O biodiesel das algas é produzido em tanques <strong>de</strong> água abertos<br />
ou fechados. Um hectare <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> algas po<strong>de</strong> produzir 90 mil<br />
litros <strong>de</strong> biodiesel por ano contra os 3 mil litros <strong>de</strong> biodiesel produzido<br />
através do pinhão manso, uma das plantas mais eficientes do mundo na<br />
produção <strong>de</strong> biodiesel convencional. O biodiesel a partir <strong>de</strong> algas não<br />
necessita <strong>de</strong> safras, po<strong>de</strong>ndo ser produzido todo dia, além <strong>de</strong> a produção<br />
po<strong>de</strong>r utilizar áreas <strong>de</strong> solos pobres e o consumo <strong>de</strong> água não potável. O<br />
fator terra afeta muito pouco o custo <strong>de</strong> produção.<br />
O etanol celulósico é produzido <strong>de</strong> uma forma diferente do<br />
etanol <strong>de</strong> 1ª geração. O etanol <strong>de</strong> 1ª geração da cana-<strong>de</strong>-açúcar é<br />
produzido a partir da sacarose. A cana é exprimida para tirar o caldo e<br />
esse caldo é levado para a fermentação. Nesse processo, um grupo <strong>de</strong><br />
microorganismos transforma o açúcar (sacarose) em etanol. No caso do<br />
etanol celulósico, se utiliza a celulose encontrada nas plantas para<br />
produzir álcool. A celulose é o recurso renovável mais abundante da<br />
terra. A celulose po<strong>de</strong> ser extraída <strong>de</strong> restos agrícolas como lascas <strong>de</strong><br />
ma<strong>de</strong>ira, grama, palha, folhas, caules e bagaços <strong>de</strong> frutas. Dessa forma<br />
não há competição entre a produção <strong>de</strong> alimentos e a produção <strong>de</strong><br />
combustível, pois numa mesma área que se produz laranja, por exemplo,<br />
po<strong>de</strong>-se extrair etanol celulósico proveniente das cascas e do bagaço das<br />
frutas no momento em que a fruta é processada para produção <strong>de</strong> suco<br />
engarrafado. O etanol celulósico po<strong>de</strong> ser extraído dos cultivos que já<br />
estão produzindo etanol <strong>de</strong> 1° geração como a cana-<strong>de</strong>-açúcar e o milho.<br />
Se aproveitando a celulose encontrada na palha, nas folhas e no bagaço
da cana-<strong>de</strong>-açúcar e a sacarose do caldo da cana, po<strong>de</strong>-se obter uma<br />
produção <strong>de</strong> 28 mil litros <strong>de</strong> etanol por hectare ao ano. Essa<br />
produtivida<strong>de</strong>, quase 4 vezes maior do que a obtida utilizando apenas o<br />
etanol da sacarose, diminui fortemente a competição por terras com o<br />
setor <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> alimentos. O processo <strong>de</strong> produção do etanol<br />
celulósico já foi viabilizado tecnicamente, mas o custo ainda é muito<br />
alto. Enquanto o etanol da sacarose custa US$ 0,22 por litro para ser<br />
produzido, o etanol da celulose, custa entre US$ 0,40 e US$ 0,60 por<br />
litro para ser produzido. Estima-se que quando o custo atingir US$ 0,30<br />
por litro, o álcool celulósico será viável comercialmente. Os custos mais<br />
altos se <strong>de</strong>vem ao alto custo das enzimas que são usadas no processo <strong>de</strong><br />
transformação da celulose em glicose. No momento está ocorrendo uma<br />
corrida tecnológica para baratear os custos <strong>de</strong>ssas enzimas, pois esse<br />
fator é chave para viabilizar o etanol celulósico. Após a transformação<br />
da celulose em glicose, outro açúcar, o processo é o mesmo do etanol da<br />
sacarose. A glicose é fermentada, obtendo-se álcool.<br />
Os especialistas afirmam que <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> 10 anos os<br />
biocombustíveis <strong>de</strong> 2ª geração se tornarão viáveis economicamente<br />
po<strong>de</strong>ndo ser adicionados gradativamente ao diesel ou a gasolina<br />
proveniente do petróleo, sem gran<strong>de</strong>s preocupações ambientais ou<br />
alimentares. Se essa previsão se confirmar, teremos nas próximas<br />
décadas uma redução significativa consumo <strong>de</strong> petróleo no setor <strong>de</strong><br />
transportes mundial e conseqüentemente <strong>de</strong> emissões líquidas <strong>de</strong> CO2.<br />
Po<strong>de</strong>remos ter em 2030, por exemplo, um típico carro <strong>global</strong> sendo flex<br />
e híbrido e fazendo 30 km/l. No setor <strong>de</strong> veículos pesados po<strong>de</strong>remos ter<br />
caminhões rodando com 50% <strong>de</strong> diesel fóssil e 50% <strong>de</strong> biodiesel. No<br />
entanto todas essas previsões precisam <strong>de</strong> inovações tecnológicas<br />
importantes para se concretizarem. Por esse motivo ainda é impreciso<br />
afirmar que os biocombustíveis <strong>de</strong> 2ª geração tomarão a dianteira no<br />
abastecimento mundial do setor <strong>de</strong> transportes.<br />
10.4 Energia proveniente do mar<br />
Os oceanos po<strong>de</strong>m fornecer milhares <strong>de</strong> vezes a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
energia que a humanida<strong>de</strong> consome. Uma abundância <strong>de</strong> energia<br />
renovável e limpa só comparável com a energia do sol e a energia dos<br />
ventos. O gran<strong>de</strong> problema é encontrar uma forma viável <strong>de</strong> aproveitar<br />
esse potencial comercialmente. Apesar <strong>de</strong> centenas <strong>de</strong> inventos
<strong>de</strong>senvolvidos, as formas <strong>de</strong> obtenção <strong>de</strong> energia dos oceanos têm se<br />
mostrado ineficientes em relação ao rendimento e aos custos. As<br />
principais formas <strong>de</strong> obtenção <strong>de</strong> energia dos oceanos são as ondas, as<br />
marés, as correntes marítimas e o calor dos oceanos.<br />
O calor do sol aquece os oceanos, principalmente nas zonas<br />
tropicais, criando uma diferença significativa <strong>de</strong> temperatura entre a<br />
superfície quente e o fundo do mar escuro e gelado. Essa diferença é<br />
capaz <strong>de</strong> gerar energia. O principal sistema <strong>de</strong> aproveitamento <strong>de</strong>sse<br />
gradiente <strong>de</strong> temperatura utiliza a amônia, uma substância que evapora<br />
com facilida<strong>de</strong>. As águas mornas da superfície do mar transformam a<br />
amônia em vapor, que movimenta uma turbina acoplada a um dínamo,<br />
gerando energia elétrica. Posteriormente o vapor da amônia é<br />
con<strong>de</strong>nsado pelo frio proveniente da água fria do fundo do mar, e em<br />
seguida a amônia líquida volta para o evaporador para começar um novo<br />
ciclo.<br />
As marés são criadas pelas forças gravitacionais que interagem<br />
entre a Terra, a Lua e o Sol, gerando variações dos níveis do mar no<br />
litoral durante o dia. Elas são mais previsíveis do que os ventos, o que<br />
representa uma gran<strong>de</strong> vantagem no aproveitamento energético. A<br />
forma <strong>de</strong> aproveitamento da energia das marés mais utilizada até hoje é<br />
através <strong>de</strong> barragens semelhantes às hidrelétricas. A barragem<br />
construída separa geralmente uma baia do restante do mar. Na maré alta,<br />
a água passa pela barragem através <strong>de</strong> uma turbina, gerando energia<br />
elétrica e enchendo o reservatório (a baia). Na maré baixa a baia, que se<br />
encontra cheia e num nível mais elevado que o mar é esvaziada e a água<br />
passa em sentido contrário ao do enchimento pela turbina gerando<br />
energia. Existem várias <strong>de</strong>ssas usinas no mundo, mas a única <strong>de</strong> gran<strong>de</strong><br />
porte e viável economicamente é a usina construída no estuário do rio<br />
Rance, no norte da França, com capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produzir 240 MW <strong>de</strong><br />
energia. As dificulda<strong>de</strong>s se referem à escassez <strong>de</strong> locais propícios para a<br />
construção, pois é preciso uma gran<strong>de</strong> amplitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> maré e uma<br />
topografia a<strong>de</strong>quada para se obter energia com um custo<br />
comercialmente viável.<br />
As ondas oceânicas po<strong>de</strong>m ser criadas por uma série <strong>de</strong> fatores<br />
como a atração gravitacional, a ativida<strong>de</strong> submarina e a pressão<br />
atmosférica, mas sua origem mais comum é o vento. Apesar <strong>de</strong> existir<br />
inúmeras variantes <strong>de</strong> aproveitamento da energia das ondas, a maioria
usa o mesmo princípio on<strong>de</strong> a onda pressiona um corpo oco,<br />
comprimindo o ar ou um líquido que move uma turbina ligada a um<br />
gerador. A <strong>de</strong>svantagem <strong>de</strong> se utilizar este processo na obtenção <strong>de</strong><br />
energia é que o fornecimento não é contínuo e apresenta baixo<br />
rendimento.<br />
As correntes marítimas são <strong>de</strong>slocamentos <strong>de</strong> massas <strong>de</strong> água<br />
oceânicas geradas pela inércia <strong>de</strong> rotação do planeta e pelos ventos, que<br />
se movimentam por todos os oceanos do mundo. As correntes são como<br />
rios oceânicos que transportam gran<strong>de</strong> quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> água. O<br />
aproveitamento é feito com turbinas semelhantes às turbinas eólicas. A<br />
utilização <strong>de</strong> turbinas para aproveitar tanto o <strong>de</strong>slocamento das correntes<br />
marítimas quanto o fluxo das marés (sem a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> construir<br />
barragens) está sendo consi<strong>de</strong>rado pelos especialistas como a fonte mais<br />
promissora <strong>de</strong> energia proveniente do mar O custo da geração <strong>de</strong><br />
energia através <strong>de</strong> turbinas em locais propícios (Escócia, por exemplo) é<br />
próximo do custo <strong>de</strong> geração da energia eólica, com a vantagem <strong>de</strong> os<br />
fluxos oceânicos serem mais constantes e previsíveis que os ventos.<br />
Veja a figura da turbina marinha 45 :<br />
45 Fonte: www.marineturbines.com
10.5 Carro a Hidrogênio<br />
O uso do hidrogênio como combustível em carros apresenta<br />
teoricamente vantagens interessantes em relação aos combustíveis<br />
fósseis. O hidrogênio é o mais simples e mais comum elemento do<br />
Universo, sendo ilimitado e renovável. A queima <strong>de</strong> hidrogênio gera<br />
energia mecânica para movimentar os carros sem emitir poluentes e um<br />
<strong>de</strong>terminado volume <strong>de</strong> hidrogênio líquido pesa menos do que um<br />
volume semelhante <strong>de</strong> gasolina e produz quase três vezes mais potência.<br />
Um combustível limpo, ilimitado, leve e eficiente energeticamente<br />
po<strong>de</strong>ria ser consi<strong>de</strong>rado perfeito. No entanto, o hidrogênio não é uma<br />
fonte <strong>de</strong> energia como os combustíveis fósseis. O hidrogênio gasoso<br />
puro raramente ocorre na natureza, pois ele é um elemento químico<br />
muito reativo e está sempre procurando outro elemento para se<br />
combinar. Como não existe nenhuma reserva <strong>de</strong> hidrogênio puro no<br />
planeta, ele <strong>de</strong>ve ser extraído <strong>de</strong> outros compostos se tiver o propósito<br />
<strong>de</strong> ser usado como uma fonte <strong>de</strong> combustível. Nesse processo <strong>de</strong><br />
extração há um consumo consi<strong>de</strong>rável <strong>de</strong> energia. Então é necessária<br />
uma fonte <strong>de</strong> energia primária que po<strong>de</strong> ser limpa (eólica, solar, etc) ou<br />
emissora <strong>de</strong> CO2. Já os combustíveis fósseis, são encontrados na<br />
natureza prontos para serem queimados no caso do gás natural ou<br />
necessitando apenas <strong>de</strong> refino no caso dos <strong>de</strong>rivados <strong>de</strong> petróleo. Na<br />
prática, o hidrogênio combustível exerce um papel semelhante às<br />
baterias nos carros elétricos, acumulando energia proveniente <strong>de</strong> uma<br />
fonte primária <strong>de</strong> energia.<br />
As duas principais formas <strong>de</strong> obtenção <strong>de</strong> hidrogênio<br />
combustível são a eletrólise da água e o uso <strong>de</strong> combustíveis fósseis. Na<br />
eletrólise a corrente elétrica é passada através da água para quebrá-la em<br />
hidrogênio e oxigênio. A reação é a seguinte:<br />
2H2O + eletricida<strong>de</strong> --> 2H2 + O2.<br />
O hidrogênio produzido na reação é usado como combustível.<br />
Na queima do hidrogênio para movimentar o carro, ocorre a reação<br />
reversa. O hidrogênio reage com o oxigênio, gerando energia elétrica,<br />
energia térmica (calor) e água. A energia elétrica move o carro e o único<br />
subproduto do motor é vapor <strong>de</strong> água, configurando uma queima limpa.<br />
Veja a reação química:<br />
2H2 + O2 --> 2 H2O + energia
Também é possível obter hidrogênio através do uso <strong>de</strong><br />
combustíveis fósseis. O petróleo e o gás natural contêm<br />
hidrocarbonetos, moléculas formadas por hidrogênio e carbono.<br />
Utilizando-se um dispositivo chamado reformador, ocorre-se a<br />
separação do hidrogênio do carbono <strong>de</strong> um hidrocarboneto. O carbono<br />
que sobra do reformador é lançado na atmosfera como dióxido <strong>de</strong><br />
carbono e o hidrogênio é posteriormente utilizado como combustível<br />
gerando vapor <strong>de</strong> água como subproduto. Essa forma <strong>de</strong> obtenção <strong>de</strong><br />
hidrogênio não é consi<strong>de</strong>rada ambientalmente correta <strong>de</strong>vido a emissão<br />
<strong>de</strong> CO2.<br />
A produção <strong>de</strong> hidrogênio via eletrólise é a única consi<strong>de</strong>rada<br />
viável ambientalmente, mas assim como os carros elétricos se faz<br />
necessário que a fonte primária que gerou a energia elétrica seja uma<br />
fonte não poluente. Precisa-se gerar energia elétrica através <strong>de</strong> usinas<br />
solares ou eólicas, por exemplo. Outros problemas são as dificulda<strong>de</strong>s<br />
<strong>de</strong> transporte e armazenamento do hidrogênio. A construção <strong>de</strong> postos<br />
<strong>de</strong> abastecimento <strong>de</strong> hidrogênio é extremamente cara, assim como o<br />
custo dos tanques <strong>de</strong> combustível nos carros. Isso se <strong>de</strong>ve as<br />
características do hidrogênio. Além <strong>de</strong> inflamável, o hidrogênio gasoso<br />
e mais leve e mais volumoso que o ar atmosférico, sendo que 1 grama<br />
<strong>de</strong> hidrogênio ocupa 10 vezes o espaço <strong>de</strong> 1 grama <strong>de</strong> ar atmosférico.<br />
Para não se construir um reservatório <strong>de</strong> abastecimento muito gran<strong>de</strong> se<br />
faz necessário armazenar o hidrogênio gasoso a uma altíssima pressão.<br />
Por isso o reservatório <strong>de</strong> combustível tem que ser muito resistente,<br />
tornando-se conseqüentemente caro. Uma alternativa é armazenar o<br />
hidrogênio no estado líquido, que ocupa 700 vezes menos espaço do que<br />
o hidrogênio gasoso, mas ele tem que ser armazenado numa temperatura<br />
<strong>de</strong> -253 graus centígrados para conservar o estado líquido. Essas<br />
temperaturas criogênicas também exigem tanques <strong>de</strong> combustível caros.<br />
A solução mais promissora é o armazenamento sólido, no qual o<br />
hidrogênio passa a fazer parte da estrutura atômica <strong>de</strong> um material,<br />
sendo liberado aos poucos, na medida necessária para alimentar o<br />
veículo. Já existem materiais especiais construídos que chegam a reter<br />
10% do seu peso em hidrogênio.<br />
O hidrogênio tem sido apresentado na mídia para o gran<strong>de</strong><br />
público como o combustível do futuro, que abastece foguetes espaciais e<br />
lança apenas água para a atmosfera. No entanto, ainda há a necessida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> avanços tecnológicos imensos para que a produção do hidrogênio se
torne barata e possa ser usada em massa no setor <strong>de</strong> transportes. Os<br />
carros elétricos e suas baterias são uma opção muito mais barata que o<br />
carro a hidrogênio na atualida<strong>de</strong> e provavelmente continuarão sendo<br />
também nas próximas décadas.<br />
10.6 Carro elétrico<br />
O carro elétrico é movido por um motor elétrico abastecido por<br />
baterias. Como foi citado no capítulo 2, o carro elétrico tem uma<br />
eficiência <strong>de</strong> 65% na conversão <strong>de</strong> energia contra 20% do carro a<br />
gasolina, pois o motor a gasolina <strong>de</strong>sperdiça mais energia na forma <strong>de</strong><br />
calor. Por esse motivo se gasta menos dinheiro com energia elétrica num<br />
carro elétrico do que com combustível num carro a gasolina. No<br />
entanto, 50 quilos <strong>de</strong> gasolina têm muito mais <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> energética do<br />
que 50 quilos <strong>de</strong> bateria, ou seja, armazena muito mais energia com o<br />
mesmo peso. Então a autonomia do carro elétrico, a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
quilômetros que o carro anda com tanque cheio, é bem menor do que a<br />
do carro a gasolina. Outro problema é a recarga <strong>de</strong>morada do carro<br />
elétrico. Enquanto um carro a gasolina é reabastecido em 3 minutos, um<br />
carro elétrico <strong>de</strong>mora horas para recarregar as baterias. Temos portanto<br />
dois gargalos na tecnologia do carro elétrico: a baixa autonomia e a<br />
recarga <strong>de</strong>morada.<br />
Nos últimos anos tem ocorrido uma corrida tecnológica para se<br />
obter baterias mais leves e baratas, que aumentariam a autonomia dos<br />
carros elétricos e diminuiriam os custos. Os aperfeiçoamentos<br />
tecnológicos obtidos na diminuição do peso das baterias dos carros<br />
híbridos, que já são produzidos comercialmente, estão sendo<br />
transferidos para a tecnologia do carro elétrico. Eles têm tornado o carro<br />
elétrico próximo da viabilida<strong>de</strong> comercial. A autonomia dos novos<br />
carros elétricos já aumentou bastante, mas ainda persiste o problema da<br />
recarga <strong>de</strong>morada. O engenheiro Shai Agassi, em parceria com o<br />
governo <strong>de</strong> Israel, tem <strong>de</strong>senvolvido um projeto revolucionário para<br />
resolver o problema da recarga <strong>de</strong>morada. A idéia é criar 500 mil postos<br />
<strong>de</strong> recargas convencionais <strong>de</strong> baterias no país, em lugares públicos<br />
como estacionamentos, e criar 200 pontos on<strong>de</strong> se po<strong>de</strong>rão trocar as<br />
baterias <strong>de</strong>scarregadas por outras previamente carregadas nos postos 46 .<br />
46 O site do projeto é: http://www.betterplace.com/
Ao invés <strong>de</strong> horas <strong>de</strong> recarga convencional, a troca <strong>de</strong> baterias <strong>de</strong>morará<br />
poucos minutos. O governo <strong>de</strong> Israel preten<strong>de</strong> implantar o sistema em<br />
2011. Críticos afirmam que o projeto é viável em Israel, por se tratar <strong>de</strong><br />
um país pequeno com pouco mais <strong>de</strong> 20 mil km² <strong>de</strong> extensão e muito<br />
povoado, mas num país com baixa <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> populacional, é inviável<br />
manter economicamente uma re<strong>de</strong> tão gran<strong>de</strong> <strong>de</strong> abastecimento com<br />
uma distância pequena <strong>de</strong> um ponto <strong>de</strong> abastecimento para outro. Outra<br />
forma <strong>de</strong> resolver o problema da autonomia seria o abastecimento <strong>de</strong><br />
energia sem fio, chamado <strong>de</strong> witrycity. A tecnologia ainda está em fase<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento, mas no futuro po<strong>de</strong>remos ter carros elétricos com<br />
pequenas baterias, que são abastecidos por pontos nas ruas e rodovias,<br />
que enviariam energia sem necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> fios para uma antena do carro<br />
enquanto ele está em movimento.<br />
Provavelmente nas próximas décadas, com a escassez do<br />
petróleo e com novas tecnologias, o carro elétrico se tornará viável e<br />
terá participação importante no fornecimento energético do setor <strong>de</strong><br />
transportes. Mas para que o carro elétrico seja limpo ambientalmente, é<br />
necessário saber se a fonte primária que produz energia para abastecer a<br />
re<strong>de</strong> elétrica emite CO2 ou não. A geração <strong>de</strong> energia elétrica precisa vir<br />
<strong>de</strong> fontes renováveis e limpas como a energia solar ou eólica, ou <strong>de</strong><br />
usinas com fontes fósseis que tenham o CO2 emitido seqüestrado<br />
geologicamente.<br />
10.7 Energia nuclear e energia hidrelétrica<br />
Além das 6 tecnologias alternativas mais promissoras citadas<br />
acima, ainda temos as tradicionais energia nuclear e energia hidrelétrica,<br />
que representam 15,2% e 16% respectivamente da geração <strong>de</strong> energia<br />
elétrica mundial, segundo a Agência Mundial <strong>de</strong> Energia (AIE). Essas<br />
duas fontes praticamente não emitem CO2, mais pairam sobre elas<br />
outros problemas ambientais. As usinas hidrelétricas barram rios e criam<br />
gran<strong>de</strong>s lagos artificiais que inundam imensas áreas <strong>de</strong> florestas e<br />
obrigam milhares <strong>de</strong> famílias a <strong>de</strong>socuparem as suas moradias. As<br />
usinas que usam a fissão nuclear apresentam riscos relacionados aos<br />
vazamentos <strong>de</strong> radioativida<strong>de</strong> nas usinas ou ao armazenamento dos<br />
rejeitos nucleares, que po<strong>de</strong>m provocar danos à saú<strong>de</strong> humana. Diante<br />
dos riscos a sobrevivência humana que o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> po<strong>de</strong>
epresentar, parece razoável continuar aumentando a participação <strong>de</strong>ssas<br />
duas fontes <strong>de</strong> energia, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que precauções necessárias sejam<br />
tomadas.<br />
As usinas hidrelétricas <strong>de</strong>vem ser construídas com lagos<br />
artificiais menores e também se <strong>de</strong>ve incentivar a construção <strong>de</strong><br />
pequenas centrais hidrelétricas, que provocam menos danos ambientais<br />
que as gran<strong>de</strong>s usinas e produzem energia com um preço competitivo.<br />
Como foi citado no capítulo 8, o Brasil (terceiro maior potencial<br />
hidrelétrico do mundo) apresenta a maior parte do potencial não<br />
explorado na Amazônia. A construção <strong>de</strong> usinas hidrelétricas tem sido<br />
muito criticada na região <strong>de</strong>vido a morte <strong>de</strong> espécies <strong>de</strong> plantas e<br />
animais pelos lagos artificiais numa região com uma biodiversida<strong>de</strong> tão<br />
rica. No entanto, as novas hidrelétricas construídas na região são usinas<br />
fios d'água, que apresentam lagos artificiais pequenos. Enquanto a usina<br />
<strong>de</strong> Jirau, que será construída no rio Ma<strong>de</strong>ira, alagará 0,08 km² alagado<br />
por cada MW gerado, a média nacional das usinas existentes é <strong>de</strong> 0,57<br />
km² alagado por cada MW gerado. No caso brasileiro, apenas 25% do<br />
potencial hidrelétrico <strong>de</strong> 260 gigawatts está sendo aproveitado, enquanto<br />
no mundo o aproveitamento é <strong>de</strong> 33% do potencial hidrelétrico. Uma<br />
parte do potencial hidrelétrico mundial esbarra nos altos custos e nos<br />
danos ambientais, mas tanto o Brasil quanto o mundo po<strong>de</strong>m no mínimo<br />
dobrar a geração <strong>de</strong> energia elétrica proveniente das hidrelétricas com<br />
viabilida<strong>de</strong> econômica e com danos ambientais mo<strong>de</strong>rados, como o<br />
exemplo da usina <strong>de</strong> Jirau.<br />
A geração <strong>de</strong> energia nuclear tradicional a partir da fissão dos<br />
átomos, explicada no capítulo 3 <strong>de</strong>ste livro, <strong>de</strong>ve ser incentivada nos<br />
países que já dominam a tecnologia nuclear para fins pacíficos, que<br />
representam a maioria absoluta da economia mundial. Uma expansão <strong>de</strong><br />
geração <strong>de</strong> energia elétrica através da fonte nuclear em novos países<br />
po<strong>de</strong>ria incentivar o aumento do número <strong>de</strong> países que dominam a<br />
tecnologia da bomba atômica e criar perigos <strong>de</strong>snecessários a segurança<br />
<strong>global</strong>. Apesar das críticas, a energia nuclear tem gerado uma fatia<br />
significativa da energia elétrica mundial a um custo competitivo, com<br />
poucos aci<strong>de</strong>ntes com morte nos últimos 50 anos. A França, país com a<br />
6º economia do mundo, gera 75% da sua energia elétrica através da<br />
fonte nuclear, com danos ambientais mínimos. Evi<strong>de</strong>ntemente que o<br />
passivo ambiental dos rejeitos nucleares, que po<strong>de</strong>rão representar um
isco ambiental por milhares <strong>de</strong> anos, <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rado, mas isso<br />
não torna a energia nuclear inviável ambientalmente.<br />
A energia hidrelétrica e a energia nuclear po<strong>de</strong>m ser importantes<br />
na transição da matriz energética fóssil para as fontes alternativas<br />
renováveis. As usinas das duas fontes energéticas, quando bem<br />
planejadas, geram danos ambientais mo<strong>de</strong>rados muito menores do que<br />
os causados pelos combustíveis fósseis. Os danos provocados a saú<strong>de</strong><br />
humana pelos fósseis diminuirão nas próximas décadas com a<br />
massificação dos catalisadores e com os testes para <strong>de</strong>tectar a emissão<br />
<strong>de</strong> gases venenosos nos automóveis e nas indústrias cada vez mais<br />
freqüentes, mas o problema do <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> provocado pelo CO2<br />
persiste. O i<strong>de</strong>al é que uma parte das usinas <strong>de</strong> carvão e gás natural<br />
geradoras <strong>de</strong> energia elétrica seja substituída por usinas com seqüestro<br />
geológico <strong>de</strong> carbono, e que outra parte seja gradativamente substituída<br />
tanto pelas usinas nucleares e usinas hidrelétricas, com danos ambientais<br />
mo<strong>de</strong>rados e custos baixos, quanto por fontes alternativas renováveis,<br />
100% limpas e com um custo um pouco mais alto. A participação da<br />
energia hidrelétrica e da energia nuclear, que representam juntas 31,2%<br />
da geração <strong>de</strong> energia elétrica atual, po<strong>de</strong>rá aumentar ainda mais nas<br />
próximas décadas.
Capítulo 11: Eficiência Energética<br />
O aumento da eficiência energética busca diminuir o gasto <strong>de</strong><br />
energia na produção <strong>de</strong> bens e serviços. No cenário atual <strong>de</strong><br />
<strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>, a lógica é que se mantivermos o nosso padrão <strong>de</strong><br />
vida consumindo menos energia, estaremos conseqüentemente emitindo<br />
menos CO2. O IPCC <strong>de</strong> 2007 estimou que a eficiência energética seja o<br />
setor com maior potencial <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> emissões <strong>de</strong> CO2 até 2050. Há<br />
100 atrás a humanida<strong>de</strong> tinha poucos recursos tecnológicos e recursos<br />
naturais abundantes, o que tornava a lógica da eficiência energética<br />
inviável. Na atualida<strong>de</strong>, diante do consumo <strong>de</strong>senfreado <strong>de</strong> recursos,<br />
temos um mundo com recursos naturais limitados como alimentos, água<br />
e energia, e por outro lado tecnologia capaz <strong>de</strong> gerar conforto com a<br />
utilização <strong>de</strong> poucos recursos naturais. Esse cenário estimula a busca<br />
por soluções que economizem energia, pois se os recursos energéticos<br />
naturais são escassos, ou no mínimo <strong>de</strong> difícil extração, eles<br />
conseqüentemente são caros. O <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> provocado pelas<br />
emissões <strong>de</strong> CO2 da matriz energética torna o aumento da eficiência<br />
energética mais importante ainda.<br />
O maior símbolo da <strong>de</strong>fesa da eficiência energética contra as<br />
emissões <strong>de</strong> CO2 é o cientista americano Amory Lovins. Ele faz da sua<br />
casa, localizada a 2000 metros <strong>de</strong> altitu<strong>de</strong> nos vales rochosos no estado<br />
do Colorado, um exemplo <strong>de</strong> como é possível viver com conforto,<br />
mesmo com pouco gasto energético. Em pleno inverno, on<strong>de</strong> a<br />
temperatura da região cai para 40 graus negativos, a sua casa consome o<br />
mínimo possível <strong>de</strong> energia. Ele utiliza arquitetura bioclimática para<br />
isolar termicamente a residência do ambiente externo e cultiva plantas<br />
tropicais em estufas, além <strong>de</strong> fazer uso <strong>de</strong> energias alternativas. Lovins é<br />
presi<strong>de</strong>nte e fundador do Rocky Mountain Institute 47 , uma fundação que<br />
<strong>de</strong>fen<strong>de</strong> o uso da eficiência energética como solução para o <strong>aquecimento</strong><br />
<strong>global</strong>.<br />
Os ganhos <strong>de</strong> eficiência energética são possíveis em todos os<br />
tipos <strong>de</strong> produtos e construções. A gran<strong>de</strong> questão é saber se os preços<br />
mais altos <strong>de</strong> instalação inicial dos produtos eficientes serão<br />
compensados por ganhos maiores na redução <strong>de</strong> gastos com energia no<br />
futuro. Também é importante que o conforto obtido com o produto<br />
47 Site: www.rmi.org
tradicional seja igual ao obtido com o produto eficiente<br />
energeticamente. O consumidor quer saber se o ar-condicionado <strong>de</strong><br />
baixo consumo gela tão bem quanto o <strong>de</strong> alto consumo, por exemplo.<br />
Existem inúmeros setores produtivos que po<strong>de</strong>riam se tornar mais<br />
eficientes com incentivos governamentais. Muitas vezes os<br />
consumidores preferem produtos mais baratos e ineficientes<br />
energeticamente <strong>de</strong>vido ao investimento inicial menor, mas acabam<br />
pagando 3, 4 vezes mais energia durante a vida útil do produto e acabam<br />
per<strong>de</strong>ndo dinheiro <strong>de</strong>vido ao imediatismo. Se os governos diminuírem<br />
os impostos sobre os produtos eficientes e os tornarem tão baratos<br />
quanto os tradicionais, o consumidor escolherá sempre o produto mais<br />
eficiente. O valor perdido com os impostos será varias vezes<br />
compensado pelos ganhos obtidos com a redução <strong>de</strong> gastos com energia<br />
para a população. Além do benefício econômico para a socieda<strong>de</strong>,<br />
teremos o benefício ambiental <strong>de</strong> emitir menos gases estufa. Outra<br />
forma <strong>de</strong> incentivo governamental é a implantação legal <strong>de</strong> um nível<br />
máximo <strong>de</strong> consumo <strong>de</strong> energia para os produtos fabricados no país.<br />
A Consultoria McKinsey estima em 14 bilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong><br />
CO2 equivalente o potencial <strong>de</strong> redução das emissões através das<br />
iniciativas <strong>de</strong> aumento da eficiência energética em 2030. Sempre se<br />
salienta que esse potencial é um acréscimo ao caso base. Mesmo no<br />
cenário on<strong>de</strong> não haja incentivos econômicos para combater o<br />
<strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> (caso base) haverá ganhos <strong>de</strong> eficiência energética<br />
entre 2011 e 2030. O potencial da eficiência energética é maior do que o<br />
setor <strong>de</strong> carbono terrestre e do que o potencial do setor <strong>de</strong> fontes<br />
energéticas limpas. Ele correspon<strong>de</strong> a aproximadamente 37% do<br />
potencial <strong>de</strong> abatimento <strong>de</strong> 38 bilhões <strong>de</strong> toneladas previsto pela<br />
consultoria. A maioria absoluta das iniciativas tem custo líquido<br />
negativo. Po<strong>de</strong>mos afirmar que a implementação das iniciativas <strong>de</strong><br />
eficiência energética aumentará o crescimento econômico dos países no<br />
longo prazo. No entanto as iniciativas necessitam <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s<br />
investimentos iniciais. Esses altos investimentos são plenamente viáveis<br />
diante dos benefícios econômicos que a economia <strong>de</strong> energia gerará.<br />
A fim <strong>de</strong> facilitar a análise sobre as principais oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
aumento da eficiência energética haverá uma divisão em quatro<br />
categorias: construção <strong>de</strong> edificações sustentáveis, uso <strong>de</strong> aparelhos<br />
elétricos e luminárias <strong>de</strong> baixo consumo, produção <strong>de</strong> veículos <strong>de</strong><br />
baixo consumo <strong>de</strong> combustível e fabricação <strong>de</strong> produtos industriais
com diminuição do consumo <strong>de</strong> energia. A seguir temos as categorias<br />
a serem analisadas:<br />
11.1 Construções <strong>de</strong> edificações sustentáveis<br />
As construções sustentáveis buscam reduzir os impactos<br />
ambientais tanto no momento <strong>de</strong> construção dos edifícios resi<strong>de</strong>nciais e<br />
comerciais, quanto no momento <strong>de</strong> uso <strong>de</strong>les (vida útil). O maior<br />
impacto ambiental são as emissões <strong>de</strong> CO2 provocadas pelo consumo <strong>de</strong><br />
energia nesses dois momentos, que po<strong>de</strong>m ser reduzidas principalmente<br />
pelo aumento da eficiência energética. Se consi<strong>de</strong>rarmos as emissões <strong>de</strong><br />
gases estufa nos 2 momentos(construção e utilização dos edifícios), elas<br />
chegam a 40% das emissões mundiais totais <strong>de</strong> 49 bilhões <strong>de</strong> toneladas<br />
<strong>de</strong> CO2 equivalente 48 .<br />
No momento da construção, o cimento é o principal responsável<br />
pelas emissões <strong>de</strong> CO2. Cada 1 tonelada <strong>de</strong> cimento gera<br />
aproximadamente 1 tonelada <strong>de</strong> CO2. O cimento é constituído <strong>de</strong> 95%<br />
<strong>de</strong> clínquer e 5% <strong>de</strong> gipsita. A produção do clínquer é a gran<strong>de</strong> fonte<br />
emissora da produção. O calcário é a matéria-prima principal do<br />
clínquer, representando aproximadamente 80% da mistura rochosa que é<br />
complementada com argila e ferro. Na produção do clínquer ocorre a<br />
calcinação do calcário (carbonato <strong>de</strong> cálcio). O processo <strong>de</strong> <strong>aquecimento</strong><br />
do calcário <strong>de</strong>manda a queima <strong>de</strong> combustíveis, o que gera CO2.<br />
Quando o calcário (CaCO3) é calcinado e se transforma em óxido <strong>de</strong><br />
cálcio (OCa) a reação química também produz CO2. Então temos a<br />
produção <strong>de</strong> CO2 através <strong>de</strong>ssas duas formas. Muitas pesquisas têm sido<br />
<strong>de</strong>senvolvidas com o objetivo <strong>de</strong> reduzir a participação do clínquer no<br />
cimento, produzindo a mesma quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cimento <strong>de</strong>mandando<br />
menos energia, um típico aumento <strong>de</strong> eficiência energética. Materiais<br />
como cinzas das centrais termelétricas, cinzas do bagaço da cana-<strong>de</strong>açúcar,<br />
casca <strong>de</strong> arroz e resíduos da indústria <strong>de</strong> cerâmicas, po<strong>de</strong>m<br />
substituir até 40% do clínquer usado no cimento. O cimento é o<br />
elemento ligante do concreto, a substância mais usada pela socieda<strong>de</strong><br />
<strong>global</strong> nas construções. Uma forma <strong>de</strong> diminuir a <strong>de</strong>manda por cimento<br />
48 Tanto no IPCC 2007 quanto no relatório da McKinsey, as emissões das<br />
edificações lançadas pela fabricação dos materiais utilizados nas<br />
construções foram classificadas como emissões do setor industrial.
nas construções é reciclar o concreto presente em <strong>de</strong>molições ou restos<br />
<strong>de</strong> obras.<br />
Outro importante emissor <strong>de</strong> CO2 é o tijolo tradicional <strong>de</strong> argila,<br />
que é queimado para ser produzido. Uma alternativa é o tijolo <strong>de</strong> solocimento<br />
que é produzido sem queima. Se mistura 1 parte <strong>de</strong> cimento<br />
com 12 partes <strong>de</strong> solo, composto <strong>de</strong> areia e argila, e posteriormente a<br />
mistura é prensada. Quando se faz o assentamento do tijolo <strong>de</strong> solocimento,<br />
ao invés <strong>de</strong> usar a argamassa tradicional com cimento na<br />
composição, se utiliza uma cola especial. A utilização <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira<br />
proveniente <strong>de</strong> extração <strong>de</strong> baixo impacto ou <strong>de</strong> reflorestamento<br />
também constitui uma alternativa interessante nas construções<br />
sustentáveis, pois quando as árvores cortadas crescem novamente,<br />
voltando a seqüestrar CO2.<br />
No momento da construção também se planeja formas <strong>de</strong> se<br />
diminuir a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> iluminação ou climatização durante a via útil<br />
da edificação, a fim <strong>de</strong> se economizar energia. O planejamento inclui a<br />
escolha dos materiais e da arquitetura do edifício. Os principais<br />
responsáveis pelo consumo <strong>de</strong> energia e pelas emissões <strong>de</strong> gases estufa<br />
nas edificações no momento <strong>de</strong> uso estão no gráfico 49 :<br />
49 O gráfico po<strong>de</strong> ser encontrado no link:<br />
http://www.mckinsey.com/clientservice/ccsi/pathways_low_carbon_econo<br />
my.asp<br />
Nesse gráfico a McKinsey incluiu as emissões indiretas das edificações (ex.<br />
consumo <strong>de</strong> energia elétrica).
A climatização e a iluminação são as utilida<strong>de</strong>s que apresentam o<br />
maior potencial <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> consumo através <strong>de</strong> uma construção<br />
planejada para se tornar eficiente energeticamente. O <strong>aquecimento</strong> <strong>de</strong><br />
água tem como melhor opção o uso <strong>de</strong> uma fonte <strong>de</strong> energia renovável,<br />
o aquecedor solar, e os aparelhos elétricos (televisão, computadores)<br />
não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m diretamente da construção para serem eficientes, por isso<br />
os aparelhos serão comentados no ítem 11.2 .<br />
A iluminação respon<strong>de</strong> por importantes 15% <strong>de</strong> emissões <strong>de</strong><br />
gases estufa nas edificações. Elementos como pare<strong>de</strong>s internas claras e<br />
uma arquitetura que facilite a entrada da luz solar, aumentam a<br />
quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> horas sem necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> luz artificial em residências e<br />
diminuem a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> luz artificial durante o dia nos escritórios<br />
comerciais. Numa região fria, on<strong>de</strong> se precisa <strong>de</strong> iluminação e calor ao<br />
mesmo tempo, janelas transparentes no teto das residências permitem a<br />
entrada <strong>de</strong> luz e criam um efeito estufa interno, apresentando duas<br />
utilida<strong>de</strong>s. Em regiões quentes, a solução não é recomendada, pois
enquanto se aumenta a luminosida<strong>de</strong>, aumenta-se mais ainda o<br />
in<strong>de</strong>sejável calor. Uma solução para as regiões quentes são os Domus<br />
Prismáticos. Eles são compostos <strong>de</strong> milhares <strong>de</strong> micro prismas,<br />
localizados nos tetos das construções, que fragmentam a luz em micro<br />
raios, direcionando-os em todo ambiente interno e gerando um leve e<br />
agradável brilho natural <strong>de</strong> luz. Além disso, cerca <strong>de</strong> 75% do calor<br />
transmitido pelos raios infravermelhos, o espectro <strong>de</strong> luz responsável<br />
pela transmissão do calor, volta para atmosfera, mantendo-se o ambiente<br />
interno com uma temperatura agradável. O aumento da iluminação<br />
natural estimula favoravelmente o relógio biológico humano,<br />
aumentando a produtivida<strong>de</strong> no trabalho.<br />
A manutenção da temperatura interna (climatização) nas<br />
edificações constitui a principal forma <strong>de</strong> reduzir gastos com energia. A<br />
busca principal é o isolamento térmico da construção, evitando a<br />
transmissão do calor em locais quentes e a transmissão do frio em locais<br />
gelados. Dessa forma evitam-se gastos <strong>de</strong> energia com a calefação ou<br />
com a refrigeração do ambiente. Projetos <strong>de</strong> isolamento térmico po<strong>de</strong>m<br />
reduzir drasticamente a perda <strong>de</strong> calor e ajudar a <strong>de</strong>ter as mudanças<br />
climáticas. A <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> energia para <strong>aquecimento</strong> nos prédios<br />
existentes po<strong>de</strong> ser reduzida <strong>de</strong> 30% a 50%, em média. Em prédios<br />
novos, a <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> energia para <strong>aquecimento</strong> po<strong>de</strong> ser reduzida <strong>de</strong><br />
90% a 95%, usando-se tecnologia e projetos amplamente disponíveis e<br />
competitivos 50 . Nas regiões frias as casas <strong>de</strong>vem ser construídas sobre<br />
pedras para se proteger do frio que vem do solo e precisam <strong>de</strong> pare<strong>de</strong>s<br />
grossas para isolar termicamente do frio externo do ar. Nas regiões<br />
quentes as construções <strong>de</strong>vem facilitar a entrada <strong>de</strong> ventilação, ser<br />
pintadas externamente com cores claras para refletir a luz solar e<br />
principalmente apresentarem um telhado que impeça a passagem do<br />
calor para o interior da residência ou edifício comercial. O alumínio é<br />
um excelente refletor da luz solar e conseqüentemente um excelente<br />
isolador térmico. Ele é usado em forma <strong>de</strong> telhas <strong>de</strong> alumínio ou em<br />
forma <strong>de</strong> folhas finas que cobrem as telhas convencionais. Outra<br />
maneira <strong>de</strong> combater o calor nos telhados é o resfriamento evaporativo,<br />
on<strong>de</strong> se utiliza uma irrigação periódica com água fria no telhado. A água<br />
fria retira o calor do telhado, evaporando em seguida. O telhado diminui<br />
<strong>de</strong> temperatura e transfere menos calor para o interior da edificação. Os<br />
50 Fonte: www.greenpeace.org.br/energia/pdf/cenario_brasileiro.pdf
telhados ver<strong>de</strong>s também representam uma alternativa interessante <strong>de</strong><br />
climatização <strong>de</strong> casas ou edifícios. Eles constituídos <strong>de</strong> uma cobertura<br />
<strong>de</strong> grama ou <strong>de</strong> um jardim e são usados a milhares <strong>de</strong> anos, tornando a<br />
temperatura amena em locais quentes. Veja a imagem 51 :<br />
A vegetação absolve menos calor do que os telhados<br />
convencionais, e parte da pequena energia absolvida é perdida através<br />
do processo <strong>de</strong> evaporação da água da planta. O uso coletivo <strong>de</strong> telhados<br />
ver<strong>de</strong>s po<strong>de</strong> potencializar economia <strong>de</strong> energia e bem-estar climático<br />
numa cida<strong>de</strong> inteira. Em cida<strong>de</strong>s como Teresina, na região Nor<strong>de</strong>ste do<br />
Brasil, on<strong>de</strong> a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida é muito prejudicada pelo calor, o<br />
incentivo governamental ao uso <strong>de</strong> telhados ver<strong>de</strong>s teria gran<strong>de</strong> sucesso.<br />
Um exemplo prático da importância dos vegetais são as diferenças <strong>de</strong><br />
temperatura <strong>de</strong> até 6,0 C° entre áreas distintas das gran<strong>de</strong>s cida<strong>de</strong>s<br />
tropicais. Enquanto regiões ricas, cheias <strong>de</strong> jardins, apresentam<br />
temperaturas mais amenas, as regiões mais pobres, sem áreas ver<strong>de</strong>s,<br />
apresentam temperaturas mais altas.<br />
51 A imagem está no site: www.ecotelhado.com.br
11.2 Fabricação <strong>de</strong> aparelhos elétricos e luminárias <strong>de</strong> baixo<br />
consumo<br />
Os aparelhos elétricos e a iluminação são responsáveis juntos por<br />
35% das emissões <strong>de</strong> gases estufa nas edificações. No caso da<br />
iluminação uma construção bem planejada diminui a sua <strong>de</strong>manda,<br />
como vimos no ítem 11.1, mas não exclui a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> iluminação<br />
mesmo que em menor intensida<strong>de</strong>. Nesse caso a alternativa para<br />
diminuir mais ainda o gasto <strong>de</strong> energia com iluminação é o uso <strong>de</strong><br />
luminárias <strong>de</strong> baixo consumo.<br />
A forma mais simples <strong>de</strong> aumentar a eficiência energética em<br />
aparelhos elétricos e eletrônicos é a imposição <strong>de</strong> marcos regulatórios<br />
fortes pelos governos. Os padrões <strong>de</strong> eficiência energética que são<br />
classificados como "A" pelas agências reguladoras <strong>de</strong>vem mudar<br />
freqüentemente. Como em quase todas as iniciativas <strong>de</strong> aumento <strong>de</strong><br />
eficiência energética, um aumento no custo <strong>de</strong> aparelhos elétricos<br />
através da imposição <strong>de</strong> exigentes padrões <strong>de</strong> eficiência gerará uma<br />
economia <strong>de</strong> dinheiro várias vezes maior durante a vida útil do<br />
equipamento através da economia <strong>de</strong> energia. Essas exigências corrigem<br />
as compras ina<strong>de</strong>quadas dos consumidores, que muitas vezes escolhem<br />
aparelhos elétricos ineficientes mirando <strong>de</strong> forma míope apenas o preço<br />
<strong>de</strong> venda do produto. O uso da energia por utensílios domésticos como<br />
máquinas <strong>de</strong> lavar roupas, lava-louças, TVs e refrigeradores po<strong>de</strong> ser<br />
reduzido em 30% usando as melhores opções disponíveis no mercado, e<br />
em 80% com tecnologias avançadas. O uso da energia por aparelhos<br />
elétricos <strong>de</strong> escritório po<strong>de</strong> ser reduzido entre 50% a 75% através <strong>de</strong><br />
uma combinação <strong>de</strong> gestão energética e sistemas <strong>de</strong> computação<br />
eficientes 52 .<br />
O aumento <strong>de</strong> funcionalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>snecessárias nos aparelhos<br />
elétricos também tem incentivado o consumo ineficiente <strong>de</strong> energia nos<br />
últimos anos. As indústrias têm aumentado a fabricação dos aparelhos<br />
elétricos que consomem energia mesmo quando estão <strong>de</strong>sligados, no<br />
modo conhecido como standby. O modo standby mantém recursos<br />
<strong>de</strong>snecessários nos aparelhos eletrônicos como a marcação da hora. O<br />
consumo <strong>de</strong> energia no modo standby é baixo, mas como ocorre 24<br />
horas por dia po<strong>de</strong> representar um consumo total <strong>de</strong> energia maior do<br />
52 Fonte: www.greenpeace.org.br/energia/pdf/cenario_brasileiro.pdf
que o consumo ocorrido pelo uso do aparelho. A Agência Internacional<br />
<strong>de</strong> Energia estima que o modo standby po<strong>de</strong> ser responsável por 1% das<br />
emissões mundiais <strong>de</strong> gases estufa, o que eqüivale as emissões <strong>de</strong> toda a<br />
indústria da aviação 53 . Em 1999, a AIE lançou a “iniciativa do watt<br />
único”, a fim <strong>de</strong> incentivar fabricantes a limitar o modo standby a um<br />
watt ou menos.<br />
Na iluminação os ganhos <strong>de</strong> eficiência energética passam pela<br />
substituição das lâmpadas incan<strong>de</strong>scentes e fluorescentes por LEDs. Os<br />
LEDS são materiais semicondutores semelhantes aos usados nos chips<br />
<strong>de</strong> computador, que emitem luz quando percorridos por uma corrente<br />
elétrica. As lâmpadas incan<strong>de</strong>scentes apresentam a pior eficiência<br />
energética, mas ainda representam uma fatia importante no uso <strong>de</strong><br />
luminárias. No Brasil, por exemplo, 50% das lâmpadas utilizadas ainda<br />
são incan<strong>de</strong>scentes. As lâmpadas incan<strong>de</strong>scentes apresentam uma<br />
capacida<strong>de</strong> luminosa <strong>de</strong> apenas 12 lumens por watt. As lâmpadas<br />
fluorescentes fluorescentes são 5 vezes mais econômicas do que as<br />
lâmpadas incan<strong>de</strong>scentes, apresentando uma capacida<strong>de</strong> luminosa <strong>de</strong> 60<br />
lumens por watt. Substituir todas as lâmpadas incan<strong>de</strong>scentes do mundo<br />
por lâmpadas fluorescentes reduziria o consumo mundial <strong>de</strong> eletricida<strong>de</strong><br />
em 12%. As lâmpadas fluorescentes têm uma vida útil 10 vezes superior<br />
às incan<strong>de</strong>scentes. No entanto a melhor solução é a substituição <strong>de</strong> todas<br />
as lâmpadas incan<strong>de</strong>scentes e fluorescentes pelos LEDs. As lâmpadas<br />
com LED são mais econômicas do que as fluorescentes e apresentam<br />
maior vida útil, possuindo uma extraordinária capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> 150 lumens<br />
por watt. Elas são mais caras do que as fluorescentes, mais vêm<br />
diminuindo <strong>de</strong> preço nos últimos anos e vem sendo utilizadas <strong>de</strong> modo<br />
crescente nas residências. No longo prazo as lâmpadas com LED<br />
possuem um custo líquido muito menor do que as lâmpadas<br />
fluorescentes. Por ultimo ainda há o potencial <strong>de</strong> diminuição da energia<br />
gasta com iluminação através do uso em massa <strong>de</strong> sistemas inteligentes<br />
como o sensor <strong>de</strong> presença. A iluminação <strong>de</strong> um corredor num prédio<br />
comercial, por exemplo, só é acionada quando o sensor <strong>de</strong>tecta a<br />
presença <strong>de</strong> uma pessoa.<br />
53 Fonte: www.iea.org/textbase/papers/2005/standby_fact.pdf
11.3 Fabricação <strong>de</strong> veículos com baixo consumo <strong>de</strong><br />
combustível<br />
No capítulo 10 foram citadas formas importantes <strong>de</strong> diminuição<br />
<strong>de</strong> emissões nos veículos como o uso <strong>de</strong> carros movidos a<br />
biocombustíveis e como o uso <strong>de</strong> carros elétricos que utilizam energias<br />
limpas como fontes primárias. Quanto ao aumento da eficiência<br />
energética em veículos, o assunto a ser tratado neste item, as<br />
oportunida<strong>de</strong>s se referem às tecnologias que tornam os carros mais<br />
econômicos. A fabricação <strong>de</strong> veículos mais eficientes diminuirá as<br />
emissões <strong>de</strong> CO2 para a atmosfera através do menor consumo <strong>de</strong><br />
combustível fóssil. O transporte rodoviário é responsável por 71% das<br />
emissões <strong>de</strong> gases estufa no setor <strong>de</strong> transportes, contribuindo com 5<br />
bilhões <strong>de</strong> toneladas <strong>de</strong> CO2 equivalente emitidas anualmente. Os<br />
automóveis atuais consomem a meta<strong>de</strong> do que os automóveis similares<br />
<strong>de</strong> 30 anos atrás consumiam. O problema é que o mundo está mais rico<br />
e comprando automóveis muito maiores e confortáveis. Isso anulou os<br />
ganhos <strong>de</strong> diminuição <strong>de</strong> consumo, fazendo com que os carros atuais<br />
tenham um consumo médio similar aos <strong>de</strong> 30 anos atrás. De olho nisso<br />
os governos do mundo estão criando metas <strong>de</strong> consumo médio <strong>de</strong><br />
combustível para a frota inteira das montadoras.<br />
As tecnologias <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> consumo nos veículos se aplicam<br />
tanto ao trem <strong>de</strong> força dos veículos quanto à estrutura física. O trem <strong>de</strong><br />
força dos veículos po<strong>de</strong> ser mais eficiente através <strong>de</strong> ganhos técnicos<br />
nos motores e nas caixas <strong>de</strong> transmissão dos veículos. No entanto a<br />
forma <strong>de</strong> se conseguir os maiores ganhos <strong>de</strong> economia <strong>de</strong> combustível é<br />
a implantação <strong>de</strong> uma propulsão adicional elétrica ao trem <strong>de</strong> força<br />
movido a gasolina ou a diesel. O carro híbrido tem um motor a gasolina<br />
e outro elétrico. O motor elétrico aproveita parte da energia<br />
<strong>de</strong>sperdiçada pelo motor a gasolina (ex: energia dos freios) e armazena<br />
essa energia numa bateria. Quando o carro está parado num sinal ele<br />
funciona exclusivamente como o motor elétrico, o que evita consumo <strong>de</strong><br />
combustível, e quando se movimenta os dois motores po<strong>de</strong>m funcionar<br />
simultaneamente. O carro híbrido básico tem uma redução <strong>de</strong> consumo<br />
apenas com a ajuda da eficiência energética. Não se utiliza energia<br />
elétrica externa, não precisando portanto <strong>de</strong> uma estrutura <strong>de</strong><br />
abastecimento <strong>de</strong> energia elétrica complementar. Qualquer local do<br />
mundo está preparado para receber os carros híbridos. Um carro híbrido<br />
é entre 25% e 50% mais econômico que um carro comum. Um Toyota
Prius, por exemplo, é capaz <strong>de</strong> fazer 25 km/l na cida<strong>de</strong>, enquanto um<br />
carro do mesmo padrão faz 12km/l. Os avanços tecnológicos <strong>de</strong>vem<br />
tornar a diferença <strong>de</strong> custos em relação aos carros comuns bem menor e<br />
tornar a obrigatorieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> fabricação dos carros híbridos menos<br />
onerosa para o consumidor. Evi<strong>de</strong>ntemente que os custos adicionais na<br />
aquisição dos carros híbridos serão compensados com gastos menores<br />
com combustível.<br />
Com a massificação dos carros híbridos, os automóveis<br />
fabricados em 2030 po<strong>de</strong>rão ter um consumo médio <strong>de</strong> 25 km/l. Com a<br />
inclusão <strong>de</strong> melhoras na estrutura física dos veículos que aumentam a<br />
eficiência energética, como a diminuição do peso e a melhora<br />
aerodinâmica dos veículos, os carros po<strong>de</strong>rão fazer 30 km/l.<br />
Basicamente, os carros gastam energia através das perdas por atrito,<br />
influenciadas pelo peso, e através da resistência do ar. O peso do veículo<br />
po<strong>de</strong> ser diminuído com o uso <strong>de</strong> materiais mais leves. Uma diminuição<br />
<strong>de</strong> peso dos veículos gera uma gran<strong>de</strong> economia <strong>de</strong> combustível. O uso<br />
do aluminío na carroceria e nas peças torna os carros mais leves e<br />
resistentes. Enquanto o típico carro americano tinha 40 quilos <strong>de</strong><br />
alumínio em 1974, em 2006, ele tinha em média 160 quilos. O alumínio<br />
é muito caro, principalmente por exigir muita energia na fabricação.<br />
Esse gasto energético inicial, gerará uma redução <strong>de</strong> consumo <strong>de</strong><br />
energia muito maior durante a vida útil do veículo. Uma alternativa é<br />
reciclar o aluminío, que gasta apenas 10% da energia usada na<br />
fabricação para ser reciclado porque envolve o <strong>de</strong>rretimento do metal ao<br />
invés do processo tradicional <strong>de</strong> redução eletroquímica. Não é por acaso<br />
que em todo mundo as latinhas <strong>de</strong> refrigerante e cerveja compostas <strong>de</strong><br />
alumínio li<strong>de</strong>ram os índices <strong>de</strong> reciclagem. O incentivo governamental a<br />
um forte aumento do uso <strong>de</strong> alumínio nos carros ajudará o atendimento<br />
da meta <strong>de</strong> se fabricar carros que façam 30 km/l em 2030. Com o passar<br />
dos anos, os carros feitos <strong>de</strong> alumínio que acabarem a vida útil, terão o<br />
seu alumínio reciclado, diminuindo os custos <strong>de</strong> fabricação dos carros<br />
novos e gerando um ciclo virtuoso. Algumas empresas estão mirando<br />
mais a frente, adaptando materiais da era espacial super leves ao invés<br />
<strong>de</strong> focarem em materiais leves convencionais como o alumínio. Entre<br />
esses materiais super leves se <strong>de</strong>staca o produzido pela empresa<br />
Fiberforge 54 . Ela fabrica compostos <strong>de</strong> termoplástico avançado<br />
reforçado com fibra <strong>de</strong> vidro ou carbono. Outra forma <strong>de</strong> diminuição <strong>de</strong><br />
54 http://www.fiberforge.com/
consumo é a fabricação <strong>de</strong> carros com melhor coeficiente aerodinâmico,<br />
afim <strong>de</strong> que se diminua a resistência do ar. Os governos <strong>de</strong>vem exigir<br />
níveis mínimos <strong>de</strong> coeficientes aerodinâmicos para cada categoria <strong>de</strong><br />
carros novos. Um exemplo <strong>de</strong> veículo super eficiente eficiente é o<br />
Loremo, carro fabricado pela empresa do mesmo nome. Ele faz 67<br />
quilômetros com 1 litro <strong>de</strong> combustível e é um carro tão funcional<br />
quanto um automóvel comum do seu porte, transportando 4 pessoas 55 . O<br />
carro é feito com materiais leves e pesa apenas 450 kilos, além <strong>de</strong><br />
apresentar um excelente coeficiente aerodinâmico <strong>de</strong> 0,20. O motor é<br />
movido a diesel e o carro chega a 160km/h <strong>de</strong> velocida<strong>de</strong> máxima. Veja<br />
a foto do Loremo:<br />
Nos próximos 20 anos se prevê um aumento proporcionalmente<br />
maior nas emissões do setor <strong>de</strong> transportes em relação aos outros setores<br />
econômicos <strong>de</strong>vido a previsão <strong>de</strong> aumento <strong>de</strong> quase 100% na quantida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> veículos no mundo. Construir veículos mais eficientes juntamente<br />
com o aumento da participação <strong>de</strong> fontes limpas como os<br />
biocombustíveis evitará que essa explosão <strong>de</strong> emissões ocorra.<br />
55 O site da empresa é: www.loremo.com
11.4 Fabricação dos produtos industriais com diminuição do<br />
consumo <strong>de</strong> energia<br />
Os processos industriais geram emissões diretas e indiretas. As<br />
emissões diretas ocorrem na própria planta industrial (ex. produção <strong>de</strong><br />
ferro gusa com a queima <strong>de</strong> carvão) e as emissões indiretas ocorrem<br />
essencialmente através do consumo <strong>de</strong> energia elétrica na indústria,<br />
sendo a produção da energia numa usina termelétrica externa. Nas<br />
emissões indiretas através do consumo <strong>de</strong> energia elétrica, inúmeros<br />
ganhos <strong>de</strong> eficiência energética têm ocorrido, principalmente com a<br />
ajuda da informatização das fábricas. Um exemplo <strong>de</strong>sse aumento <strong>de</strong><br />
eficiência é o uso <strong>de</strong> motores <strong>de</strong> alto rendimento com controle<br />
eletrônico <strong>de</strong> partida, velocida<strong>de</strong> e freqüência. Aproximadamente 65%<br />
do consumo <strong>de</strong> eletricida<strong>de</strong> industrial <strong>de</strong>stina-se a impulsionar sistemas<br />
<strong>de</strong> motores elétricos 56 em máquinas como bombas, compressores e<br />
ventiladores. Um motor que opera <strong>de</strong> modo contínuo e flexível em<br />
velocida<strong>de</strong>s relativamente baixas usa muito menos energia do que um<br />
motor que liga e <strong>de</strong>sliga em uma velocida<strong>de</strong> muito alta 57 . No entanto,<br />
esses ganhos não avançam mais rapidamente <strong>de</strong>vido a gran<strong>de</strong> vida útil<br />
(superior a 30 anos) <strong>de</strong> aparelhos obsoletos energeticamente, mas que a<br />
substituição custa caro. Existem cal<strong>de</strong>iras funcionando há mais <strong>de</strong> 50<br />
anos e motores há mais <strong>de</strong> 30 anos. Substituir equipamentos significa, às<br />
vezes, alterar todo o projeto <strong>de</strong> um processo ou <strong>de</strong> uma planta industrial.<br />
Isso implica em investimentos com um tempo <strong>de</strong> retorno financeiro<br />
longo. As gran<strong>de</strong>s indústrias normalmente apresentam capital aberto e<br />
alegam que os investimentos <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m dos acionistas. A melhor forma<br />
<strong>de</strong> se obter ganhos cada vez maiores <strong>de</strong> eficiência energética na<br />
indústria é a imposição <strong>de</strong> marcos regulatórios pelos governos que<br />
estabeleçam consumos <strong>de</strong> energia cada vez menores na fabricação dos<br />
produtos juntamente com incentivos financeiros governamentais para<br />
mudanças estruturais nas indústrias.<br />
A diminuição das emissões diretas dos processos industriais<br />
através do aumento da eficiência energética tem gran<strong>de</strong> potencial <strong>de</strong><br />
implementação. Os setores industriais que apresentam as maiores<br />
56 Fonte: www.greenpeace.org.br/energia/pdf/cenario_brasileiro.pdf<br />
57 Gabrielle Walker e Sir David King.Como combater o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> e<br />
manter as luzes acesas. Página 110, 2008
emissões são os setores químico, si<strong>de</strong>rúrgico e petrolífero. O setor<br />
cimenteiro também po<strong>de</strong>ria ser incluído grupo, mas resolvi explicá-lo no<br />
ítem 11.1 (Construções <strong>de</strong> edificações sustentáveis), por estar<br />
intimamente associado às edificações. A maioria das iniciativas se refere<br />
a processos técnicos específicos <strong>de</strong> cada indústria, mas existem<br />
alternativas que se aplicam as 3 principais indústrias como a<br />
manutenção preventiva <strong>de</strong> equipamentos, a otimização <strong>de</strong> processos <strong>de</strong><br />
gestão e logística e a co-geração. Na co-geração o calor gerado pelos<br />
gases <strong>de</strong> um forno si<strong>de</strong>rúrgico, por exemplo, é reaproveitado para gerar<br />
energia elétrica. Essa energia elétrica po<strong>de</strong> abastecer a própria indústria<br />
ou po<strong>de</strong> ser vendida para um consumidor externo. Uma fonte <strong>de</strong> calor é<br />
usada eficientemente para duas funções ao invés <strong>de</strong> uma só. Quanto à<br />
diminuição <strong>de</strong> emissões diretas através da melhoria dos processos<br />
específicos <strong>de</strong> cada indústria po<strong>de</strong>mos citar:<br />
a) Indústria química – Otimização <strong>de</strong> catalisadores. Os catalisadores são<br />
aquelas substâncias que aceleram a velocida<strong>de</strong> das reações químicas. O<br />
aumento da velocida<strong>de</strong> das reações diminui a necessida<strong>de</strong> da queima <strong>de</strong><br />
combustíveis fósseis;<br />
b) Indústria petrolífera – redução do “flaring”. O “flaring” é a queima<br />
<strong>de</strong> gás natural em poços <strong>de</strong> petróleo. Quando o petróleo bruto é trazido à<br />
superfície, vem com ele também o gás natural. Este gás po<strong>de</strong> ser<br />
transportado por gasodutos e vendido, ou po<strong>de</strong> ser reinjetado no próprio<br />
campo. Entretanto, em áreas que não dispõem <strong>de</strong> infra-estrutura ou<br />
mercados, este gás associado é usualmente liberado na atmosfera,<br />
queimado ou não. Embora a queima <strong>de</strong> gás natural seja um método<br />
seguro e efetivo <strong>de</strong> eliminar o excesso <strong>de</strong> gás associado à produção <strong>de</strong><br />
petróleo (a liberação <strong>de</strong>ste gás, em gran<strong>de</strong> parte metano, sem queimá-lo,<br />
é muito mais nociva do ponto <strong>de</strong> vista ambiental), o "flaring" <strong>de</strong>sperdiça<br />
uma valiosa fonte <strong>de</strong> energia e emite dióxido <strong>de</strong> carbono. A construção<br />
<strong>de</strong> infra-estrutura para o uso do gás, o acesso a novos mercados<br />
consumidores e o estabelecimento <strong>de</strong> marcos regulatórios que<br />
estimulem o uso racional do combustível são fundamentais para a<br />
redução do “flaring”.
Capítulo 12: Conclusão<br />
Nós faremos inicialmente uma recapitulação. Ao longo do livro<br />
foram avaliadas as possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> mitigação do <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong><br />
sob os ângulos científico, econômico e político, apresentando dados <strong>de</strong><br />
estudos realizados por instituições que são referências mundiais no<br />
tema. Essa avaliação começou com as previsões científicas do IPCC<br />
2007 sobre o impacto que as nossas emissões futuras <strong>de</strong> gases estufa<br />
trarão ao clima da Terra. Posteriormente mostramos estudos importantes<br />
da Agência Internacional <strong>de</strong> Energia e da Consultoria McKinsey sobre<br />
as estimativas <strong>de</strong> emissões <strong>de</strong> gases estufa até 2030. Também foi<br />
apresentada a proposta <strong>de</strong> mitigação <strong>de</strong> emissões da consultoria<br />
McKinsey que tem o objetivo <strong>de</strong> reduzir em 30% as emissões <strong>de</strong> gases<br />
estufa lançadas em 2005 até o ano <strong>de</strong> 2030. A proposta a ser<br />
implementada no período 2011-2030 po<strong>de</strong> controlar o <strong>aquecimento</strong><br />
<strong>global</strong>, limitando o aumento da temperatura da Terra em 2°C. O nível <strong>de</strong><br />
viabilida<strong>de</strong> política da proposta foi avaliado. Posteriormente os três<br />
principais grupos <strong>de</strong> mitigação <strong>de</strong> emissões foram abordados focando<br />
nos potenciais e gargalos <strong>de</strong> cada iniciativa. Os capítulos explicaram<br />
com aprofundamento o título do livro: “<strong>Controlando</strong> o <strong>aquecimento</strong><br />
<strong>global</strong> - como reduzir em 30% as emissões <strong>de</strong> gases estufa até 2030”.<br />
No entanto essa proposta se refere apenas a um caminho técnico que a<br />
humanida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> seguir ou po<strong>de</strong> não seguir. Não adianta provar que o<br />
custo líquido para controlar o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> é baixo e viável <strong>de</strong> ser<br />
implementado, se a socieda<strong>de</strong> e os governantes não se convencerem<br />
disso. Por isso é tão importante que as informações corretas sejam<br />
disseminadas e que se procurem formas a<strong>de</strong>quadas <strong>de</strong> financiamento das<br />
iniciativas.<br />
Quanto à disseminação correta da informação é fundamental que<br />
as pessoas saibam que as florestas tropicais, por exemplo, po<strong>de</strong>m ser<br />
salvas com uma quantida<strong>de</strong> muito pequena <strong>de</strong> investimento em relação<br />
as suas rendas. Com um volume <strong>de</strong> investimento que cresce<br />
gradativamente e atinge 0,07% do PIB <strong>global</strong> estimado em 2030 esse<br />
objetivo po<strong>de</strong> ser alcançado. Também é importante que as pessoas<br />
saibam que a implementação <strong>de</strong> iniciativas <strong>de</strong> aumento da eficiência<br />
energética as tornará mais ricas ao invés <strong>de</strong> diminuírem as suas rendas<br />
como muitos pensam. Os sete argumentos apresentados no capítulo 6
<strong>de</strong>ste livro para se “ven<strong>de</strong>r a idéia” do combate ao <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong><br />
aos governantes mundiais representam informações <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> valia. A<br />
socieda<strong>de</strong> na forma <strong>de</strong> ONGs, associações <strong>de</strong> classe, cidadãos, políticos<br />
e partidos políticos tem gran<strong>de</strong> potencial <strong>de</strong> realizar a missão <strong>de</strong><br />
informar.<br />
Quanto ao financiamento das iniciativas é preciso que os<br />
governos cumpram essa missão com a contribuição dos cidadãos na<br />
forma <strong>de</strong> impostos. A contribuição espontânea e direta dos<br />
consumidores para financiar as iniciativas é muito difícil. Se um<br />
consumidor tiver que escolher entre um carro híbrido, 20% mais caro,<br />
mas que economizará combustível, e um carro comum ele<br />
provavelmente escolherá um carro comum vislumbrando a economia no<br />
curto prazo. Apesar <strong>de</strong> existirem pessoas engajadas com a causa<br />
ambiental, que trocam um ganho econômico por um ganho ambiental<br />
difuso para socieda<strong>de</strong>, a maioria das pessoas só respon<strong>de</strong> as causas<br />
ambientais se tiverem estímulos econômicos. Isso se agrava pelo fato <strong>de</strong><br />
a maioria dos impactos ambientais negativos do <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong><br />
ainda não estarem acontecendo. Por outro lado uma gran<strong>de</strong> parte dos<br />
cidadãos do mundo está disposta a contribuir através <strong>de</strong> impostos com<br />
1% das suas rendas para financiar iniciativas que combaterão o<br />
<strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> e que trarão benefícios econômicos futuros como a<br />
economia <strong>de</strong> energia que compensarão a maioria dos impostos pagos. A<br />
disposição <strong>de</strong> contribuir dos cidadãos, mesmo que com uma pequena<br />
fatia das suas rendas, precisa ser aproveitada pelos governos. Essa é a<br />
forma mais a<strong>de</strong>quada <strong>de</strong> se obter recursos para financiar as iniciativas.<br />
A nossa socieda<strong>de</strong> apresenta cada vez mais uma economia <strong>de</strong> serviços<br />
baseada em setores como saú<strong>de</strong>, educação e tecnologia da informação,<br />
setores que não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m <strong>de</strong> muitos recursos físicos e<br />
conseqüentemente não lançam muito gases estufa. Então é mais fácil<br />
diluir o custo <strong>de</strong> investimento das iniciativas entre os setores <strong>de</strong> alta<br />
emissão (minoria da economia) e os setores <strong>de</strong> baixa emissão (maioria<br />
da economia) do que esperar que os consumidores troquem produtos<br />
mais baratos por produtos mais caros em nome da consciência<br />
ambiental. Os custos são os mesmos, mas as abordagens são diferentes.<br />
Uma isenção <strong>de</strong> impostos para carros híbridos para que tenham o<br />
mesmo preço <strong>de</strong> carros convencionais po<strong>de</strong> ser compensada com um<br />
pequeno aumento <strong>de</strong> impostos em todos os setores econômicos. Como<br />
complemento po<strong>de</strong>mos ter aumentos <strong>de</strong> impostos para setores<br />
poluidores a fim <strong>de</strong> incentivar o uso <strong>de</strong> tecnologias limpas, assim como
uma boa regulação estatal para incentivar o aumento da eficiência<br />
energética. Por fim os consumidores conscientes têm muita importância,<br />
pois aquilo que faltar em termos <strong>de</strong> implementação <strong>de</strong> políticas pelos<br />
governos po<strong>de</strong> ser complementado pelas iniciativas individuais<br />
espontâneas como trocar o carro por transporte coletivo, fazer coleta<br />
seletiva <strong>de</strong> lixo e comprar apenas produtos ambientalmente sustentáveis.<br />
Gran<strong>de</strong> parte da escolha do clima que teremos nas próximas<br />
décadas <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões políticas. No final do ano <strong>de</strong> 2009<br />
tivemos a COP 15 58 , uma reunião entre governantes do mundo em<br />
Copenhague na Dinamarca on<strong>de</strong> se discutiu o que faremos para<br />
combater as mudanças climáticas nas próximas décadas. Na conferência<br />
poucos resultados concretos foram alcançados. Essa conferência e<br />
outras conferências posteriores nos próximos anos serão fundamentais<br />
para <strong>de</strong>cidir o rumo que a socieda<strong>de</strong> e os governos tomarão. Muitos<br />
analistas acreditam que o ponto <strong>de</strong> controlar o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>,<br />
diante dos relatórios científicos mais recentes, já passou. Outros acham<br />
que não conseguiremos nos <strong>de</strong>sviciar da nossa matriz energética suja.<br />
Esse pessimismo não é compartilhado por mim. Acredito que diante do<br />
bombar<strong>de</strong>io <strong>de</strong> informações na mídia sobre o tema <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong><br />
nos últimos anos e diante dos estudos técnicos que os tomadores <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>cisões políticas têm nas mãos, alertando sobre os perigos das<br />
catástrofes climáticas futuras, ocorrerá uma MUDANÇA. A pressão<br />
ambiental será muito mais forte nas próximas duas décadas por parte da<br />
socieda<strong>de</strong> organizada do que foi nas duas décadas anteriores, e isso<br />
provavelmente modificará a estimativa <strong>de</strong> crescimento <strong>de</strong> emissões <strong>de</strong><br />
gases estufa. No entanto é uma gran<strong>de</strong> incógnita saber se essa mudança<br />
será suficiente para controlar o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong>. Nesse processo <strong>de</strong><br />
mudança qualquer atitu<strong>de</strong> favorável conta, mesmo que o objetivo final<br />
<strong>de</strong> aumento <strong>de</strong> temperatura <strong>global</strong> <strong>de</strong>ntro do limite <strong>de</strong> 2°C não seja<br />
alcançado. Quanto menos gases estufa lançarmos, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do<br />
aumento final da temperatura do planeta, menos mudanças climáticas<br />
teremos. Os três conselhos básicos que eu sugiro ao leitor para ajudar<br />
nesse esforço coletivo são: consumir produtos com o maior nível <strong>de</strong><br />
sustentabilida<strong>de</strong> ambiental possível, disseminar informar corretas sobre<br />
o <strong>aquecimento</strong> <strong>global</strong> às pessoas do seu convívio social e votar em<br />
políticos que tenham compromisso com a diminuição das mudanças<br />
climáticas.<br />
58 O en<strong>de</strong>reço eletrônico oficial da Conferência é: www.en.cop15.dk
A Terra, o mundo azul on<strong>de</strong> vivemos, é o único lugar do universo<br />
que propicia a sobrevivência da humanida<strong>de</strong>. Nós precisamos agir agora<br />
para que ela continue nos fornecendo o clima estável dos últimos<br />
milhares <strong>de</strong> anos que garantiu o florescimento da nossa civilização. Essa<br />
<strong>de</strong>cisão provará que somos verda<strong>de</strong>iramente racionais.