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Relações Comerciais entre a Grande Distribuição Agro-Alimentar e ...

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<strong>Relações</strong> <strong>Comerciais</strong> <strong>entre</strong> a<br />

<strong>Grande</strong> <strong>Distribuição</strong> <strong>Agro</strong>-<strong>Alimentar</strong><br />

e os seus Fornecedores<br />

Autoridade da Concorrência<br />

Gabinete de Estudos Económicos e de Acompanhamento de<br />

Mercados<br />

Relatório Preliminar<br />

Dezembro de 2009


<strong>Relações</strong> <strong>Comerciais</strong> <strong>entre</strong> a <strong>Grande</strong> <strong>Distribuição</strong> <strong>Agro</strong>-<strong>Alimentar</strong> e os seus Fornecedores (Preliminar)<br />

________________________________________________________________________________________<br />

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<strong>Relações</strong> <strong>Comerciais</strong> <strong>entre</strong> a <strong>Grande</strong> <strong>Distribuição</strong> <strong>Agro</strong>-<strong>Alimentar</strong> e os seus Fornecedores (Preliminar)<br />

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Índice remissivo<br />

Sumário Executivo ................................................................................................ 4<br />

1. Introdução: origem e objecto do Relatório ........................................................ 9<br />

2. Antecedentes ............................................................................................. 12<br />

3. O sector da <strong>Distribuição</strong> ............................................................................... 37<br />

4. Uma análise dos sectores nacionais do leite UHT, arroz e massas alimentícias ..... 66<br />

5. <strong>Relações</strong> comerciais <strong>entre</strong> fornecedores e distribuidores ................................... 88<br />

Anexo 1 – Dados e elementos complementares ...................................................... 95<br />

Anexo 2 – Resenha da literatura económica sobre poder de compra ........................ 100<br />

Glossário ......................................................................................................... 138<br />

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<strong>Relações</strong> <strong>Comerciais</strong> <strong>entre</strong> a <strong>Grande</strong> <strong>Distribuição</strong> <strong>Agro</strong>-<strong>Alimentar</strong> e os seus Fornecedores (Preliminar)<br />

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Sumário Executivo<br />

1. À semelhança do ocorrido em diversos mercados internacionais (v.g., do sector<br />

energético), os preços internacionais e europeus de alguns produtos-base<br />

(“commodities”) do sector agro-alimentar – em especial dos cereais, bem como<br />

de outros produtos transaccionáveis – caracterizaram-se por um período de<br />

intensa volatilidade no recente biénio 2007-2008, tendo registado um movimento<br />

de forte subida desde o segundo semestre de 2006 para máximos históricos no<br />

inicio do ano de 2008 e regredido desde então.<br />

2. Esta evolução dos preços de alguns produtos-base no sector agro-alimentar<br />

condicionou, mesmo que só parcialmente, a evolução dos preços na produção<br />

agro-alimentar (de produtos-base e derivados, tal como o leite) na União Europeia<br />

(UE), tendo esta evolução nos preços na produção vindo a merecer especial<br />

atenção por parte da Comissão Europeia (CE) e de diversos Estados Membros.<br />

3. É importante ter presente que o pano de fundo das questões agrícolas na UE está<br />

relacionado com as perspectivas em torno da reforma da PAC (Politica Agrícola<br />

Comum) de 2003. Esta reforma iniciou o processo de liberalização do sector<br />

agrícola, reduzindo o mecanismo de apoio dos preços e criando ajudas directas ao<br />

rendimento, com a abolição definitiva do regime de quotas em 2013 e 2015.<br />

4. A evolução dos preços na produção de diversos produtos agro-alimentares acima<br />

descrita em muito agravou os incentivos às respectivas produções, acentuando os<br />

efeitos da crise económica e do pessimismo gerado por esta nova reforma da PAC.<br />

O impacto que esta situação tem tido no rendimento agrícola levou à promoção de<br />

diversas análises a nível Comunitário, quer pela CE quer por diversos Estados<br />

Membros, de forma a equacionar um conjunto de soluções que se compaginem<br />

com as reformas em curso no âmbito da PAC.<br />

5. Neste sentido a CE produziu, recentemente, uma série de documentos de trabalho<br />

preliminares sobre o funcionamento actual da cadeia de abastecimento alimentar<br />

na UE. Conforme consta destes documentos, é objectivo da CE prosseguir o<br />

acompanhamento deste tema, incluindo o das relações comerciais <strong>entre</strong> a grande<br />

distribuição alimentar (GDA) e os seus fornecedores ao nível da UE.<br />

6. A Autoridade da Concorrência (AdC) vem acompanhando, no seio da REC (Rede<br />

Europeia da Concorrência ou “European Competition Network”, ECN), os<br />

desenvolvimentos das análises conduzidas pela CE e por outros Estados Membros.<br />

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7. Em paralelo, diversas questões têm sido dirigidas à AdC sobre o alegado<br />

enquadramento deste tipo de problemas no âmbito das relações comerciais <strong>entre</strong><br />

os grupos da GDA (grossista e retalhista) e os seus fornecedores que poderão,<br />

nomeadamente, ter condicionado a evolução das margens comerciais dos<br />

fornecedores de diversos produtos agro-alimentares.<br />

8. O presente Relatório Preliminar deverá ser enquadrado neste contexto.<br />

Juntamente com o Relatório Final, com conclusão prevista para Julho de 2010,<br />

procede a uma análise mais aprofundada do que análises anteriores da AdC, quer<br />

ao nível de práticas da GDA (contratuais ou extra-contratuais) junto dos seus<br />

fornecedores, quer ao nível mais especifico de certos produtos, designadamente,<br />

do leite UHT, arroz e massas alimentícias.<br />

9. O enfoque do Relatório Preliminar nestes três produtos justifica-se pelo facto de<br />

serem objecto de intervenção ao abrigo da PAC (existência de preços de<br />

intervenção no leite, no arroz e no trigo duro, sendo este utilizado para o fabrico<br />

de massas alimentícias), de serem objecto de preocupações nacionais e<br />

Comunitárias, nomeadamente no caso do leite. Acresce que as suas cadeias de<br />

valor ao nível nacional apresentam características suficientemente diferenciadas,<br />

no que respeita à produção e transformação, para constituírem pontos de<br />

referência aquando da análise detalhada do impacto do comportamento dos GGR<br />

sobre a evolução do sector agro-alimentar, a ser apresentada no Relatório Final.<br />

10. Este Relatório Preliminar apresenta também as linhas gerais da evolução da GDA,<br />

em especial dos grandes grupos retalhistas (GGR) – principais operadores neste<br />

sector –, quer ao nível do seu posicionamento no comércio a retalho, quer ao<br />

nível da sua representatividade na procura em diversos mercados nacionais de<br />

aprovisionamento. Consta, de igual forma, deste Relatório Preliminar, uma<br />

descrição detalhada da literatura económica relativa aos principais conceitos<br />

subjacentes ao tema em análise, tais como “dependência económica”, “poder de<br />

compra” (“buyer power”), impacto do poder de compra dos GGR sobre o bem-<br />

estar dos consumidores (efeito de “pass-through”) e efeitos colaterais deste poder<br />

de compra sobre os fornecedores e sobre o comércio tradicional (efeito de<br />

“waterbed”).<br />

11. Para além de uma análise mais aprofundada dos três sectores acima indicados, o<br />

Relatório Final de Julho de 2010 incluirá diversos outros produtos, <strong>entre</strong> os quais<br />

outros lácteos (iogurtes, queijos e manteigas), cafés e sucedâneos, conservas e<br />

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enlatados, farinhas lácteas e de uso culinário, cereais de pequeno-almoço,<br />

bolachas, produtos de gordura vegetal (margarinas, óleos e azeites), pescado<br />

fresco e bacalhau, frutas e legumes, aves (frango e peru) e carne fresca, ovos,<br />

bem como bebidas não alcoólicas de alta rotação.<br />

12. Igualmente, o Relatório Final de Julho de 2010 analisará em detalhe o fenómeno<br />

dos produtos de marca da distribuição (também designados de ‘marca própria’ ou<br />

‘marca branca’) e do seu impacto sobre a concorrência e bem-estar dos<br />

consumidores. Outros temas delegados para esta análise mais aprofundada são:<br />

(i) o eventual enquadramento de algumas cláusulas constantes dos contratos<br />

<strong>entre</strong> a GDA e os seus fornecedores no âmbito jusconcorrencial; (ii) a apreciação<br />

jusconcorrencial das práticas da GDA elencadas pelos fornecedores como lesivas<br />

dos seus interesses; e (iii) o impacto que a expansão dos GGR poderá ter tido, a<br />

montante e a jusante, através de uma análise quantitativa enquadrada pelos<br />

conceitos acima referidos.<br />

13. No entanto, algumas conclusões podem, desde já, ser retiradas da presente<br />

análise preliminar. Embora o Relatório tenha como enfoque toda a GDA, os<br />

problemas potenciais em torno das relações comerciais <strong>entre</strong> esta e os seus<br />

fornecedores respeitam, sobretudo, os GGR. De facto, atenta a expansão destes<br />

grupos na compra nos mercados de aprovisionamento em detrimento dos demais<br />

grupos, nomeadamente dos grossistas e de cadeias retalhistas de dimensão<br />

regional, será pouco expectável que estes outros grupos possam beneficiar de um<br />

poder de compra comparável ao dos GGR, a menos que integrem agrupamentos<br />

de compra e/ou de negociação com estes GGR.<br />

14. Em particular, a representatividade dos GGR no valor total da procura no mercado<br />

de aprovisionamento de produtos alimentares evoluiu de 57,1% em 2002 para<br />

72,4% em 2008. No valor global do comércio a retalho, os GGR cresceram de<br />

77,4% em 2002 para 83,5% em 2008, tendo esta evolução resultado num reforço<br />

do grau de concentração destes Grupos nos mercados de aprovisionamento e de<br />

venda a retalho. A forte concentração do GGR no aprovisionamento reflecte-se, de<br />

igual forma, na importância cumulativa dos dois principais GGR na procura neste<br />

mercado, a qual evolui de 36,6% em 2002 para 45,6% em 2008.<br />

15. Porém, não obstante esta forte concentração, é importante salientar que estes<br />

grupos não se comportam como uma única entidade, mas como 9 grupos<br />

distintos, quer no aprovisionamento, quer no retalho, revelando grande dinâmica<br />

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ao nível das suas estratégias de concorrência <strong>entre</strong> eles (tal como aliás referido<br />

na análise supra citada da CE).<br />

16. De igual forma se constata que, nos casos do leite UHT, arroz e massas<br />

alimentícias, os GGR representam <strong>entre</strong> 60% e 80% da procura destes produtos<br />

no mercado de aprovisionamento sem que, todavia, estas percentagens per se<br />

signifiquem que estes grupos disponham, nestes sectores, de um suficiente poder<br />

de compra que possa contrapor o poder de mercado dos respectivos fornecedores.<br />

17. O impacto dos GGR ao nível destes três sectores varia consoante o sector<br />

considerado. Enquanto que existe uma produção agrícola nacional nos casos do<br />

leite e do arroz, envolvendo um número muito significativo de produtores – sendo<br />

Portugal auto-suficiente em leite cru e em cerca de 60% em arroz (auto-suficiente<br />

em arroz carolino, mas quase total dependência externa em arroz agulha) –, as<br />

massas são um produto industrial transformado, sendo a sua principal matéria-<br />

prima (o trigo duro), essencialmente, de origem externa.<br />

18. No que respeita aos mercados de aprovisionamento destes produtos, constata-se<br />

existir um fraco recurso à importação de massas alimentícias e de leite UHT,<br />

tendo estas sido de cerca de 5% e de 10%, respectivamente, no valor total dos<br />

consumos em 2008.<br />

19. Por seu turno, os mercados nacionais de aprovisionamento do leite UHT e das<br />

massas alimentícias são significativamente mais concentrados do que no caso do<br />

arroz (sendo que nos dois primeiros casos um fornecedor representa mais de 70%<br />

dos respectivos mercados).<br />

20. Assim, enquanto que a importância dos GGR no aprovisionamento de leite UHT e<br />

de arroz poderá ter efeitos na respectiva actividade agrícola nacional, ao nível das<br />

massas alimentícias estes efeitos cingir-se-ão à indústria de moagem e fabrico<br />

deste produto.<br />

21. De salientar que a presente análise, que será concluída em Julho de 2010, tem<br />

como objecto as relações comerciais <strong>entre</strong> a grande distribuição agro-alimentar e<br />

os seus fornecedores, e em que medida estas relações podem ser enquadráveis<br />

na lei nacional da concorrência (Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho) e/ou no âmbito<br />

de práticas comerciais restritivas (Decreto-Lei n.º 370/93, de 29 de Outubro, na<br />

redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 140/98, de 16 de Maio).<br />

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22. Não sendo atribuição da AdC constituir-se como um observatório de preços no<br />

sector agro-alimentar, tarefa que, aliás, se revelaria de muito difícil execução<br />

dada a complexidade de que a mesma se revestiria face à longa lista de produtos,<br />

e/ou tipos de um mesmo produto, que teriam de ser considerados, bem como à<br />

dispersão de fontes de informação e à ausência de vários dados estatísticos, a<br />

análise da evolução de custos, preços e margens comerciais ao longo da cadeia<br />

alimentar para cada produto objecto do presente relatório, será conduzida na<br />

medida em que possa informar a análise das relações comerciais <strong>entre</strong> a GDA e os<br />

seus fornecedores e a sua evolução no passado recente.<br />

23. Saliente-se que a CE tem-se defrontado com estas mesmas dificuldades tendo,<br />

por este motivo, sublinhado o interesse em construir ferramentas, a nível<br />

europeu, de monitorização dos preços de pelo menos alguns produtos<br />

alimentares, como será referido adiante.<br />

24. Aliás, a relativa dificuldade em obter dados estatísticos de grande abrangência (ao<br />

nível dos diferentes mercados e produtos considerados) e actualizados aponta<br />

para a necessidade de um significativo investimento na expansão da capacidade<br />

de recolha e de tratamento deste tipo de informação a nível nacional.<br />

25. Por último, saliente-se que numa análise jusconcorrencial das práticas (sejam elas<br />

contratuais ou extra-contratuais) da GDA junto dos seus fornecedores, há que<br />

distinguir as que possam, eventualmente, ser: (i) enquadráveis na Secção II –<br />

Práticas Proibidas – da lei nacional da concorrência (ex vi nos seus artigos 4.º, 6.º<br />

e 7.º); (ii) enquadráveis no disposto no supra referido Decreto-Lei n.º 370/93; e<br />

(iii) as que embora espelhando um desequilíbrio de forças negociais <strong>entre</strong> as duas<br />

partes, não constituem um ilícito jusconcorrencial (ou uma proibição ao abrigo do<br />

supra citado Decreto-Lei n.º 370/93), antes podendo, eventualmente, ser<br />

mitigadas pela adopção de v.g. contratos-tipo, pela facilitação de entrada no<br />

mercado e por outras medidas de natureza regulamentar, quer em termos de<br />

auto-regulação sectorial, quer em termos legislativos.<br />

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1. Introdução: origem e objecto do Relatório<br />

26. À semelhança do ocorrido em diversos mercados internacionais (v.g., do sector<br />

energético), os preços internacionais e europeus de alguns produtos-base<br />

(“commodities”) do sector agro-alimentar – em especial dos cereais, bem como<br />

de outros produtos transaccionáveis – caracterizaram-se por um período de<br />

intensa volatilidade no recente biénio 2007-2008, tendo registado um movimento<br />

de forte subida desde o segundo semestre de 2006 para máximos históricos no<br />

inicio do ano de 2008 e regredido desde então<br />

27. Em particular, os preços dos futuros a um mês dos principais lotes de trigo no<br />

mercado de Chicago (Chicago Board of Trade) – i.e., no mercado de referência<br />

para os cereais nos Estados Unidos (EUA) – atingiram máximos históricos no<br />

primeiro trimestre de 2008. Na UE, os preços médios na produção de diversos<br />

produtos-base (tal como os cereais) e derivados (tal como o leite) atingiram em<br />

vários Estados Membros, incluindo Portugal, máximos históricos no final do ano de<br />

2007 ou no início do ano de 2008, tendo regredido desde essa data.<br />

28. Sem prejuízo desta evolução dos preços na produção poder ser atribuída, segundo<br />

análises recentes da CE e do Banco Mundial, a alterações do próprio<br />

funcionamento dos mercados, a forte queda dos preços na produção no sector<br />

agro-alimentar europeu, observada no decorrer do ano de 2008, em muito<br />

agravou os incentivos às respectivas produção, acentuando os efeitos da crise<br />

económica e do pessimismo gerado por esta nova reforma da PAC. O impacto que<br />

esta situação tem no rendimento agrícola levou à promoção de diversas análises a<br />

nível Comunitário, de forma a equacionar um conjunto de soluções que<br />

condicionem semelhantes evoluções futuras e que se compaginem com o conjunto<br />

de reformas em curso no âmbito da PAC.<br />

29. A importância de que se reveste a designada “grande distribuição alimentar”<br />

(GDA), nomeadamente ao nível dos GGR, na revenda de produtos agro-<br />

alimentares ao consumidor final e a relação tida <strong>entre</strong> estes grupos e os mercados<br />

de aprovisionamento, ressuscitou, uma vez mais, a tradicional polémica das<br />

relações desequilibradas <strong>entre</strong> estes grupos e as empresas de aprovisionamento.<br />

30. Neste sentido, o presente Relatório, ainda numa versão preliminar, surge na<br />

sequência de diversas questões dirigidas à AdC sobre problemas que,<br />

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supostamente, se colocam nas relações comerciais <strong>entre</strong> a GDA (retalhista e<br />

grossista), nomeadamente ao nível dos GGR, e os seus fornecedores.<br />

31. Igualmente, e em paralelo, várias têm sido as notícias veiculadas pela imprensa<br />

dando conta de algumas situações consideradas ”abusivas” por parte da GDA ou<br />

por parte dos GGR e das eventuais repercussões negativas das mesmas na “saúde<br />

económica” das empresas industriais fornecedoras, assim como, em relação a<br />

alguns bens, nos produtores agrícolas nacionais.<br />

32. Em causa estará um certo desequilíbrio nas relações comerciais <strong>entre</strong><br />

fornecedores e distribuidores resultante do poder de compra (ou de mercado)<br />

detido pela distribuição, decorrente, nomeadamente, do movimento de<br />

concentrações ao nível do mercado do aprovisionamento e da especificidade<br />

subjacente àquelas relações comerciais, nomeadamente, da maior dependência<br />

dos fornecedores em relação à GDA, face à necessidade de fazerem chegar os<br />

seus produtos aos consumidores, do que dos distribuidores em relação aos<br />

fornecedores, dada a natureza multi-produtos da actividade dos primeiros, tendo<br />

estes cada produto mais do que uma opção de fornecedor.<br />

33. Para o citado desequilíbrio negocial tem também sido apontado como responsável<br />

o crescente peso das marcas dos distribuidores (MDD), com o consequente<br />

reforço do seu poder negocial daí decorrente.<br />

34. A actual crise económica e a concorrência ao nível da GDA tem suscitado uma<br />

adaptação permanente das suas estratégias comerciais, algumas delas com<br />

repercussões directas nas relações comerciais com os seus fornecedores.<br />

35. Têm sido apontadas, como alegadamente lesivas da concorrência, várias práticas<br />

que ocorrem com frequência no sector da cadeia de abastecimento alimentar<br />

(v.g., agrupamentos de compra, crescente uso de MDD e pagamentos para<br />

referenciação de produtos).<br />

36. Numa perspectiva de política de concorrência, questões como a estrutura<br />

concorrencial dos mercados e as barreiras regulamentares à entrada terão de ser<br />

analisadas ab initio para, posteriormente, ser avaliado em que medida as práticas<br />

identificadas estão correlacionadas com aquelas questões.<br />

37. Após uma descrição de diversos antecedentes à problemática das relações<br />

comerciais <strong>entre</strong> a grande distribuição agro-alimentar e os seus fornecedores<br />

(capítulo 2), analisaremos o enquadramento regulamentar da GDA e dos GGR em<br />

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Portugal, bem como o seu posicionamento nos mercados de venda e de<br />

aprovisionamento (capítulo 3). Embora a questão da alegada dependência<br />

económica dos fornecedores face aos grupos da GDA seja remetida para o<br />

Relatório Final de Julho de 2010, a qual incluirá uma análise específica a vários<br />

produtos agro-alimentares 1 , o presente Relatório Preliminar identifica alguns<br />

aspectos potencialmente relevantes para este tipo de análise ao nível do leite<br />

UHT, do arroz e das massas alimentícias (capítulo 4).<br />

38. Neste âmbito, constata-se que, nos casos do leite UHT, arroz e massas<br />

alimentícias, os GGR representam <strong>entre</strong> 60% e 80% da procura destes produtos<br />

no mercado de aprovisionamento sem que, todavia, estas percentagens per se<br />

signifiquem que estes grupos disponham, nestes sectores, de um suficiente poder<br />

de compra que possa contrapor o poder de mercado dos respectivos fornecedores.<br />

39. Também as principais cláusulas constantes dos contratos celebrados <strong>entre</strong> a<br />

grande distribuição e os seus fornecedores susceptíveis de criar desequilíbrios<br />

nesta negociação são identificadas neste Relatório Preliminar (capítulo 5).<br />

40. Finalmente, este Relatório apresenta ainda em anexo uma resenha da literatura<br />

económica sobre as principais questões de índole económica relacionadas com os<br />

temas aqui em análise, a saber os conceitos de poder de compra da GDA, “pass-<br />

through” (repercussão ao nível do bem-estar do consumidor) e “waterbed effect”<br />

(efeitos colaterais do poder de compra da GDA). A perspectiva da literatura<br />

económica sobre estes conceitos (Anexo 2) permitirá o devido enquadramento<br />

dos temas aqui em análise para uma análise mais aprofundada no âmbito do<br />

Relatório Final de Julho de 2010.<br />

1 A amostra completa de produtos em análise – para o Relatório de Julho de 2010 – inclui produtos lácteos<br />

(leite UHT, iogurtes, queijos e manteigas), cafés e sucedâneos, conservas e enlatados, arroz, massas<br />

alimentícias, farinhas lácteas e de uso culinário, cereais de pequeno-almoço, bolachas, produtos de<br />

gordura vegetal (óleos, azeites e margarinas), pescado fresco e bacalhau, frutas e legumes, ovos, aves e<br />

carne fresca, bem como as bebidas não alcoólicas de alta rotação.<br />

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2. Antecedentes<br />

2.1. Caracterização dos grandes grupos retalhistas<br />

41. O presente Relatório tem como enfoque a análise das relações comerciais <strong>entre</strong> a<br />

GDA e os seus fornecedores. Neste sentido, são de salientar as seguintes três<br />

ressalvas.<br />

42. Primeiro, a aqui denominada GDA inclui grossistas e retalhistas, nomeadamente<br />

os de grande dimensão, que operam enquanto redes (ou cadeias) de unidades de<br />

distribuição. Sem prejuízo do facto de se analisarem as relações comerciais <strong>entre</strong><br />

a GDA e os seus fornecedores, o presente estudo tem como principal enfoque os<br />

GGR atento o seu forte crescimento desde a década de 1980, em detrimento do<br />

comércio tradicional e do canal grossista (vide Capítulo 3 infra).<br />

43. Para efeitos do presente estudo, consideram-se GGR, as cadeias de<br />

supermercados (supers) e de hipermercados (hipers) de âmbito nacional, em<br />

oposição aos demais grupos retalhistas de âmbito regional (v.g., as cadeias<br />

Alisuper no distrito de Faro e A. C. Santos nos distritos de Lisboa e de Leiria).<br />

44. Actualmente, existem nove GGR em Portugal: os grupos Aldi, Auchan (insígnias<br />

Pão de Açúcar e Jumbo), Carrefour (rede de lojas Dia%/Minipreço) 2 , E. Leclerc, El<br />

Corte Inglés (lojas El Corte Inglés e Supercor), ITMI ou “Os Mosqueteiros”<br />

(insígnias Intermarché e Ecomarché), Jerónimo Martins (doravante “JM” ou<br />

“Grupo JM”, detentor das insígnias retalhistas Pingo Doce 3 e Feira Nova e da<br />

insígnia grossista Recheio), Modelo Continente (doravante “MC” ou “Grupo MC”,<br />

do Grupo Sonae <strong>Distribuição</strong> e detentor das insígnias Modelo, Continente e das<br />

lojas M24 localizadas em alguns postos Galp) e Lidl.<br />

45. Segundo, a aqui denominada GDA inclui todos os bens de consumo corrente<br />

escoados pelos supers, que integram não apenas o ramo alimentar – produtos de<br />

“mercearia”, “frescos (pescado, carne, bem como frutas e legumes)”, “lácteos”,<br />

2 A anterior rede de hipers do Grupo Carrefour foi adquirida pelo Grupo MC após decisão da AdC de não<br />

oposição sob condições, de 27.12.2007 (cf. http://www.concorrencia.pt/Conteudo.asp?ID=1232, vide, de<br />

igual modo, subsecção 2.3.3 infra).<br />

3 A cadeia de supermercados Plus (Grupo Tengelmann) foi adquirida pela cadeia Pingo Doce do Grupo JM<br />

após decisão da AdC de não oposição sob condições, datada de 29.04.2008 (cf. http://www.concorrencia<br />

.pt/Conteudo.asp?ID=1232, vide, de igual modo, subsecção 2.3.3 infra).<br />

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bem como as “bebidas” alcoólicas e não alcoólicas – mas, de igual modo, os<br />

produtos de “higiene pessoal” e de “drogaria e bazar”. 4<br />

46. Terceiro, embora o presente Relatório se cinja aos supra referidos produtos da<br />

“distribuição alimentar”, parte da GDA opera, de igual modo, em segmentos de<br />

um comércio mais especializado (v.g., vestuário, material informático e<br />

electrodomésticos), tal como é o caso, por exemplo, dos Grupos Auchan (Box), El<br />

Corte Inglés e MC (Worten e Sport Zone). Para além destes segmentos, são,<br />

ainda, de salientar os da reparação automóvel (Stationmarché do Grupo ITMI) e o<br />

da venda de combustíveis líquidos rodoviários (gasóleos e gasolinas) em postos<br />

de abastecimento ao público (casos dos Grupos Auchan, E. Leclerc, ITMI e JM).<br />

47. Para além de uma análise genérica da evolução da GDA, e em especial dos GGR,<br />

quer ao nível do seu posicionamento no comércio a retalho, quer ao nível da sua<br />

representatividade na procura nos diversos mercados nacionais de<br />

aprovisionamento, este Relatório tem como enfoque a análise das relações<br />

comerciais <strong>entre</strong> a GDA e os seus fornecedores nos seguintes produtos: lácteos<br />

(leite UHT, iogurtes, manteiga e queijos), cafés e sucedâneos, conservas e<br />

enlatados, arroz, massas alimentícias, farinhas lácteas e de uso culinário, cereais<br />

de pequeno-almoço, bolachas, produtos de gordura vegetal (margarinas, óleos e<br />

azeites), pescado fresco e bacalhau, frutas e legumes, aves (frango e peru) e<br />

carne fresca, ovos, bem como bebidas não alcoólicas de alta rotação.<br />

48. O Presente Relatório Preliminar focará em três destes produtos: leite UHT, arroz e<br />

massas alimentícias.<br />

49. Este capítulo apresenta uma breve resenha da evolução da relação <strong>entre</strong> a<br />

produção / aprovisionamento e a grande distribuição (secção 2.2), as acções<br />

desenvolvidas no âmbito destas relações ao nível nacional, pela AdC (secção 2.3)<br />

e de auto-regulamentação do sector (secção 2.4), bem como ao nível Comunitário<br />

(secção 2.5) e internacional (secção 2.6).<br />

4 Estes produtos compõem a categoria dos “groceries”, tal como denominada pelos Relatórios recentes<br />

sobre o sector da Autoridade da Concorrência Irlandesa, de Abril de 2008 e da Comopetition Commission<br />

do Reino Unido, também de Abril de 2008 (vide secção 2.6 infra).<br />

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<strong>Relações</strong> <strong>Comerciais</strong> <strong>entre</strong> a <strong>Grande</strong> <strong>Distribuição</strong> <strong>Agro</strong>-<strong>Alimentar</strong> e os seus Fornecedores (Preliminar)<br />

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2.2. Breve descrição da evolução das relações <strong>entre</strong><br />

produção e distribuição<br />

50. À semelhança de outros países da UE, o sector da distribuição alimentar em<br />

Portugal sofreu significativas mutações nas últimas décadas.<br />

51. Como marcos de referência na evolução deste sector podemos dizer que o forte<br />

desenvolvimento dos GGR iniciou-se em Portugal na década de 1980, tendo o<br />

primeiro hipermercado sido aberto em 1985, em Matosinhos, pelo Grupo MC.<br />

Recorde-se que o primeiro hipermercado na Europa foi aberto pelo Grupo<br />

Carrefour, em França, em 1963. Em Portugal, o segmento do “hard discount” 5<br />

começou a desenvolver-se nos anos 90 com a entrada da cadeia Lidl 6 .<br />

52. As mutações em causa assentaram, fundamentalmente, na expansão de novas<br />

formas e métodos de venda, originando novos formatos comerciais, novas<br />

estratégias que tiveram, como provável consequência, uma progressiva alteração<br />

das preferências (ou, mais rigorosamente, da escolha) do consumidor final em<br />

favor dos GGR, o que terá reforçado o grau de concentração dos mesmos ao nível<br />

do retalho e do aprovisionamento. Por seu turno, este movimento de<br />

concentração poderá, em parte, ter contribuído para o reforço do grau de<br />

concentração da oferta, quer nos mercados de aprovisionamento, quer ao nível da<br />

produção (vide capítulo 4 infra).<br />

53. Esta “revolução” comercial foi, sobretudo, induzida pela evolução dos hábitos dos<br />

consumidores, em resultado de factores demográficos, horários de trabalho,<br />

condições de transporte, poder de compra, etc., os quais tornaram o consumidor<br />

cada vez mais exigente, multifacetado e complexo, comportando-se de maneira<br />

diferente na escolha do tipo de loja, consoante o produto a adquirir, a ocasião de<br />

compra e o tipo de compra. Por outro lado, a multiplicação, diversificação e<br />

massificação dos produtos, gerando um aumento significativo de concorrência,<br />

tem originado diversificação dos métodos de venda e do tipo de oferta<br />

(estabelecimentos e produtos) em função de segmentos específicos de mercado.<br />

5 Entende-se por hard discount a distribuição no retalho caracterizada pela venda de produtos a muito baixo<br />

preço, em que muitos desses produtos são MDD (também denominadas por “marcas brancas”), i.e.,<br />

produtos fabricados ou fornecidos por uma empresa, e vendidos sob a insígnia de outra empresa.<br />

6 J. Rodrigues (2006). “Buyer power and pass-through of large retailing groups in the Portuguese food<br />

sector”, Documento de Trabalho (WP) n.º 14 da AdC, Setembro de 2006 (disponível em: http://<br />

www.concorrencia.pt/Publicacoes/Autoridade.asp, secção “Working Papers”).<br />

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54. Igualmente, a evolução da utilização de novas tecnologias na venda a retalho<br />

propiciou importantes economias na gestão de stocks, bem como o acesso a<br />

dados importantes sobre o tipo de despesas dos consumidores, possibilitando aos<br />

operadores, quase em tempo real, adaptarem as suas estratégias comerciais.<br />

55. O fenómeno tem-se centrado, sobretudo, na área da GDA, onde operam unidades<br />

comerciais oferecendo multiprodutos num sistema de livre-serviço, se bem que se<br />

venha igualmente estendendo à área da distribuição não alimentar, com a<br />

crescente instalação de grandes unidades de retalho especializado (vide supra).<br />

56. A actividade comercial deixou de ser entendida numa óptica de simples actividade<br />

de escoamento dos produtos do fornecedor, para se passar a reconhecer o serviço<br />

que a mesma acrescenta aos produtos (i.e., o seu valor acrescentado)<br />

contribuindo, de maneira decisiva, para a sua valorização junto dos consumidores.<br />

57. Neste sentido, nas relações que se estabelecem <strong>entre</strong> fornecedores e<br />

distribuidores, estes deixam de ser entendidos como meros agentes do produtor –<br />

permitindo uma total transparência da fileira produtor/consumidor –, passando a<br />

sobressair o valor do seu contacto com o consumidor e a importância das<br />

variáveis de marketing sob seu controlo – preços, promoções, exposição e gama<br />

de produtos - cuja manipulação, segundo os seus próprios objectivos e dos<br />

consumidores, passa a constituir uma “cortina opaca” <strong>entre</strong> fornecedores e<br />

distribuidores.<br />

58. Assiste-se a uma transferência para as cadeias da GDA, em especial para os GGR,<br />

de funções comerciais que anteriormente eram assumidas exclusivamente pelos<br />

fornecedores/produtores, em que aquelas passam a deter um elevado poder de<br />

mercado na cadeia de valor dos produtos face ao poder destes últimos.<br />

59. Assim, os fornecedores/produtores passam a depender, cada vez mais, da GDA<br />

para fazerem chegar os seus produtos aos consumidores a nível geográfico<br />

(nacional, regional ou local).<br />

60. A gestão dos espaços disponíveis para exposição dos produtos nem sempre é<br />

compatível com a comercialização de novos produtos ou referências, podendo<br />

gerar conflitos de interesses <strong>entre</strong> fornecedores/produtores e a GDA.<br />

61. Por outro lado, a evolução da capacidade e sofisticação da GDA em matéria de<br />

marketing traduz-se no desenvolvimento da utilização das marcas do distribuidor,<br />

passando este a concorrer directamente com os seus fornecedores.<br />

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62. Todos estes desenvolvimentos têm contribuído para uma certa deterioração no<br />

relacionamento <strong>entre</strong> fornecedores e distribuidores no sector agro-alimentar, que<br />

merece ser analisada e, se necessário, corrigida.<br />

2.3. Acções desenvolvidas pela AdC no âmbito das<br />

relações <strong>entre</strong> produção e distribuição<br />

63. A AdC, tal como disposto nos seus Estatutos (aprovados pelo Decreto-Lei n.º<br />

10/2003, de 18 de Janeiro), tem por missão assegurar a aplicação das regras da<br />

concorrência em Portugal, no respeito pelo princípio da economia de mercado e da<br />

concorrência não falseada, tendo em vista o funcionamento eficiente dos<br />

mercados e a repartição eficaz dos recursos, na prossecução dos interesses dos<br />

consumidores.<br />

64. Para a realização desta missão, incumbe à AdC, nomeadamente, (i) velar pelo<br />

cumprimento das leis, regulamentos e decisões destinados a promover a defesa<br />

da concorrência; (ii) fomentar a adopção de práticas que promovam a<br />

concorrência e a generalização de uma cultura de concorrência junto dos agentes<br />

económicos e do público em geral; (iii) difundir, em especial junto dos agentes<br />

económicos, as orientações consideradas relevantes para a política de<br />

concorrência; e (iv) contribuir para o aperfeiçoamento do sistema normativo<br />

português em todos os domínios que possam afectar a livre concorrência, por sua<br />

iniciativa ou a pedido do Governo.<br />

65. Para o desempenho das suas atribuições, a AdC dispõe de poderes sancionatórios,<br />

de supervisão e de regulamentação.<br />

66. No exercício dos seus poderes sancionatórios compete, em particular, à AdC:<br />

identificar e investigar as práticas susceptíveis de infringir a legislação de<br />

concorrência nacional e comunitária, proceder à instrução e decidir sobre os<br />

respectivos processos, aplicando, se for caso disso, as sanções previstas na lei.<br />

67. Quanto aos seus poderes de supervisão, compete à AdC, <strong>entre</strong> outros, proceder à<br />

realização de estudos, inquéritos, inspecções ou auditorias que, em matéria de<br />

concorrência, se revelem necessários.<br />

68. No âmbito dos seus poderes de regulamentação a AdC pode, <strong>entre</strong> outras<br />

medidas, emitir regulamentações e directivas genéricas.<br />

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69. Acresce que, e ainda de acordo com os seus Estatutos (na alínea b) do n.º 1 do<br />

artigo 5.º do Preâmbulo do supra referido Decreto-Lei n.º 10/2003), a AdC passou<br />

a exercer as competências conferidas à ex-DGCC (Direcção Geral do Comércio e<br />

Concorrência) pelo Decreto-Lei n.º 370/93, de 29 de Outubro, na redacção que<br />

lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 140/98, de 16 de Maio.<br />

70. Assim, este capítulo detalha as principais acções da AdC e de anteriores Direcções<br />

Gerais nacionais da concorrência no âmbito das suas atribuições, no que diz<br />

respeito a: análises (subsecção 2.3.1); recomendações (subsecção 2.3.2);<br />

controlo de operações de concentração (subsecção 2.3.3); e práticas restritivas<br />

(subsecção 2.3.4).<br />

2.3.1. Análises<br />

71. A ex-Direcção Geral de Concorrência e Preços (DGCP) procedeu, em 1995, a um<br />

primeiro inquérito junto da GDA e respectivos fornecedores, sobre as práticas em<br />

vigor no relacionamento comercial <strong>entre</strong> aquelas entidades.<br />

72. O levantamento então efectuado surgiu na sequência das primeiras queixas,<br />

nomeadamente, de associações de produtores/fabricantes de bens de consumo<br />

corrente (alimentares e outros), sobre alegados “abusos” das cadeias da GDA em<br />

relação aos mesmos.<br />

73. Das conclusões do citado inquérito, salienta-se o facto de algumas empresas, à<br />

data, dependerem em mais de 30% das suas vendas de uma só cadeia de<br />

distribuição, sendo que em vários grupos de produtos a representatividade das<br />

vendas para os GGR de certas empresas era na ordem dos 50%-60%. 7<br />

74. À data, as práticas mais frequentemente denunciadas foram:<br />

Selecção de fornecedores: cobrança de avultadas verbas para constarem da<br />

lista de potencial fornecedor;<br />

Custos de entrada: custos de referenciação de novos produtos (entrada em<br />

linha), variáveis e negociáveis loja a loja dentro da mesma cadeia, sendo<br />

7 No período mais recente 2004-2008, nos casos infra analisados do leite UHT, do arroz e das massas<br />

alimentícias (capítulo 4), constata-se que os fornecedores dependem em cerca de, respectivamente, 15%<br />

e 30% do primeiro e dos dois primeiros GGR no aprovisionamento. A representatividade das vendas<br />

destes produtos para os GGR varia, todavia e no mesmo período, <strong>entre</strong> 60% e 80%.<br />

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novamente exigidos em situações de mudança de insígnia da loja (situações<br />

de aquisições de estabelecimentos por outra cadeia);<br />

Preços: exigência ao fornecedor, por parte da cadeia de distribuição, do<br />

diferencial de preço necessário para suportar movimentos de baixa de<br />

preços que permite a esta ser competitiva com cadeias concorrentes;<br />

Imposição ou dilação de prazos de pagamento com a ameaça de retirada<br />

dos produtos de todas as lojas das cadeias;<br />

Imposição de promoções;<br />

Imposição de “rappel incondicional” isto é, sem qualquer contrapartida em<br />

termos de volume de vendas anual;<br />

Marcas do distribuidor (MDD): utilização abusiva de “facings” (também<br />

denominados por “look alike”) semelhantes aos das marcas dos<br />

fornecedores induzindo em erro os consumidores;<br />

75. Após este inquérito foram desenvolvidas várias acções, nomeadamente ao nível<br />

legislativo, procurando dar resposta às questões mais problemáticas por via<br />

regulamentar, na medida em que a aplicação das regras de concorrência não se<br />

afigurava adequada (dada a grande relutância dos fornecedores identificarem e<br />

apresentarem documentação sobre situações concretas, para além do difícil<br />

enquadramento das práticas nas regras de concorrência 8 ).<br />

76. Dificilmente, práticas que ocorrem <strong>entre</strong> fornecedores e distribuidores no âmbito<br />

das suas relações comerciais, decorrentes, nomeadamente, de um poder de<br />

compra acrescido por força de um certo grau de concentração, serão<br />

enquadráveis nos objectivos da legislação de concorrência, na medida em que as<br />

mesmas não tenham por objecto ou como efeito restringir de forma sensível a<br />

concorrência, condição sine qua non para aplicação da lei da concorrência.<br />

77. Assim, foram criadas disposições regulamentares (“venda com prejuízo” e<br />

“práticas comerciais abusivas”) no âmbito da legislação relativa a práticas<br />

comerciais restritivas (ex vi supra referido Decreto-Lei n.º 370/93), a qual visa<br />

regular aspectos de ética comercial e assegurar a protecção dos concorrentes<br />

8 A título de exemplo, ver questões que se colocaram em França com a decisão do Conselho da<br />

Concorrência Francês no caso CORA, em Vogel, Louis (1994), “Ateliers de la Concurrence: juge civil et<br />

juge commercial (DGCCRF/02) – L’articulation <strong>entre</strong> le droit civil, le droit commercial et le droit de la<br />

concurrence”, Revue d’Economie Industrielle, 68(1): 81-98.<br />

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e/ou consumidores, aplicando-se independentemente dos seus efeitos ao nível da<br />

concorrência no mercado.<br />

78. Se o procedimento inerente à implementação do Código de Boas Práticas –<br />

celebrado <strong>entre</strong> a a CIP (Confederação da Indústria Portuguesa) e a APED<br />

(Associação Portuguesa de Empresas de <strong>Distribuição</strong>) – 9 pode ter contribuído para<br />

um melhor relacionamento comercial <strong>entre</strong> os diferentes agentes económicos das<br />

áreas da produção/distribuição, não eliminou, todavia, um conjunto de problemas<br />

que continuaram a ser relatados pelas empresas e associações de fornecedores.<br />

79. Assim, posteriormente, em 1998/1999, a ex-DGCC procedeu, a um novo inquérito<br />

junto dos principais fornecedores e dos GGR, no sentido de actualizar a<br />

informação recolhida no Estudo anterior e, também, de avaliar a evolução<br />

verificada no relacionamento comercial <strong>entre</strong> aqueles agentes económicos.<br />

80. O inquérito foi realizado a 97 fornecedores, cobrindo a maioria dos sectores do<br />

retalho alimentar e misto, cujos produtos são comercializados na GDA.<br />

81. Basicamente, as conclusões deste inquérito apontaram no sentido de que as<br />

práticas anteriormente identificadas como geradores de conflitos nas relações<br />

negociais <strong>entre</strong> fornecedores e distribuidores continuavam a manter-se, por vezes<br />

com outra designação, mas produzindo o mesmo efeito.<br />

82. A AdC, após a sua criação em 2003, iniciou um procedimento de<br />

acompanhamento das “<strong>Relações</strong> Fornecedores/Distribuidores no Sector da<br />

<strong>Distribuição</strong> <strong>Alimentar</strong>”, no âmbito do qual procedeu a um Estudo relativo a<br />

“Breve Enquadramento do Sector da <strong>Distribuição</strong> <strong>Alimentar</strong> em Portugal”<br />

(Fonseca, 2005) 10 , bem como a uma análise econométrica aprofundada do poder<br />

de compra dos GGR no período 2000-2003 (Rodrigues, 2006, cit.), tendo ambos<br />

sido apresentados no Encontro Ibérico <strong>entre</strong> as Autoridades de Concorrência<br />

Espanholas e Portuguesas, realizado em Ávila a 15 de Abril de 2005.<br />

83. O citado Enquadramento do Sector, para além de apresentar dados estruturais de<br />

evolução do sector a retalho alimentar e por grosso em Portugal, faz uma breve<br />

descrição dos principais problemas em termos de concorrência que se têm<br />

colocado neste âmbito (em particular a constituição de centrais de<br />

9 Vide secção 2.4 infra.<br />

10<br />

Fonseca, C. (2005), “Breve Enquadramento do Sector da <strong>Distribuição</strong> <strong>Alimentar</strong> em Portugal”, Documento<br />

Interno da AdC, Abril de 2005.<br />

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compra/referenciação e marcas do distribuidor), do enquadramento regulamentar<br />

aplicável e da intervenção da AdC face às suas competências e atribuições.<br />

84. A análise econométrica (Rodrigues, 2006) foi realizada com base em dados de<br />

compras e vendas dos 5 principais GGR, recolhidos para o período 2000-2003,<br />

desagregados por produto, marca e fornecedor. Esta análise revelou que a<br />

centralização de compras e a integração vertical de alguns GGR originam preços<br />

mais baixos na aquisição por estes grupos, sendo os ganhos daí decorrentes,<br />

tendencialmente, repercutidos nos consumidores, verificando-se assim, o passthrough<br />

dos resultados do poder de compra dos GGR para os consumidores. 11<br />

85. Em paralelo, e segundo esta análise, dados adicionais revelaram também que<br />

esses GGR tendem a aumentar menos os seus preços de venda ao público (PVP)<br />

do que o restante comércio.<br />

86. Dos valores apurados nas citadas análises constatava-se que, em 2005, os GGR<br />

representavam 53,4% do global dos mercados de aprovisionamento e 73,9% do<br />

comércio a retalho. Por sua vez, os cinco maiores GGR detinham uma quota<br />

conjunta de, respectivamente, 46,2% e 62,3% no global dos mercados do<br />

aprovisionamento e do comércio a retalho.<br />

87. No ano de 2008, os GGR representavam, respectivamente, 72,4% e 83,5% do<br />

global dos mercados de aprovisionamento e do comércio a retalho. No mesmo<br />

ano, os quatro maiores GGR detinham uma quota conjunta de, respectivamente,<br />

58,8% e 66,9% do global dos mercados de aprovisionamento e do comércio a<br />

retalho (vide subsecções 3.3 e 3.4.1 infra).<br />

88. Quanto ao peso das MDD nas vendas dos GGR, de acordo com dados publicados<br />

pela Revista <strong>Distribuição</strong> Hoje, a situação em 2004 era a seguinte. (i) Sonae (MC)<br />

28,5%; (ii) JM 36,8% (Pingo Doce 26,9% e Feira Nova 9,9%); (iii) Carrefour<br />

46,4% (Minipreço 39,6% e Hipers 6,8%); (iv) Auchan 10,4% e (v) Plus 52,4%. 12<br />

11 Vide, de igual modo, Anexo 2 de resenha do estado de arte da literatura económica sobre estes conceitos<br />

de poder de compra e de “pass-through”, bem como sobre outros conceitos relacionados.<br />

12<br />

A actualização destes valores para o período mais recente 2005-2008 é remetida para o Relatório Final de<br />

Julho de 2010.<br />

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2.3.2. Recomendações já efectuadas pela AdC<br />

89. Em Outubro de 2003, a AdC formulou ao Senhor Ministro da Economia uma<br />

Recomendação sobre a legislação relativa ao licenciamento de grandes superfícies<br />

comerciais.<br />

90. A Recomendação surgiu num contexto em que o Governo tinha em análise a<br />

reformulação da legislação aplicável à data sobre o licenciamento de grandes<br />

superfícies comerciais, a qual continha critérios quantitativos limitativos de acesso<br />

ao mercado (quotas de mercado máximas a nível nacional e local).<br />

91. Nessa Recomendação a AdC alertou para o facto de, no caso em concreto, ser<br />

indispensável eliminar as barreiras à entrada que pudessem constituir limitações<br />

quantitativas de acesso à actividade, criando condições para o estabelecimento de<br />

relações mais equilibradas nos mercados de aprovisionamento.<br />

92. Foi igualmente referido que o licenciamento deveria ter por objectivo assegurar o<br />

cumprimento de requisitos de ordem ambiental, de ordenamento do território e de<br />

política urbanística.<br />

93. A AdC considerou que deveria ser evitado todo o acréscimo de custos<br />

administrativos desnecessários, limitando-se o sistema de autorização prévia de<br />

instalação às unidades comerciais cuja dimensão fosse susceptível de produzir<br />

efeitos negativos ao nível dos aspectos anteriormente referidos.<br />

94. Por outro lado, os critérios de concessão da autorização prévia de instalação<br />

deveriam ser objectivos, transparentes e facilmente comprováveis, eliminando-se<br />

quaisquer critérios quantitativos, pela grave limitação à liberdade de formação da<br />

oferta que os mesmos constituem, bem como, os critérios qualitativos cuja<br />

aplicação envolva elevado grau de discricionariedade.<br />

95. Este aspecto, no caso em apreço, apresentava extrema relevância, dado estar<br />

prevista a descentralização das decisões de autorização em comissões de âmbito<br />

regional, o que foi considerado poder constituir um factor potencialmente gerador<br />

de assimetrias de decisão.<br />

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2.3.3. Controlo de operações de concentração<br />

96. Várias têm sido as concentrações de empresas do sector da distribuição<br />

notificadas à AdC, salientando-se, pelas repercussões que tiveram no sector, a<br />

concentração relativa à aquisição, em 2007, por parte da Sonae dos<br />

hipermercados Carrefour (cit.), bem como a aquisição, em 2008, por parte do<br />

Pingo Doce (Grupo JM) da cadeia de discount Plus do Grupo Tengelmann (cit.).<br />

97. As duas operações foram aprovadas com obrigações e condições, tendentes a<br />

assegurar o cumprimento dos compromissos apresentados pelas notificantes no<br />

sentido de ser assegurada a manutenção de uma concorrência efectiva nos<br />

mercados relevantes 13 onde foram detectados problemas de concorrência.<br />

98. No âmbito das análises efectuadas, a AdC avaliou, de igual modo, os efeitos sobre<br />

os mercados de aprovisionamento, que se encontram a montante da actividade de<br />

distribuição retalhista de base alimentar e onde actuam as empresas que<br />

fornecem os retalhistas de base alimentar, sendo assim considerada uma<br />

actividade relacionada com a de distribuição retalhista de base alimentar. 14<br />

99. O mercado do aprovisionamento compreende a venda de bens de consumo<br />

corrente, pelos respectivos fabricantes, à totalidade dos seus clientes – grossistas,<br />

GGR e outros clientes, incluindo outras cadeias retalhistas de âmbito regional 15 e<br />

o canal HORECA (Hotéis, Restaurantes e Cafés) –, localizados em território<br />

nacional ou sedeados no exterior.<br />

100. Não existindo um único mercado do aprovisionamento mas, antes, um conjunto<br />

diversificado de mercados, a AdC considerou que se impunha, em face da<br />

diversidade das estruturas de cada mercado e da especificidade própria de cada<br />

produto ou categoria de produtos, uma análise mais desagregada.<br />

13 A definição dos mercados relevantes foi feita com base na prática decisória da CE e da AdC em processos<br />

anteriores; quanto ao “mercado do produto relevante”, a AdC concluiu que deveria ser o mercado de base<br />

alimentar, nos formatos hipermercados, supermercados e lojas discount; quanto ao “mercado relevante<br />

geográfico”, foi definido em termos locais, variando a delimitação das áreas em função da localização das<br />

lojas da Adquirida e do equipamento comercial da zona (isócronas correspondentes a 10 minutos ou 30<br />

minutos de deslocação, consoante os casos).<br />

14 Vide, de igual modo, Comunicação CE relativa à definição do mercado relevante para efeitos de aplicação<br />

da legislação Comunitária da concorrência, Jornal Oficial n.º C 372, de 09.12.1997 e Comunicação CE<br />

relativa às linhas de orientação na aplicação do Artigo 81 do Tratado CE (Tratado que instituiu as<br />

Comunidades Europeias) sobre os acordos de cooperação horizontal, Jornal Oficial n.º C 3, de 06.01.2001.<br />

15 O pequeno retalho ou “retalho tradicional” (v.g., mercearias e mercados locais) não se abastece, em<br />

geral, directamente nos mercados de aprovisionamento, mas outrossim no canal grossista.<br />

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101. Assim, com base na prática decisória da CE, a actividade do aprovisionamento é<br />

normalmente analisada por referência a grupos de produtos, cuja homogeneidade<br />

é função da finalidade no consumo e do grau de substituibilidade ou<br />

complementaridade <strong>entre</strong> os produtos.<br />

102. No processo Sonae/Carrefour, a avaliação jusconcorrencial da AdC incidiu sobre<br />

dezasseis mercados relevantes de distribuição de retalho alimentar de âmbito<br />

local, e ainda o mercado nacional da venda retalhista de combustível para<br />

transportes rodoviários.<br />

103. Na avaliação jusconcorrencial do impacto da operação de concentração analisou-<br />

se a estrutura de todos os mercados relevantes identificados, considerando-se,<br />

para esses efeitos, os estabelecimentos de formato “hipermercado”,<br />

“supermercado” e discount de todos os operadores activos nas áreas de influência<br />

consideradas.<br />

104. Foi, ainda, desenvolvida uma análise prospectiva destes mercados, tendo em<br />

conta a evolução previsível das respectivas estruturas de mercado, incluindo as<br />

autorizações já concedidas para a instalação deste tipo de estabelecimentos.<br />

105. A AdC definiu os mercados geográficos relevantes com base na identificação de<br />

áreas de influência, em torno de cada um dos estabelecimentos da insígnia<br />

Carrefour a adquirir, atento, designadamente a que, do ponto de vista da procura,<br />

a substituibilidade <strong>entre</strong> diferentes localizações está limitada pela disponibilidade<br />

de deslocação dos consumidores.<br />

106. Dos mercados relevantes identificados pela AdC onde a operação de concentração<br />

era susceptível de levar à criação ou reforço de posição dominante da qual<br />

poderiam resultar entraves significativos à concorrência efectiva, os<br />

compromissos assumidos pela notificante permitiram afastar as preocupações<br />

jusconcorrenciais identificadas.<br />

107. No processo Pingo Doce/Plus, a AdC, em linha com a sua prática decisória neste<br />

sector, aceitou a proposta da Notificante quanto à definição dos mercados<br />

relacionados de aprovisionamento.<br />

108. A Notificante definiu 23 grupos de produtos, correspondendo cada um a um<br />

mercado relevante distinto.<br />

109. Quanto ao mercado relevante geográfico, a AdC, embora reconhecendo que<br />

determinados mercados geográficos de aprovisionamento poderão apresentar um<br />

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âmbito geográfico mais lato do que o território nacional, tanto a prática decisória<br />

da AdC 16 , como a prática decisória da CE tendem a considerar o mercado<br />

geográfico como sendo o mercado nacional.<br />

110. Com base nos elementos recolhidos, a AdC não concluiu que a operação fosse<br />

susceptível de resultar na deterioração das condições comerciais de<br />

aprovisionamento dos restantes distribuidores retalhistas de base alimentar, nem<br />

tão pouco que a operação fosse susceptível de resultar no reforço significativo do<br />

poder negocial do Grupo JM nos mercados de aprovisionamento, pelo que concluiu<br />

que a operação não seria susceptível de resultar em efeitos anti-concorrenciais<br />

relacionados com os mercados de aprovisionamento.<br />

2.3.4. Práticas restritivas<br />

111. Nesta subsecção, serão apresentadas as acções desenvolvidas pela AdC ao abrigo<br />

dos seus poderes sancionatórios, tal como tipificados na lei nacional da<br />

concorrência (Lei n.º 18/2003), nos seus artigos 4.º, 6.º e 7.º, bem como no<br />

supra referido Decreto-Lei n.º 370/93.<br />

2.3.4.1. Artigo 4.º da Lei n.º 18/2003<br />

112. Na sequência de denúncias efectuadas junto da ex-DGCC, sobre os efeitos de um<br />

alegado reforço do poder de compra da UNIARME (União dos Armazenistas de<br />

Mercearia, C.R.L.) 17 , resultante da adesão à mesma das empresas retalhistas<br />

Pingo Doce, SA e Feira Nova Hipermercados, pertencentes ao Grupo JM, e, em<br />

cumprimento de despacho do Conselho da AdC, foi aberto o processo nº. 12/05.<br />

113. Estava em causa uma situação de duplo desconto (rappel) auferido por aquelas<br />

empresas em resultado do reforço do poder negocial que lhes permitia negociar,<br />

no âmbito dos contratos de fornecimento anuais, um rappel junto dos seus<br />

fornecedores e outro rappel decorrente da adesão à UNIARME (rappel UNIARME).<br />

16 Cf. Decisões AdC relativas às operações de concentração Sonae/Carrefour e Pingo Doce/Plus (cit.).<br />

17 A UNIARME foi constituída em 1985 como uma central de negociação <strong>entre</strong> cadeias grossistas, tendo tido<br />

como principais fundadores o Grupo Manuel Nunes (grossista) e a cooperativa de grossistas UNIMARK. O<br />

Grupo JM integra a UNIARME em 1986 através da sua cadeia Recheio e mais tarde, em 1998, através das<br />

suas cadeias retalhistas Pingo Doce e Feira Nova.<br />

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114. A retroactividade do duplo rappel a todo o ano em que se processou a referida<br />

adesão à UNIARME (Novembro de 1998), foi sancionada pela ex-DGCC por prática<br />

negocial abusiva (em infracção ao artigo 4.º-A do supra referido Decreto-Lei n.º<br />

370/93), tendo a decisão sido confirmada, em sede de recurso, pelo Tribunal do<br />

Comércio de Lisboa.<br />

115. Esta prática foi considerada abusiva na medida em que a exigência aos<br />

fornecedores, com efeitos retroactivos, por parte das empresas Pingo Doce e Feira<br />

Nova, de um duplo rappel sobre o mesmo montante anual de aquisições,<br />

constituía uma condição de cooperação comercial exorbitante, por constituir um<br />

benefício para aquelas empresas compradoras não proporcional ao seu volume de<br />

compras (vide, de igual modo, subsecção 2.3.4.4 infra).<br />

116. O processo AdC (n.º 12/05) tinha em vista avaliar se o acordo resultante da<br />

adesão do Pingo Doce e Feira Nova à UNIARME se revelava restritivo da<br />

concorrência, nos termos do n.º 1 do artigo 4.º da lei nacional da concorrência.<br />

117. A avaliação jusconcorrencial efectuada ao referido acordo concluiu que o mesmo<br />

não constituía um entrave ao livre funcionamento do mercado, quer no mercado<br />

da compra, quer nos mercados a jusante de venda a retalho e de venda por<br />

grosso, pelo que o processo foi arquivado.<br />

118. Para a conclusão supra referida contribuíram vários factos, tais como: (i) forte<br />

queda da quota de compra da UNIARME, no período 2002-2005, de cerca de 30%<br />

para cerca de 15%; (ii) forte concorrência afecta à UNIARME no mercado de<br />

compra dado o seu principal concorrente representar, por si só, quase o total de<br />

compras de todos os associados desta central e os seus quatro principais<br />

concorrentes superarem o seu cumulativo de compras, no global do mercado e<br />

em todas as categorias de produtos; (iii) o peso relativamente enfraquecido que<br />

os associados da UNIARME, para além do Grupo JM, representavam (e ainda<br />

representam) nos seus mercados de venda respectivos, quer no que concerne à<br />

evolução das suas vendas, em queda no sector grossista, quer no que concerne<br />

ao peso crescente dos seus concorrentes directos; e (iv) a saída recente da<br />

UNIARME de grande parte dos seus associados grossistas, que representaram, em<br />

2005, cerca de metade do volume total de compras da nova UNIARME e um<br />

volume de vendas por grosso superior ao desta central.<br />

119. Em Janeiro de 2001, as empresas Modelo Continente, SGPS, S.A. (MC) e GCT –<br />

Gestão Comercial Total, S.A. (GCT), notificaram à ex–DGCC a celebração de um<br />

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Acordo Global de Parceria Estratégica, no âmbito do qual estavam previstos três<br />

negócios jurídicos (duas concentrações e um acordo de franquia que integrava um<br />

contrato de cooperação comercial).<br />

120. Estas operações, para além do acordo de franquia, foram analisadas e permitidas<br />

pela ex-DGCC enquanto operações de concentração. Foi, de igual forma, decidido<br />

pela ex-DGCC que o contrato de franquia deveria ser analisado, enquanto acordo,<br />

nos termos do disposto no artigo 2.º do então Decreto-Lei n.º 371/93, de 29 de<br />

Outubro (hoje artigo 4.º da lei nacional da concorrência).<br />

121. Com a criação da AdC, o citado processo foi remetido a esta Autoridade, o qual<br />

veio a ser analisado no âmbito da actual lei nacional da concorrência, nos termos<br />

do disposto no seu artigo 4.º.<br />

122. Compulsados os elementos <strong>entre</strong>tanto solicitados às empresas envolvidas, foi<br />

constatado que os acordos de franquia e de cooperação comercial tinham sido<br />

revogados em 2003 por vontade expressa das partes, tendo sido substituídos por<br />

um Contrato Quadro de Franquia.<br />

123. Quanto ao contrato de cooperação comercial, revogado em 2003, foi possível<br />

apurar que nunca as empresas efectuaram quaisquer aquisições em conjunto pelo<br />

que não foi verificado que o acordo tivesse produzido quaisquer efeitos danosos,<br />

designadamente, em termos jusconcorrenciais.<br />

124. No que se refere ao Contrato Quadro de Franquia foi feita uma análise<br />

jusconcorrencial do mesmo à luz do artigo 4.º da citada lei, tendo sido apurado<br />

que no seu texto não se verificava a existência de qualquer cláusula restritiva da<br />

concorrência, sendo o processo arquivado por falta de objecto processual.<br />

2.3.4.2. Artigo 6.º da Lei n.º 18/2003<br />

125. Segundo o disposto neste artigo, “[é] proibida a exploração abusiva por uma ou<br />

mais empresas, de uma posição dominante no mercado nacional ou numa parte<br />

substancial deste, tendo por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir<br />

a concorrência”.<br />

126. Até à data, não foram abertas investigações no âmbito das relações comerciais<br />

<strong>entre</strong> a distribuição alimentar e os seus fornecedores ao abrigo deste artigo, quer<br />

pela AdC, quer pela ex-DGCC.<br />

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2.3.4.3. Artigo 7.º da Lei n.º 18/2003<br />

127. O número 1.º do artigo 7.º da Lei da Concorrência proíbe, na medida que seja<br />

susceptível de afectar o funcionamento do mercado ou a estrutura da<br />

concorrência, a exploração abusiva, por uma ou mais empresas, do estado de<br />

dependência económica em que se encontre relativamente a elas qualquer<br />

empresa fornecedora ou cliente, por não dispor de alternativa equivalente.<br />

128. Pode ser considerada ‘exploração abusiva’ do estado de dependência económica a<br />

adopção de qualquer dos comportamentos previstos no n.º 1 do artigo 4.º da<br />

mesma lei – ‘práticas proibidas’ –, ou a ruptura injustificada, total ou parcial, de<br />

uma relação comercial estabelecida, tendo em consideração as relações<br />

comerciais anteriores, os usos reconhecidos no ramo da actividade económica e<br />

as condições contratuais estabelecidas.<br />

129. Para efeitos da aplicação do n.º 1, entende-se que uma empresa não dispõe de<br />

alternativa equivalente, quando: (a) O fornecimento do bem ou serviço em causa,<br />

nomeadamente o de distribuição, for assegurado por um número restrito de<br />

empresas; e (b) A empresa não puder obter idênticas condições por parte de<br />

outros parceiros comerciais num prazo razoável.<br />

130. Por outro lado, e de forma simplificada, pode afirmar-se que um fornecedor é<br />

economicamente dependente de um comprador se não é viável para o fornecedor<br />

perder o comprador como cliente, podendo este permitir-se a perder esse<br />

fornecedor. Para que exista dependência económica, esta terá de ser sempre<br />

unilateral, no sentido em que não afecta o comprador.<br />

131. A adopção do conceito de ‘dependência económica’ suscita a questão de<br />

determinar qual o “benchmark” que identifica a sua existência e o seu grau. No<br />

caso Rewe/Meinl a CE, tendo em conta os relatórios dos produtores<br />

(fornecedores), estabeleceu que, em média, um comprador que contribua para<br />

22% ou mais do volume de negócios do fornecedor só pode ser substituído a um<br />

custo financeiro muito elevado.<br />

132. Contudo, tem de se ter em conta a importância do bem para o próprio retalhista.<br />

Tratando-se de um produto “âncora”, relativamente ao qual os consumidores têm<br />

um certo grau de lealdade, é necessário ter em conta o custo que o retalhista<br />

incorre ao não fornecer esses produtos. Os fornecedores de um produto com estas<br />

características estarão obviamente menos dependentes. Mesmo assim, os<br />

retalhistas, ao oferecerem uma série de comodidades aos seus consumidores<br />

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como one-stop-shopping, uma grande variedade de produtos e outras, podem<br />

muitas vezes reduzir a importância da disponibilização desses produtos nas<br />

decisões dos consumidores sobre onde efectuar as suas compras (vide Anexo 2,<br />

subsecção A2.9.3).<br />

133. Até à data, não foram abertas investigações no âmbito das relações comerciais<br />

<strong>entre</strong> a distribuição alimentar e os seus fornecedores ao abrigo deste artigo, quer<br />

pela AdC, quer pela ex-DGCC.<br />

2.3.4.4. Decreto-Lei n.º 370/93, de 29 de Outubro<br />

134. O supra referido Decreto-Lei n.º 370/93 tem como objectivo a promoção do<br />

equilíbrio e da transparência das relações <strong>entre</strong> agentes económicos que lhe estão<br />

subjacentes, muito embora não tenham necessariamente efeitos a nível da<br />

concorrência e/ou não envolvam um abuso de posição dominante, tal como<br />

caracterizado no artigo 6.º da Lei n.º 18/2003.<br />

135. Estes diplomas tipificam o que se entende como “práticas comerciais restritivas”,<br />

designadamente, a aplicação de preços ou de condições de venda<br />

discriminatórias, a venda com prejuízo, a recusa de venda de bens ou de<br />

prestação de serviços e as práticas negociais abusivas.<br />

136. Até à data a AdC interveio, ao abrigo daqueles diplomas legais, em vários casos<br />

de venda com prejuízo. A ex-DGCC também interveio ao abrigo daqueles mesmos<br />

diplomas, nomeadamente no caso UNIARME (vide subsecção 2.3.4.1 supra),<br />

envolvendo a imposição de retroactividade do duplo desconto (rappel).<br />

2.4. Código de Boas Práticas <strong>Comerciais</strong> – APED/CIP<br />

137. As dificuldades sentidas no relacionamento <strong>entre</strong> produtores/fornecedores e a<br />

<strong>Grande</strong> <strong>Distribuição</strong>, levaram a CIP e a APED, a elaborar e assinar, em 17 de<br />

Julho de 1997, um “Código de Boas Prática <strong>Comerciais</strong>” 18 que tinha em vista abrir<br />

uma via de diálogo <strong>entre</strong> as duas partes.<br />

18 Cf. http://www.cpaa.org.pt/codigo.asp<br />

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138. Nesse documento foram estabelecidos uma série de princípios, de regras e de<br />

procedimentos que os respectivos associados, sem prejuízo da própria liberdade<br />

contratual, deverão observar nas suas relações comerciais.<br />

139. No campo dos princípios foram adoptados os seguintes:<br />

Transparência: prevê um documento com as condições básicas de<br />

negociação, devendo ser formalizadas aquelas que vierem a ser objecto de<br />

acordo;<br />

Não discriminação: consiste no compromisso de oferecer a todos os<br />

clientes as mesmas condições de partida para a negociação de prestações<br />

equivalentes 19 ;<br />

Reciprocidade: dever de basear as negociações e acordos na existência de<br />

contrapartidas efectivas e proporcionais;<br />

Maximização do valor: dever de cooperar para proporcionarem um maior<br />

benefício ao consumidor assegurando a maior eficácia à cadeia logística;<br />

Cumprimento do acordado: compromisso de cumprir pontual e<br />

integralmente os acordos celebrados, dentro dos limites da boa-fé<br />

negocial.<br />

140. Para além dos princípios atrás enunciados as partes aceitaram fazer<br />

recomendações aos associados relativas ao clima de cooperação e urbanidade que<br />

deve presidir às negociações, ao cumprimento integral dos contratos, à logística<br />

com a observância de todas as condições de <strong>entre</strong>ga e ao cumprimento dos<br />

prazos de pagamento negociados.<br />

141. Para supervisionar e dinamizar a aplicação desta auto-regulamentação a CIP e<br />

APED criaram a CPAA (Comissão Permanente de Avaliação e Acompanhamento do<br />

Código de Boas Práticas <strong>Comerciais</strong>).<br />

142. A CPAA é constituída por dois representantes de cada parte subscritora e por uma<br />

personalidade independente, escolhida por acordo <strong>entre</strong> as partes, que preside à<br />

Comissão.<br />

143. A CPAA tem por atribuições avaliar e acompanhar a aplicação do Código e propor<br />

às partes subscritoras as alterações ao clausulado do Código que considere<br />

necessárias.<br />

19 Podemos interpretar este princípio como uma forma de estabelecer um level playing field <strong>entre</strong> clientes<br />

aquando do processo de negociação, procurando neutralizar eventuais diferenças que existam <strong>entre</strong> o<br />

valor das opções-fora-do-contrato (OFC’s) dos diferentes clientes. Podemo-nos questionar se, em termos<br />

da promoção da eficiência económica, faz sentido a criação desse level playing filed.<br />

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144. As interpretações e recomendações emitidas pela CPAA serão comunicadas às<br />

partes subscritoras que se encarregarão de as divulgar a todos os interessados e<br />

incentivar a sua aplicação 20 .<br />

145. A CPAA funciona de acordo com um regulamento interno aprovado pelas partes<br />

subscritoras e reúne regularmente de dois em dois meses, reunindo<br />

extraordinariamente sempre que convocada por dois ou mais dos seus membros.<br />

146. Até à data (2009) foram já produzidas 15 Recomendações 21 pela CPAA sobre os<br />

mais variados assuntos, tais como:<br />

Recomendação relativa à Modificação das Condições Contratuais<br />

Negociadas (1998);<br />

Recomendação relativa às Tabelas de Espaços do "Pingo Doce" (1998);<br />

Recomendação sobre o Contrato - Tipo relativo às Condições Gerais de<br />

Fornecimento das Empresas do Grupo Sonae para 1998;<br />

Recomendação sobre os Sistemas de Centralização de Pagamentos (2001);<br />

Recomendação relativa à Resolução de Divergências <strong>entre</strong> as Empresas<br />

(2001);<br />

Recomendação sobre a Cooperação <strong>entre</strong> Produtores e Distribuidores para<br />

a Limitação da Quebra (2003).<br />

2.5. Acções da Comissão Europeia<br />

147. A nível comunitário, a questão do ‘poder de compra’ do retalho alimentar tornou-<br />

se num assunto relevante no contexto dos desenvolvimentos ocorridos na<br />

distribuição a retalho na UE ao nível, nomeadamente, de alguns movimentos<br />

concentrativos, quer de âmbito nacional, quer de âmbito comunitário (v.g., caso<br />

Kesko/Tuko 22 ).<br />

20 Como Código de Boas Práticas que é, ele não prevê penalizações pelo não cumprimento das suas<br />

disposições. Neste contexto, vale a pena referir que existem dúvidas sobre a eficácia do estabelecimento<br />

deste tipo de códigos. Assim, numa apresentação na Autoridade da Concorrência Irlandesa, em 22 de<br />

Outubro 2009, o seu presidente, William Prasifka, levantou dúvidas sobre a eficácia da adopção destes<br />

códigos no controlo do denominado “poder de compra” dos GGR. Por outro lado, e ainda segundo Prasifka,<br />

“planning laws and facilitating market access are the key to countering buyer power concerns”.<br />

21 Cf. http://www.cpaa.org.pt/recomendacoes.asp.<br />

22 Caso IV/M.784 – Kesko/Tuko, com Decisão CE, datada de 20.11.1996, declarando a operação de<br />

concentração <strong>entre</strong> estas duas empresas finlandesas como incompatível com o Mercado Comum.<br />

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148. Algumas Autoridades Nacionais de Concorrência iniciaram inquéritos sobre a<br />

problemática do poder de compra da distribuição a retalho, tendo a DG COMP<br />

(Direcção Geral da Concorrência da CE e ex-DGIV) contratado um estudo a<br />

consultores externos sobre “O poder de compra e o seu impacto, em termos de<br />

concorrência, no sector da distribuição a retalho alimentar na União Europeia” 23 .<br />

149. O problema da evolução dos preços dos bens alimentares, bem como dos<br />

diferenciais <strong>entre</strong> os preços ao produtor e os preços ao consumidor associado a<br />

um conjunto de práticas comerciais seguidas pela grande distribuição alimentar,<br />

têm vindo a preocupar as instâncias comunitárias, nomeadamente, o Parlamento<br />

Europeu e a Comissão.<br />

150. Vários documentos foram já produzidos sobre esta problemática de que se<br />

salientam: (i) Declaração do Parlamento Europeu sobre a necessidade de<br />

investigar e solucionar o abuso de poder (de compra) por parte dos GGR que<br />

operam na UE; (ii) Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao<br />

Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões de<br />

09.12.2008 sobre “Preços dos géneros alimentícios na Europa” 24 ; (iii)<br />

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité<br />

Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões, de 20.05.2008 sobre “Fazer<br />

face à subida dos preços dos géneros alimentícios. Orientações para a acção da<br />

UE” 25 ; e (iv) Comunicação da Comissão de 29.01.2008 sobre “Acompanhamento<br />

dos resultados para os consumidores no mercado único: o painel de avaliação dos<br />

mercados de consumo” 26 .<br />

151. Na sua Comunicação de Dezembro de 2008 a CE constatou que o choque causado<br />

pelo recente aumento dos preços agrícolas e da energia foi absorvido de modo<br />

diferente nos Estados Membros, identificando vários factores que poderão ter<br />

contribuído para a fragmentação do mercado interno, de <strong>entre</strong> os quais se<br />

salientam: (i) restrições à entrada de grandes retalhistas; (ii) restrições às vendas<br />

com prejuízo; e (iii) restrições de horários de abertura de grandes<br />

estabelecimentos.<br />

23 “Buyer Power and its Impact on Competition in the Food Retail Distribution Sector of the European Union”,<br />

prepared for the European Commission – DGIV by DOBSON CONSULTING – Maio de 1999.<br />

24 COM CE (2008) 821 final de 9.12.2008.<br />

25 COM CE (2008) 321 final de 20.05.2008.<br />

26 COM CE (2008) 31 final de 29.01.2008.<br />

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152. Todavia, esta Comunicação CE alerta para o facto de quando se procura avaliar o<br />

impacto destas medidas regulamentares (restrições acima indicadas) não se<br />

podem descurar os eventuais objectivos políticos que as mesmas procuraram<br />

alcançar.<br />

153. Em termos do enquadramento jusconcorrencial, a CE constatou que o poder<br />

negocial das empresas nos diversos sectores ao longo da cadeia de valor, varia<br />

muito conforme os produtos que comercializam.<br />

154. Assim, produtores que oferecem marcas internacionais com um estatuto<br />

irrecusável tendem a gozar de uma maior margem de manobra junto dos<br />

retalhistas; em contrapartida, os produtores de marcas com estatuto<br />

indiferenciado junto dos consumidores tendem a ficar numa posição mais fraca.<br />

155. Ao nível dos produtores agrícolas, a assimetria do poder de negociação tem<br />

fomentado uma certa reorganização daqueles, nomeadamente, através da<br />

constituição de agrupamentos de produtores e cooperativas.<br />

156. Quanto às práticas mais preocupantes em matéria de concorrência 27 , a Comissão<br />

considera que as mesmas devem ser avaliadas numa base casuística, nunca<br />

deixando de considerar o contexto em que ocorrem.<br />

157. De <strong>entre</strong> as acções que a Comissão tem em curso nesta área, de destacar a<br />

recente versão provisória da Comunicação CE relativa ao “Melhor funcionamento<br />

da cadeia de abastecimento alimentar na Europa”, de 28.10.2009.<br />

158. A Comissão tem acompanhado a evolução dos preços dos géneros alimentícios no<br />

âmbito de um exercício de monitorização do mercado lançado no contexto da<br />

revisão do mercado único de Novembro de 2007, que tem por objectivo<br />

apresentar soluções políticas para as causas de mau funcionamento<br />

identificadas 28 .<br />

27 São enunciadas as seguintes práticas: cartéis, acordos de compra, imposição de preços de venda, marca<br />

única, produtos de marca privada, subordinação, acordos de fornecimento exclusivo e regimes de<br />

certificação.<br />

28 Vide Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social<br />

Europeu e ao Comité das Regiões “Um mercado único para a Europa do século XXI”, Bruxelas, 20.11.2007<br />

COM(2007) 724 final.<br />

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159. Em Dezembro de 2008, a Comissão publicou um relatório intercalar sobre “Preços<br />

dos géneros alimentícios na Europa” 29 , tendo estabelecido um roteiro que<br />

identifica as orientações chave para as acções políticas.<br />

160. A supra referida Comunicação CE, de 28.10.2009, apresenta iniciativas políticas<br />

concretas em consonância com esse roteiro, concluindo o exercício de<br />

monitorização do mercado da cadeia de abastecimento alimentar.<br />

161. Nesta comunicação a Comissão identifica três prioridades transversais comuns a<br />

toda a cadeia de abastecimento alimentar e a serem prosseguidas pelos diferentes<br />

Estados Membros, não obstante o facto desta cadeia ser muito heterogénea e de<br />

os desafios enfrentados pelas partes interessadas diferirem <strong>entre</strong> subsectores e<br />

<strong>entre</strong> Estados Membros: (i) a promoção das relações sustentáveis e baseadas no<br />

mercado <strong>entre</strong> as partes interessadas da cadeia de abastecimento alimentar; (ii) o<br />

aumento da transparência ao longo da cadeia para incentivar a concorrência e<br />

aumentar a sua resistência à volatilidade dos preços; e (iii) a promoção da<br />

integração e a competitividade da cadeia europeia de abastecimento alimentar em<br />

todos os Estados Membros.<br />

162. De seguida, são apresentadas diversas considerações pela Comissão com o<br />

objectivo de dar resposta às três prioridades acima identificadas, e que<br />

envolverão a colaboração continuada <strong>entre</strong> a Comissão e os diferentes Estados<br />

Membros, quer seja com as diferentes autoridades da concorrência quer seja com<br />

os diferentes institutos nacionais de estatística.<br />

163. Em particular, e no que respeita à primeira prioridade – a promoção das relações<br />

sustentáveis e baseadas no mercado <strong>entre</strong> as partes interessadas da cadeia de<br />

abastecimento alimentar –, a Comissão considera que é necessário agir para<br />

eliminar as práticas contratuais desleais <strong>entre</strong> agentes comerciais em toda a<br />

cadeia de abastecimento alimentar e colaborará com a REC (Rede Europeia da<br />

Concorrência) para desenvolver uma abordagem comum das questões de<br />

concorrência pertinentes, tendo em vista um intercâmbio contínuo de<br />

informações, a identificação rápida de casos problemáticos e uma distribuição<br />

eficiente de tarefas <strong>entre</strong> os seus membros.<br />

164. No que respeita à segunda prioridade – o aumento da transparência ao longo da<br />

cadeia para incentivar a concorrência e aumentar a sua resistência à volatilidade<br />

29 Vide COM(2008) 821, de 9 de Dezembro de 2008, e respectivos documentos de trabalho.<br />

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dos preços – a Comissão apresentará propostas para melhorar a supervisão e a<br />

transparência geral dos mercados de derivados dos produtos agrícolas de base no<br />

contexto da abordagem global dos derivados e da revisão da directiva relativa aos<br />

mercados de instrumentos financeiros; publicará uma primeira edição da<br />

ferramenta europeia de monitorização dos preços dos alimentos, comprometendo-<br />

se a examinar formas de a desenvolver para abranger um número maior de<br />

produtos e de cadeias alimentares, com início no Verão de 2010; e recomendará a<br />

todos os Estados Membros que implantem serviços de comparação de preços de<br />

retalho dos géneros alimentícios, disponíveis na Web e de fácil acesso.<br />

165. No que respeita à terceira prioridade – a promoção da integração e a<br />

competitividade da cadeia europeia de abastecimento alimentar em todos os<br />

Estados Membros –, a Comissão avaliará medidas para abordar os<br />

condicionalismos do abastecimento territorial, na medida em que estes criam<br />

ineficiências económicas e estão em contradição com os princípios do mercado<br />

interno; insta o Conselho e o Parlamento Europeu a adoptarem rapidamente a<br />

proposta da Comissão para a revisão da legislação sobre as regras de rotulagem;<br />

reverá um conjunto seleccionado de normas ambientais e de sistemas de<br />

rotulagem da origem que podem impedir o comércio transfronteiras e colaborará<br />

com os Estados Membros e com a indústria para melhorar a harmonização da<br />

aplicação das normas comunitárias em matéria de segurança alimentar;<br />

promoverá e facilitará a reestruturação e a consolidação do sector; e adoptará<br />

medidas para apresentar as propostas do grupo de alto nível com o objectivo de<br />

melhorar a competitividade do sector agro-alimentar, nomeadamente das PME, e<br />

promover a inovação e as exportações no sector.<br />

166. Assim, e não obstante as acções e/ou recomendações que a AdC possa vir a<br />

tomar e/ou a propor no que concerne as relações comerciais <strong>entre</strong> a GDA e os<br />

seus fornecedores, a AdC está envolvida num esforço conjunto a nível da UE com<br />

vista à prossecução das três prioridades transversais comuns a toda a cadeia de<br />

abastecimento alimentar, tal como acima identificadas e referidas na<br />

Comunicação CE, de 28.10.2009 (cit.).<br />

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2.6. Acções de autoridades de concorrência de diversos<br />

países e de organizações internacionais (OCDE)<br />

167. Vários têm sido os organismos responsáveis pela política de concorrência em<br />

Estados Membros da UE que têm desenvolvido estudos/inquéritos sobre os efeitos<br />

do poder de compra da grande distribuição quer nos mercados a montante<br />

(aprovisionamento), quer nos mercados a jusante (venda a retalho e por grosso).<br />

168. Estes estudos iniciaram-se no início da década de 1990, quando se começaram a<br />

sentir os efeitos do desenvolvimento/consolidação dos GGR.<br />

169. Assim, o Conselho da Concorrência de França elaborou um Parecer em Janeiro de<br />

1997 relativo às diversas questões relacionadas com a concentração da<br />

distribuição 30 onde procede a uma abordagem desta problemática com o objectivo<br />

de definir linhas de orientação para análises concretas quer de concentrações<br />

nestes sectores, quer de eventuais práticas restritivas.<br />

170. O citado Parecer, para além de fazer um enquadramento histórico da<br />

problemática, analisa as estruturas da venda a retalho de bens de consumo<br />

corrente, a metodologia para definir os mercados da distribuição na acepção da<br />

concorrência (venda a retalho e aprovisionamento), a concentração no sector da<br />

distribuição, o efeito da concentração sobre a concorrência nos mercados a<br />

montante e jusante desenvolvendo metodologias de análise na perspectiva da<br />

concorrência (dependência económica, marcas do distribuidor).<br />

171. Por seu lado, a Autoridade da Concorrência Irlandesa produziu, em 2008, três<br />

relatórios sobre os sectores alimentar e de produtos de drogaria e higiene pessoal<br />

(“groceries”), no grosso e no retalho, nesse país, em resposta a uma solicitação<br />

ministerial. 31<br />

30<br />

Avis n.º 97-A-04 du Conseil de la Concurrence en date du 21 Janvier 1997 relatif à diverses questions<br />

portant sur la concentration de la distribuition.<br />

31 Estes três relatórios foram elaborados pela AdC Irlandesa em resposta a uma solicitação do Minister for<br />

Enterprise, Trade and Employment da Irlanda, na sequência de alterações legislativas ocorridas em 2006.<br />

O primeiro relatório, publicado em Abril 2008, analisa a estrutura de mercado e o nível de concorrência no<br />

grosso e no retalho alimentar, de produtos de higiene e drogarias (“groceries”), <strong>entre</strong> 2001 e 2006. O<br />

segundo relatório, publicado simultaneamente com o primeiro, analisa a evolução dos preços no retalho<br />

<strong>entre</strong> 2001 e 2007. O terceiro e último relatório, publicado em Julho de 2008, analisa o sistema de<br />

licenciamento neste sector (“groceries”) <strong>entre</strong> 2001 e 2007.<br />

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172. No Reino Unido (RU), em 1999, o Office of Fair Trading (OFT) concluiu uma<br />

primeira investigação sobre o poder dos GGR, tendo remetido a mesma para a<br />

Competition Commission (CC).<br />

173. Por outro lado, em Maio de 2006 o OFT recomendou à CC a investigação, nos<br />

termos da legislação de concorrência, das relações fornecedores/ retalhistas,<br />

tendo aquele organismo vindo a elaborar um estudo aprofundado sobre a<br />

questão 32 , cujo relatório final foi publicado em Abril de 2008.<br />

174. As conclusões focaram, essencialmente, dois tipos de problemas: (i) que várias<br />

cadeias retalhistas detinham fortes posições em mercados locais com<br />

consequências negativas para os consumidores e (ii) que a transferência<br />

excessiva de risco e de custos inesperados dos distribuidores retalhistas para os<br />

seus fornecedores através de diversas práticas comerciais, pode ter efeitos<br />

adversos no investimento e inovação dos fornecedores e em último caso no bem<br />

estar dos consumidores.<br />

175. No que se refere à área dos produtos hortofrutícolas e à evolução dos seus<br />

preços, para além dos desenvolvimentos que tem tido a nível comunitário como<br />

anteriormente referido, também algumas autoridades nacionais de concorrência<br />

têm procurado acompanhar este assunto.<br />

176. A Direcção Geral de Defesa da Concorrência Espanhola publicou em 2004 um<br />

relatório relativo a “Investigação da cadeia de distribuição de determinadas frutas<br />

e hortaliças” 33 onde faz um levantamento dos circuitos de comercialização destes<br />

produtos e compara preços ao longo da cadeia de valor.<br />

177. Das várias conclusões constantes deste relatório, salientamos a de que as<br />

características estruturais mais salientes da cadeia de distribuição são, por um<br />

lado, a significativa importância da intermediação (<strong>entre</strong> produtores de<br />

hortofrutícolas e o retalho e efectuada, em boa parte, pela rede de mercados<br />

centrais), a reduzida dimensão dos operadores na produção e/ou fornecimento e,<br />

por outro, a existência de barreiras à entrada no retalho de hortofrutícolas em<br />

resultado de normas autonómicas de licenciamento de novos formatos comerciais.<br />

32 Competition Commission (2008), “The supply of Groceries in the UK - Market Investigation”, 30.04.08, RU<br />

(em http://www.competition-commission.org.uk/ rep_pub/reports/2008/fulltext/538.pdf). Saliente-se que<br />

este relatório teve origem numa solicitação do OFT, de Maio de 2006, e foi antecedido de dois conjuntos<br />

de análises preliminares, a primeira de Janeiro de 2007 e a segunda de Outubro de 2007.<br />

33<br />

“Investigación de la Cadena de Distribución de Determinadas Frutas y Hortalizas”, Dirección General de<br />

Defensa de la Competencia, Janeiro de 2004.<br />

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3. O sector da <strong>Distribuição</strong><br />

178. O sector da distribuição tem estado sujeito a forte regulamentação, quer quanto a<br />

restrições no acesso ao mercado, quer quanto a restrições a nível do exercício da<br />

actividade.<br />

179. Apresenta-se de seguida uma breve descrição da evolução deste tipo de<br />

regulamentação, do seu impacto no mercado e dos eventuais efeitos restritivos<br />

sobre a concorrência da regulamentação actualmente em vigor (secção 3.1) e da<br />

estrutura da distribuição retalhista em Portugal (secção 3.2), bem como o<br />

posicionamento nacional dos GGR no comércio a retalho (secção 3.3) e nos<br />

mercados de aprovisionamento (secção 3.4).<br />

3.1. Enquadramento regulamentar<br />

3.1.1. Restrições no acesso ao mercado<br />

3.1.1.1. Evolução<br />

1989 – Sector retalhista – hipers<br />

180. Após a abertura do primeiro hiper em Portugal, pelo Grupo MC em Matosinhos, no<br />

ano de 1985 (vide supra), a primeira legislação que instituiu um sistema de<br />

autorização prévia de instalação de unidades comerciais, para além do<br />

licenciamento camarário relativo a obras particulares, surgiu em 1989 34 , após as<br />

reacções do pequeno comércio, <strong>entre</strong>tanto ocorridas no mercado, face à abertura<br />

de grandes unidades comerciais retalhistas.<br />

181. Ficaram abrangidas pela obrigatoriedade de obtenção, por parte da Administração<br />

Central, 35 de uma autorização prévia de localização, todas as unidades retalhistas<br />

de área superior a 3000m 2 (designadas à data por “UCDR”, i.e. “Unidades<br />

<strong>Comerciais</strong> de Dimensão Relevante”).<br />

34 Decreto-Lei n.º 190/89, de 6 de Junho.<br />

35 Ministério do Comércio e Turismo.<br />

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182. A concessão da autorização baseava-se em critérios qualitativos tais como a<br />

avaliação: (i) do impacto em termos de abastecimento (interesses dos<br />

consumidores); (ii) das consequências para o tecido comercial da zona; e (iii) da<br />

contribuição para a reestruturação e modernização da actividade comercial da<br />

zona.<br />

1991 – Sector grossista<br />

183. Em 1991, face à entrada no mercado português da cadeia grossista Makro – de<br />

unidades comerciais de maior dimensão do que as dos grupos grossistas já<br />

presentes em Portugal (v.g., a cadeia Manuel Nunes) –, o âmbito do sistema<br />

anteriormente referido foi alargado às unidades grossistas 36 .<br />

184. Em paralelo com a instalação de grandes unidades comerciais, começaram a<br />

surgir unidades comerciais com formatos de média dimensão (supers) – já<br />

existentes antes de 1985 – que não estavam abrangidos pelo sistema de<br />

autorização prévia anteriormente indicado.<br />

1992 – Sector retalhista – supers<br />

185. Como resposta ao desenvolvimento deste segmento de mercado, em 1992 37 a<br />

legislação foi alterada, baixando o limiar mínimo de área sujeita a autorização<br />

prévia, para 2000m 2 e passando o sistema também a abranger os centros<br />

comerciais com área superior a 3000m 2 .<br />

186. Os critérios para autorização da instalação continuaram a ser de teor qualitativo e<br />

tinham em consideração os seguintes aspectos: (i) a instalação da nova unidade<br />

devia contribuir para a modernização e diversificação da oferta comercial na<br />

região e aí estimular uma ‘sã concorrência’; (ii) o benefício para os consumidores<br />

decorrente do equilíbrio <strong>entre</strong> os vários tipos de equipamento comercial; e (iii) as<br />

características da estrutura e da actividade comercial da respectiva zona, no que<br />

respeita à qualificação profissional, à utilização de novas tecnologias e aos<br />

serviços prestados ao consumidor.<br />

36 Decreto-Lei n.º 9/91, de 8 de Janeiro.<br />

37 Decreto-Lei n.º 258/92, de 20 de Novembro.<br />

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187. Em 1995 38 , numa tentativa de “travar” a instalação de médias unidades<br />

comerciais cujas dimensões se situavam, por norma, ligeiramente abaixo do limiar<br />

de aplicação da lei, as áreas mínimas para aplicação da legislação foram<br />

novamente reduzidas e definidas em função do número de habitantes do concelho<br />

onde as unidades se instalavam.<br />

1997 – Unidades individuais e unidades de Grupos: Limitações<br />

quantitativas e Quotas máximas<br />

188. Entretanto, em meados dos anos 90 surgiram em força as lojas de desconto<br />

(discount) e pequenos supers (lojas de proximidade), os quais, não estando<br />

abrangidos pelos limiares da legislação, facilmente se instalaram e expandiram.<br />

189. Face a esta realidade e a uma crescente contestação do comércio instalado (lojas<br />

tradicionais), o sistema é profundamente alterado em 1997 39 numa tentativa de<br />

travar o aumento de quota de mercado da grande distribuição.<br />

190. A nova legislação, para além de ter alterado os limiares de aplicação (ficaram<br />

abrangidas unidades retalhistas alimentares, retalhistas especializadas e unidades<br />

grossistas, com áreas superiores a 2000m 2 , 4000m 2 e 5000m 2 , respectivamente),<br />

passou a abranger também as unidades comerciais integradas em grupos que<br />

dispusessem de áreas de venda acumuladas superiores a 15.000m 2 , 25.000m 2 e<br />

30.000m 2 , respectivamente).<br />

191. O sistema de áreas acumuladas foi instituído para controlar as pequenas unidades<br />

dos grupos, nomeadamente, os de hard discount.<br />

192. Deixaram de estar abrangidos os centros comerciais, enquanto área de venda<br />

descontínua, estando, contudo, abrangidas as lojas que ultrapassassem os<br />

limiares referidos no parágrafo n.º 185 supra.<br />

193. Foram introduzidos critérios quantitativos com carácter eliminatório para a<br />

autorização de unidades comerciais retalhistas (quotas de mercado a nível<br />

nacional e a nível da área de influência):<br />

(i) Quota máxima de 35% a nível nacional (unidades abrangidas pela lei em<br />

relação ao mercado global de retalho) e,<br />

38 Decreto-Lei n.º 83/95, de 26 de Abril.<br />

39 Decreto-Lei n.º 218/97, de 20 de Agosto.<br />

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(ii) Quota máxima de 45% a nível da área de influência (idem a nível da área<br />

de influência da unidade a instalar);<br />

194. Os critérios qualitativos constituíam um segundo patamar de decisão.<br />

2001 a 2004 – “Congelamento” de autorizações (entradas)<br />

195. Em virtude de as quotas nacionais terem sido atingidas, a legislação ficou<br />

suspensa de aplicação desde Outubro de 2001 até à entrada em vigor da lei<br />

seguinte (Maio de 2004), tendo correspondido a um verdadeiro “congelamento”<br />

na atribuição de novas autorizações de instalação.<br />

196. Esta situação foi fortemente contestada, sobretudo, pelos grupos que se<br />

encontravam em fase de expansão.<br />

2004 – Descentralização das autorizações: Taxas por<br />

procedimento que revertem para apoio pequeno comércio<br />

197. Em Maio de 2004 foi publicada nova legislação 40 cuja regulamentação ficou<br />

consubstanciada em quatro Portarias 41 e um Despacho 42 .<br />

198. Esta nova Lei introduziu alterações profundas nas regras anteriormente vigentes,<br />

tendo alterado (reduzido) os limiares de aplicação:<br />

500m 2 para retalhistas;<br />

5000m 2 de área acumulada retalhista;<br />

5000m 2 para grossistas;<br />

30.000 m 2 de área acumulada grossista; e<br />

6000m 2 para centros comerciais<br />

199. Os critérios de decisão passaram a ser exclusivamente qualitativos, se bem que<br />

alguns deles relacionados com a dinâmica concorrencial da área de influência:<br />

Enquadramento protecção ambiental e ordenamento do território;<br />

Áreas adequadas para estacionamento;<br />

40 Lei n.º 12/2004, de 30 de Março.<br />

41<br />

Portaria n.º 518/2004, de 20 de Maio; Portaria n.º 519/2004, de 20 de Maio; Portaria n.º 520/2004, de 20<br />

de Maio e Portaria n.º 620/2004, de 7 de Junho.<br />

42 Despacho n.º 11005/2004, de 2 de Junho.<br />

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Contribuição para a melhoria das condições concorrenciais do sector da<br />

distribuição, coexistência e equilíbrio <strong>entre</strong> várias formas de comércio e<br />

adequação da estrutura comercial às necessidades dos consumidores;<br />

Desenvolvimento do emprego; e<br />

Integração intersectorial (sectores a montante).<br />

200. De <strong>entre</strong> as novidades destaca-se a criação de taxas a aplicar aos actos relativos<br />

ao processo que reverteram para um Fundo destinado a apoiar o pequeno<br />

comércio (URBCOM 43 ).<br />

201. As decisões deixaram de pertencer ao Ministro e passaram a ser responsabilidade<br />

das designadas Comissões Regionais de Equipamento Comercial (CREC), onde<br />

estavam representadas várias entidades da Administração Central e Local, bem<br />

como representantes das Associações de Comerciantes da zona de instalação da<br />

nova unidade e representantes de Associações de Consumidores.<br />

2009 – Legislação actual: Critérios qualitativos<br />

202. Entretanto, em Janeiro do corrente ano, foi mais uma vez alterado o regime de<br />

autorização de instalação de estabelecimentos comerciais, passando a vigorar um<br />

novo sistema 44 .<br />

203. O novo sistema, para além de pretender dar cumprimento aos objectivos do<br />

Programa de Simplificação Administrativa e Legislativa – SIMPLEX – adequou os<br />

critérios de autorização aos imperativos comunitários em matéria de concorrência<br />

e de liberdade de estabelecimento.<br />

204. Como principais novidades, será de referir que a legislação actual: (i) reduziu o<br />

universo de estabelecimentos sujeito a autorização prévia (aumento dos limiares<br />

das áreas abrangidas); (ii) acabou com as fases de candidatura; (iii) exigiu a<br />

prévia obtenção da informação prévia de localização favorável e de impacto<br />

43 O URBCOM, ou Sistema de Incentivos a Projectos de Urbanismo Comercial, foi uma medida do Eixo 2<br />

(Medida 2.4.B2) do Programa de Incentivos à Modernização da Economia (PRIME), inserido no QCA III,<br />

tendo como objectivo revitalizar e consolidar as actividades empresariais do sector do comércio e de<br />

alguns serviços, requalificar o espaço público envolvente e promover o respectivo projecto global.<br />

44 Decreto-Lei n.º 21/2009, de 19 de Janeiro, que estabelece o regime jurídico da instalação e da<br />

modificação dos estabelecimentos de comércio a retalho e de conjuntos comerciais.<br />

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ambiental; e (iv) criou uma única entidade decisória (COMAC 45 ) ao nível da NUT<br />

III, com decisões mensais.<br />

205. Para efeitos de decisão, os projectos são pontuados em função da sua valia<br />

(VP) 46 , tendo em conta parâmetros tais como: (i) a contribuição do projecto para<br />

a multiplicidade da oferta comercial, quer em formatos, insígnias e diversidade<br />

das actividades nos conjuntos comerciais, tendo em vista promover a<br />

concorrência efectiva na área de influência; (ii) a avaliação da qualidade dos<br />

serviços prestados, integração de pessoas com incapacidades; (iii) a avaliação da<br />

qualidade do emprego e da responsabilidade social da empresa; (iv) a avaliação<br />

da integração da unidade comercial no ambiente urbano; e (v) a contribuição da<br />

unidade comercial para a eficiência energética ou utilização de energias<br />

renováveis e de materiais recicláveis.<br />

206. A metodologia para proceder à determinação da VP e as regras técnicas para<br />

execução dos seus parâmetros foram definidas por Portaria do Ministro da<br />

Economia e da Inovação 47 .<br />

207. A pontuação é positiva quando o projecto obtém uma VP superior a 50% da<br />

pontuação total.<br />

208. No caso da pontuação ser negativa a decisão da COMAC é desfavorável.<br />

209. A decisão da COMAC pode ser acompanhada da imposição de obrigações<br />

destinadas a garantir o cumprimento de dos compromissos assumidos pelo<br />

requerente e que tenham constituído pressupostos da autorização.<br />

210. Das decisões das COMAC cabe impugnação para os Tribunais Administrativos de<br />

Círculo.<br />

211. As autorizações concedidas têm validade de três ou quatro anos, caso se trate,<br />

respectivamente, de estabelecimentos comerciais ou conjuntos comerciais<br />

(centros comerciais).<br />

45 A Comissão de Autorização Comercial (COMAC) foi criada pelo Decreto-Lei n.º 21/2009, de 19 de Janeiro,<br />

como a única entidade com competência para decidir, ao nível das NUT III e com uma periodicidade<br />

mensal, os pedidos de autorização de instalação e modificação dos estabelecimentos de comércio e retalho<br />

e de conjuntos comerciais. As suas regras de funcionamento foram estabelecidas pela Portaria n.º<br />

417/2009, de 16 de Abril, do Ministério da Economia e Inovação.<br />

46 Cf. Artigo 10.º, 13.º e 14.º do Decreto-Lei n.º 21/2009, de 19 de Janeiro.<br />

47 Portaria n.º 418/2009, de 16 de Abril.<br />

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212. Findo aqueles prazos sem que se tenha verificado a entrada em funcionamento<br />

dos estabelecimentos, as autorizações de instalação caducam.<br />

3.1.1.2. Síntese conclusiva<br />

213. Conforme exposto anteriormente, as restrições à instalação de unidades<br />

comerciais surgiram após se terem feito sentir os efeitos da abertura ao público<br />

dos primeiros hipers, tendo por objectivo salvaguardar um correcto ordenamento<br />

territorial, quanto a aspectos ambientais e à preservação do território.<br />

214. Tinham, igualmente, subjacente evitar sobrecarga excessiva nas infra-estruturas<br />

(rodoviárias) bem como o impacto no tecido comercial retalhista tradicional.<br />

215. O surgimento da cadeia Makro, levou a que a legislação fosse adaptada no sentido<br />

de abranger também unidades grossistas de grande dimensão.<br />

216. Entretanto, o sector da distribuição continuou o seu processo de desenvolvimento,<br />

à semelhança do que ocorria na Europa, começando a surgir novos formatos,<br />

novas insígnias e novos conceitos de venda (discount).<br />

217. A legislação, que inicialmente abrangia só grandes unidades comerciais (hipers),<br />

veio sucessivamente a ser alterada procurando abranger todas as novas<br />

realidades que foram surgindo.<br />

218. À medida que o mercado foi evoluindo, crescendo, nomeadamente, nos formatos<br />

não abrangidos pela legislação, a contestação por parte do pequeno comércio<br />

tradicional foi aumentando, pelo que a legislação foi “tentando adaptar-se” às<br />

novas realidades, tornando cada vez mais abrangente o seu campo de aplicação.<br />

219. Assim, em 1992 o sistema de licenciamento foi profundamente modificado,<br />

surgindo o conceito de “área de venda acumulada” para determinar o limiar de<br />

aplicação da lei, tendo sido também introduzidos limites para as quotas (nacional<br />

e na área de influência) dos estabelecimentos, em termos de mercado global,<br />

limites esses que tinham carácter eliminatório.<br />

220. Na sequência da aplicação desta regulamentação, a quota de mercado nacional foi<br />

atingida em 2001, pelo que foi suspensa a aplicação da legislação, o que na<br />

prática resultou num “congelamento” da atribuição de autorizações para a<br />

instalação e/ou expansão de unidades comerciais.<br />

221. Esta situação durou até 2004, data em que foi publicada nova legislação, sem<br />

restrições quantitativas, mas ainda com critérios económicos na atribuição das<br />

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autorizações, prevendo vir a ser revista passados três anos após a sua entrada<br />

em vigor (i.e., a 15.04.2007).<br />

222. Entretanto, a partir de 2003, começaram a chegar queixas à CE, a qual abriu um<br />

processo 48 ao Estado Português por infracção ao Princípio da Liberdade de<br />

Estabelecimento (artigo 43.º do Tratado CE 49 ).<br />

223. Em causa está o cumprimento por parte da legislação dos princípios e disposições<br />

constantes da Directiva “Serviços” 2006/123/CE.<br />

224. A CE considerava que a legislação anteriormente em vigor (Lei n.º 12/2004)<br />

continha restrições, na instalação de unidades comerciais, incompatíveis com as<br />

disposições comunitárias.<br />

225. A legislação actualmente em vigor (Decreto-Lei n.º 21/2009, de 19 de Janeiro)<br />

procurou eliminar tudo o que fossem critérios incompatíveis com a legislação<br />

comunitária, nomeadamente, critérios económicos, centrando a avaliação dos<br />

projectos em requisitos ambientais e de política urbanística.<br />

3.1.2. Restrições ao nível dos horários de funcionamento<br />

3.1.2.1. Evolução<br />

226. O Decreto-Lei n.º 48/96, de 15 de Maio, actualmente em vigor, marcou a<br />

legislação nacional em matéria de horários de comércio.<br />

227. Com efeito, até 1977, os horários do comércio não eram regulados de forma<br />

autónoma, mas por via de regulamentação relacionada (legislação do trabalho) a<br />

qual obrigava ao descanso no domingo (encerramento obrigatório).<br />

228. A legislação publicada em 1977 50 , veio introduzir os conceitos de abertura e fecho<br />

dos estabelecimentos (das 8h às 22h, todos os dias da semana), deixando, assim,<br />

de estar limitada a abertura ao domingo e, competindo às Câmaras Municipais<br />

definirem o horário de acordo com as especificidades locais (dentro dos limites<br />

legais).<br />

48 Processo CE 2003/4717 – Nota de culpa ao Estado Português em 18.10.2004. Notificação complementar<br />

para cumprimento em 04.07.2006 e Parecer fundamentado em 29.06.2007. Fica a dúvida se o Decreto-Lei<br />

n.º 21/2009, de 19 de Janeiro, terá corrigido as restrições alegadas pela Comissão Europeia.<br />

49 Leia-se “Tratado que institui as Comunidades Europeias”. Hoje substituído pelo Tratado sobre o<br />

Funcionamento da União Europeia (vide Anexo 2 infra).<br />

50 Decreto-Lei n.º 75-T/77, de 28 de Fevereiro.<br />

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229. Em 1983 51 , o horário sofreu um alargamento (das 6h às 24h, todos os dias da<br />

semana), prevendo a possibilidade, nalguns casos, de funcionamento<br />

permanente.<br />

230. Em 1995 52 , a legislação veio redefinir o encerramento (das 2h às 6h, todos os<br />

dias da semana) e limitar, pela primeira vez, o horário de funcionamento das<br />

grandes superfícies comerciais contínuas 53 aos domingos e feriados, nos meses de<br />

Janeiro a Outubro, em que apenas podiam operar por um período de 6 horas.<br />

231. O enquadramento legal em vigor 54 , de 1996, permite a abertura <strong>entre</strong> as 6h e as<br />

24h todos os dias da semana, contemplando algumas excepções, sendo a mais<br />

relevante a das grandes superfícies comerciais contínuas com mais de 2000m 2 ,<br />

situadas em concelhos com mais de 30 mil habitantes, e, as com mais de 1000m2<br />

desde que situadas em concelhos de menos de 30 mil habitantes, cujo período de<br />

funcionamento foi reduzido aos domingos e feriados, de Janeiro a Outubro, <strong>entre</strong><br />

as 8h e as 13h.<br />

232. A situação tem sido objecto de contestação por parte, nomeadamente, das<br />

empresas de distribuição e dos seus fornecedores, sendo defendido, <strong>entre</strong> outros,<br />

pelo comércio tradicional, sindicatos e organizações várias que defendem o<br />

domingo como dia de descanso.<br />

233. Em 1999, foi realizado um Estudo para o Observatório do Comércio 55 que, <strong>entre</strong><br />

outras, produziu as seguintes conclusões:<br />

A restrição de abertura das grandes unidades comerciais contínuas,<br />

contrariando a lei geral, está associada a uma tentativa de contenção<br />

crescente da quota de mercado dos grandes operadores em prejuízo do<br />

comércio independente (tradicional);<br />

A informação recolhida leva a crer que ninguém beneficiou com a medida<br />

adoptada;<br />

51 Decreto-Lei n.º 417/83, de 25 de Novembro.<br />

52 Decreto-Lei n.º 86/95, de 28 de Abril.<br />

53 Terminologia da legislação sobre autorização prévia de instalação de unidades comerciais.<br />

54 Decreto-Lei n.º 48/96, de 15 de Maio.<br />

55 “Horários de Funcionamento dos Estabelecimentos <strong>Comerciais</strong> – situação actual e prospectiva”, Dezembro<br />

de 1999 - realizado para o Observatório do Comércio por: I.D.E. - Instituto de Dinâmica do Espaço<br />

Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, coordenado por Prof.ª<br />

Margarida Pereira e Prof. José Afonso Teixeira.<br />

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O crescimento e diversificação da oferta continua em curso e o reforço da<br />

concentração tem conduzido a um aumento da quota de mercado dos<br />

principais grupos; e<br />

O pequeno comércio ainda se apoia no raciocínio segundo o qual o<br />

consumidor tinha de se ajustar aos horários proporcionados pelos<br />

comerciantes.<br />

234. A APED tem exercido forte contestação a esta medida tendo, em 2007, <strong>entre</strong>gue<br />

na Assembleia da República uma petição com 250 mil assinaturas de<br />

consumidores, tendo em vista a liberalização dos horários do comércio.<br />

235. No seu site apresenta um documento 56 onde enumera 12 argumentos para a<br />

abertura ao domingo das grandes superfícies comerciais, salientando-se, de <strong>entre</strong><br />

elas, as seguintes:<br />

A abertura do comércio ao Domingo vai ao encontro das necessidades da<br />

generalidade da população trabalhadora;<br />

A abertura do comércio ao Domingo gera emprego e evita desemprego;<br />

A abertura do comércio ao Domingo representa a consagração de um<br />

hábito responsável por boa parte das vendas da semana;<br />

A abertura do comércio ao Domingo é um pressuposto básico e<br />

determinante dos investimentos efectuados no sector.<br />

236. A APED procedeu, também, a uma síntese da situação regulamentar dos horários<br />

de abertura das lojas na Europa 57 , onde se verifica que só dois países (Suécia e<br />

Irlanda) não têm restrições de abertura ao domingo.<br />

237. Existem 4 países com restrição total de abertura ao domingo (Alemanha, Áustria,<br />

França e Grécia), apresentando os outros países, situações diversas de restrições<br />

de nível médio de abertura.<br />

238. Entretanto, em 2007, a Roland Berger produziu um Estudo 58 para a APED<br />

intitulado “Impacto da liberalização dos horários do comércio nas grandes<br />

56<br />

“12 argumentos em defesa da abertura do comércio ao domingo”, APED (http://www.aped.pt/<br />

documentacao_outra_campanha_horarios.php).<br />

57<br />

“Situação actual e evolução dos horários de comércio nos países da Europa”, APED (http://<br />

www.aped.pt/pdf/Hor_rios_Abertura_Europa.pdf).<br />

58 Cf. http://www.aped.pt/pdf/roland_berger.pdf.<br />

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superfícies aos domingos e feriados” onde apresenta, de <strong>entre</strong> outras, as<br />

seguintes conclusões:<br />

A restrição de abertura das lojas com mais de 2.000m2 aos domingos e<br />

feriados nos meses de Janeiro a Outubro foi imposta para permitir tempo<br />

ao comércio tradicional alimentar para reinventar-se – Hoje em dia cria<br />

desigualdades <strong>entre</strong> operadores e condiciona a escolha dos formatos de<br />

loja mais adequados;<br />

Face aos outros países europeus Portugal está a meio da tabela em termos<br />

de liberalização, sendo um dos países em que o comércio tradicional tem<br />

mais peso;<br />

A liberalização dos horários de comércio poderá criar <strong>entre</strong> 8000 e 8300<br />

novos postos de trabalho e gerar uma receita fiscal de 1 300 a 1 600M€<br />

(em 10 anos – até 2017);<br />

A indústria nacional irá beneficiar de um aumento das vendas para as<br />

grandes superfícies alimentares, devido a estas terem maior diversidade de<br />

oferta.<br />

239. O supra citado Estudo veio a ser muito contestado pela CCP – Confederação do<br />

Comércio e Serviços de Portugal 59 , em particular, os pressupostos para o calculo<br />

dos novos empregos e das receitas no período de 10 anos.<br />

3.1.2.2. Síntese conclusiva<br />

240. As restrições existentes no horário de funcionamento das grandes superfícies<br />

(estabelecimentos com área superior a 2 000m2), vieram favorecer os grupos de<br />

distribuição que têm privilegiado os estabelecimentos de formato médio ou<br />

pequeno.<br />

241. Por outro lado, em termos de efeitos no pequeno comércio, serão estes formatos<br />

os que, em princípio, fazem maior concorrência às lojas tradicionais, dado<br />

funcionarem, praticamente, como lojas de proximidade.<br />

242. De acordo com estudos efectuados e tal como salientado anteriormente, as<br />

restrições existentes nos horários não parecem ter tido os efeitos esperados,<br />

59 Cf. http://www.uacs.pt/fotos/noticias/CCPestudopelaAPED.pdf.<br />

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concretamente, em termos de protecção do comércio tradicional face à quota<br />

ganha pela grande distribuição. 60<br />

243. Contudo, será de realçar que a maioria dos países europeus têm regulamentações<br />

que restringem o horário de funcionamento dos estabelecimentos comerciais ao<br />

domingo, sendo muito variável, de país para país, o grau da restrição existente.<br />

3.2. Caracterização da distribuição retalhista<br />

3.2.1. Caracterização da distribuição retalhista nacional actual<br />

244. O sector nacional da distribuição retalhista actual é caracterizado por uma elevada<br />

heterogeneidade (métodos/conceitos de venda, formatos, perfil das empresas,<br />

grau de desempenho da cadeia de distribuição), com elevado grau de<br />

concentração da oferta ao nível dos GGR.<br />

245. Continuam a coexistir um grande número de empresas de reduzida dimensão, a<br />

maioria delas pouco evoluídas a par de um reduzido número de grupos com forte<br />

know-how e elevada capacidade de gestão, os quais têm vindo a ganhar quota de<br />

mercado.<br />

246. Tem-se verificado, igualmente, algum processo de concentração e formas de<br />

cooperação <strong>entre</strong> empresas, com vista à aquisição de capacidade competitiva,<br />

bem como procura de dimensão europeia por parte das empresas de maior<br />

dimensão.<br />

247. Todavia, segundo dados da A.C.Nielsen de 2002, Portugal continuava a ser dos<br />

países europeus que dispõe do maior número de lojas per capita, 2,4 por 1000<br />

habitantes contra 0,3 na Holanda e Dinamarca ou 0,6 na França.<br />

248. Ainda segundo dados Nielsen de 2002, Portugal era dos países da Europa que<br />

apresentava a maior percentagem de lojas tradicionais, em relação ao número<br />

total de lojas dos vários conceitos de retalho misto, de 88,1%.<br />

60 Salientar-se-á, todavia, que a devida aferição desta ilação deveria considerar o contrafactual de qual teria<br />

sido a evolução do mercado na ausência daquela restrição, i.e. se os hipers tivessem sido autorizados a<br />

abrir aos Domingos. Não obsta porém o facto que mesmo com esta restrição de horários de<br />

funcionamento, os GGR têm conseguido ganhar quota de mercado ao comércio tradicional.<br />

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249. Em contrapartida, considerando a repartição do volume de vendas do retalho<br />

misto, por conceito/formato, as lojas tradicionais representavam 11,3% da<br />

facturação total dos vários conceitos.<br />

250. O formato hipermercado representava, por si só, uma quota de 35%. 61<br />

3.2.2. Influência a montante e a jusante dos GGR<br />

251. Em comparação com o comércio tradicional, os GGR apresentam a principal<br />

vantagem de concentrarem nas suas unidades de venda uma forte diversidade de<br />

produtos, dos produtos vendidos em supers (dos produtos da denominada<br />

“distribuição alimentar”, vide supra) à oferta mais abrangente dos hipermercados,<br />

que incluem, de igual modo, outros segmentos de actividade, da venda de<br />

vestuário, a electrodomésticos e a combustíveis (gasóleos e gasolinas) em postos<br />

de abastecimento (vide supra).<br />

252. A expansão dos GGR terá efeitos, do lado do consumo, sobre o remanescente do<br />

comércio (v.g., mercearias e mercados tradicionais locais); e terá também efeitos<br />

nos mercados de aprovisionamento, através de agrupamentos de compra e/ou de<br />

negociação com outros retalhistas e/ou grossistas (v.g., os casos da UNIARME e<br />

do recente acordo Intercompra 62 ).<br />

253. A expansão dos GGR nos lados do consumo e do aprovisionamento têm efeitos<br />

sobre os demais clientes do aprovisionamento, que incluem: (a) o canal grossista,<br />

de menor dimensão do que os GGR e cujo declínio progressivo deriva, de igual<br />

modo, do facto deste canal ser fornecedor do comércio tradicional; e (b) sobre os<br />

demais canais de distribuição, incluindo cadeias retalhistas de menor dimensão e<br />

de âmbito regional (v.g., os casos das cadeias A. C. Santos nos distritos de Lisboa<br />

e de Leiria e Alisuper no distrito de Faro) e o canal HORECA (hotéis, restaurantes<br />

e cafés). De salientar a propósito do canal HORECA que, embora este canal possa,<br />

ainda, não concorrer de forma significativa no retalho com os GGR, grande parte<br />

dos supermercados e hipermercados dispõem já de serviços próprios de<br />

restauração e de pastelaria.<br />

61<br />

A actualização destas percentagens para o período recente de 2005-2008 é remetida para o Relatório Final<br />

de Julho de 2010.<br />

62 O acordo Intercompra foi estabelecido <strong>entre</strong> a Auchan, operador no retalho, e a Makro, operador no<br />

grosso, com o objectivo de negociar os contratos-base de fornecimento e algumas condições de compra<br />

em representação conjunta daquelas duas empresas.<br />

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254. O forte crescimento dos GGR, quer no aprovisionamento, com detrimento das<br />

quotas dos demais clientes deste mercado (v.g., canal grossista e outros canais,<br />

tal como o HORECA), quer nas vendas a retalho, com detrimento das quotas de<br />

mercado do comércio tradicional, poderá decorrer de condições de preço mais<br />

vantajosas para o consumidor final e de uma alteração da escolha de consumo do<br />

consumidor final.<br />

255. Por seu turno, o aumento do grau de concentração da procura dos GGR nos<br />

mercados de aprovisionamento poderá, de igual modo, incentivar o reforço do<br />

grau de concentração da oferta nesses mercados (vide da indústria<br />

transformadora / fornecedora), pelo desaparecimento progressivo de empresas<br />

menos competitivas (vide, de igual modo, Capítulo 4 infra).<br />

256. Nos sectores onde a produção nacional assume ainda alguma importância – tal<br />

como nos casos do leite e do arroz (Capítulo 4 infra) –, o poder de compra<br />

exercido pelos GGR junto do aprovisionamento poderá ter influência na<br />

determinação dos preços na produção, i.e. na negociação mais a montante <strong>entre</strong><br />

as empresas de aprovisionamento (indústria transformadora) e a produção.<br />

257. Em qualquer dos casos, quer isto dizer que, em termos jusconcorrenciais,<br />

qualquer apreciação do comportamento dos GGR deverá ter em consideração dois<br />

níveis, o nível material dos mercados dos produtos / serviços relevantes e o nível<br />

espacial dos mercados geográficos relevantes 63 , em dois estádios da actividade:<br />

(i) O estádio do aprovisionamento, onde os GGR concorrem, na compra, com<br />

agrupamentos de compras <strong>entre</strong> grandes retalhistas e/ou grossistas, com<br />

empresas grossistas, bem como com outros canais tal como o canal<br />

HORECA e, na venda dos produtos da sua marca (MDD), com as empresas<br />

de aprovisionamento; e,<br />

(ii) O estádio da venda a retalho, onde os GGR concorrem com o<br />

remanescente do comércio ou o denominado “comércio tradicional”, o qual<br />

inclui as tradicionais “mercearias”, bem como padarias, pastelarias e os<br />

mercados locais tradicionais (vide supra).<br />

63 Cf. Comunicação CE relativa à definição do mercado relevante para efeitos de aplicação da legislação<br />

Comunitária da concorrência (cit.) e Comunicação CE relativa às linhas de orientação na aplicação do<br />

Artigo 81.º do Tratado sobre os acordos de cooperação horizontal (cit.).<br />

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258. No âmbito jusconcorrencial e atento o critério de substituibilidade subjacente à<br />

definição de mercado relevante e segundo prática decisória da CE 64 , as dimensões<br />

material e geográfica relevantes variam consoante o estádio considerado.<br />

259. Ao nível do retalho, a dimensão material do mercado relevante respeita o serviço<br />

prestado pelos GGR aos consumidores finais, abrangendo, por conseguinte, todo o<br />

cabaz de bens da aqui considerada “distribuição alimentar” comercializado pelas<br />

unidades (supers e hipers) destes grupos. Por seu turno, ao nível geográfico, os<br />

mercados de venda a retalho são definidos em termos locais, em torno de cada<br />

unidade de venda (num raio de curta distância e/ou curto tempo de percurso).<br />

260. Em contrapartida, nos mercados do aprovisionamento, deverá ser feita a<br />

destrinça, ao nível material, <strong>entre</strong> os diversos produtos comercializados pelos GGR<br />

atento o facto da oferta e procura poderem diferir consoante o produto em causa.<br />

Ao nível geográfico, os mercados de aprovisionamento são, em geral, definidos<br />

como de âmbito nacional. 65<br />

261. Esta estrutura a dois níveis de mercados tem uma complexidade acrescida<br />

derivada da existência de:<br />

(i) Um estádio mais a montante da produção, que abastece os mercados de<br />

aprovisionamento, estejam estes interligados ou não;<br />

(ii) Agrupamentos de compra e/ou de negociação <strong>entre</strong> GGR e cadeias<br />

grossistas, os quais concorrem no aprovisionamento, mas operam em<br />

diferentes estádios a jusante da actividade, os GGR na venda a retalho e os<br />

grossistas enquanto intermediários <strong>entre</strong> os fornecedores e o comércio a<br />

retalho tradicional (v.g., o caso supra da UNIARME);<br />

(iii) Acordos de integração vertical <strong>entre</strong> os GGR e empresas de<br />

aprovisionamento (v.g., o caso da participação de 49% do Grupo JM da<br />

Unilever Portuguesa), bem como com Agrupamentos de Produção no caso<br />

dos hortofrutícolas; e<br />

(iv) Os denominados “produtos da marca do distribuidor” dos GGR (MDD),<br />

<strong>entre</strong>gues pelas empresas de aprovisionamento aos GGR – e<br />

64 V.g. Decisão CE relativa ao Caso n.º COMP/M.1684 « Non-opposition à la fusion Carrefour – Promodés »,<br />

de 25.01.2000 (versão francesa). Vide, de igual modo, Relatório preparado para a CE pela Dobson<br />

Consulting, Buyer power and its impact on competition in the food retail distribution sector of the<br />

European Union, DG IV, Study Contract nº IV/98/ETD/078 by Dobson Consulting, Maio 1999.<br />

65 Vide subsecção 2.3.3 supra e Anexo 2 infra.<br />

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transformados, maioritariamente, pela produção nacional – mas vendidos<br />

sob a marca do distribuidor em clara concorrência com os produtos de<br />

marca das empresa de aprovisionamento.<br />

262. A existência de agrupamentos de negociação e/ou de compra junto à integração<br />

vertical dos GGR no aprovisionamento – através, quer dos acordos de integração<br />

vertical, quer, nomeadamente, da venda de produtos sob as suas insígnias –<br />

reforça o poder de compra destes grupos no aprovisionamento. Todavia, este tipo<br />

de acordos reforça, de igual modo, a complexidade das relações comerciais <strong>entre</strong><br />

os GGR e os seus fornecedores, dificultando a apreciação económica do impacto<br />

da expansão destes grupos, quer sobre o bem-estar dos consumidores, quer<br />

sobre a eficiência dos mercados de aprovisionamento (vide, de igual modo, da<br />

produção) em geral.<br />

263. Uma análise recente do sector agro-alimentar nacional (Barros et al., 2006 66 )<br />

sugere que o aumento do grau de concentração dos GGR ao nível local do retalho<br />

nacional contribui para um maior poder de compra destes grupos nos mercados<br />

de aprovisionamento mas, de igual modo, para maiores preços de venda ao<br />

consumidor final. Este estudo conclui, assim, que o aumento do grau de<br />

concentração dos GGR no retalho nacional anula qualquer transmissão (pass-<br />

through) do maior poder de compra destes grupos ao consumidor final.<br />

264. Em contrapartida, uma outra análise do sector agro-alimentar nacional no período<br />

2002-2005 (Rodrigues, 2006, cit.) conclui pela inexistência de evidência de um<br />

elevado grau de concentração dos GGR na venda a retalho e no<br />

aprovisionamento, desagregado por categorias de produtos. Os resultados desta<br />

análise sugerem que o poder de compra dos GGR no aprovisionamento é, em<br />

geral, transmitido ao consumidor final. Em particular, resulta da análise<br />

econométrica constante deste estudo que o maior poder de compra decorrente do<br />

agrupamento de negociação UNIARME, reflectido na redução de preços de<br />

aquisição, é, em geral, transmitido ao consumidor, ainda que parcialmente.<br />

265. No que respeita aos agrupamentos de compra / negociação e aos acordos de<br />

integração vertical <strong>entre</strong> os GGR e empresas de aprovisionamento, salientar-se-á<br />

que, embora este tipo de acordos contribua a priori para um maior grau de<br />

concentração da procura no aprovisionamento, reduzindo assim as alternativas<br />

66 Barros, P.P., Brito, D. e D. Lucena (2006), “Mergers in the food retailing sector: an empirical<br />

investigation”, European Economic Review, 50(2): 447-468.<br />

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dos fornecedores, o mesmo não é necessariamente prejudicial aos fornecedores.<br />

Enquanto que os acordos verticais poderão contribuir para uma redução de custos<br />

de ambos os distribuidores e fornecedores, estes últimos beneficiam seguramente<br />

de uma redução de custos em negociarem com um único conjunto de<br />

compradores do que com cada um deles de forma separada 67 .<br />

266. Acresce que, não obstante a dimensão e elevada diversidade de oferta dos GGR,<br />

dificilmente poderão estes grupos impor o seu poder de compra sobre todos os<br />

fornecedores. Em particular, um estudo recente (Gohin e Guyomard, 2000) 68<br />

sugere que o poder de compra dos GGR tende a ser menor quanto maior for o<br />

grau de concentração dos fornecedores e maior a inelasticidade preço-procura do<br />

produto em questão. Este estudo sugere que a alocação de rendas <strong>entre</strong> os GGR/<br />

fornecedores depende dos poderes relativos de oligopsónio / oligopólio que estes<br />

operadores dispõem nos respectivos mercados dos produtos relevantes, sendo<br />

ambos condicionados pelos graus de elasticidade da oferta e da procura nos<br />

mercados em causa. 69<br />

3.3. Posicionamento dos GGR no comércio a retalho<br />

267. Para a estimativa do posicionamento dos GGR no comércio a retalho e nos<br />

mercados de aprovisionamento, bem como dos totais respectivos destes<br />

mercados e seguindo prática decisória da CE, bem como análises de outras<br />

entidades no sector alimentar 70 , são consideradas as seguintes categorias de<br />

produtos: “mercearia”, “frescos”, “bebidas (alcoólicas e não alcoólicas)”, “lácteos”,<br />

“congelados”, “higiene pessoal” e “drogaria e bazar”. 71<br />

67 Custos de negociação deverão ser considerados como “custos de transacção” ou custos incorridos na<br />

realização de uma transacção comercial. Este conceito foi introduzido na literatura económica por Ronald<br />

Coase, ainda que de uma forma não explícita.<br />

68<br />

Gohin, A. and H. Guyomard (2000). “Measuring market power for food retail activities: French evidence”,<br />

Journal of Agricultural Economics, 51: 181-195.<br />

69 Embora uma análise mais aprofundada deste tipo de questões seja delegada para o Relatório Final de<br />

Julho de 2010, as secções 4 e 0 infra tecem alguns comentários mais detalhados sobre esta matéria. Vide,<br />

de igual modo, Rodrigues (2006, cit.).<br />

70 V.g. Decisão CE de não oposição à operação de concentração Carrefour / Promodés (cit.) e análises da<br />

Centromarca (disponíveis em http://www.centromarca.pt/), bem como da Autoridade da Concorrência<br />

Irlandesa e da Competition Commission do RU, ambas de Abril de 2008 (cit.).<br />

71 A secção 4 infra apresenta uma análise mais fina ao nível do leite UHT, arroz e massas alimentícias.<br />

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268. Para este efeito, consideram-se, em acréscimo, elementos de valores de compra,<br />

no período 2004-2008, recolhidos dos GGR que operam actualmente em Portugal,<br />

a saber, conforme supra referido, os Grupos Aldi, Auchan (Pão de Açúcar e<br />

Jumbo), Carrefour (Dia% / Minipreço), E. Leclerc, El Corte Inglés, ITMI<br />

(Intermarché e Ecomarché), JM (Feira Nova, Pingo Doce e Recheio), MC (Modelo e<br />

Continente) e Lidl – e dos três grossistas de maior dimensão, para além da cadeia<br />

grossista Recheio do Grupo JM – Grupos GCT, Makro e Manuel Nunes.<br />

269. Dado que esta informação não abrange, por um lado, a rede de hipermercados do<br />

Grupo Carrefour (adquirida pelo Grupo MC em Dezembro de 2007, cit.) e a cadeia<br />

retalhista Plus (adquirida pela cadeia Pingo Doce do Grupo JM em Abril de 2008,<br />

cit.), bem como, por outro lado, os restantes retalhistas, que incluem outras<br />

cadeias retalhistas de âmbito regional (v.g., os casos das cadeias A. C. Santos e<br />

Alisuper) e o denominado “retalho tradicional”, estes elementos são extrapolados<br />

com base em informação anterior da Centromarca (Associação Portuguesa de<br />

Empresas de Produtos de Marca), disponível para o período 2002-2005. 72<br />

270. Esta informação da Centromarca permitirá, de igual modo, uma estimativa, ao<br />

nível dos mercados de aprovisionamento, do total do canal grossista – em<br />

particular, os que integram a UNIARME para além dos Grupos JM e Manuel Nunes,<br />

este último apenas até ao final de 2007 – e os denominados “Outros Canais” de<br />

distribuição – que incluem cadeias retalhistas de menor dimensão e de âmbito<br />

mais regional e o canal HORECA, bem como do total dos mercados de<br />

aprovisionamento (vide secção 3.4 infra e Anexo 1 para detalhes).<br />

271. Destas estimativas resulta que o valor total do mercado nacional de venda a<br />

retalho dos produtos ditos da distribuição alimentar” terá crescido de forma quase<br />

ininterrupta no período 2002-2008, salvo uma ligeira contracção no período 2003-<br />

2005, de 8.217,9 M € em 2002 para 10.616,2 M € em 2008, com um aumento<br />

cumulativo de 29,2%. O aumento do valor total de aprovisionamento no período<br />

2002-2008 foi de 20,3% (vide Tabela 1 e secção 3.4 infra).<br />

272. Na venda a retalho, observa-se, de igual modo, um crescimento dos GGR face aos<br />

demais retalhistas, no global do mercado, de 77,4% em 2002 (6360,7 M €) para<br />

83,5% em 2008 (8864,5 M €). Os GGR revelam-se, de igual modo, de maior<br />

72 Todavia, dado que a informação recolhida no âmbito do presente estudo é mais exaustiva e mais actual do<br />

que a da Centromarca – relativa às vendas dos seus associados, discriminados pelos principais tipos de<br />

clientes e pelas categorias de produtos supra referidas, no período 2002-2005 (detalhados em Anexo) –, a<br />

mesma permite a actualização de estimativas anteriores (em Fonseca, 2005 e Rodrigues, 2006, cit.).<br />

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<strong>Relações</strong> <strong>Comerciais</strong> <strong>entre</strong> a <strong>Grande</strong> <strong>Distribuição</strong> <strong>Agro</strong>-<strong>Alimentar</strong> e os seus Fornecedores (Preliminar)<br />

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importância do que os demais retalhistas na venda a retalho, discriminada por<br />

categorias de produtos, com percentagens que variam dos 62,5% nas bebidas<br />

alcoólicas em 2004 para os 89,9% nos “frescos” em 2008 (vide Gráfico 1 infra).<br />

Tabela 1 – Evolução do valor total do comércio nacional a retalho de produtos de grande<br />

consumo, período 2002-2008<br />

Anos 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008<br />

Valor do mercado (M €) 8.217,9 8.401,4 8.335,7 8.612,4 9.045,3 9.866,5 10.616,2<br />

Taxa de crescimento anual 2,23% -0,78% 3,32% 5,03% 9,08% 7,60%<br />

GGR 77,4% 76,7% 76,5% 78,5% 79,9% 82,0% 83,5%<br />

Primeiros 2 44,0% 41,7% 39,0% 39,5% 40,9% 41,5% 46,5%<br />

Primeiros 4 61,2% 59,5% 58,1% 59,1% 60,3% 63,1% 66,9%<br />

Outros 16,2% 17,2% 18,3% 19,4% 19,6% 18,9% 16,7%<br />

Outros retalhistas 22,6% 23,3% 23,5% 21,5% 20,1% 18,0% 16,5%<br />

Rácios de quotas<br />

Primeiros 2 GGR / Total dos GGR 0,569 0,544 0,511 0,503 0,512 0,506 0,556<br />

MC / JM Retalho 1,389 1,425 1,388 1,409 1,364 1,314 1,355<br />

IHH GGR 1186 1122 1094 1136 1185 1240 1413<br />

Fonte: Estimativas (preliminares) AdC com base em informação recolhida dos GGR (vide Anexo 1). De salientar<br />

que os “outros retalhistas” incluem o “comércio tradicional” e todos as outras cadeias retalhistas (de âmbito<br />

regional) não consideradas nos GGR.<br />

Gráfico 1 – Importância relativa dos GGR e dos demais retalhistas no comércio nacional a<br />

retalho de produtos da “distribuição alimentar”, no global do mercado e discriminado por<br />

categoria de produtos, nos anos de 2004 e de 2008<br />

100%<br />

90%<br />

80%<br />

70%<br />

60%<br />

50%<br />

40%<br />

30%<br />

20%<br />

10%<br />

0%<br />

Frescos<br />

Mercearia<br />

Frescos + Mercearia<br />

Bebidas não alcoólicas<br />

Bebidas alcoólicas<br />

Total Bebidas<br />

Lácteos<br />

Congelados<br />

Higiene pessoal<br />

Drogaria e Bazar<br />

GGR 2004 Outros 2004 GGR 2008 Outros 2008<br />

Total<br />

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273. Atenta a importância decrescente dos demais retalhistas e o crescimento dos dois<br />

e dos quatro principais GGR desde 2004 – sendo que os dois principais (MC e JM)<br />

representam, em 2008 e no seu conjunto, cerca de 46,5% do comércio nacional<br />

total a retalho – o grau de concentração desta actividade tem vindo a aumentar<br />

para valores acima do limiar de 1800 de uma estrutura concentrada de mercado.<br />

Em especial, no ano de 2008, o Índice de concentração de Herfindahl-Hirschmann<br />

(IHH) 73 atinge os valores mais elevados nas categorias “frescos” (2230), “drogaria<br />

e bazar” (1917) e “higiene pessoal” (1830), para um IHH no global do mercado de<br />

1413, acima dos 1094 do ano de 2004 (vide Gráfico 8 em Anexo 1). Os valores<br />

mais baixos destes IHH verificam-se ao nível das bebidas, sendo de,<br />

respectivamente, 1050 e 854 nas bebidas alcoólicas e não alcoólicas.<br />

3.4. Posicionamento dos GGR nos mercados nacionais<br />

de aprovisionamento<br />

274. No que respeita à procura nos mercados de aprovisionamento, dado dispor-se<br />

apenas de informação relativa aos GGR e a três grossistas (vide supra), o global<br />

do canal grossista e dos “outros canais” – incluindo outras cadeias retalhistas de<br />

dimensão regional (cit.) e o canal HORECA – são extrapolados através desta<br />

informação conjugada com informação anterior da Centromarca, relativa ao<br />

período 2002-2005 (vide Anexo 1 para detalhes). 74<br />

275. Saliente-se que o valor de aquisições relativo ao Grupo JM inclui as aquisições da<br />

sua cadeia grossista Recheio, atento o facto deste grupo – o único GGR que<br />

opera, de igual modo, no segmento grossista – adquirir como um todo no<br />

aprovisionamento, sendo este valor incluído no total de aquisições dos GGR.<br />

276. Esta secção começa por comentar o posicionamento relativo dos GGR nos<br />

mercados de aprovisionamento, bem como a sua evolução no período 2002-2008<br />

(subsecção 3.4.1). Atento o facto da UNIARME integrar todas as cadeias do Grupo<br />

JM, desde 1998, e deste ser o maior agrupamento actual de negociação em<br />

73 Segundo os critérios de concentração do índice de Herfindhal-Hirschmann (IHH), valores deste índice<br />

abaixo dos limiares de 1000-1200 indicam uma estrutura de mercado não concentrada, valores <strong>entre</strong><br />

1200-1800 indicam uma estrutura de mercado com grau moderado de concentração e valores acima de<br />

1800 definem uma estrutura concentrada de mercado, onde a existência de questões de índole jusconcorrencial<br />

é mais verosímil.<br />

74 De qualquer forma, os globais do canal grossista e dos “outros canais” são de difícil quantificação atento,<br />

nomeadamente, o elevado grau de atomização dos operadores que incluem estes canais.<br />

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<strong>Relações</strong> <strong>Comerciais</strong> <strong>entre</strong> a <strong>Grande</strong> <strong>Distribuição</strong> <strong>Agro</strong>-<strong>Alimentar</strong> e os seus Fornecedores (Preliminar)<br />

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Portugal, o cálculo do grau de concentração (IHH) dos GGR nestes mercados<br />

considera a quota de aquisição do total da UNIARME em substituição da quota do<br />

Grupo JM (subsecção 3.4.2).<br />

3.4.1. Posicionamento dos GGR nos mercados nacionais de<br />

aprovisionamento<br />

277. No agregado dos mercados de aprovisionamento aqui em análise, verifica-se,<br />

primeiro, uma ligeira contracção do valor global destes mercados dos anos de<br />

2002 a 2004, de 10.078,7 milhões de euros (M €) em 2002 para 9655,7 M € em<br />

2004 (um decréscimo cumulativo de 4,4%). De 2004 a 2008, este valor global<br />

evidencia, em contrapartida, um forte crescimento – de variação anual sempre<br />

positiva e superior à taxa de inflação –, para 12.128,2 M € em 2008, i.e. um<br />

aumento (nominal) de 25,6% em relação a 2004 (vide Tabela 4 infra).<br />

278. De par com esta evolução, a quota conjunta dos GGR evidencia um forte<br />

crescimento em detrimento dos demais canais de distribuição, i.e. dos grossistas<br />

e dos outros canais. No agregado do mercado de aprovisionamento, o conjunto<br />

dos (9) GGR evolui de 57,1% em 2002 (5754,9 M €) para 72,4% em 2008<br />

(8780,8 M €), i.e. um aumento de, respectivamente, 26,8% e 52,6% da quota e<br />

do valor total de aquisições. Em contrapartida, o canal grossista regride de 21,5%<br />

em 2002 (2166,9 M €) para 11,8% em 2008 (1431,1 M €), i.e. um decréscimo de<br />

34,0% do seu valor total de aquisições. Os demais canais regridem em menor<br />

proporção de 21,4% em 2002 (2156,8 M €) para 15,8% em 2008 (1916,3 M €),<br />

tendo o valor das suas aquisições regredido, assim, de 11,2% de 2002 a 2008<br />

(vide, de igual modo, Gráfico 2 infra).<br />

279. O crescimento dos GGR no aprovisionamento e decréscimo dos demais canais de<br />

distribuição é comum a todas as categorias de produtos, salvo a excepção das<br />

bebidas não alcoólicas, que representam cerca de 9,3% do valor total do<br />

aprovisionamento, em média, no período 2004-2008 (vide Gráfico 3 infra e<br />

Gráfico 9 em Anexo 1).<br />

280. Nas bebidas não alcoólicas, o conjunto dos GGR no aprovisionamento evolui de<br />

45,8% em 2004 (390,9 M €) para 43,3% em 2008 (498,3 M €), à semelhança do<br />

observado no canal grossista, de 15,8% em 2004 (134,8 M €) para 13,0% em<br />

2008 (149,6 M €) – embora este decréscimo de quota esteja associado com um<br />

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aumento do valor total de aquisições destes canais nesta categoria de,<br />

respectivamente, 27,5% e 11,0% –, observando-se, assim, um aumento da quota<br />

dos “outros canais”, de 38,3% em 2004 (326,9 M €) para 43,7% em 2008 (502,9<br />

M €). Em contrapartida, no total das bebidas alcoólicas e não alcoólicas, os GGR<br />

cresceram, de 40,1% em 2004 para 48,9% em 2008, em detrimento do canal<br />

grossista e dos outros canais que regrediram, respectivamente, de 16,4% e<br />

43,5% em 2004 para 12,8% e 38,3% em 2008.<br />

Tabela 2 – Evolução do total do mercado de aprovisionamento de produtos de grande<br />

consumo, período 2002-2008<br />

Anos 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008<br />

Valor do mercado (M €) 10.078,7 9.918,0 9.655,7 10.111,0 10.658,6 11.238,8 12.128,2<br />

Taxa de crescimento anual -1,59% -2,64% 4,72% 5,42% 5,44% 7,91%<br />

GGR 57,1% 60,4% 62,5% 66,0% 68,3% 70,3% 72,4%<br />

Primeiros 2 (%) 36,6% 34,7% 34,7% 37,2% 39,6% 40,9% 45,6%<br />

Primeiros 4 (%) 47,6% 48,2% 49,2% 51,9% 54,0% 56,0% 58,8%<br />

Outros (%) 9,5% 12,2% 13,3% 14,1% 14,3% 14,3% 13,5%<br />

Grossistas 21,5% 19,1% 17,7% 14,9% 13,8% 13,0% 11,8%<br />

Outros canais 21,4% 20,5% 19,8% 19,1% 17,9% 16,7% 15,8%<br />

Rácios de quotas<br />

UNIARME / MC 1,686 1,423 1,342 1,098 1,182 1,217 1,089<br />

UNIARME / GGR 0,531 0,439 0,403 0,317 0,334 0,337 0,336<br />

IHH GGR c/ UNIARME 1402 1216 1162 986 1073 1129 1248<br />

Fonte: Cálculos AdC baseados nos elementos e estimativas detalhados em Anexo 1. “GGR” inclui a cadeia<br />

grossista Recheio do Grupo JM. O remanescente da UNIARME, para além do Grupo JM, integra a categoria<br />

“Grossistas”. Os rácios “UNIARME/MC” e “UNIARME/GGR” reportam-se aos rácios de quotas de aquisição do<br />

total da UNIARME (incluindo o Grupo JM) e, respectivamente, o Grupo MC e o cumulativo de todos os GGR.<br />

Gráfico 2 – Repartição do agregado do mercado do aprovisionamento por tipo de<br />

clientes, GGR, Grossistas e outros canais, anos de 2002 e de 2008<br />

21,5%<br />

21,4%<br />

Ano de 2002<br />

57,1%<br />

GGR Grossistas Outros canais<br />

11,8%<br />

Fonte: Cálculos AdC baseados nos elementos detalhados em Anexo 1.<br />

15,8%<br />

Ano de 2008<br />

72,4%<br />

GGR Grossistas Outros canais<br />

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Gráfico 3 – Importância relativa dos três canais de distribuição no aprovisionamento –<br />

GGR, Grossistas e Outros Canais –, discriminado por categoria de produtos (anos de<br />

2004 e de 2008)<br />

100%<br />

90%<br />

80%<br />

70%<br />

60%<br />

50%<br />

40%<br />

30%<br />

20%<br />

10%<br />

0%<br />

Frescos<br />

Mercearia<br />

Frescos + Mercearia<br />

Bebidas não alcoólicas<br />

Bebidas alcoólicas<br />

Total Bebidas<br />

Lácteos<br />

Congelados<br />

Higiene pessoal<br />

Drogaria e Bazar<br />

GGR 2004 Grosso 2004 Outros 2004 GGR 2008 Grosso 2008 Outros 2008<br />

Fonte: Cálculos AdC baseados nos elementos detalhados em Anexo 1.<br />

281. No que respeita às bebidas, observa-se, assim, que enquanto que os “outros<br />

canais” superam os GGR nas bebidas não alcoólicas em 2008 – em oposição à<br />

situação em 2004 – estes “outros canais” regridem no total das bebidas de uma<br />

posição relativa acima dos GGR em 2004 – respectivamente, de 43,5% contra<br />

40,1% – para uma importância relativa abaixo destes GGR em 2008, de 38,3%<br />

contra 48,9%.<br />

282. Os maiores aumentos de quotas dos GGR de 2004 a 2008 ocorrem nas bebidas<br />

alcoólicas e nos produtos de higiene pessoal, respectivamente, de 36,1% para<br />

54,4% e de 64,7% para 81%.<br />

283. À excepção das bebidas (alcoólicas e não alcoólicas) e dos congelados, os GGR<br />

representam, em 2008, mais de 70% da procura neste mercado, com<br />

percentagens de, respectivamente, 72,4% e 73,1% no agregado do mercado e<br />

nos lácteos e percentagens superiores a 80% nos produtos de “higiene pessoal”<br />

(81,0%), de “frescos e mercearia” (81,6%) e de “drogaria e bazar” (82,5%).<br />

Total<br />

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284. A forte concentração dos GGR no aprovisionamento reflecte-se, de igual forma,<br />

pela importância cumulativa dos dois principais GGR na procura neste mercado –<br />

Grupos JM (Feira Nova, Pingo Doce e Recheio) e MC (Modelo e Continente) – a<br />

qual evolui de 36,6% em 2002 (3688,8 M €) para 45,6% em 2008 (5530,5 M €).<br />

O cumulativo de quotas destes dois GGR atinge inclusive percentagens superiores<br />

a 50% em 2008 nos “frescos e mercearia”, “higiene pessoal” e “drogaria e bazar”,<br />

ficando próximo dos 40% nos lácteos e congelados (vide Gráfico 4 infra).<br />

Gráfico 4 – Cumulativo de quotas dos dois primeiros GGR no aprovisionamento,<br />

discriminado por categoria de produtos e no período 2004-2008<br />

70%<br />

60%<br />

50%<br />

40%<br />

30%<br />

20%<br />

10%<br />

0%<br />

Frescos<br />

Mercearia<br />

Frescos + Mercearia<br />

Bebidas não alcoólicas<br />

Bebidas alcoólicas<br />

Total Bebidas<br />

Lácteos<br />

Congelados<br />

Higiene pessoal<br />

Drogaria e Bazar<br />

2004 2005 2006 2007 2008<br />

Fonte: Cálculos AdC baseados nos elementos detalhados em Anexo 1.<br />

285. O cumulativo de quotas dos 4 primeiros GGR no total do aprovisionamento evolui,<br />

em contrapartida, de quase 50% em 2002 (47,6%) para 58,8% em 2008. 75 A<br />

concentração dos 4 primeiros GGR no aprovisionamento varia consoante a<br />

categoria de produtos (vide Gráfico 10 em Anexo 1), superando os 60% nos<br />

produtos de “frescos e mercearia” (67,4%), “higiene pessoal” (70,7%) e “drogaria<br />

e bazar” (72,6%), e rondando, respectivamente, os 60% e 50% nos “lácteos”<br />

(57,8%) e nos “congelados” (48,7%).<br />

Total<br />

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<strong>Relações</strong> <strong>Comerciais</strong> <strong>entre</strong> a <strong>Grande</strong> <strong>Distribuição</strong> <strong>Agro</strong>-<strong>Alimentar</strong> e os seus Fornecedores (Preliminar)<br />

________________________________________________________________________________________<br />

3.4.2. Uma apreciação preliminar do poder de compra dos GGR<br />

286. Não obstante a forte concentração da procura pelos GGR no aprovisionamento,<br />

tanto no agregado como quando discriminado por categorias de produtos, salvo<br />

os casos das bebidas e dos congelados, o IHH relativo às quotas daqueles GGR no<br />

global do aprovisionamento toma valores abaixo do limiar de 1200 de um<br />

mercado ligeiramente concentrado no período 2007-2008 e valores abaixo do<br />

limiar de 1000, reflectindo uma estrutura não concentrada de mercado, no<br />

período 2002-2008 (vide “IHH GGR” na Tabela 3 infra).<br />

Tabela 3 – Evolução do total do mercado de aprovisionamento de produtos de grande<br />

consumo, período 2002-2008<br />

Anos 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008<br />

Valor do mercado (M €) 10.078,7 9.918,0 9.655,7 10.111,0 10.658,6 11.238,8 12.128,2<br />

Taxa de crescimento anual -1,59% -2,64% 4,72% 5,42% 5,44% 7,91%<br />

GGR 57,1% 60,4% 62,5% 66,0% 68,3% 70,3% 72,4%<br />

Q4 / Q2 1,299 1,388 1,418 1,395 1,366 1,371 1,291<br />

UNIARME + MC 42,4% 43,0% 43,9% 40,0% 42,1% 43,2% 46,7%<br />

Rácios de quotas<br />

UNIARME / MC 1,686 1,423 1,342 1,098 1,182 1,217 1,089<br />

UNIARME / GGR 0,531 0,439 0,403 0,317 0,334 0,337 0,336<br />

IHH GGR 945 819 783 878 964 1024 1195<br />

IHH GGR c/UNIARME 1402 1216 1162 986 1073 1129 1248<br />

IHH GGR c/UNIARME e Interc. 1484 1287 1230 1040 1120 1174 1290<br />

Fonte: Cálculos AdC baseados nos elementos detalhados em Anexo 1. As três primeiras linhas são as<br />

reportadas na Tabela 2 supra. “Q4 / Q2” reporta-se ao rácio de quotas conjuntas <strong>entre</strong> os 4 e os 2 primeiros<br />

GGR. Os rácios “UNIARME/MC” e “UNIARME/GGR” reportam-se aos rácios de quotas no aprovisionamento do<br />

total da UNIARME e, respectivamente, o Grupo MC e o cumulativo dos “GGR”. Os IHH são relativos às quotas<br />

de aquisições dos GGR, destes em conjunto com a UNIARME (em substituição do Grupo JM) e deste último em<br />

conjunto com o agrupamento recente de negociação, a Intercompra, <strong>entre</strong> os Grupos Auchan e Makro, em<br />

substituição do Grupo Auchan.<br />

287. Enquanto que o aumento relativo das quotas dos terceiro e quarto GGR face aos<br />

dois maiores, tal como reflectido pelo aumento do rácio Q4 / Q2 no período 2002-<br />

2004 contribui para um ligeiro recuo do “IHH GGR” naquele período (vide, de<br />

igual modo, Rodrigues, 2006, cit.), esta tendência inverte-se no período 2004-<br />

2008. Neste último período, observa-se um aumento do “IHH GGR” no global do<br />

mercado e em todas as categorias de produtos em análise, salvo a única excepção<br />

das “bebidas não alcoólicas” (vide Gráfico 10 em Anexo 1).<br />

75 Enquanto que os Grupos JM e MC são os dois primeiros compradores em todas as categorias de produtos<br />

e anos considerados, os terceiro e quarto GGR variam consoante o período e categoria em análise. No ano<br />

de 2008 e global do mercado, estes lugares são ocupados, respectivamente, pelos Grupos ITMI e Lidl.<br />

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288. Em particular, nos “frescos”, o “IHH GGR” evolui de 1646 em 2004 para valores<br />

acima do limiar de 1800 de um mercado concentrado a partir de 2005, atingindo<br />

o valor de 2254 em 2008. Na aquisição de produtos de “drogaria e bazar”, o “IHH<br />

GGR” atinge o segundo valor mais elevado em 2008, de 1778, próximo do limiar<br />

de 1800. No global dos produtos de “frescos e mercearia” e de “higiene pessoal”,<br />

aquele IHH supera, de igual modo, o limiar de 1200, atingindo os valores de,<br />

respectivamente, 1567 e 1624 em 2008.<br />

289. Embora este “IHH GGR” reflicta o grau de concentração das aquisições efectivas<br />

dos GGR, o mesmo não quantifica o poder de compra destes grupos naquele<br />

mercado. Para além do facto dos GGR centralizarem as suas compras –<br />

independentemente de operarem em regime de franquia (v.g., os casos dos<br />

Grupos ITMI e E. Leclerc) –, o seu poder de compra traduz-se pela força de<br />

aquisição destes grupos e/ou de eventuais agrupamentos de compra / negociação<br />

que os mesmos possam integrar. No período em análise, apenas o Grupo JM<br />

integra um tal agrupamento de compras / negociação, a UNIARME. Assim, o<br />

poder de compra do Grupo JM deve ser conjugado ao da UNIARME (vide supra).<br />

290. A importância relativa da UNIARME no mercado do aprovisionamento tem,<br />

todavia, vindo a decrescer no período em análise, tal como reflectido, quer pelo<br />

rácio de quotas no aprovisionamento <strong>entre</strong> a UNIARME e o Grupo MC (segundo<br />

operador neste mercado) que evolui de 1,686 em 2002 para 1,089 em 2008, quer<br />

pelo rácio de quotas <strong>entre</strong> a UNIARME e o total de todos os GGR (incluindo o<br />

Grupo JM), que evolui de 0,531 em 2002 para 0,336 em 2008. Acresce que a<br />

UNIARME perde recentemente grande parte dos seus principais associados, a CMC<br />

e grande parte da UNIMARK em 2005 (vide supra), e o grossista Manuel Nunes<br />

em 2007. Com a saída destes associados, a importância do Grupo JM na UNIARME<br />

evolui de cerca de 40-60% (59% em média) para mais de 80%.<br />

291. Assim, a ligeira recuperação de quota da UNIARME, em relação ao Grupo MC e<br />

aos demais GGR de menor dimensão, no período 2006-2007 dever-se-á ao<br />

reforço relativo da quota do Grupo JM face aos demais GGR. A queda de quota da<br />

UNIARME em relação ao Grupo MC no ano de 2008 poderá, por seu turno, estar<br />

relacionada com a expansão deste grupo neste ano, derivada da sua aquisição da<br />

rede de hipermercados Carrefour em Dezembro de 2007 (cit.).<br />

292. Considerando os IHH relativos às aquisições dos GGR, sendo as do Grupo JM<br />

substituídas pelo total da UNIARME, temos que estes “IHH GGR c/UNIARME”<br />

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evoluíram de 1402 em 2002 para 1248 em 2008, ambos acima do limiar de 1200<br />

de um mercado com grau moderado de concentração, mas em ligeira queda. Esta<br />

evolução é semelhante <strong>entre</strong> categorias de produtos, embora os respectivos IHH<br />

superem, por vezes, o limiar de 1800 de um mercado concentrado, nos “frescos”<br />

desde 2004-2005 e na “drogaria e bazar” desde 2008 (vide Gráfico 5 infra).<br />

Gráfico 5 – IHH relativos às quotas no aprovisionamento dos GGR, sendo o Grupo JM<br />

substituído pela UNIARME, discriminados por categoria de produtos (período 2004-2008)<br />

2400<br />

2200<br />

2000<br />

1800<br />

1600<br />

1400<br />

1200<br />

1000<br />

800<br />

600<br />

400<br />

200<br />

0<br />

Frescos<br />

Mercearia<br />

Frescos + Mercearia<br />

Bebidas não alcoólicas<br />

Bebidas alcoólicas<br />

Total Bebidas<br />

Lácteos<br />

Congelados<br />

Higiene pessoal<br />

Drogaria e Bazar<br />

2004 2005 2006 2007 2008<br />

Fonte: Cálculos AdC baseados nos elementos detalhados em Anexo 1.<br />

293. No que respeita ao recente agrupamento de negociação, Intercompra, constituído<br />

<strong>entre</strong> os Grupos Auchan (retalho) e Makro (grossista), no ano de 2009, a última<br />

linha da Tabela 3 supra estima qual teria sido o efeito sobre o grau de<br />

concentração do aprovisionamento nacional no período 2002-2008 caso este<br />

acordo tivesse vigorado durante este período e no pressuposto que o mesmo não<br />

teria alterado as quotas na aquisição daqueles grupos 76 . Observa-se, assim, um<br />

ligeiro aumento do IHH quando considerados os dois agrupamentos de<br />

76 Em princípio, um agrupamento de negociação, tal como o da Intercompra, terá como efeito o aumento de<br />

quotas individuais na aquisição de cada um dos seus associados, sendo este, aliás, o objectivo principal de<br />

um tal acordo. O facto deste acordo ser ainda recente não permite, todavia, averiguar de forma rigorosa<br />

os efeitos que o mesmo terá sobre a estrutura do mercado e/ou a posição individual no mesmo de cada<br />

um dos seus associados.<br />

Total<br />

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negociação, UNIARME e Intercompra, embora o acréscimo de IHH em relação ao<br />

“IHH GGR c/ UNIARME” se atenue no tempo, o que reflecte o decréscimo da quota<br />

conjunta dos Grupos Auchan e Makro na aquisição. 77<br />

3.5. Evolução das margens médias brutas dos GGR<br />

294. No que respeita à evolução das margens médias brutas dos GGR 78 – i.e., da<br />

diferença <strong>entre</strong> os valores de vendas e de compras em percentagem do valor de<br />

vendas – constata-se, em geral, que estas têm vindo a regredir no período em<br />

análise, no global de vendas – de 13,3% em 2004 para 7,1% em 2008 – e<br />

quando discriminadas por categorias de produtos, à excepção dos lácteos (vide<br />

Gráfico 6 infra). Nos lácteos, a margem média bruta dos GGR evoluiu de 9,7% em<br />

2004 para 15,7% em 2008, tendo atingido um máximo em 2007 de 17,5%, após<br />

o mínimo de 1,7% em 2006.<br />

295. Esta evolução das margens médias brutas dos GGR deverá, todavia, ser objecto<br />

de uma análise mais aprofundada no Relatório Final de Julho de 2010, dado que a<br />

mesma pode resultar de outros factores sem alcance jusconcorrencial. De <strong>entre</strong><br />

estes factores, são de salientar: (i) o grau de heterogeneidade <strong>entre</strong> produtos<br />

incluídos nas aqui consideradas categorias de produtos e (ii) o peso que os<br />

produtos de marca do distribuidor (MDD) poderão ter sobre estas margens, sendo<br />

os MDD caracterizados por um custo para o distribuidor inferior ao dos produtos<br />

de marca do fornecedor.<br />

296. Em particular, o efeito potencial dos MDD poder-se-á sentir, nomeadamente, no<br />

caso dos lácteos, onde o leite UHT representa cerca de 40% das vendas totais<br />

destes produtos (vide secção 4.2 infra), mais do que nas demais categorias, onde<br />

existe uma maior heterogeneidade <strong>entre</strong> os produtos ai incluídos.<br />

297. Acresce que, na ausência de uma análise paralela sobre a evolução das margens<br />

das empresas de aprovisionamento, será prematuro concluir por qualquer tipo de<br />

distribuição de rendas <strong>entre</strong> estas empresas e os GGR, incluindo uma eventual<br />

77 No global do aprovisionamento, a quota conjunta dos Grupos Auchan e Makro regrediu de 10,4% em 2004<br />

para 8,6% em 2008, tendo idêntica situação se verificado ao nível individual de cada um destes grupos.<br />

78 De salientar que, embora dispúnhamos de elementos de compra e de venda para os quatro principais<br />

grossistas, estes valores não nos permitem uma estimativa rigorosa das margens médias brutas do canal<br />

grossista em geral, embora estas quatro empresas representem mais de 50% do aprovisionamento total<br />

deste canal. A resposta a esta questão é, todavia, delegada para o Relatório Final de Julho de 2010.<br />

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maior captação de rendas por estes grupos no caso dos lácteos, em contraponto à<br />

elevada concentração do aprovisionamento neste sector, detendo a Lactogal uma<br />

quota superior a 2/3 neste mercado (vide secção 4.2 infra). Remete-se, de igual<br />

forma, esta análise para o Relatório Final de Julho de 2010, bem como uma<br />

comparação com a situação a nível dos vários Estados membros da UE. De<br />

qualquer forma, uma redistribuição de rendas não constitui per se um ilícito<br />

jusconcorrencial.<br />

Gráfico 6 – Evolução das margens médias brutas na venda a retalho, em percentagem do<br />

valor global destas vendas no agregado dos GGR, discriminadas por categorias de<br />

produtos e no período 2004-2008<br />

25%<br />

20%<br />

15%<br />

10%<br />

5%<br />

0%<br />

Frescos<br />

Mercearia<br />

Frescos + Mercearia<br />

Bebidas não alcoólicas<br />

Bebidas alcoólicas<br />

Total Bebidas<br />

Lácteos<br />

Congelados<br />

Higiene pessoal<br />

Drogaria e Bazar<br />

2004 2005 2006 2007 2008<br />

Total<br />

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4. Uma análise dos sectores nacionais do leite<br />

UHT, arroz e massas alimentícias<br />

298. A análise do capitulo anterior permite o enquadramento genérico do<br />

posicionamento (nacional) dos GGR no global das vendas a retalho e na procura<br />

em diversos mercados de aprovisionamento. O grau de concentração destes<br />

grupos e, em especial, o seu poder de compra face ao poder de venda dos<br />

fornecedores podem, todavia, diferir consoante o produto em causa.<br />

299. Sem prejuízo da natureza multi-serviços / multi-produtos da actividade dos GGR,<br />

no que respeita às relações comerciais <strong>entre</strong> estes grupos e os seus fornecedores<br />

nos mercados de aprovisionamento, o mercado relevante do produto para efeitos<br />

de apreciação jusconcorrencial de certos tipos de práticas poderá ter de ser<br />

definido ao nível de um determinado produto, i.e. a um nível mais fino do que o<br />

das categorias de produtos consideradas no capitulo anterior.<br />

300. Em particular, à semelhança do que aconteceu em diversos mercados<br />

internacionais de produtos base (“commodities”) – incluindo os sectores do<br />

petróleo e derivados –, os preços internacionais e europeus na produção nos<br />

sectores lácteo e cerealífero foram afectados por um forte pico de volatilidade no<br />

biénio recente de 2007-2008, tendo fortemente aumentado do segundo semestre<br />

de 2006 para máximos históricos no final de 2007 e regredido desde essa data.<br />

301. Embora a forte subida destes preços, do segundo semestre de 2006 até ao final<br />

do ano de 2007, tenha incentivado as respectivas produções e de forma algo<br />

contra-cíclica face à crise económica da data, a sua forte queda, que se observou<br />

de forma compensatória no ano de 2008, em muito agravou aqueles incentivos,<br />

acentuando os efeitos da crise económica e do pessimismo gerado pela nova<br />

reforma da PAC.<br />

302. O impacto que a forte queda destes preços tem no rendimento agrícola e nos<br />

respectivos incentivos à produção levaram à promoção de diversos estudos a nível<br />

Comunitário, de forma a equacionar um conjunto de soluções, que se<br />

compaginem com o conjunto de reformas em curso no âmbito da PAC. 79<br />

79<br />

V.g. Comunicação CE sobre o “Melhor funcionamento da cadeia de abastecimento alimentar na Europa”<br />

(cit.).<br />

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303. Assim, o presente Relatório Preliminar pretende facultar uma primeira visão sobre<br />

a situação nacional actual ao nível das relações <strong>entre</strong> os GGR e os seus<br />

fornecedores no âmbito de três sectores influenciados, quer por aquela evolução,<br />

quer pela PAC, e que se compaginam com as análises ora em curso ao nível<br />

Comunitário, a saber o leite UHT – que representa cerca de 40% das vendas<br />

nacionais de produtos lácteos –, o arroz e as massas alimentícias.<br />

304. A escolha destes três produtos justifica-se, de igual modo, pela importante<br />

destrinça existente <strong>entre</strong> as suas cadeias de valor ao nível nacional e a influência<br />

potencial que o eventual poder de compra dos GGR poderá ter sobre as mesmas.<br />

Primeiro, enquanto que Portugal é auto-suficiente em leite cru, matéria-prima<br />

para a produção láctea, e cerca de 60% do arroz para transformação é de origem<br />

doméstica, a maioria do trigo duro para fabrico de massas alimentícias é de<br />

origem externa (intracomunitária). Segundo, embora o mercado nacional de<br />

venda de arroz à GDA seja caracterizado por alguma concentração, com IHH<br />

próximos do limiar de 1800 de um mercado concentrado, mais de 70% de cada<br />

um dos mercados de aprovisionamento de leite UHT e de massas alimentícias é<br />

controlado por uma única empresa, exibindo ambos IHH superiores a 5000.<br />

305. Assim, enquanto que nos casos do leite UHT e do arroz, o eventual poder de<br />

compra da GGR poderá influenciar a determinação dos preços na produção<br />

nacional, o mesmo não acontece ao nível do trigo duro atenta a sua natureza<br />

externa. Por seu turno, será a priori mais verosímil que o poder de compra dos<br />

GGR tenha uma maior influência sobre os preços no aprovisionamento e, por esta<br />

via, na produção no caso do arroz do que nos casos do leite UHT e das massas,<br />

onde a indústria transformadora é fortemente concentrada.<br />

306. Esta primeira análise caracteriza, de forma preliminar, a cadeia de valor específica<br />

a cada um destes sectores, da produção à indústria transformadora e da relação<br />

<strong>entre</strong> esta, enquanto fornecedora, e a GDA, incluindo os GGR, bem como o grau<br />

de concentração de cada uma destas actividades, incluindo o da procura pelos<br />

GGR no aprovisionamento. Todavia, o devido enquadramento <strong>entre</strong> as<br />

caracterizações destes sectores e os conceitos económicos de “dependência<br />

económica” de alguns fornecedores face aos GGR e de existência ou não de um<br />

“poder de compra” destes GGR é delegado para uma análise mais aprofundada no<br />

âmbito do Relatório Final de Julho de 2010 (vide, de igual modo, capítulo 6 infra).<br />

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307. Esta análise aprofundada, a ser concluída em Julho de 2010 debruçar-se-á, de<br />

igual modo, sobre um cabaz mais diversificado de produtos para além dos aqui<br />

em análise, incluindo outros produtos lácteos (iogurtes, queijos e manteigas),<br />

cafés e sucedâneos, conservas e enlatados, farinhas lácteas e de uso culinário,<br />

cereais de pequeno-almoço, bolachas, produtos de gordura vegetal (óleos, azeites<br />

e margarinas), pescado fresco e bacalhau, frutas e legumes, ovos, aves e carne<br />

fresca, bem como bebidas não alcoólicas de alta rotação.<br />

308. O presente capítulo é organizado do seguinte modo. Primeiro, atento o carácter<br />

preliminar da presente análise, começaremos por salientar um conjunto de<br />

ressalvas relativas à mesma (secção 4.1). De seguida, descreve-se o<br />

enquadramento geral dos sectores em análise (secção 4.2) e analisa-se os casos<br />

do leite UHT (secção 4.3) e do arroz e das massas alimentícias (secção 4.4). O<br />

capítulo é concluído por alguns comentários finais preliminares (secção 4.5).<br />

4.1. Ressalvas quanto à análise preliminar<br />

309. Primeiro, os elementos estatísticos que servem de base a esta análise,<br />

desagregados pelas empresas abrangidas, não podem ser divulgados por motivos<br />

de confidencialidade relativos aos pedidos de elementos efectuados pela AdC no<br />

âmbito da elaboração do presente Relatório. Assim, a informação estatística infra<br />

é de natureza agregada e não passível de poder inferir qualquer tipo de elementos<br />

específicos a uma determinada empresa.<br />

310. A referência, na presente secção, a “grau de dependência” e/ou à<br />

representatividade dos GGR na procura reporta-se à percentagem do valor de<br />

vendas de um fornecedor afecto a um ou a vários GGR, não podendo esta medida<br />

ser confundida com o conceito de “dependência económica”. Aliás, não existe uma<br />

medida exacta a partir de que grau de representatividade das suas vendas face a<br />

um determinado cliente, in casu GGR, pode um determinado fornecedor ser<br />

legalmente qualificado no estado de “dependência económica”, tal como tipificado<br />

no artigo 7.º na lei nacional da concorrência (vide, de igual modo, Anexo 2 infra),.<br />

311. Em paralelo, atento o seu carácter preliminar, não pode ainda a presente análise<br />

pronunciar-se sobre a eventual existência de poder de compra dos GGR, quer nos<br />

sectores aqui em análise, quer nas categorias de produtos analisadas no capítulo<br />

anterior. Todavia, conforme supra referido (capítulo 3), nos sectores com<br />

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produção de origem nacional e onde o poder de compra dos GGR prevaleça sobre<br />

o poder de mercado (“selling power”) dos fornecedores, poderá ser expectável<br />

que sejam os GGR e não os produtores e/ou fornecedores que determinem os<br />

preços na produção, sem que tal facto consubstancie per se um ilícito<br />

jusconcorrencial.<br />

4.2. Enquadramento geral dos sectores nacionais do<br />

leite UHT, arroz e massas alimentícias<br />

312. Segundo a CE, 80 a forte volatilidade dos preços europeus na produção nos<br />

sectores lácteo e cerealífero deve-se a um conjunto de diversos factores, <strong>entre</strong> os<br />

quais se incluem o aumento da procura europeia e internacional destes produtos<br />

em paralelo com restrições do lado da oferta na UE nos anos de 2006 e de 2007,<br />

que reduziram de forma considerável os stocks europeus destes produtos.<br />

Também o aumento dos custos de transporte marítimo e das cotações energéticas<br />

(petróleo e derivados), conjugadas com a relativa fraqueza do dólar americano,<br />

poderão ter, em parte, contribuído para uma maior volatilidade dos preços destes<br />

produtos no biénio 2007-2008.<br />

313. O leite e os cereais são de elevada importância em toda a cadeia de<br />

abastecimento alimentar. Em particular, enquanto que o trigo é utilizado, em<br />

conjunto com outros cereais no fabrico de rações para animais, importante para o<br />

sector lácteo, o trigo mole é o principal cereal utilizado no fabrico de farinhas para<br />

alimentação humana, bem como para panificação e produtos de pastelaria em<br />

geral enquanto que o trigo duro é o principal cereal para o fabrico de massas<br />

alimentícias.<br />

314. Aos níveis nacional e Comunitário, os sectores do leite, arroz e das massas<br />

alimentícias (provenientes do trigo duro) são, à semelhança de outros sectores<br />

agro-alimentares na UE, fortemente influenciados pelas regras estabelecidas no<br />

âmbito da PAC.<br />

315. A PAC estabelece preços de garantia para os agricultores, controla as áreas para a<br />

sua produção (set-aside) e cobra direitos aduaneiros às importações. Os preços<br />

de intervenção estabelecidos pela PAC têm mostrado uma tendência decrescente<br />

80 Cf. Comunicação CE “Melhor funcionamento da cadeia de abastecimento alimentar na Europa” (cit.).<br />

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nos últimos anos, fruto da redução do orçamento da PAC, sendo previsto o seu<br />

termo, bem como das respectivas quotas na produção, até 2013.<br />

316. Em particular, a Reforma da PAC de 2000 no sector cerealífero estabeleceu uma<br />

redução de 15%, a ocorrer em dois anos (2001-2002), dos preços de intervenção,<br />

que viria a ser fixada em 3% em 2005, 4% em 2006 e 5% a partir de 2007 na<br />

Reforma da PAC de 2003. 81 Também, no caso do leite, os preços de intervenção<br />

da PAC têm vindo a diminuir de forma considerável. 82<br />

317. Em resultado da PAC, o sector nacional tem vindo a especializar-se na produção<br />

de arroz em detrimento de outros cereais, tal como o trigo (mole e duro). Por seu<br />

turno, o sector nacional é auto-suficiente em leite cru para a produção láctea.<br />

318. Segundo o Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas<br />

(MADRP) 83 , da proposta de reforma em curso da PAC é esperada uma redução<br />

significativa da produção nacional de leite cru, de arroz e de trigo duro. No que<br />

respeita ao trigo, está apenas a ser equacionada a eventual manutenção das<br />

quotas e preços de intervenção actuais ao nível do trigo mole, utilizado na<br />

panificação e nos produtos de pastelaria em geral.<br />

319. A produção agro-alimentar nacional é, em geral, caracterizada por sistemas<br />

fortemente atomizados, embora por vezes dominados por estruturas<br />

cooperativistas, tal como no caso dos lácteos. Em particular, a recolha de leite cru<br />

em território nacional é assegurada por um número limitado de grandes<br />

cooperativas (caso da Serraleite na região do Alentejo) ou uniões de cooperativas<br />

(caso da Lactogal no Centro e Norte do Continente, bem como na RAA), sendo<br />

estas, em geral, integradas mais a jusante na indústria transformadora.<br />

81 V.g., Culturas Arvenses: Diagnóstico Sectorial, Ministério da Agricultura (cit.) e Evolução da Politica<br />

Agrícola Comum (PAC) no Sector dos Cereais, CONFAGRI, 02.07.2008 (cit.). Consta, todavia, deste último<br />

documento que uma das propostas para a futura da PAC é a da manutenção dos preços de intervenção<br />

apenas no caso do trigo mole.<br />

82 Cf. Comunicação da Comissão ao Conselho: Situação do mercado do leite e dos produtos lácteos – 2009,<br />

COM(2009) 385 Final, de 22.07.2009, Gráficos pp. 4 e 5.<br />

83 Cf. Leite e Lacticínios: Diagnóstico Sectorial, Gabinete de Planeamento e Politicas do MADRP, 2007.<br />

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4.3. Sector lácteo e leite UHT<br />

4.3.1. Caracterização do sector lácteo nacional 84<br />

320. Segundo a ANIL (Associação Nacional dos Industriais de Lacticínios), Portugal é<br />

auto-suficiente no aprovisionamento de matéria-prima (leite cru), embora esta<br />

auto-suficiência possa vir a ser comprometida em resultado da proposta de<br />

reforma da PAC até 2013 (cit.), caso os preços nacionais na produção de leite<br />

percam em competitividade face a outros Estados Membros em resultado do<br />

termo dos preços de intervenção estabelecidos no âmbito da PAC.<br />

321. Todavia, a crise no sector dos lacticínios ao nível da UE (cit.) gerou diversas<br />

discussões aos níveis Comunitários e de diversos Estados Membros no sentido de<br />

aligeirar os efeitos da crise no sector através de auxílios de Estado. Uma análise<br />

detalhada de propostas neste sentido consta, em particular, das conclusões<br />

recentes da CE relativas ao “Melhor funcionamento da cadeia de abastecimento<br />

alimentar na Europa” (cit.) 85 .<br />

4.3.1.1. Produção primária de produtos lácteos<br />

322. Segundo o MADRP, a produção nacional de leite cru é caracterizada por uma<br />

estrutura fundiária atomizada, embora a dimensão das explorações tenha<br />

aumentado desde meados da década de 1990, em resultado de uma redução do<br />

seu número, nomeadamente, das de menor dimensão e de uma maior<br />

concentração destas explorações na proximidade da indústria transformadora<br />

(Norte, Centro, Alentejo e RAA).<br />

323. <strong>Grande</strong> parte da produção nacional de leite cru é, conforme supra referido,<br />

organizada em cooperativas, sendo a maioria destas cooperativas integradas mais<br />

a jusante na indústria transformadora. Em particular, este facto confere a esta<br />

industria um poder de influência sobre os preços na produção.<br />

84 O referido nesta subsecção, bem como na secção 4.4 infra, provém, nomeadamente, de informação da<br />

ANIL (Associação Nacional dos Industriais de Lacticínios) – v.g. Comunicado da ANIL, Audiência com o<br />

Exmo. Sr. Secretário do Estado do Comércio, dos Serviços e da Defesa do Consumidor, Lisboa,<br />

11.07.2008, bem como Newsletters da ANIL (http://anilact.pt/content/view/60/100/) – e do MADRP (cf.<br />

Leite e Lacticínios: Diagnóstico Sectorial, Gabinete de Planeamento e Politicas do MADRP, 2007).<br />

85 Vide também o Comunicado CE relativo à distribuição de um auxilio adicional de 300 M € para a produção<br />

láctea na UE, cabendo 4,08 M € a Portugal (em http://ec.europa.eu/agriculture/newsroom/en/373.htm).<br />

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324. As quatro maiores uniões de cooperativas nacionais de produtores integram a<br />

FENALAC (Federação Nacional das Cooperativas de Produtores de Leite) 86 , a saber<br />

a <strong>Agro</strong>s, Proleite, Lacticoop e Serraleite. As três primeiras (<strong>Agro</strong>s, Lacticoop e<br />

Proleite) 87 constituíram, por fusão, a Lactogal (Lactogal – Produtos <strong>Alimentar</strong>es,<br />

SA), em 1996, sendo as suas accionistas desde essa data. A Lactogal é, segundo<br />

informação do MADRP, responsável por cerca de 2/3 da recolha de leite em<br />

território nacional (Norte, Centro e RAA), sendo a Serraleite 88 , segundo<br />

nformação da própria, a principal responsável pela recolha de leite na região do<br />

Alentejo. 89<br />

325. A Lactogal e a Serraleite, operam, de igual modo, na indústria transformadora,<br />

sendo esta representada pela ANIL. Segundo a FENALAC, os cerca de 8000<br />

produtores que esta federação reagrupa representam<br />

nacional (Continente e RAA) de produção de leite cru.<br />

cerca de 75% do total<br />

326. No período 2000-2005, embora se tenha assistido na UE15 a uma redução do<br />

número de vacas leiteiras 90 , de 7% em Portugal (de 355 mil em 2000 para 330<br />

mil em 2005) contra 11% na UE15, e de explorações, de 38% em Portugal (de<br />

23,9 mil em 2000 para 14,7 mil em 2005) contra 9% na UE15, o volume (em<br />

milhares de ton) de produção de leite em Portugal aumentou no mesmo período<br />

em 1,9%, de 2060 no ano de 2000 para 2100 em 2005. A este aumento está<br />

associado um aumento da produtividade bovina, de 9% em Portugal (de 5787 ton<br />

de leite/vaca em 2000 para 6287 ton/vaca em 2005) contra 12% na UE15, bem<br />

como da produtividade por exploração, de 59% em Portugal (de 79<br />

ton/exploração em 2000 para 126 ton/exploração em 2005) contra 10% na UE15.<br />

327. Salientar-se-á, de igual modo, que o rendimento líquido bovino se situa, em<br />

média, nos 29% do rendimento total por animal. Os custos bovinos são,<br />

86 Cf. http://www.fenalac.pt/#/a-fenalac/.<br />

87 Formalmente, estas uniões de cooperativas são designadas por: AGROS – União das Cooperativas de<br />

Produtores de Leite de Entre Douro e Minho e Trás-os-Montes, UCRL, LACTICOOP – União das<br />

Cooperativas de Produtores de Leite de Entre Douro e Mondego, UCRL e PROLEITE / MIMOSA, SA (cf.<br />

http://www.lactogal.pt/presentationlayer/Home _00.aspx).<br />

88<br />

SERRALEITE – Cooperativa Agrícola dos Produtores de Leite de Portalegre, CRL (http://<br />

www.serraleite.pt/quem_somos.htm).<br />

89 No biénio 2005-2006, a produção nacional de leite está repartida <strong>entre</strong> as regiões de: Entre-Douro-e-<br />

Minho (35%), RAA (27%), Beira Litoral (14%), Ribatejo (10%), Alentejo (7%), Trás-os-Montes (4%),<br />

Beira Interior (3%) e Algarve (


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maioritariamente, devidos à alimentação (51,6% do custo total) e a juros e<br />

amortizações (32,9% do custo total). Assim, a evolução das taxas de juro e dos<br />

preços dos cereais utilizados para fabrico de rações para animais, terá um<br />

impacto não negligenciável na evolução dos custos no sector lácteo.<br />

4.3.1.2. Indústria transformadora de produtos lácteos<br />

328. Segundo o MADRP, a produção láctea (de leite e de derivados) representava no<br />

biénio 2005-2006 cerca de 11% (1200<br />

M €) do total de VABpm gerado pela<br />

indústria agro-alimentar e de bebidas.<br />

329. Em comparação, na UE como um todo, mais de um milhão de produtores escoam,<br />

actualmente, cerca de 48 M de tons de leite por ano, com um valor aproximado<br />

de 41 mil M € à saída da exploração. Por outro lado, a produção láctea na UE gera<br />

um VABpm de cerca de 120 mil M € anualmente. Note-se, igualmente, que a UE é<br />

o maior produtor mundial de leite com cerca de 27% da produção<br />

mundial,<br />

seguido da Índia com cerca de 20% e dos EUA com cerca de 16% 91 .<br />

330. Nesta indústria (transformadora de leite cru), operam em território nacional<br />

empresas nacionais e grandes multinacionais, sendo o seu consumo de leite cru,<br />

maioritariamente, de origem nacional (Continente e RAA).<br />

331. Os principais produtores de leite UHT em Portugal são: a Lactogal (insígnias<br />

<strong>Agro</strong>s, Gresso, Matinal, Mimosa e Vigor), Parmalat<br />

(Parmalat e Ucal), Fromageries<br />

92<br />

BEL (Terra Nostra) e a Serraleite (Serraleite).<br />

332. Nos demais produtos lácteos, são de destacar, nas manteigas: a Lactogal<br />

(Milhafre, Mimosa e Primor), Parmalat (Ucal), Fromageries BEL<br />

queijos: a Fromageries BEL (Limiano), Lactogal e Queijo Saloio.<br />

(Loreto); e nos<br />

333. Enquanto que a Lactogal e a Serraleite são as principais responsáveis pela recolha<br />

de leite em território nacional (vide supra), a Fromageries BEL é o principal<br />

operador na recolha de leite na RAA. A Lactogal é líder no sector lácteo em<br />

Portugal, detendo uma quota na produção e na revenda de produtos lácteos<br />

91 Dados da International Dairy Federation, “Production of cow milk”, 2007, http://www.fil-icif.org.<br />

92 A Fromageries BEL integra o Grupo francês BEL (http://www.groupe-bel.com/bebel/fr/accueil.html).<br />

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superior a 2/3. Esta liderança é apenas contraposta no segmento dos queijos, o<br />

qual é liderado pela Fromageries BEL, em especial, através dos queijos Limiano. 93<br />

334. <strong>Grande</strong> parte do leite cru (47%) é destinado à produção de leite UHT, o qual<br />

representa cerca de 77% do volume total de produção nacional de produtos<br />

lácteos frescos. Dos demais produtos lácteos de origem doméstica, são de<br />

destacar: (i) os iogurtes, que consomem cerca de 5,5% do total nacional de leite<br />

cru e representam cerca de 9% do volume nacional total de produtos lácteos<br />

frescos; (ii) os queijos, que consomem cerca de 3,5% do total nacional de leite<br />

cru e representam cerca de 50% do volume nacional total de produtos lácteos<br />

transformados; e (iii) as manteigas, que consomem cerca de 1,5% do total<br />

nacional de leite cru e representam cerca de 20% do volume nacional total de<br />

produtos lácteos frescos (vide Tabela 4 infra).<br />

Tabela 4 – Principais produtos lácteos de fabrico nacional<br />

2005 2006 2007*<br />

Ton. % Ton. % Ton. %<br />

1. Leite cru 1.954.432 100% 1.889.547 100% 1.871.643 100%<br />

De vaca 1.920.643 98,3% 1.850.836 98,0% 1.836.543 98,1%<br />

2. Produtos frescos 1.164.527 59,6% 1.169.864 61,9% 1.141.676 61,0%<br />

Leite para consumo 958.988 49,1% 962.927 51,0% 917.812 49,0%<br />

Leite cru 17 0,0% 57 0,0% 39 0,0%<br />

Leite UHT 930.322 47,6% 919.524 48,7% 883.912 47,2%<br />

Outros leites 28.649 1,5% 43.346 2,3% 33.861 1,8%<br />

Natas 17.167 0,9% 17.382 0,9% 17.367 0,9%<br />

Iogurtes 101.671 5,2% 105.986 5,6% 108.109 5,8%<br />

Bebidas lácteas 62.828 3,2% 68.780 3,6% 74.037 4,0%<br />

Outros lácteos frescos 23.873 1,2% 24.789 1,3% 24.360 1,3%<br />

3. Produtos transformados 130.882 6,7% 141.451 7,5% 139.529 7,5%<br />

Leite em pó 16.216 0,8% 16.421 0,9% 14.418 0,8%<br />

Manteiga 26.971 1,4% 28.694 1,5% 27.695 1,5%<br />

Queijos 66.282 3,4% 66.244 3,5% 69.269 3,7%<br />

Soro de leite 22.413 1,1% 30.091 1,6% 28.146 1,5%<br />

Fonte: MADRP e INE (Instituto Nacional de Estatística). Os valores relativos ao ano de 2007 referem-se a<br />

estimativas.<br />

335. Todavia, dado que o sector nacional é deficitário em iogurtes e queijos, sendo<br />

excedentário em leites e em manteigas, estas percentagens não correspondem à<br />

importância relativa destes produtos nas vendas nacionais totais (em €) de<br />

produtos lácteos (vide Gráfico 7 infra).<br />

93 De salientar que operam, de igual modo, no sector lácteo nacional, outras grandes multinacionais tais<br />

como a Nestlé (leite em pó) e a Milupa (leites infantis). Realçar-se-á ainda o facto da Lactogal e a<br />

Parmalat operarem, em paralelo, no sector dos sumos e néctares.<br />

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336. Segundo informação do MADRP, enquanto que o sector nacional é excedentário<br />

em leite cru, ao nível dos produtos lácteos finais, esta capacidade excedentária<br />

verifica-se apenas nos produtos de menor valor acrescentado (leite, natas e<br />

manteiga), sendo o sector nacional deficitário nos produtos de maior valor<br />

acrescentado (“iogurtes & quefir” e “queijos & requeijão”). O principal destino das<br />

saídas é o espaço UE, com excepção dos queijos onde existe alguma colocação<br />

em Angola e nos EUA.<br />

337. Ao nível do consumo per capita e no cômputo geral do período 2000-2006,<br />

verificou-se uma relativa estagnação no consumo nacional de leite e queijos e um<br />

ligeiro aumento do consumo de manteigas. Segundo estatísticas do INE relativas<br />

às despesas das famílias no ano de 2005, 94 o consumo de leites UHT (magro,<br />

meio gordo e gordo) representava nesse ano cerca de, respectivamente, 4,6% e<br />

32,7% do consumo nacional total de produtos alimentares e de produtos lácteos,<br />

i.e. da rubrica “leite, queijo e ovos” (vide Tabela 5 infra).<br />

Gráfico 7 – Repartição do total nacional de vendas (em €) de lacticínios em 2007<br />

Queijos<br />

21,9%<br />

Iogurtes<br />

22,9%<br />

Nata<br />

3,2%<br />

Gelados<br />

2,8%<br />

Fonte: Inquérito Anual à Produção Industrial, INE, 2007.<br />

Manteiga<br />

6,9%<br />

Leite em pó<br />

1,8%<br />

Leite UHT<br />

40,5%<br />

94<br />

De notar que estes inquéritos do INE são quinquenais, de onde o próximo inquérito será efectuado apenas<br />

em 2010.<br />

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Tabela 5 – Importância dos principais produtos lácteos nas despesas das famílias,<br />

inquérito do INE relativo ao ano de 2005<br />

Categoria<br />

Total de<br />

produtos lácteos<br />

("leite, queijo e<br />

ovos")<br />

Total de<br />

"Produtos<br />

<strong>Alimentar</strong>es"<br />

Leites UHT 32,7% 4,6%<br />

Iogurte s, Leites<br />

Fementados e Similares<br />

28,8% 4,0%<br />

Queijo 25,7% 3,6%<br />

Outros Produtos Lácteos 5,6% 0,8%<br />

Manteiga 3,8% 0,5%<br />

Fonte: Cálculo AdC com base em informação facultada pelo INE.<br />

338. Dado que o total de “Produtos <strong>Alimentar</strong>es” representa, segundo as mesmas<br />

estatísticas, cerca de 14,8% do total de despesas de consumo (em 2005), o<br />

consumo de leites UHT representa, assim, cerca de 0,7% do total de despesas de<br />

consumo. Em contrapartida, os “iogurtes, leites fermentados e similares” e os<br />

“queijos” representam, respectivamente, 0,6% e 0,5% do total de despesas de<br />

consumo. Estas percentagens em muito excedem os 0,1% que o arroz e as<br />

massas alimentícias representam no total de despesas de consumo (vide infra).<br />

4.3.2. Representatividade da procura dos GGR em leite UHT<br />

339. Dos elementos apurados relativos aos principais fornecedores de produtos lácteos<br />

no mercado nacional, verifica-se que no global de vendas de leite UHT relativo ao<br />

ano de 2008, cerca de 60% é escoado para os GGR, sendo cerca de 15%<br />

exportado e cerca de 4% destinado ao canal HORECA (vide Tabela 6 infra).<br />

Enquanto que no período 2004-2008, esta última percentagem se manteve<br />

estável, verificou-se um ligeiro aumento das exportações – de cerca de 10% em<br />

2005 para cerca de 15% em 2008 – em detrimento das vendas aos GGR. O<br />

remanescente de cerca de 21% de vendas de leite UHT é destinado aos demais<br />

clientes do aprovisionamento, incluindo o canal grossista.<br />

340. De igual modo se constata que do total de vendas de leite UHT dos principais<br />

fornecedores aos GGR, cerca de 50% são destinados, de forma quase equitativa,<br />

aos dois principais GGR. Assim, estes GGR adquirem, no seu conjunto, cerca de<br />

30% do valor total do aprovisionamento nacional em leite UHT.<br />

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341. Embora cerca de 60% do total de vendas de leite UHT se destinem aos GGR no<br />

ano de 2008, no global do volume de negócios (VN) destes fornecedores – o qual<br />

inclui a venda de outros produtos lácteos – aquelas vendas de leite UHT afectas<br />

aos GGR representam 25%. Percentagem esta que contrasta com 30% no ano de<br />

2005. Assim, no agregado dos fornecedores considerados, o total de vendas de<br />

leite UHT representou, em 2008, cerca de 41,5% do VN destas empresas (vide<br />

Gráfico 7 supra).<br />

342. Resulta, assim, como primeira ilação desta análise que, sem prejuízo de um<br />

ligeiro aumento das exportações de leite UHT pelos principais fornecedores de<br />

produtos lácteos e atenta a importância do leite UHT no global de vendas dos<br />

produtos lácteos, a forte importância que revestem os GGR nas aquisições totais<br />

de leite UHT no mercado nacional poder-lhes-á conferir um poder de compra não<br />

negligenciável neste produto, sendo este poder potencialmente acrescido pela<br />

possibilidade destes grupos recorrerem à importação deste produto.<br />

Tabela 6 – Importância dos GGR no valor total de compras em território nacional de leite<br />

UHT, em % dos valores de vendas no global deste produto e do VN dos fornecedores<br />

2004 2005 2006 2007 2008<br />

Em termos do global de vendas de leite UHT<br />

GGR n.d. 66,1% 68,8% 66,4% 60,7%<br />

HORECA n.d. 4,0% 4,0% 3,6% 4,6%<br />

Outros canais n.d. 19,6% 16,9% 17,2% 19,7%<br />

Exportações n.d. 10,3% 10,2% 12,8% 15,0%<br />

Maior GGR n.d. 14,0% 15,8% 13,7% 15,9%<br />

Dois maiores GGR<br />

Em termos do VN<br />

n.d. 27,0% 30,0% 25,9% 29,0%<br />

GGR n.d. 29,3% 31,3% 30,7% 24,9%<br />

Maior GGR n.d. 6,2% 7,2% 6,3% 6,5%<br />

Dois maiores GGR n.d. 12,0% 13,6% 12,0% 11,9%<br />

Mercado do aprovisionamento<br />

Importações n.d. 12,6% 13,0% 13,0% 9,9%<br />

IHH n.d. 6490 6521 6425 7034<br />

Fonte: Cálculo AdC com base em elementos confidenciais recolhidos no âmbito do Estudo. A indisponibilidade<br />

de informação para o ano de 2004 justifica-se pelo facto desta não ter sido fornecida pela integralidade das<br />

empresas abrangidas pelo Estudo.<br />

343. Também não é menos negligenciável o facto de existir um elevado grau de<br />

concentração nas vendas de leite UHT no mercado nacional. Em consistência com<br />

a supra referida informação do MADRP, na amostra de (21) fornecedores<br />

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considerada no presente Relatório AdC, a Lactogal dispõe de uma quota superior a<br />

2/3 do total de vendas de leite UHT no mercado nacional, constatando-se, ainda,<br />

que nenhuma outra empresa atinge os 10% de quota.<br />

344. Nesta amostra do aprovisionamento nacional de leite UHT, o IHH relativo às<br />

vendas deste produto neste mercado supera valores na ordem dos 5400, bastante<br />

acima do limiar de 1800 de um mercado concentrado. Todavia, este grau de<br />

concentração tem mostrado alguma tendência decrescente no período 2004-2008<br />

com um ligeiro aumento do recurso à importação, de cerca de 12% em 2004 para<br />

cerca de 17% em 2008.<br />

345. No mesmo sentido se verifica que o valor total de aquisições de leite UHT pelos<br />

dois principais GGR representa cerca de 12% do VN dos fornecedores aqui<br />

considerados, sendo esta percentagem repartida de forma quase equitativa <strong>entre</strong><br />

estes dois GGR.<br />

4.3.3. Influência dos GGR na determinação dos preços na produção<br />

nacional de leite cru<br />

346. Resulta da análise supra que a representatividade dos GGR na procura de leite<br />

UHT, na ordem dos 60% em 2008, poderia a priori ser mitigado: (i) por o que as<br />

vendas de leite UHT destas empresas representam no seu VN e (ii) pelo elevado<br />

grau de concentração no mercado nacional de aprovisionamento deste produto.<br />

347. Todavia, a verosimilhança que aquele “grau de dependência” se estenda, de<br />

forma análoga, a outros produtos lácteos (v.g., iogurtes, queijos e manteigas) 95 ,<br />

poderá reduzir o impacto que o VN tem sobre o “grau de dependência” especifico<br />

a um determinado produto, concedendo a priori um maior poder aos GGR em<br />

influenciar os preços na produção nacional de leite cru, através do processo<br />

negocial <strong>entre</strong> estes grupos e a indústria transformadora (fornecedora).<br />

348. Não obstante o peso que os GGR representam no total de compras de leite UHT,<br />

este está repartido <strong>entre</strong> os GGR de uma forma pouco concentrada. Embora cerca<br />

de 60% e 30% das vendas de leite UHT no aprovisionamento relativo ao ano de<br />

2008 estejam condicionadas ao conjunto dos nove GGR e dos dois principais GGR,<br />

respectivamente, o IHH relativo ao peso dos GGR no aprovisionamento em<br />

95<br />

Conforme supra referido estes outros produtos lácteos integram a análise esperada para o Relatório Final<br />

de Julho de 2010.<br />

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produtos lácteos atinge, no período 2004-2008, valores abaixo de 1200,<br />

compatíveis com uma estrutura não concentrada de mercado (vide supra).<br />

349. Todavia, embora a aquisição de leite UHT pelos GGR seja caracterizada por uma<br />

estrutura menos concentrada do que a da venda de leite no aprovisionamento, os<br />

lácteos – da qual o leite UHT representará cerca de 40% (vide supra) –<br />

constituem a única categoria de produtos da “distribuição alimentar” onde se<br />

observa um acréscimo, significativo, da margem média bruta global no agregado<br />

dos GGR, nomeadamente, no biénio 2007-2008 (vide secção 3.5 supra).<br />

Conforme acima referido, no âmbito do Relatório Final de Julho de 2010 será<br />

avaliada a forma como este alegado aumento da margem média bruta de revenda<br />

de produtos lácteos pelos GGR se compara à evolução das margens das empresas<br />

de aprovisionamento, em especial, no caso do leite UHT.<br />

4.4. Arroz e massas alimentícias<br />

350. As indústrias do arroz e das massas alimentícias dependem da produção de<br />

cereais, respectivamente, arroz para transformação e trigo duro.<br />

351. Segundo informação do MADRP 96 , a produção nacional anual de cereais (incluindo<br />

arroz) representava, em média no quinquénio 2000-2004, cerca de 378 M € a<br />

contrastar com cerca de 475 M € de importações/ano, sendo cerca de 75% destas<br />

“importações” de natureza intracomunitária, ascendendo o valor anual de<br />

exportações a cerca de 31 M €, na sua quase totalidade destinado à UE. Estes<br />

produtos contribuíram, nesse mesmo quinquénio, em 15% para o défice da então<br />

balança comercial de produtos agrícolas. O VABpm gerado pelo conjunto das<br />

indústrias de transformação de cereais (i.e., da moagem,<br />

descasque/branqueamento de arroz, produção de amidos, alimentos compostos<br />

para animais, panificação e pastelaria, bem como massas alimentícias)<br />

representava cerca de 25% do conjunto das Indústrias <strong>Alimentar</strong>es e de Bebidas,<br />

totalizando 2325 M € em 2004.<br />

96 Cf. Culturas Arvenses: Diagnóstico Sectorial, Gabinete de Planeamento e Politicas, do MADRP, 2007 (em<br />

http://www.gppaa.min-agricultura.pt/pbl/diagnosticos/Arvenses_Diagnostico_Sectorial.pdf).<br />

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4.4.1. Caracterização dos sectores nacionais de arroz e de trigo<br />

4.4.1.1. Produção nacional de arroz e de trigo duro<br />

352. Segundo o MADRP e o Eurostat, a área nacional de produção cerealífera (cereais e<br />

arroz) regrediu em quase 50% de 1990 a 2006, de 750 mil hectares (ha) para<br />

390 mil.<br />

353. As reformas da PAC contribuíram para uma forte redução da área de produção do<br />

trigo duro, de 19 mil ha em 1990 para 3,2 mil ha em 2006 (após a reforma da<br />

PAC de 2003) 97 .<br />

354. A área de produção de arroz regrediu em cerca de 25% <strong>entre</strong> 1990 e 2006, de<br />

33,8 mil ha para 25,0 mil ha. A distribuição desta área <strong>entre</strong> as duas principais<br />

subespécies, Japónica (arroz “Carolino”) e Indica (arroz “Agulha”), manteve-se<br />

relativamente estável, embora em claro favor da cultura Japónica. De salientar, a<br />

este propósito, que enquanto Portugal é auto-suficiente em arroz do tipo<br />

“Carolino”, grande parte do consumo nacional de arroz do tipo “Agulha”, bem<br />

como de todo o tipo de trigo duro, é de origem externa maioritariamente<br />

intracomunitária. Em particular, as importações nacionais de arroz “Agulha”<br />

representam cerca de 80% do total nacional de importações de arroz, sendo o<br />

remanescente em novos tipos de arroz (v.g., dos tipos “vaporizado” e “basmati”).<br />

355. A área nacional afecta à produção de trigo duro e de arroz reparte-se no ano de<br />

2005, respectivamente, <strong>entre</strong> as regiões do Alentejo (83% e 41%), Ribatejo e<br />

Oeste (12% e 35%) e Beira Litoral (5% e 23%).<br />

356. Enquanto que a cultura de arroz deve cingir-se às áreas de exploração<br />

especializadas neste cereal, as áreas de especialização arvense podem ser afectas<br />

à cultura de diversos cereais de sequeiro, sendo a cultura de milho a que<br />

apresenta a maior rentabilidade nestas últimas áreas. As áreas de especialização<br />

em arroz apresentam quase o quadruplo da rentabilidade unitária das áreas de<br />

especialização arvense de cerca de, respectivamente, 399 € e 117 €/ha de SAU<br />

(Superfície Agrícola Útil), embora o custo unitário da exploração de arroz seja<br />

quase o triplo do relativo à exploração arvense de cerca de, respectivamente,<br />

1206 € e 415 €/ha de SAU (MADRP, 2007, cit., pp. 22-24).<br />

97 A reforma da PAC de 2000 terá, todavia, contribuído para um forte crescimento das áreas de exploração<br />

de trigo duro, tendo a sua dimensão atingido os 188 mil ha em 2002.<br />

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<strong>Relações</strong> <strong>Comerciais</strong> <strong>entre</strong> a <strong>Grande</strong> <strong>Distribuição</strong> <strong>Agro</strong>-<strong>Alimentar</strong> e os seus Fornecedores (Preliminar)<br />

________________________________________________________________________________________<br />

357. A produção nacional de cereais e de arroz é, em geral, estruturada em<br />

cooperativas sob forma de Agrupamentos de Produtores, em grande parte<br />

constituídos na década de 1990. Estes agrupamentos terão contribuído para uma<br />

maior concentração da produção na presente década e representavam, no ano de<br />

2005, cerca de, respectivamente, 30% e 38% da produção nacional total de arroz<br />

e de cereais.<br />

4.4.1.2. Indústria transformadora de arroz e de trigo duro<br />

358. Segundo um inquérito do INE relativo ao ano de 2004, o tecido empresarial<br />

nacional da indústria de arroz (descasque e branqueamento de arroz) era<br />

composto por 17 empresas (11 e 6 de pequena e média dimensões,<br />

respectivamente) enquanto que a indústria de massas alimentícias (fabrico de<br />

massas alimentícias, cuscuz e similares) era composta por 7 empresas (uma<br />

grande, uma média e cinco de pequena dimensão).<br />

359. Segundo informação mais recente obtida pela AdC, relativa ao ano de 2008, a<br />

Cerealis (insígnias Nacional e Milaneza) representou mais de 80% da produção<br />

nacional de massas alimentícias enquanto que nas actividades nacionais de<br />

produção e de comercialização de arroz, destacam-se três grandes empresas – a<br />

Arrozeiras Mundiarroz (insígnia Cigala), a Ernesto Morgado (insígnia Pato Real) e<br />

a Saludães (insígnia Saludães) – em concorrência com outras empresas de menor<br />

dimensão (v.g., Orivárzea e Valente Marques), 98 bem como com o arroz<br />

proveniente do exterior.<br />

360. A transformação de cereais e leguminosas, fabrico de amidos, féculas e produtos<br />

afins representava, no seu conjunto e no ano de 2006, cerca de 3,1% (140,9 M €)<br />

do VABpm do conjunto das Indústrias <strong>Alimentar</strong>es e de Bebidas. O fabrico de<br />

alimentos compostos para animais assume um peso maior, de cerca de 5,8%,<br />

correspondente a um VABpm de 878 M €.<br />

361. Segundo o Inquérito Anual à Produção Industrial do INE, relativo ao ano de 2007<br />

(cit.), o valor de vendas em território nacional de produtos de arroz ascendeu a<br />

138,1 M € – do qual o de “arroz semi-branqueado, branqueado e glaceado”<br />

representava 92,1% – enquanto que o de massas alimentícias ascendeu a 56,0 M<br />

98 Vide, de igual modo, Associação Nacional dos Industriais de Arroz (ANIA, em http://www.ania.pt/).<br />

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€. Em comparação, o valor de vendas de leites UHT ascendeu, no mesmo ano, a<br />

533,3 M € (Gráfico 7 supra).<br />

4.4.1.3. Consumo nacional de arroz e de trigo duro<br />

362. O grau de auto aprovisionamento nacional de cereais – excluindo o milho e o<br />

arroz – é bastante reduzido, sendo de cerca de 19% em média no quinquénio<br />

1999/2000 a 2004/2005. Em média neste período, as importações de trigo duro<br />

representaram cerca de 65% do consumo nacional total deste cereal (161 mil ton<br />

para um consumo total de 247 mil ton), para um grau de aprovisionamento<br />

nacional de cerca de 13%. 99<br />

363. No caso do arroz, em média no mesmo período, as importações representaram<br />

34% do consumo nacional total (75 mil ton para um consumo total de 218 mil<br />

ton), para um grau de aprovisionamento de 55%.<br />

364. Enquanto que naquele período, o consumo anual per capita de trigo duro exibiu<br />

alguma volatilidade – de 42kg per capita em 1999/2000 para 76kg em 2004/2005<br />

e 59kg em média no período de 1999/2000 a 2004/2005 – o consumo anual per<br />

capita de arroz manteve-se relativamente estável, em torno dos 16kg. Este último<br />

é cerca de triplo do consumo anual per capita médio na UE deste cereal, sendo<br />

cerca de dobro do espanhol, o segundo maior na UE.<br />

365. Não obstante a estabilidade do consumo nacional per capita de arroz, observou-se<br />

na década de 1990 uma certa alteração dos hábitos de consumo do arroz do tipo<br />

Carolino para o arroz do tipo Agulha, embora se estime que, actualmente, estes<br />

dois tipos de arroz repartam equitativamente cerca de 90% do consumo nacional<br />

total de arroz, sendo os 10% remanescentes dos novos tipos, “vaporizado” e<br />

“basmati”.<br />

366. Segundo o último inquérito do INE relativo às despesas das famílias, realizado no<br />

ano de 2005 (cit.), o arroz e de massas alimentícias representavam ambos cerca<br />

de 0,1% do total de despesas de consumo e, respectivamente, 0,9% e 0,8% do<br />

total de despesas em produtos alimentares, e 5,5% e 4,9% do total da sua<br />

categoria de “Cereais e Produtos à base de Cereais”.<br />

99 Em contrapartida, as importações de trigo mole representavam, em média no mesmo período, cerca de<br />

95% do consumo nacional total (1531 mil ton para um consumo total de 1606 mil ton – 87,7% do<br />

consumo nacional total no agregado dos trigos mole e duro), para um grau de aprovisionamento nacional<br />

de cerca de 7%.<br />

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4.4.1.4. Comércio internacional de arroz e de trigo duro<br />

367. Na UE e em média no biénio 2005-2006, os dois maiores produtores de arroz<br />

eram a Itália e a Espanha com cerca de 50% e 30% da produção total de arroz<br />

respectivamente. A subespécie Japónica (Carolino) é a principal na UE,<br />

representando cerca de 60% da produção UE no total das duas subespécies de<br />

arroz, Japónica e Indica (Agulha). A produção nacional total de arroz representa<br />

cerca de 5% do total da UE, sendo, respectivamente, de 7% e de 2% nos casos<br />

das subespécies Japónica e Indica. Em contrapartida, a Itália e a Espanha<br />

contribuem para a produção total da UE em, respectivamente, 61% e 29% na<br />

subespécie Japónica e 42% e 39% na subespécie Indica.<br />

368. Os maiores produtores mundiais de arroz são a China e a Índia com,<br />

respectivamente, 128 e 91 M ton, em média no biénio 2006-2007, em<br />

comparação com 6,1 M ton nos EUA e 1,7 M ton na UE.<br />

369. Na produção mundial de trigo (mole e duro) no biénio 2006-2007, a liderança é<br />

assumida pela UE, com 117,2 M ton, seguida da China (103,5 M ton), da Índia<br />

(68 M ton), dos EUA (49,3 M ton) e da Rússia (43,5 M ton).<br />

370. As principais origens do consumo nacional de trigo duro são europeias, em<br />

especial, a Espanha, Reino Unido e Turquia, embora os dois maiores produtores<br />

deste cereal na UE sejam (no biénio 2005-2006) a Itália e a Grécia. 100<br />

4.4.2. Representatividade da procura dos GGR no arroz e nas massas<br />

alimentícias<br />

4.4.2.1. Caso do arroz<br />

371. Em relação ao leite UHT, constata-se que o mercado nacional de<br />

aprovisionamento de arroz (vide Tabela 7 infra) é menos concentrado, embora o<br />

IHH relativo à amostra de 20 fornecedores considerados, nacionais e estrangeiros,<br />

ascenda a valores acima do limiar de 1800 de um mercado concentrado, embora<br />

em ligeiro decréscimo no período 2004-2008. De igual forma se constata um<br />

maior recurso à importação de arroz do que no caso do leite UHT, em aumento<br />

100 Em contrapartida, o consumo nacional de trigo mole provém, mormente, de França e da Alemanha, em<br />

cerca de, respectivamente, 66% e 18% (vide Relatório AdC sobre os Sectores da Moagem de Trigo Mole e<br />

da Panificação em Portugal, Setembro de 2009).<br />

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desde 2004 e tendo a sua percentagem no consumo total sido em 2008 cerca do<br />

dobro da relativa ao leite UHT, de 31,8% contra 16,7% respectivamente. 101<br />

372. Em contrapartida, a procura de arroz no aprovisionamento está mais concentrada<br />

nos GGR do que no caso do leite UHT, em percentagens superiores a 70% no<br />

período considerado, salvo no ano de 2006. Todavia, os dois principais GGR<br />

representam uma percentagem no global de aquisições, idêntica à observada no<br />

caso do leite UHT, de cerca de 30%.<br />

373. No que respeita aos canais alternativos aos GGR para escoamento de arroz,<br />

constata-se, primeiro, que as exportações de arroz são, em oposição às de leite<br />

UHT, despiciendas e, segundo, que o canal HORECA tem vindo a assumir uma<br />

importância crescente desde 2005, de 0,4% nesse ano para 7,4% em 2008.<br />

374. Em suma, à semelhança do leite UHT, esta análise preliminar sugere um a priori<br />

forte grau de representatividade da procura de arroz pelos GGR. Todavia, em<br />

termos do VN destas empresas, o valor global de compras de arroz pelos GGR<br />

contribui para cerca de 49% em 2008 no agregado destas empresas.<br />

Tabela 7 – Importância dos GGR no valor total de compras em território nacional de<br />

arroz, em % dos valores de vendas no global deste produto e do VN dos fornecedores<br />

2004 2005 2006 2007 2008<br />

Em termos do global de vendas de arroz<br />

GGR 82,7% 71,0% 61,9% 72,4% 72,5%<br />

HORECA n.d. 0,4% 0,5% 3,6% 7,4%<br />

Outros canais n.d. 26,6% 37,4% 23,8% 19,3%<br />

Exportações 0,1% 1,9% 0,2% 0,3% 0,9%<br />

Maior GGR 17,4% 26,4% 14,8% 17,5% 18,3%<br />

Dois maiores GGR<br />

Em termos do VN<br />

27,7% 39,7% 26,0% 27,5% 28,0%<br />

GGR n.d. 44,8% 40,8% 52,9% 49,0%<br />

Maior GGR 16,3% 16,7% 9,8% 12,8% 12,4%<br />

Dois maiores GGR 26,0% 25,0% 17,2% 20,1% 18,9%<br />

Mercado do aprovisionamento<br />

Importações 15,9% 13,0% 16,8% 24,3% 31,8%<br />

IHH 2235 2235 1987 1893 1892<br />

Fonte: Cálculo AdC com base em elementos confidenciais recolhidos no âmbito do Estudo. A indisponibilidade<br />

de parte da informação relativa ao ano de 2004 justifica-se pelo facto desta ter sido fornecida não pela<br />

integralidade das empresas abrangidas pelo Estudo.<br />

101 Salientar-se-á, todavia, que a percentagem de importações de arroz aqui referidas estão enviesadas por<br />

defeito dado respeitarem apenas o arroz vendido em território nacional à distribuição alimentar por<br />

empresas estrangeiras e não o arroz importado comercializado por empresas nacionais, tais como os do<br />

tipo “Agulha”, “Vaporizado” e “Basmati” não proveniente da produção doméstica.<br />

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375. Em oposição ao caso do leite UHT, a importância relativa que a venda de arroz<br />

aos GGR tem no VN destas empresas, em especial, nas arrozeiras, especializadas<br />

na venda deste produto, na ordem de 49% em 2008, pode traduzir a importância<br />

de outros tipos de actividade, para além da relativa à venda de arroz à GDA,<br />

destas empresas, questão esta que delegamos para o Relatório de Julho de 2010.<br />

4.4.2.2. Caso das massas alimentícias<br />

376. No caso das massas alimentícias (vide Tabela 8 infra), constata-se, primeiro, um<br />

fraco recurso às importações, fortemente aquém dos observados nos casos do<br />

leite UHT e do arroz, na ordem dos 1-2% no período 2004-2007 e com um ligeiro<br />

aumento, até 4,6% em 2008. À semelhança do leite UHT e em oposição ao caso<br />

do arroz, o aprovisionamento nacional de massas alimentícias é, de igual forma,<br />

fortemente concentrado, com valores do IHH acima de 6700, neste caso numa<br />

amostra de 26 empresas consideradas (19 estrangeiras).<br />

Tabela 8 – Importância dos GGR no valor total de compras em território nacional de<br />

massas alimentícias, em % do global de vendas deste produto e do VN dos fornecedores<br />

2004 2005 2006 2007 2008<br />

Em termos do global de vendas de massas alimentícias<br />

GGR n.d. > 90% > 80% > 80% > 80%<br />

HORECA n.d. n.d. n.d. n.d. n.d.<br />

Outros canais n.d. n.d. n.d. n.d. n.d.<br />

Exportações n.d. < 10% < 10% 5-15% 5-15%<br />

Maior GGR n.d. < 20% < 20% < 20% < 20%<br />

Dois maiores GGR<br />

Em termos do VN<br />

n.d. 25-35% 25-35% 25-35% 25-35%<br />

GGR n.d. < 50% < 50% < 40% < 40%<br />

Maior GGR n.d. < 10% < 10% < 10% < 10%<br />

Dois maiores GGR n.d. < 20% < 20% < 20% < 20%<br />

Mercado do aprovisionamento<br />

Importações 1,5% 1,7% 1,2% 1,2% 4,6%<br />

IHH 7412 6768 7439 7368 7318<br />

Fonte: Cálculo AdC com base em elementos confidenciais recolhidos no âmbito do Estudo. A indisponibilidade<br />

de parte desta informação justifica-se pela sua potencial confidencialidade.<br />

377. No caso das massas alimentícias, a importância das exportações é semelhante à<br />

do leite UHT, tendo sido observado um ligeiro acréscimo das mesmas no biénio<br />

2007-2008.<br />

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378. A representatividade da procura deste produto pelos GGR é, de igual modo,<br />

superior à observada nos casos do leite UHT e do arroz, superando os 80% em<br />

2008, sendo que os dois principais GGR representam, à semelhança dos produtos<br />

anteriores, uma representatividade <strong>entre</strong> 25% e 35% no período em análise.<br />

379. Quando ajustado pelo VN dos fornecedores, este grau de representatividade da<br />

procura de massas alimentícias pelos GGR reflecte a possibilidade, como nos<br />

casos supra do leite UHT e do arroz, das empresas aqui consideradas<br />

comercializarem outros produtos para além das massas alimentícias, sem,<br />

todavia, significar que as vendas destes outros produtos não estejam no mesmo<br />

“grau de dependência” em relação aos GGR do que os aqui considerados.<br />

380. Em oposição aos casos do leite UHT e do arroz, o sector nacional de massas<br />

alimentícias tem, todavia, a característica do eventual poder de compra dos GGR<br />

ter impacto apenas no processo de negociação com as empresas de<br />

aprovisionamento, não tendo o primeiro nem estas últimas qualquer influência<br />

sobre os preços de aquisição do trigo duro, atenta a sua origem externa.<br />

4.5. Síntese conclusiva<br />

381. No cômputo geral destes três sectores – leite UHT, arroz e massas alimentícias -<br />

constata-se um forte grau de representatividade da procura destes produtos pelos<br />

GGR nos respectivos mercados de aprovisionamento. Embora este grau de<br />

representatividade seja mitigado pelo volume de negócios dos fornecedores,<br />

atento o facto destas empresas comercializarem outros produtos potencialmente<br />

escoados para os GGR, não poderá este facto atenuar per se o eventual “grau de<br />

dependência” destes fornecedores em relação aos GGR.<br />

382. Em particular, a AdC averiguará no Relatório Final de Julho de 2010: (i) se no<br />

caso dos lácteos, a representatividade das vendas do global de todos os produtos<br />

lácteos aos GGR difere ou não da representatividade aqui encontrada para o caso<br />

do leite UHT e (ii) se este “grau de dependência” das vendas dos fornecedores em<br />

análise face aos GGR não confere per se um poder de compra a estes grupos que<br />

contraponha o poder de mercado dos fornecedores de maior dimensão, em<br />

especial, nos sectores concentrados do leite UHT e das massas alimentícias.<br />

383. Sem prejuízo da necessidade de uma análise mais aprofundada deste tipo de<br />

questões, os resultados deste capítulo sugerem, primeiro, que no caso do arroz, o<br />

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eventual poder de compra da GGR é susceptível de ter uma forte influência ao<br />

nível dos preços na produção, sendo este acrescido pela capacidade destes grupos<br />

em recorrerem ao arroz importado, quer do tipo Carolino (Japónico) – existente<br />

em Espanha –, quer do tipo Agulha (Indico) – onde a produção nacional é<br />

deficitária –, bem como dos novos tipos (basmático e vaporizado), para os quais<br />

não existe produção nacional.<br />

384. O possível recurso à importação pelos GGR é, de igual modo, susceptível de<br />

conferir a estes grupos um poder de compra acrescido, com maior verosimilhança<br />

de contrapor o elevado grau de concentração dos mercados nacionais de<br />

aprovisionamento de leite UHT e de massas alimentícias detendo, assim, os GGR<br />

no caso dos lácteos, um maior grau de influência dos preços na produção<br />

nacional.<br />

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5. <strong>Relações</strong> comerciais <strong>entre</strong> fornecedores e<br />

distribuidores<br />

385. O presente capítulo apresenta uma resenha das práticas da GDA – contratuais ou<br />

extra-contratuais – elencadas pelos fornecedores como potencialmente lesivas dos<br />

seus interesses. Assim, após uma breve descrição das principais características<br />

dos contratos de fornecimento celebrados com a GDA (secção 5.1), apresentamos<br />

as práticas da GDA elencadas pelos fornecedores como lesivas dos seus interesses<br />

(secção 5.2). A análise aprofundada do eventual enquadramento destas práticas<br />

no âmbito jusconcorrencial é remetida para o Relatório Final de Julho de 2010.<br />

5.1. Contratos de fornecimento<br />

386. Todos os Grupos da <strong>Grande</strong> <strong>Distribuição</strong> <strong>Alimentar</strong> (GDA) – retalhistas e<br />

grossistas –, os Agrupamentos de Compras e as Centrais de Negociação, celebram<br />

anualmente acordos comerciais, suportados em contratos, com os seus<br />

fornecedores.<br />

387. Os tipos de contratos, em especial os estabelecidos com os fornecedores de bens<br />

da indústria alimentar, são semelhantes <strong>entre</strong> os vários Grupos, destacando-se:<br />

(i) CGF – Contratos Gerais de Fornecimento, (ii) Contratos de Prestações de<br />

Serviços, (iii) Contratos Pontuais de Promoções, (iv) Condições <strong>Comerciais</strong>,<br />

Condições Gerais de Fornecimento e Condições Específicas de Fornecimento, (v)<br />

Acordo de Cooperação Comercial, (vi) Acordo de Parceria Comercial, e (vii)<br />

Contrato/Acordo Logístico.<br />

388. Para além destes contratos-base, alguns GDA celebram, ao longo do ano,<br />

aditamentos/complementos/adendas aos acordos/contratos gerais, relativos a (i)<br />

acções promocionais pontuais, (ii) contratos de aberturas de lojas, (iii)<br />

aniversários.<br />

389. O contrato-base (clausulado) de cada Grupo, é igual para todos os fornecedores,<br />

sendo negociados, cada ano, alguns dos valores das clausulas pré-estabelecidas,<br />

bem como as condições comerciais.<br />

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390. Assim, alguns fornecedores consideram que estão perante contratos de adesão,<br />

na medida em que existem cláusulas inegociáveis.<br />

391. Genericamente, os contratos de fornecimento anuais, estabelecem as principais<br />

cláusulas de fornecimento (prazos e modo de pagamento, regras sobre as<br />

<strong>entre</strong>gas, prazos de validade dos produtos, devoluções, requisitos das<br />

embalagens, penalizações por incumprimentos, desconto comercial, rappel,<br />

qualidade dos produtos, etc.), havendo ao longo do ano, aditamentos/adendas<br />

onde são regulamentadas acções de promoção, aberturas de lojas, aniversários,<br />

etc.<br />

392. Alguns contratos definem também, o número de vezes que o distribuidor aceita<br />

variações dos preços base do fornecedor, sendo que alguns estipulam que, no<br />

caso de baixas de preços, o fornecedor é obrigado a suportar o diferencial de<br />

preços dos stocks existentes no distribuidor.<br />

5.2. Práticas consideradas lesivas pelos fornecedores<br />

393. Várias têm sido as práticas comerciais referenciadas pelos fornecedores, como<br />

habitualmente seguidas pelas empresas da distribuição alimentar no<br />

relacionamento comercial <strong>entre</strong> as duas partes, que consideram lesivas dos seus<br />

interesses.<br />

394. Enquanto algumas das práticas identificadas se reportam e ocorrem durante o<br />

processo negocial dos contratos de fornecimento anuais, outras verificam-se ao<br />

longo do período de fornecimento (ano civil), muitas vezes sem ligação directa a<br />

transacções concretas de produtos.<br />

395. Algumas práticas consideradas lesivas pelos fornecedores surgem como resultado<br />

da desigual relação da força negocial <strong>entre</strong> fornecedores e distribuidores,<br />

motivada por vários factores (ex: mercados atomizados do lado da oferta versus<br />

mercado concentrado do lado da procura).<br />

396. A CE, no âmbito da sua Comunicação sobre o “Melhor funcionamento da cadeia de<br />

abastecimento alimentar na Europa” (cit.), no seu documento de trabalho sobre<br />

“Competition in the food supply chain” integrante daquela Comunicação, refere<br />

que um poder desigual de negociação nem sempre representa um problema de<br />

poder de compra em termos da legislação de concorrência.<br />

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397. Em particular, enquanto que o poder de compra e os abusos decorrentes do<br />

mesmo, poderão ter implicações nefastas do ponto de vista da concorrência,<br />

nomeadamente, no bem-estar dos consumidores, algumas das práticas<br />

resultantes do desequilíbrio da força negocial das partes, surgem como práticas<br />

consideradas “injustas”, “desleais” ou “indesejáveis” de outros pontos de vista.<br />

398. No âmbito destas práticas poder-se-ão enquadrar os “atrasos de pagamento”,<br />

“cláusulas não negociáveis”, “alteração unilateral de certas condições contratuais”,<br />

“pagamentos de topos, aniversários”, etc.<br />

399. Alguns países têm regulamentado, através de legislação específica, certas<br />

condições de transacção <strong>entre</strong> distribuidores e fornecedores, procurando tornar o<br />

ambiente negocial <strong>entre</strong> as partes mais transparente e equilibrado.<br />

400. Também têm surgido alguns Códigos de Boas Práticas definindo regras para a<br />

negociação <strong>entre</strong> os fornecedores e as empresas de distribuição.<br />

Exemplos de práticas consideradas lesivas<br />

401. Contrato-tipo: Os grupos da distribuição dispõem de minutas de contratos de<br />

fornecimento, iguais para todos os fornecedores, não sujeitas a negociação<br />

(contratos de adesão).<br />

402. Em princípio, não existe negociação das cláusulas constantes do contrato,<br />

respeitantes a regras de fornecimento (prazos e locais de <strong>entre</strong>ga, prazos de<br />

pagamento, devoluções, prazos de validade dos produtos fornecidos, etc.), só<br />

havendo negociação quanto aos valores a considerar como descontos comerciais,<br />

descontos de volume (quantidades), rappel incondicional.<br />

403. Alguns fornecedores (de maior poder negocial, v.g. multinacionais e/ou<br />

detentores de certas marcas líder), negoceiam alterações/revogações de algumas<br />

das cláusulas base.<br />

404. Penalizações de serviço: Os contratos contêm as regras para o fornecimento do<br />

produto encomendado nas centrais logísticas dos distribuidores.<br />

405. Os prazos de fornecimento dos produtos, após a encomenda, são fixados e variam<br />

<strong>entre</strong> os vários distribuidores, podendo ir desde 6 horas até 2 a 3 dias, sendo em<br />

média de 24 horas.<br />

406. O não cumprimento do prazo estipulado implica, regra geral, uma penalização<br />

(em regra um valor percentual da encomenda que pode ir até 20%).<br />

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407. Normalmente, não existe reciprocidade para situações de rupturas de stocks nas<br />

prateleiras dos estabelecimentos, derivadas de falhas das centrais de <strong>entre</strong>ga.<br />

408. Prazos de validade dos produtos: Só são aceites produtos que não tenham<br />

ultrapassado, em média, 2/3 do prazo total de validade recomendada,<br />

independentemente desse prazo ser 1 ano ou 30 dias com as inerentes<br />

repercussões em termos dos stocks dos fornecedores.<br />

409. Emissão de débitos indevidos: Notas de débito, não justificadas, e imediatamente<br />

descontadas nos pagamentos efectuados pelo distribuidor.<br />

410. Retroactividade: Os distribuidores impõem que as condições dos contratos de<br />

fornecimento negociados, muitas vezes só concluídos no final do ano, tenham<br />

efeitos retroactivos a 1 de Janeiro.<br />

411. Acordos de compra/negociação conjunta: alinhamento das condições de venda, de<br />

vários operadores, através de “agrupamento de negociação" que não oferece<br />

qualquer contrapartida adicional para os produtores/fornecedores, só melhorando<br />

as condições comerciais das entidades que integram o agrupamento.<br />

412. Estes casos de acordos de compra/negociação conjunta traduzem-se num reforço<br />

do poder negocial da <strong>Grande</strong> <strong>Distribuição</strong> face aos seus fornecedores.<br />

413. Comparticipações desproporcionadas para abertura de novas lojas: Normalmente,<br />

o valor exigido a cada fornecedor não é ajustado ao potencial de vendas das lojas<br />

e, em certos casos, sem evidente contrapartida (ex: quando a loja muda<br />

meramente de insígnia, continuando a pertencer ao mesmo grupo da<br />

distribuição).<br />

414. Cláusulas penais nos CGF: Em regra, os Contratos definem penalizações para<br />

incumprimentos do fornecedor, sem possibilidade negocial.<br />

415. Práticas de retaliação: o distribuidor corta ou limita as compras durante a<br />

negociação das condições de fornecimento, como forma de forçar a conclusão do<br />

acordo.<br />

416. Também, no caso de existirem no mercado preços de venda ao público, para<br />

produtos do fornecedor, inferiores aos praticados por aquela cadeia, o distribuidor<br />

segue, por tempo indeterminado, os PVP praticados pela concorrência e exige do<br />

fornecedor consequente compensação da margem, ameaçando com retirada de<br />

produtos de linha como retaliação.<br />

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417. Pressão negocial através da retirada injustificada de linha de produtos de forma<br />

inesperada.<br />

418. Acordo de margem garantida: Por vezes existe um acordo verbal de margem<br />

garantida, pelo fornecedor ao distribuidor, com débitos mensais, como condição<br />

necessária para estar presente na cadeia.<br />

419. Descontos globais ou antecipados: sem qualquer relação com os volumes de<br />

vendas (descontos incondicionais).<br />

420. Pagamentos relacionados com promoções não acordadas previamente.<br />

421. Pagamentos por incumprimento de expectativas de vendas (em volume e valor)<br />

ou de lucros do distribuidor.<br />

422. Contratualização de prazos de pagamento excessivos: Em especial para produtos<br />

perecíveis, são definidos, em geral, prazos muito alargados, face à data de<br />

<strong>entre</strong>ga dos produtos às empresas de distribuição, face ao curto prazo de validade<br />

desses produtos e face à data da sua venda ao consumidor, que em termos<br />

médios não ultrapassa 10 dias.<br />

423. Atrasos nos pagamentos: Atrasos face aos prazos contratualmente definidos, sem<br />

pagamento de penalizações.<br />

424. Retirada unilateral e não justificada de linha de produtos relativamente aos quais<br />

tinha havido pagamento de um fee de entrada.<br />

425. Incumprimento de serviços de reposição em loja: O serviço é normalmente pago<br />

pelo fornecedor (% em função das vendas).<br />

426. Alguns distribuidores diminuem, por vezes, o nível de reposição obrigando alguns<br />

fornecedores a contratarem pessoal para realizarem esse serviço, duplicando,<br />

assim, os seus custos com o mesmo.<br />

427. Utilização da localização das marcas próprias (MDD) no linear de venda como<br />

instrumento negocial: Verificam-se dificuldades crescentes no que diz respeito à<br />

localização e espaço concedido às marcas da indústria, em detrimento dos MDD,<br />

independentemente da sua efectiva aceitação pelos consumidores.<br />

428. Cópias parasitárias: Os GDA procuram replicar sob as suas próprias insígnias<br />

quaisquer produtos que obtenham sucesso no mercado.<br />

429. Este comportamento sistemático é alavancado no facto dos GDA disporem, por<br />

um lado, de toda a informação estatística relativa às vendas de produtos de<br />

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marca e, por outro lado, da possibilidade de influenciarem (o que se tem<br />

verificado na prática através de extensos espaços reservados nos expositores aos<br />

próprios produtos) a performance comercial dos produtos dos fornecedores.<br />

430. A conduta supra referida é especialmente gravosa relativamente aos novos<br />

produtos/linhas de produtos que são objecto de apresentações do “plano de<br />

negócio” pela empresa produtora, por forma a atingir a sua comercialização, o<br />

que constitui um instrumento relevante para uma subsequente replicação e<br />

comercialização destes produtos enquanto produtos MDD.<br />

431. Várias vezes, os GDA lançam exactamente o mesmo tipo de produto (de carácter<br />

inovador) do fornecedor, com acentuadas semelhanças físicas, pouco tempo<br />

depois do seu lançamento original (pago).<br />

432. O distribuidor tem, simultaneamente, marcas próprias e tem acesso e usa a<br />

informação comercial sensível do fornecedor (ex: preços, planos de lançamento,<br />

investimentos promocionais, campanhas de promoção, etc.).<br />

433. A política de gestão de stocks dos distribuidores, em relação aos produtos dos<br />

fornecedores, é definida por estratégias que vão contra os interesses das marcas<br />

da indústria, pois sempre que existe a necessidade de escoar um produto de<br />

marca própria são feitas alocações obrigatórias às lojas, reduzindo o stock das<br />

marcas industriais, chegando por vezes ao ponto de ruptura.<br />

434. Os produtos MDD têm uma visibilidade privilegiada nos lineares, não proporcional<br />

à sua quota de mercado, regra que é, normalmente, utilizada para as marcas<br />

comerciais do fornecedor.<br />

435. Os distribuidores, por vezes, não validam claims promocionais que valorizem as<br />

marcas industriais, sempre que entendem que esse claim coloca em causa as suas<br />

marcas próprias.<br />

436. Comercialização de look alikes.<br />

437. Os distribuidores no desenvolvimento da imagem das suas marcas próprias<br />

copiam todo o universo da marca líder e colocam-nas lado a lado para que assim<br />

o consumidor seja confundido e seja levado a escolher, só via factor preço, único<br />

em que as marcas da distribuição têm, normalmente, vantagem.<br />

438. Os distribuidores adoptam políticas agressivas de preços nas marcas próprias<br />

financiando esta baixa de preços através do aumento das margens obtidas nas<br />

marcas dos fornecedores.<br />

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439. Desta forma, são as marcas da indústria que subsidiam o crescimento dos seus<br />

maiores concorrentes, as marcas da distribuição (MDD).<br />

440. Os distribuidores impedem que os fornecedores pratiquem preços promocionais<br />

nas suas marcas, abaixo dos preços das marcas próprias, para não haver hipótese<br />

de uma marca da indústria ser mais barata que a marca branca similar.<br />

441. Alavancagem nas margens auferidas nos produtos de marca: É convicção de<br />

alguns fornecedores que a estratégia dos vários operadores da grande distribuição<br />

alimentar passa por extrair dos produtores de marca o rendimento/margem<br />

suficiente na distribuição dos seus produtos, que lhes permita oferecer preços<br />

muito competitivos nas suas marcas próprias.<br />

442. Esta estratégia tem um objectivo claro por parte dos distribuidores que é o de<br />

criar uma fidelização dos consumidores às respectivas marcas, que não consegue<br />

obter com as marcas de produtores, em regra disponíveis em toda a GDA.<br />

443. Os fornecedores não controlam parte significativa da promoção efectuada em loja,<br />

a exposição nos lineares, não controlando o posicionamento dos seus produtos<br />

face aos dos seus concorrentes – nomeadamente as marcas da distribuição.<br />

5.3. Síntese conclusiva<br />

444. Na análise jusconcorrencial das práticas, contratuais e extra-contratuais, da GDA<br />

junto dos seus fornecedores, há que distinguir as que possa, eventualmente, ser:<br />

(i) enquadráveis na Secção II – Práticas Proibidas – da lei nacional da<br />

concorrência (ex vi os seus artigos 4.º, 6.º e 7.º); (ii) enquadráveis no disposto<br />

no Decreto-Lei n.º 370/93, de 29 de Outubro (na redacção dada pelo Decreto-Lei<br />

n.º 140/98, de 16 de Maio); e (iii) as que embora espelhando um desequilíbrio de<br />

forças negociais <strong>entre</strong> as duas partes não constituem um ilícito jusconcorrencial<br />

(ou uma proibição ao abrigo do supra citado Decreto-Lei n.º 370/93), antes<br />

podendo, eventualmente, ser mitigadas pela adopção de v.g. contratos-tipo, pela<br />

facilitação de entrada no mercado e por outras medidas de natureza<br />

regulamentar, quer em termos de auto-regulamentação, quer em termos<br />

legislativos. 102<br />

102<br />

Cf. Comunicação CE sobre o “Melhor funcionamento da cadeia de abastecimento alimentar na Europa”<br />

(cit.), pp. 5-7.<br />

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Anexo 1 – Dados e elementos complementares<br />

445. Apresentam-se neste anexo os dados recolhidos pela AdC, ao abrigo dos seus<br />

poderes de supervisão (ex vi artigo 7.º dos seus Estatutos, aprovados pelo<br />

Decreto-Lei n.º 10/2003, de 18 de Janeiro), para elaboração do capítulo 3 do<br />

texto (secção A1.1), bem como os Gráficos complementares apresentados<br />

naquela secção (secção A1.2).<br />

A1.1. Dados e extrapolações<br />

446. No âmbito do presente Relatório, foi solicitada informação a 18 empresas de<br />

fornecimento, a três grossistas (GCT. Makro e Manuel Nunes), para além da<br />

cadeia grossista (Recheio) do Grupo JM e aos GGR: Aldi, Auchan, Dia%/Minipreço<br />

(Grupo Carrefour), E. Leclerc, El Corte Inglés, ITMI, JM (insígnias Pingo Doce,<br />

Feira Nova e Recheio), MC (insígnias Modelo e Continente) e Lidl.<br />

447. A informação relativa aos grupos da GDA (grossistas e retalhistas) inclui, em<br />

particular, os seus valores totais anuais de vendas e de compras (em €),<br />

desagregados pelas categorias de produtos “frescos”, “mercearia”, “bebidas não<br />

alcoólicas”, “bebidas alcoólicas”, “lácteos”, “congelados”, “higiene pessoal” e<br />

“drogaria e bazar”, bem como no agregado destas categorias, relativos ao período<br />

2004-2008.<br />

448. Todavia, esta informação não é exaustiva no que respeita, quer ao global do<br />

comércio a retalho – que abrange, de igual modo, outras cadeias retalhista de<br />

âmbito regional (v.g., os casos das cadeias Alisuper e A.C. Santos) e o comércio<br />

tradicional, não existindo informação relativa às vendas deste último atento,<br />

nomeadamente, o seu elevado grau de atomização –, quer ao global da procura<br />

nos mercados de aprovisionamento da GDA. A procura nos mercados de<br />

aprovisionamento é, em geral, desagregada <strong>entre</strong> três principais canais: (i) os<br />

GGR, (ii) o canal grossista; e (iii) os “outros canais”, que incluem outras cadeias<br />

retalhistas de âmbito regional que se abastecem directamente junto dos<br />

fornecedores 103 e o canal HORECA.<br />

103 Conforme referido no texto (secção 3), o pequeno comércio (ou “comércio tradicional”) não se abastece,<br />

em geral, directamente junto dos fornecedores, mas outrossim no canal grossista, não sendo, por este<br />

motivo, considerado para efeitos de quantificação da procura nos aqui considerados mercados de<br />

aprovisionamento.<br />

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449. Enquanto que os GGR e os grandes grossistas dispõem de informação fiável<br />

relativa aos valores acima referidos, este tipo de informação é de quase<br />

impossível recolha junto de empresas de menor dimensão e/ou do canal HORECA<br />

atento o elevado grau de atomização destas entidades.<br />

450. A única informação que pode, de algum modo, colmatar, em parte, este problema<br />

provém da Centromarca. Esta Associação colige informação directamente junto<br />

dos seus associados (53 empresas de produtos de marca) relativa aos seus<br />

valores anuais de vendas discriminados pelos supra referidos canais de procura no<br />

aprovisionamento. A informação de que dispomos da Centromarca é, todavia,<br />

relativa ao período 2002-2005, menos recente do que o aqui considerado.<br />

451. Acresce que, para além desta informação, não existem elementos recentes<br />

(período 2006-2008) relativos à cadeia de supermercados Plus (adquirida pela<br />

cadeia Pingo Doce do Grupo JM, em Abril de 2008, cit.) e à cadeia de<br />

hipermercados Carrefour (adquirida pelo Grupo MC, em Dezembro de 2007, cit.).<br />

452. O conjunto de informação não disponível, desagregada pelas supra referidas<br />

categorias de produtos e no agregado destas, foi, assim, extrapolada da forma<br />

que de seguida se descreve. Atento o carácter algo ad hoc destas extrapolações,<br />

uma análise mais aprofundada do sector deverá equacionar uma forma alternativa<br />

de obtenção de estatísticas mais fiáveis para devida quantificação dos mercados<br />

em análise.<br />

Hipermercados Carrefour, cadeia Plus e vendas dos Grupos ITMI e E. Leclerc<br />

453. Os valores de compras dos hipermercados (hipers) Carrefour relativo aos anos de<br />

2006 e de 2007 – dado que no ano de 2008 estes hipers estavam já integrados<br />

no Grupo MC – foram extrapolados da informação da Centromarca, disponível<br />

para os anos 2002-2005, assumindo a mesma taxa de crescimento que a relativa<br />

à evolução do ano de 2004 para 2005 e ajustados por um factor de correcção.<br />

Este factor corresponde ao rácio <strong>entre</strong> os elementos disponibilizados à AdC pela<br />

rede Dia%/Minipreço (no global das suas compras) e os elementos desta rede<br />

constantes da informação restrita ao universo Centromarca.<br />

454. Os valores de vendas dos hipers Carrefour, no período 2002-2007, são<br />

extrapolados das suas compras assumindo a mesma margem percentual de<br />

revenda que a da rede Dia%/Minipreço. Esta estimativa de vendas estará<br />

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potencialmente enviesada por defeito atento o facto da rede Dia%/Minipreço<br />

praticar, em geral, um nível de preços inferior ao da rede de hipers Carrefour.<br />

455. Os valores de compras da cadeia Plus no período 2006-2008 são extrapolados da<br />

mesma forma que no caso dos hipers Carrefour, embora seja apenas considerado<br />

um terço do total do ano de 2008 (primeiros 4 meses) dado esta cadeia ter sido<br />

adquirida pelo Grupo JM no final de Abril de 2008 (cit.). Os valores de vendas<br />

desta cadeia são extrapolados dos seus valores de compras assumindo a mesma<br />

margem percentual de revenda que a do Grupo Lidl, cuja politica de preços era<br />

semelhante à da cadeia Plus.<br />

456. Por seu turno, atento o facto dos Grupos ITMI e E. Leclerc operarem no retalho<br />

em regime de franquia, estes grupos dispõem apenas de elementos fiáveis de<br />

compra, tal como disponibilizados pelas suas centrais de compras respectivas.<br />

Assim, os valores de vendas destes Grupos foram extrapolados através dos seus<br />

elementos de compras e com base no pressuposto que as vendas E. Leclerc e<br />

ITMI têm a mesma margem de revenda que as cadeias Lidl e Pingo Doce<br />

respectivamente.<br />

Valores de compras do canal grossista e dos “outros canais”<br />

457. Os valores de compras do canal grossista no período 2006-2008 foram<br />

extrapolados dos valores disponíveis para este canal no período 2002-2005, tal<br />

como coligido pela Centromarca, e ajustados por um factor de correcção<br />

semelhante ao supra referido, <strong>entre</strong> a média dos valores existentes para os<br />

grossistas GCT, Makro e Manuel Nunes e a média destes valores no universo<br />

Centromarca, no período 2002-2005.<br />

458. Os valores de compras dos “outros canais” no período 2006-2008 foram<br />

extrapolados com base nos valores existentes do universo Centromarca,<br />

assumindo para os anos subsequentes a 2005, a mesma taxa de crescimento que<br />

a do canal grossista.<br />

Valores de vendas dos outros retalhistas para além dos GGR<br />

459. Os valores de vendas dos outros retalhistas para além dos GGR – que incluem o<br />

denominado “comércio tradicional” e todas as cadeias retalhistas de dimensão<br />

regional, necessários à estimativa do global do comércio a retalho na área<br />

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“alimentar” da GDA, foram fixados ao valor de compras do canal grossista<br />

acrescido da margem média de revenda do agregado das cadeias grossistas GCT,<br />

Makro e Manuel Nunes.<br />

460. Embora possa existir algum enviesamento por excesso destas vendas do canal<br />

grossista, este enviesamento poderá ser compensado ao nível das vendas a<br />

retalho atento o facto de tal estimativa pressupor que os retalhistas que adquirem<br />

junto daqueles grossistas não têm qualquer margem de revenda.<br />

A1.2. Gráficos complementares ao capítulo 3 do texto<br />

Gráfico 8 – IHH relativos à importância dos GGR no comércio nacional a retalho,<br />

discriminados por categoria de produtos e no período 2004-2008<br />

2400<br />

2200<br />

2000<br />

1800<br />

1600<br />

1400<br />

1200<br />

1000<br />

800<br />

600<br />

400<br />

200<br />

0<br />

Frescos<br />

Mercearia<br />

Frescos + Mercearia<br />

Bebidas não alcoólicas<br />

Bebidas alcoólicas<br />

Total Bebidas<br />

Lácteos<br />

Congelados<br />

Higiene pessoal<br />

Drogaria e Bazar<br />

2004 2005 2006 2007 2008<br />

Total<br />

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Gráfico 9 – Importância relativa das categorias de produtos no global dos mercados de<br />

aprovisionamento, período 2004-2008<br />

45%<br />

40%<br />

35%<br />

30%<br />

25%<br />

20%<br />

15%<br />

10%<br />

5%<br />

0%<br />

Frescos + Mercearia<br />

Bebidas não alcoólicas<br />

Bebidas alcoólicas<br />

Total Bebidas<br />

Lácteos<br />

Congelados<br />

Higiene pessoal<br />

2004 2005 2006 2007 2008<br />

Drogaria e Bazar<br />

Gráfico 10 – Quota conjunta dos 4 principais GGR no aprovisionamento, sendo a do<br />

Grupo JM substituída pela do total da UNIARME, discriminados por categoria de produtos<br />

e no período 2004-2008<br />

90%<br />

80%<br />

70%<br />

60%<br />

50%<br />

40%<br />

30%<br />

20%<br />

10%<br />

0%<br />

Frescos<br />

Mercearia<br />

Frescos + Mercearia<br />

Bebidas não alcoólicas<br />

Bebidas alcoólicas<br />

Total Bebidas<br />

Lácteos<br />

Congelados<br />

Higiene pessoal<br />

Drogaria e Bazar<br />

2004 2005 2006 2007 2008<br />

Total<br />

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Anexo 2 – Resenha da literatura económica sobre<br />

poder de compra<br />

A2.1. Introdução<br />

461. O sector da distribuição alimentar em Portugal, à semelhança do sucedido em<br />

toda a Europa, tem sido alvo de profundas alterações estruturais induzidas por<br />

mudanças significativas nos hábitos dos consumidores relativamente aos horários<br />

e subsequente generalização do one-stop-shopping, pela banalização da utilização<br />

do automóvel como meio de transporte, e pelo aumento do poder de compra. A<br />

tais comportamentos não é alheio o processo de consolidação e concentração da<br />

actividade de venda a retalho e do comércio grossista, que se traduz na<br />

implantação das grandes cadeias de distribuição alimentar 104 .<br />

462. A vantagem comparativa das grandes cadeias de distribuição alimentar, decorre<br />

da exploração de economias de escala que surgem com a aplicação de novas<br />

tecnologias na gestão de stocks, e da compreensão dos hábitos de despesa dos<br />

consumidores, que lhes confere neste contexto um papel decisivo no processo de<br />

valorização dos produtos junto destes. Tal decorre da assimetria de informação<br />

<strong>entre</strong> fornecedores e grande distribuição, em que estes têm mais informação<br />

sobre as preferências dos consumidores finais do que aqueles. Esta nova função<br />

desempenhada através do marketing, das campanhas promocionais etc., produz<br />

uma transferência de poder de negociação para as grandes cadeias de distribuição<br />

alimentar, que está na origem do fenómeno denominado por “poder de compra”.<br />

463. O acréscimo de poder de compra associado ao processo de consolidação e<br />

concentração do sector do retalho é acentuado pela cada vez maior participação<br />

das cadeias de distribuição no processo de produção (verticalização), através da<br />

promoção de marcas próprias que concorrem directamente com as dos<br />

fornecedores. Este acréscimo de concorrência é, contudo, desigual já que as<br />

marcas dos fornecedores não têm controlo sobre as decisões de exposição e<br />

promoção dos seus produtos nos espaços comerciais, em condições idênticas à<br />

104 Vários artigos e estudos caracterizam a evolução recente dos mercados retalhistas em Portugal; Fonseca<br />

(2005, cit.), Rodrigues (2006, cit.) Barros et al. (cit.); Os estudos realizados em 2009 pela Nielsen e pela<br />

Roland Berger (cit.); enquanto que a nível europeu refira-se, <strong>entre</strong> outros, o artigo de Dobson, P. et al.<br />

(2001), “Buyer Power and its Impact on Competition in the Food Retail Distribution Sector of the European<br />

Union”, Journal of Industry Competition and Trade, 1(3): 247-281; Competition Commission (2008), “The<br />

Supply of Groceries in the UK Market Investigation” (cit.); e o Relatório CE “Food supply chain” (cit.).<br />

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dos produtos de marca da distribuição. De facto, a grande distribuição exerce<br />

para muitos fornecedores e produtores uma função de “gatekeeper” dos seus<br />

produtos, o que lhe confere ainda maior poder de negociação.<br />

464. Paralelamente ao movimento de consolidação do sector do retalho, a constituição<br />

de Grupos de Compras, onde retalhistas independentes se juntam para negociar<br />

com os fornecedores, tem acentuado, ainda mais, o grau de concentração da<br />

procura e o correspondente poder de negociação nos mercados de<br />

aprovisionamento 105 .<br />

465. Além dos Grupos de Compras de acção nacional, tem-se assistido à criação de<br />

“alianças” de compras compostos por grandes retalhistas de nacionalidades<br />

diferentes, não concorrentes <strong>entre</strong> si, que partilham informação sobre os preços<br />

de compra, agindo como uma única unidade económica perante fornecedores e<br />

que colaboram na contratação de fornecedores para as suas marcas próprias 106 .<br />

Esta questão, que será alvo de análise neste artigo, levanta o problema de se<br />

acordos <strong>entre</strong> compradores numa cadeia vertical são tratados de uma forma mais<br />

benévola pelas políticas de concorrência do que acordos <strong>entre</strong> vendedores.<br />

466. Como resultado desta revolução, o poder de mercado do produtor deu lugar ao<br />

poder de compra do retalhista, onde este, através da escala das suas operações e<br />

a dimensão das suas compras, adquire maior capacidade para impor as condições<br />

de compra que lhe sejam favoráveis e, eventualmente, impor restrições verticais<br />

com o intuito de não só se apropriar da renda económica dos fornecedores mas,<br />

também, limitar a liberdade destes fornecerem outros retalhistas em condições<br />

concorrenciais.<br />

467. Neste capítulo é feito o enquadramento das relações bilaterais que se estabelecem<br />

<strong>entre</strong> fornecedores e compradores em geral e grande distribuição alimentar (e<br />

bebidas) em particular, no contexto do exercício de poder de compra destes.<br />

Interessa aferir sob o ponto de vista da política de concorrência quais as<br />

consequências deste exercício ponderando, nomeadamente, os efeitos positivos<br />

105 É comum referir-se ao espaço onde decorrem as negociações bilaterais <strong>entre</strong> grande distribuição e<br />

fornecedores como “jaulas de negociação”, enfatizando-se o carácter intimidatório e pouco amigável com<br />

que são conduzidas.<br />

106 Dobson, P. (2003), “Buyer Power in Food Retailing: The European Experience” proceedings from the<br />

Conference on Changing Dimensions of the Food Economy: Exploring the Policy Issues”, 6-7 Fevereiro<br />

2003, The Hague, Netherlands, debruça-se sobre o impacto nas relações <strong>entre</strong> fornecedores e grande<br />

distribuição dos “grupos de compras” que operam nos mercados internacionais, alertando para as<br />

consequências do excessivo poder de negociação destas alianças.<br />

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de curto prazo decorrentes do expectável pass-through para o consumidor, com<br />

outros efeitos dinâmicos potencialmente lesivos da concorrência e do bem-estar<br />

geral (e do consumidor em particular) como por exemplo os resultantes do<br />

denominado “waterbed-effect” (WBE), menor diversidade de produtos e menor<br />

inovação no médio e longo prazos.<br />

468. A este respeito o Relatório Preliminar CE sobre o “Food supply chain” (cit.), vem<br />

enfatizar a ideia de que “(…) quando se afere do impacto do exercício de poder de<br />

compra sobre os consumidores, o bem-estar do consumidor deve ter em conta, os<br />

preços, a diversidade e a qualidade (dos produtos)”.<br />

469. No contexto desta nova estrutura do mercado retalhista, o problema de<br />

regulamentar o poder de mercado dos grandes retalhistas sobre os seus<br />

fornecedores tem suscitado diversos desafios quanto à interpretação dos<br />

objectivos da politica de concorrência.<br />

470. Embora a consolidação no retalho esteja associada a um aumento de eficiência e<br />

de qualidade do serviço, o aumento da concentração daí decorrente pode facilitar<br />

a capacidade dos retalhistas exercerem poder de mercado como compradores<br />

(i.e., poder de compra) – muitas vezes com recurso a práticas que só são<br />

possíveis devido ao desequilíbrio de poder negocial <strong>entre</strong> este e os fornecedores –<br />

e como vendedores (poder de venda ou de mercado, “seller power”, SP), com<br />

impacto sobre o bem-estar geral e do consumidor em particular.<br />

471. A questão que se coloca à política de concorrência é a de como lidar com o poder<br />

de compra dos grandes retalhistas, especialmente quando ele não é exercido<br />

apenas aquando da negociação de preços, mas se reflecte em toda uma série de<br />

contrapartidas contratuais muitas vezes consideradas desproporcionais e não<br />

justificadas 107 . 108<br />

472. No que diz respeito a esta matéria a CE, no contexto do seu Relatório Preliminar<br />

sobre o “Food Supply Chain” (cit.), veio clarificar a sua posição relativamente ao<br />

fenómeno do poder de compra. Na sua perspectiva deve-se distinguir <strong>entre</strong> poder<br />

107 Na UE existem as orientações da Comissão na aplicação do artigo 102 TFUE, relativas ao comportamento<br />

de exclusão abusivos por parte de empresas com posição dominante, e em Portugal os decretos de lei<br />

nº370/93 sobre vendas com prejuízo e práticas negociais abusivas.<br />

108 Vide Dobson, P. Waterson, M. and A. Chu (1998) “The Welfare Consequences of the Exercise of Buyer<br />

Power”, Office of Fair Trading, Research Paper 16. De referir que nos EUA, à semelhança do que sucede<br />

com os vendedores, o Robinson-Patman Act proíbe todas as formas de discriminação de preços praticadas<br />

pelos fornecedores.<br />

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de negociação desigual (“Unequal Bargaining Power” ou UBP) e poder de compra.<br />

O primeiro diz respeito a situações em que “…uma das partes (o vendedor ou o<br />

comprador), consegue impor à outra termos e condições contratuais que são<br />

desfavoráveis à outra parte.(…) UBP geralmente conduz a negociações comerciais<br />

que parecem injustas, ou indesejáveis do ponto de vista social. O segundo, “(…)<br />

pode ter efeitos benéficos ou perversos sobre os consumidores. poder de compra<br />

é geralmente imposto por compradores como um countervailling power para obter<br />

melhores preços e termos dos fornecedores”. Por isso, a Comissão parece<br />

distinguir <strong>entre</strong> o exercício de poder de mercado do lado da procura (poder de<br />

compra) que se traduz em alterações dos preços, e o exercício de poder de<br />

mercado através de outras práticas negociais que não envolvem directamente os<br />

preços.<br />

473. De qualquer forma, com a crescente concentração do sector do retalho, há cada<br />

vez uma maior preocupação de que o poder de compra exercido pelos grandes<br />

retalhistas junto dos fornecedores possa ter efeitos adversos sobre a viabilidade<br />

económica destes e o nível de eficiência da afectação dos mercados a jusante<br />

(quando está associado ao mero exercício de poder negocial e independente da<br />

eficiência produtiva) e que, paralelamente, esteja associado a um aumento do SP<br />

com efeitos nefastos para o consumidor.<br />

474. A questão da aplicação da lei da concorrência neste sector levanta vários desafios.<br />

Aparentemente, os artigos 101 e 102 TFUE (Tratado sobre o Funcionamento da<br />

União Europeia) 109 e correspondentes orientações para a sua aplicação seriam<br />

suficientes para regulamentar as relações comerciais <strong>entre</strong> fornecedores e<br />

distribuição. Contudo, mesmo quando não existe uma posição dominante à la<br />

artigo 102 TFUE e correspondentes disposições nacionais (artigo 6.º da Lei n.º<br />

18/2003, de 11 de Junho) alguns retalhistas podem ainda exercer poder de<br />

compra de formas que podem ser interpretadas como lesivas para a concorrência.<br />

O problema reside na interpretação e aplicação do conceito de posição dominante<br />

no contexto das relações <strong>entre</strong> retalhistas e fornecedores 110 .<br />

109 Substitui o Tratado CE.<br />

110 No artigo 7.º, n.º 3, da lei nacional da concorrência (Lei n.º 18/2003, cit.) está contemplado o conceito de<br />

dependência económica que vem explicitamente referir a questão da dependência de fornecedores que<br />

não têm uma alternativa equivalente.<br />

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475. Por exemplo, de acordo com Warwick and Murray (2009) 111 , a análise da<br />

regulação do sector do retalho alimentar no Reino Unido veio, de acordo com a<br />

interpretação da Competition Comission (CC), alertar para a insuficiência dos<br />

artigos 101 e 102 TFUE para garantirem que esses mercados funcionem<br />

concorrencialmente. De acordo com estes autores, a falha existe quando certas<br />

características dos mercados indiciam que a concorrência não está a funcionar<br />

correctamente. Esta falha de mercado não ocorre devido à existência de ilícitos<br />

jusconcorrenciais, quer ao abrigo do artigo 101 TFUE, quer ao abrigo do artigo<br />

102 TFUE, mas outrossim devido à natureza estrutural do mercado retalhista<br />

caracterizado por um elevado grau de concentração 112 .<br />

476. As questões relativas ao poder de compra de um operador de mercado suscitam<br />

três tipos de potenciais problemas: (i) operações de concentração <strong>entre</strong> grandes<br />

compradores, potencialmente conducentes a um elevado índice de concentração<br />

no mercado retalhista e, consequentemente, a um excessivo SP; (ii) agentes<br />

independentes que fazem acordos de compras conjuntas (centrais de compras); e<br />

(iii) compradores poderosos que exercem abusivamente o seu poder de compra<br />

para extraírem vantagens sobre os fornecedores sem contrapartidas<br />

proporcionais 113 .<br />

477. A política de concorrência preocupa-se em primeiro lugar com distorções no<br />

mercado que afectam o bem-estar do consumidor final, privilegiando por isso a<br />

intervenção nos mercados a jusante.<br />

478. Por outro lado, refira-se que a política de concorrência não tem uma finalidade<br />

redistributiva, entendida como um instrumento para salvaguardar a sobrevivência<br />

dos retalhistas mais pequenos. Contudo, embora este não possa ser um fim, ele<br />

pode, em certas circunstâncias, ser um meio necessário para garantir que, no<br />

longo prazo, um excessivo grau de concentração no retalho não prejudique o<br />

111<br />

Warwick, N. and Murray, D. (2009), “Regulation of UK Supermarkets: The Saga Continues”. European<br />

Competition Law Review, Vol. 30(8), pp. 376-378.<br />

112 Este argumento surge na sequência da deliberação do Competition Appeals Tribunal (CAT) contra aspectos<br />

do relatório da Competition Comission (CC) sobre os mercados retalhistas no Reino Unido que limitavam a<br />

capacidade de expansão ou abertura de novas lojas a estabelecimentos com quotas de mercado elevadas.<br />

O recurso interposto pela TESCO e aceite pelo CAT baseou-se no argumento de que a CC não considerou<br />

os potenciais efeitos nefastos sobre os consumidores, nem aferiu correctamente da proporcionalidade da<br />

medida.<br />

113 Vide Bundeskartellamt, “Buyer Power in Competition Law- Status and Perspectives”, Meeting of the<br />

Working Group on Competition Law, 18 Setembro 2008.<br />

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consumidor final, especialmente quando este processo é fruto do mero exercício<br />

de poder negocial.<br />

479. Apesar da legislação nacional incluir disposições que contemplam as situações de<br />

venda com prejuízo e práticas comerciais abusivas (Decreto-Lei n.º 370/93, de 29<br />

de Outubro, coma redacção do Decreto-Lei n.º 140/98, de 16 de Maio), são<br />

sobretudo os efeitos dinâmicos e logo a médio e longo prazo do exercício do poder<br />

de compra, ou seja, a visão prospectiva da politica de concorrência que estão em<br />

causa, e a adequabilidade da “actual” interpretação das leis da concorrência.<br />

A2.2. Definição e origens do conceito de poder de<br />

compra<br />

A2.2.1. Poder de compra como resultado da existência de rendas<br />

económicas<br />

480. Uma condição necessária para a existência do fenómeno de poder de compra é a<br />

presença de rendas económicas do lado da oferta do mercado 114 . Por sua vez,<br />

elas existem se, na sua globalidade, os fornecedores do produto em causa<br />

auferem mais receitas do que o mínimo necessário para induzi-los a fornecer a<br />

mesma quantidade do produto 115 . Segundo Noll (2005), existem três tipos de<br />

renda económica do lado da oferta que podem ser apropriadas pela procura no<br />

mercado se esta detiver poder de compra (nomeadamente sobre a forma de<br />

monopsónio): rendas Ricardianas – associadas a diferenças de produtividade ou<br />

nos custos unitários <strong>entre</strong> os factores produtivos; quase-rendas – definidas como<br />

a diferença <strong>entre</strong> as receitas totais e os custos de curto-prazo; e os lucros de<br />

monopólio (ou oligopólio), definidos como a diferença <strong>entre</strong> as receitas e os custos<br />

totais de produção de longo prazo, decorrentes da existência e exercício do poder<br />

de mercado pelos vendedores.<br />

481. No primeiro caso, o poder de compra do lado da procura apropria a renda dos<br />

fornecedores mais eficientes; no segundo, absorve a renda que seria destinada a<br />

114 Vide Noll, R. (2005) “Buyer Power and Economic Policy”, SIEPR Discussion Paper No. 04-08, sobre rendas<br />

económicas e poder de compra na forma de monopsónio.<br />

115 A não existirem estas rendas do lado da oferta, a procura nada poderia extrair dos seus fornecedores, já<br />

que qualquer tentativa de pagar um preço abaixo do custo marginal em que estes incorrem apenas<br />

resultaria na sua saída do mercado.<br />

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cobrir os custos afundados (sunk costs) da sua actividade não sendo, portanto,<br />

uma situação sustentável no longo-prazo; no terceiro caso, o poder de compra<br />

pode contrabalançar o poder de mercado do fornecedor monopolista (ou<br />

oligopolista), produzindo um resultado de mercado mais eficiente e com<br />

melhoramentos no bem-estar líquido do consumidor caso haja pass-through.<br />

A2.2.2. Visão tradicional: Poder de compra e monopsónio<br />

482. A visão tradicional do conceito de poder de compra associa este fenómeno a uma<br />

situação de monopsónio que é em tudo análoga à estratégia do monopolista, só<br />

que no lado da procura. Da mesma forma que os vendedores monopolistas sobem<br />

os preços ao restringir a oferta, o comprador monopsonista consegue baixar o<br />

preço ao restringir a procura.<br />

483. Esta visão de poder de compra é apropriada quando aplicada a mercados de<br />

“commodities” competitivos, onde existe apenas um preço de transacção, e<br />

compradores e vendedores interagem de acordo com regras comuns e pré-<br />

determinadas. Neste contexto, o exercício deste tipo de poder de compra<br />

prejudica o bem-estar global na medida em que a quantidade transaccionada é<br />

menor do que no modelo competitivo, e gera à semelhança do monopólio uma<br />

perda líquida de bem-estar (v.g., Noll, 2005).<br />

A2.2.3. Visão da teoria da negociação (“Bargaining Theory”)<br />

484. Esta interpretação do conceito de poder de compra não é a mais apropriada para<br />

descrever as relações que se estabelecem <strong>entre</strong> fornecedores e distribuidores no<br />

sector alimentar. Aqui, existem relativamente poucos distribuidores/retalhistas<br />

que interagem bilateralmente com os fornecedores de produtos de marca e<br />

produtores de marcas-próprias. Neste contexto, podem haver diferenças<br />

substanciais nos preços médios pagos por diferentes compradores e o poder de<br />

compra manifesta-se, sobretudo, pela magnitude dos descontos e outras<br />

condições de transacção que cada comprador consegue obter 116 .<br />

116 Note-se que vendas com diferentes preços nem sempre são sinónimo de exercício de poder de compra<br />

(então são sinómnimo de quê?) Para um fornecedor monopolista a prática de discriminação de preços é<br />

(pode ser?) uma estratégia óptima.<br />

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485. É no contexto das teorias de negociação bilateral que se deve analisar esta<br />

situação 117 . Estas teorias assentam no princípio de que o poder de negocial de<br />

cada uma das partes aumenta com o valor da sua opção-fora-do-contrato (OFC).<br />

Por um lado, o comprador tem a opção de encontrar outro fornecedor e retirar os<br />

produtos do actual, enquanto que o fornecedor pode procurar canais alternativos<br />

para fazer escoar os seus produtos.<br />

486. Qualquer evento que aumente o valor da OFC do comprador e não aumente a do<br />

vendedor, permitirá ao comprador apropriar-se de uma fracção maior do lucro<br />

conjunto gerado pelo contrato, via aumento do seu poder de compra. Por<br />

exemplo, o comprador pode passar a ter conhecimento da estrutura de custos dos<br />

seus fornecedores e, assim, estar em melhor posição para extrair rendas destes.<br />

Note-se que o resultado das negociações <strong>entre</strong> qualquer um fornecedor e um<br />

retalhista impõe uma externalidade aos demais retalhistas, tanto no mercado a<br />

jusante (se houver pass-through) como a montante se houver por exemplo um<br />

waterbed-effect 118 .<br />

487. Por outro lado, há que salientar que o poder de negociação de cada uma das<br />

partes é função não só do valor da OFC de cada uma delas, mas também da<br />

“estrutura de conhecimento” das partes em relação ao valor e ao conhecimento<br />

da OFC de ambas.<br />

A2.2.4. Definição de poder de compra<br />

488. Embora não exista apenas uma definição de poder de compra, regra geral todas<br />

elas envolvem os conceitos de monopsónio, contrapoder (da oferta), poder de<br />

negociação, reflectindo vários aspectos do problema. Em todas elas, poder de<br />

compra diz respeito a uma situação em que de acordo com Noll (2005) “… o lado<br />

da procura do mercado é suficientemente concentrado de forma a permitir aos<br />

compradores exercer poder de mercado sobre os vendedores”.<br />

117 Vide Inderst, R and N. Mazzarotto (2006) “Buyer Power in Distribution”, Issues in Competition Law and<br />

Policy, Capitulo XX (W.D. Collins ed., em http://personal.lse.ac.uk/inderst/buyerpower_in<br />

_distribution_chapter.pdf) e Chen, Z. (2007) “Buyer Power: Economic Theory and Antitrust Policy”<br />

Research in Law and Economics, 22: 17-40, sobre como a teoria de negociação dá o enquadramento<br />

teórico adequado para descrever as relações bilaterais <strong>entre</strong> fornecedores e distribuidores.<br />

118 Note-se que caso não ocorra um WBE, pode existir uma externalidade pecuniária decorrente de uma<br />

redução nos preços pagos ao fornecedor por todos os compradores.<br />

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489. Ainda de acordo com este autor, enquanto imagem do monopólio do lado da<br />

procura, poder de compra pode ser definido “…como a capacidade dos<br />

compradores exercerem o seu poder de mercado para fixarem (com lucro) os<br />

preços abaixo do seu valor competitivo”. Como já referido, no caso de uma<br />

situação de monopsónio, em que o lado da oferta é competitivo e assumindo que<br />

a curva de oferta tem declive positivo, o poder de compra é exercido através da<br />

contracção da procura. Esta definição é, contudo, redutora porque quase sempre<br />

o exercício de poder de compra vai além da fixação de preços baixos, incluindo a<br />

exigência de outro tipo de contrapartidas por parte dos compradores.<br />

490. A definição proposta pela OCDE, por sua vez, afirma que “… um retalhista tem<br />

poder de compra se, relativamente a pelo menos um fornecedor, pode ameaçar<br />

de forma credível a imposição de um custo de oportunidade de longo prazo (i.e.<br />

prejuízo ou reter um benefício) que, caso a ameaça fosse executada, seria<br />

significativamente desproporcionada em relação a qualquer custo de oportunidade<br />

de longo prazo em si mesmo”.<br />

491. Esta definição, refere-se a poder de compra como “capacidade de negociação<br />

bilateral”, e difere de poder de monopsónio porque o preço mais baixo resulta de<br />

uma ameaça e não propriamente do acto de redução da quantidade procurada em<br />

mercado. Isto implica que o poder de negociação só pode ser exercido se as<br />

empresas fornecedoras, na ausência de exercício de poder de compra, operarem<br />

com preços acima dos custos marginais, e por isso, se existir concorrência<br />

imperfeita <strong>entre</strong> fornecedores, geradora de rendas. Quando o poder de compra é<br />

exercido neste contexto, constitui uma forma de contrapoder relativamente ao<br />

poder de mercado dos fornecedores.<br />

492. Chen (2007, 2008) 119 dá uma definição de poder de compra que incorpora as<br />

duas problemáticas preço: “ poder de compra é a capacidade de um comprador<br />

reduzir o preço de forma proveitosa abaixo do preço normal de venda do<br />

fornecedor, ou mais genericamente, a capacidade de obter termos de<br />

fornecimento mais favoráveis que os termos normais do fornecedor. O preço<br />

119 Chen (2007). “Buyer Power: Economic Theory and Antitrust Policy”. Research in Law and Economics,<br />

Vol.22, pp.17-40; Chen (2008). “Defining Buyer Power”, The Antitrust Bulletin, Vol.53(2), pp.241-249.<br />

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normal de venda, por sua vez, é definido com o preço do fornecedor que<br />

maximiza o lucro na ausência de poder de compra” 120 .<br />

493. Apesar das diferentes estruturas competitivas do lado da oferta originarem<br />

diferentes conceitos de poder de compra, as várias definições envolvem quase<br />

sempre o conceito “termos de troca” em lugar de preços, enfatizando o facto de<br />

que os contratos <strong>entre</strong> fornecedores e retalhistas, regra geral, envolverem outras<br />

contrapartidas que não o preço (em alguns casos é possível traduzir essas<br />

contrapartidas num efeito preço). Segundo Dobson, P. et al (2001) 121 “… poder de<br />

compra pode manifestar-se nas obrigações contratuais que os retalhistas<br />

consigam impor aos seus fornecedores, tais como: pagamentos para espaço na<br />

prateleira, custos de entrada, descontos de quantidade, contribuições para<br />

despesas promocionais, cláusulas de cliente mais favorecido, e acordos de<br />

exclusividade”.<br />

A2.3. Formas de exercício do poder de compra<br />

494. No contexto das relações <strong>entre</strong> distribuidores e fornecedores, o exercício de poder<br />

de compra é o resultado da capacidade de alguns retalhistas obterem dos<br />

fornecedores termos de troca mais favoráveis do que aqueles disponíveis a<br />

outros, ou que seriam expectáveis em condições normais de mercado i.e., em<br />

mercados concorrenciais. Isto inclui não só os descontos, mas toda uma série de<br />

obrigações contratuais que podem ser encaradas como restrições verticais,<br />

impostas pelos retalhistas aos fornecedores. Tais restrições podem traduzir-se nos<br />

comportamentos que de seguida se descrevem.<br />

495. Selecção de fornecedores: os compradores exigem pagamentos para que<br />

determinados produtos façam parte da lista de potencial fornecedor;<br />

496. Custos de entrada; custos de referenciação de novos produtos (entrada em linha)<br />

são variáveis e negociáveis loja a loja da mesma cadeia sendo novamente<br />

120 Esta definição levanta porém a questão de como determinar o preço normal de venda, já que o exercício<br />

de poder de compra é uma característica “normal” do mercado. Por outro lado, o termo definido, “poder<br />

de compra” é incluído na sua própria definição, o que levanta um problema lógico.<br />

121 Dobson, P., Roger, C., Davies, S. and M. Waterson (2001) “Buyer Power and its Impact on Competition in<br />

the Food Retail Distribution Sector of the European Union”, Journal of Industry Competition and Trade,<br />

3(1): 247-280.<br />

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exigidos em situações de mudança de insígnia da loja (situações de aquisições de<br />

estabelecimentos por outra cadeia);<br />

497. Espaço na prateleira: são cobrados montantes para que os produtos dos<br />

fornecedores possam ser expostos nas prateleiras dos retalhistas;<br />

498. Descontos retroactivos: são pedidos descontos sobre transacções já efectuadas;<br />

499. Cláusula de cliente mais favorecido: obrigação contratual que impossibilita o<br />

fornecedor de vender a qualquer outro retalhista a um preço mais baixo;<br />

500. Contribuição para despesas de promoção não justificadas;<br />

501. Insistência na exclusividade de fornecimento;<br />

502. Imposição de rappel incondicional: sem qualquer contrapartida em termos de<br />

volume de vendas anual;<br />

503. Imposição ou dilatação de prazos de pagamento com a ameaça de retirada dos<br />

produtos de todas as lojas da cadeia;<br />

504. “look-alike”: utilização abusiva de “facings” dos produtos de marca dos<br />

distribuidores semelhantes aos das marcas dos fornecedores induzindo em erro os<br />

consumidores.<br />

A2.4. Origens do poder de compra no retalho<br />

A2.4.1. Dimensão<br />

505. Regra geral, a origem de poder de compra no retalho está associada a uma série<br />

de inovações tecnológicas que permitiu às grandes cadeias da distribuição<br />

alimentar, usufruir de economias de escala e de gama. Estes avanços tecnológicos<br />

estão associados a um movimento de consolidação e concentração do lado da<br />

procura, que conferiu poder de compra aos compradores perante os fornecedores.<br />

Por isso, um factor crítico para o exercício de poder de compra é a dimensão do<br />

retalhista.<br />

506. De acordo com Inderst e Mazzarotto (2006), a dimensão aumenta o valor da OFC<br />

do retalhista de várias formas: ele pode ameaçar integrar a sua actividade a<br />

montante - nomeadamente mediante a produção de marcas próprias - tornando o<br />

fornecedor redundante; pode ameaçar de forma credível mudar de fornecedor; ou<br />

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pode ajudar a criar condições para a entrada de novos fornecedores, através da<br />

participação nos custos de arranque e garantindo a sua viabilidade económica<br />

com o seu volume de compras.<br />

507. Simultaneamente, a dimensão do retalhista, medida pelo seu peso no lado da<br />

procura no mercado de aprovisionamento, pode diminuir o valor da OFC do<br />

fornecedor. Mediante a capacidade que o fornecedor tenha de encontrar canais<br />

alternativos, substituir um contrato de grandes dimensões pode requerer uma<br />

redução significativa no preço e logo nos seus lucros. Na verdade, não é só um<br />

problema de dimensão mas sim da estrutura da procura no mercado de<br />

aprovisionamento. Por exemplo, um retalhista pequeno (em volume ou valor de<br />

vendas 122 ) mas monopolista pode ser mais difícil de substituir que um grande<br />

retalhista que opere num mercado competitivo.<br />

508. Por isso, o nível de concentração no lado da oferta do mercado de aquisição é um<br />

factor fundamental: quanto menos concentrado for, mais fácil será para o<br />

fornecedor encontrar canais alternativos. Logo, fornecedores com quotas de<br />

mercado elevadas podem libertar-se do poder de compra dos retalhistas com<br />

menores custos ou, alternativamente, os retalhistas têm menor poder de compra<br />

junto destes fornecedores.<br />

A2.4.2. Dependência económica<br />

509. O conceito fundamental para a determinação de poder de compra é o grau de<br />

dependência económica: “Um fornecedor será tanto mais dependente<br />

economicamente de um comprador quanto menos puder correr o risco de o<br />

perder como cliente e quanto mais este o puder dispensar enquanto fornecedor”.<br />

Uma medida directa desse grau de dependência do fornecedor relativamente ao<br />

retalhista, é a proporção das compras do retalhista nas vendas totais do<br />

fornecedor. Além disso, como medida do efeito real do exercício de poder de<br />

compra, é importante comparar a perda percentual nos lucros do fornecedor<br />

relativamente à perda percentual do lucro do retalhista em caso de ruptura de<br />

122 O que nos remete para a importância de considerar a “dimensão” de um determinado operador de<br />

mercado no contexto do mercado relevante em que opera.<br />

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contrato: o poder de negociação do retalhista será tanto maior quanto menor<br />

(eventualmente nula) for a sua perda relativa. 123<br />

510. Na aplicação dos conceitos de poder de compra e dependência económica do<br />

fornecedor relativamente a um retalhista devem se ter em conta como factores<br />

agravantes: o grau de vulnerabilidade financeira do fornecedor; a sua capacidade<br />

de reduzir a escala da sua produção na eventualidade de ruptura de contrato, ou<br />

de encontrar alternativas equivalentes.<br />

A2.4.3. Comercialização de marcas próprias<br />

511. É comum assumir-se que quando um retalhista vende uma marca própria (ou<br />

marca do distribuidor, MDD), o seu preço de aquisição iguala o custo marginal,<br />

porque este ou encomenda a uma franja competitiva da indústria ou integra<br />

verticalmente a sua actividade. Neste contexto, existem duas teorias que<br />

explicam em que condições a venda de MDD confere aos retalhistas poder de<br />

compra perante os fornecedores de marca 124 . A primeira, assume estruturas de<br />

custos variáveis iguais (já que os produtos de marca têm custos fixos maiores<br />

associados à promoção e publicidade), mas qualidades diferentes (Mills,<br />

1995) 125 ; a segunda assume que para a mesma qualidade os custos marginais<br />

são superiores na produção da MDD (Bontems, Monier and Réquillart, 1999) 126 .<br />

512. Na primeira teoria, as características físicas dos bens são idênticas mas a<br />

percepção que os consumidores têm deles – qualidade subjectiva – é diferente.<br />

Quando a qualidade da MDD é muito baixa, o retalhista não a introduz no<br />

mercado porque ela é considerada como sendo um substituto fraco do produto de<br />

marca. Neste caso, o retalhista não consegue através da sua MDD exercer poder<br />

123 A determinação do benchmark a partir do qual se considera haver uma relação de dependência económica<br />

constitui um problema para a aplicação desta definição como discutido em Pozdnakova, A. (2009) “Buyer<br />

Power in the Retail Sector: Evolving Latvian Regulation”, European Competition Law Review, 8: 387-392.<br />

124 Bergés-Sennou, F., Bontems, P., and V. Réquillart (2004). “Economics of Private Labels: A Survey of the<br />

Literature”, Journal of Agricultural and Food Industrial Organization, 2(1), article 3.<br />

125<br />

Mills, E. (1995) “Why Retailers Sell Private Labels”, Journal of Economics and Management Strategy, 4(3):<br />

509-528.<br />

126<br />

Bontems, P., Sylvette, M., and V. Réquillart (1999) “Strategic Effects of Private Labels”, European Review<br />

of Agricultural Economics, 26(2): 147-165.<br />

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<strong>Relações</strong> <strong>Comerciais</strong> <strong>entre</strong> a <strong>Grande</strong> <strong>Distribuição</strong> <strong>Agro</strong>-<strong>Alimentar</strong> e os seus Fornecedores (Preliminar)<br />

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de compra sobre o fornecedor 127 . Se a qualidade está acima de um dado nível,<br />

então o retalhista pode ameaçar, de uma forma credível, a introdução da MDD e,<br />

assim, forçar o produtor a reduzir o seu preço. A redução será tanto maior quanto<br />

maior for esse nível de qualidade. Acima de determinado nível de qualidade, o<br />

fornecedor não consegue impedir a entrada da MDD e concorre directamente<br />

fixando um preço cujo diferencial relativamente ao preço da MDD será tanto<br />

menor quanto maior for a qualidade do produto de MDD, ainda que inferior à<br />

qualidade do produto de marca. No limite, se os produtos são idênticos, o preço<br />

do fornecedor igualará o custo marginal de produção da MDD e o lucro do<br />

fornecedor será nulo 128 .<br />

513. Na segunda teoria, assume-se que para a mesma qualidade os custos marginais<br />

são superiores na produção da MDD. Se a qualidade do bem é fraca, o fornecedor<br />

não consegue impedir a entrada da MDD a baixo custo. Se a qualidade da MDD<br />

for bastante fraca e consequentemente o preço também for baixo, e se os<br />

consumidores não tiverem dispostos a pagar o diferencial de preço para comprar<br />

o produto de marca, estes podem, no limite, sair do mercado.<br />

514. Regra geral, a entrada da MDD motiva uma redução no preço do produto de<br />

marca que será tanto maior quanto maior a qualidade do MDD. Contudo, dada a<br />

hipótese sobre a relação com os custos marginais, um aumento da qualidade da<br />

MDD conduz a um aumento dos custos, que pode levar a um aumento do preço<br />

do produto de marca. Para valores intermédios de qualidade da MDD, o<br />

fornecedor fixa um preço que impede a entrada do produto, e que é crescente<br />

com a qualidade. Acima de um certo patamar de qualidade, a MDD não é<br />

suficientemente competitiva. Neste caso o preço do produto de marca não é<br />

limitado pelo poder de compra do comprador.<br />

515. Em qualquer dos casos, se a estratégia da MDD confere poder de compra ao<br />

fornecedor, produzindo uma ruptura (temporária) no fornecimento do produto de<br />

marca, parte das vendas deste serão capturadas pela MDD, aumentando por isso<br />

o valor da OFC do retalhista.<br />

127 Note-se que a estratégia dos “look-alike” pode, pelo menos durante algum tempo, favorecer a MDD,<br />

mesmo sendo esta de qualidade inferior ao produto de marca.<br />

128 Nesta teoria embora a qualidade subjectiva do produto seja um conceito definido pelo consumidor final, é<br />

o retalhista que toma a decisão do nível de qualidade do produto que irá oferecer.<br />

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516. A comercialização de marcas próprias pode aumentar substancialmente o poder<br />

de compra do retalhista e, simultaneamente, gerar distorções significativas na<br />

concorrência de três formas 129 : (i) através da capacidade que os grandes<br />

distribuidores têm de explorar a sua dupla condição de compradores e<br />

concorrentes dos produtos de marca; (ii) através de concorrência “desleal”<br />

mediante o uso (abuso) de estratégias de “look-alike”; (iii) e através do potencial<br />

de crescimento de marcas próprias para reduzir a concorrência <strong>entre</strong> retalhistas.<br />

517. Relativamente à primeira forma, a grande distribuição tem a capacidade de<br />

controlar as condições de acesso ao mercado dos produtos de marca<br />

relativamente a variáveis tão importantes como: espaço de prateleira, preço no<br />

consumidor, promoções etc., além de ter a capacidade de exigir informação sobre<br />

as estratégias de marketing e planos de novos produtos de marca. O acesso a<br />

esta informação pode ser usado para posicionar estrategicamente as MDD de<br />

forma a se anteciparem a essas inovações.<br />

518. Na segunda forma, a MDD pode induzir o consumidor em erro, ao pretender fazer<br />

passar a ideia de que o produto é idêntico, é produzido pela mesma empresa ou é<br />

de qualidade igual ao produto de marca. Isto distorce a concorrência <strong>entre</strong><br />

retalhistas e fornecedores, mas também pode afectar a concorrência <strong>entre</strong><br />

retalhistas (ver Dobson, 1998) 130 .<br />

519. A terceira forma de distorção na concorrência deriva do facto da MDD poder,<br />

eventualmente, reduzir a capacidade dos consumidores compararem as ofertas de<br />

diferentes retalhistas, contribuindo assim para uma limitação da concorrência via<br />

preços <strong>entre</strong> diferentes retalhistas. Esta análise assenta no pressuposto que só os<br />

produtos de marca podem ser directamente comparáveis, já que a MDD produz<br />

algum grau de diferenciação no produto. Contudo, apesar da existência dessas<br />

diferenças, regra geral os consumidores têm a capacidade de comparar MDD de<br />

diferentes retalhistas com base nos preços e, após aquisição, com base na<br />

qualidade.<br />

129 “Working paper on the competitive effects of own-label goods” da CC do RU (http://www.competitioncommission.org.uk/Inquiries/ref2006/grocery/pdf/working_paper_own_label.pdf).<br />

130 Dobson, P. (1998) “The Competition Effects of Look-alike Products”, University of Nottingham.<br />

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A2.5. Consequências do poder de compra: Análise do<br />

bem-estar<br />

A2.5.1. Consequências do monopsónio<br />

520. A análise do impacto sobre o bem-estar do poder de compra deve ter em conta<br />

que, embora exercido nos mercados a montante, afecta também o equilíbrio dos<br />

mercados a jusante no que respeita a preços e quantidades.<br />

521. Considere-se, primeiro, os efeitos do monopsónio, em que o comprador enfrenta<br />

um mercado competitivo. Neste caso simples, o poder de compra é exercido<br />

mediante restrição da quantidade procurada produzindo uma redução no preço.<br />

Como consequência, existe uma transferência de bem-estar do vendedor para o<br />

comprador, mas uma perda líquida de bem-estar (equivalente ao do monopólio)<br />

associado à redução da quantidade transaccionada. Esta perda de eficiência,<br />

verifica-se independentemente da estrutura competitiva do mercado a jusante<br />

enfrentada pelo monopsonista.<br />

522. Existem, por isso, três razões porque o monopsónio é ineficiente: (i) se a oferta<br />

não for perfeitamente elástica o nível de produção é muito baixo em relação ao<br />

regime competitivo; (ii) pode assistir-se a uma utilização ineficiente de substitutos<br />

imperfeitos; (iii) se o bem em monopsónio, enquanto input, não tiver substitutos,<br />

os produtos que o utilizam serão também produzidos em quantidades inferiores<br />

relativamente à situação de não monopsónio e, por isso, vendidos a um preço<br />

mais elevado.<br />

523. A perda de eficiência associada à perda líquida de bem-estar pode ser mitigada,<br />

ou até anulada, se as partes acordarem na adopção de um esquema de fixação de<br />

preço não linear, de modo a capturar o bem-estar social perdido.<br />

524. Desde que a curva de oferta seja crescente e as transacções sejam baseadas num<br />

preço único (fixação de preço linear), os resultados anteriores podem ser<br />

extensíveis a um mercado oligopsonista, onde um número reduzido de grandes<br />

compradores exerce poder de compra sobre um grupo de vendedores<br />

competitivos. Nesta estrutura de mercado, o exercício de poder de compra requer<br />

que se verifiquem três condições: (i) os compradores contribuírem, de forma<br />

substancial, para as compras no sector; (ii) a existência de barreiras à entrada de<br />

novos compradores; (iii) e as curvas de oferta serem crescentes. Esta última<br />

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hipótese é necessária para a existência de perda líquida de bem-estar tal como no<br />

caso de um monopsónio.<br />

525. Nesta situação, os consumidores finais beneficiam de um aumento de bem-estar<br />

desde que a redução obtida no preço (assumindo que existe pass-through) mais<br />

do que compense a redução na quantidade vendida. Além disso, o efeito líquido<br />

global deve ter em conta não só a transferência de renda dos fornecedores para<br />

os compradores, mas também uma perda de eficiência devido à redução da<br />

procura dos fornecedores noutros mercados.<br />

526. Por fim, nada garante que o exercício de poder de compra do monopsonista se<br />

repercuta, favoravelmente, sobre o bem-estar do consumidor.<br />

A2.5.2. Consequências do contrapoder da procura<br />

527. As análises de Ungern-Sternberg 131 e de Dobson & Waterson 132 sobre os efeitos<br />

do contrapoder da procura (countervailing power), são motivadas pela tendência<br />

verificada para a concentração dos mercados de venda a retalho e o surgimento<br />

de poderosos retalhistas. Ambos concluem que o aumento da concentração no<br />

retalho não conduz, necessariamente, a uma diminuição dos preços mas pode,<br />

sob certas condições, levar a uma subida dos mesmos.<br />

528. O primeiro mostra que quando no mercado se encontram um produtor<br />

monopolista e um grupo de retalhistas oligopolistas que oferecem os mesmos<br />

serviços e concorrem à Cournot, uma diminuição do número de retalhistas conduz<br />

a um aumento nos preços de equilíbrio. Estes só descerão se aquela diminuição se<br />

der num contexto em que o lado da procura do mercado de aprovisionamento é<br />

competitivo. Os segundos consideram um mercado com a mesma estrutura, mas<br />

em que os serviços prestados pelos retalhistas são substitutos imperfeitos. Neste<br />

contexto, os preços no consumidor descem com a redução do número de<br />

retalhistas, apenas se os seus serviços forem substitutos.<br />

529. Em ambos os argumentos, é evidente o conflito <strong>entre</strong> as duas forças geradas pelo<br />

processo de consolidação no retalho. Com a redução do número de retalhistas<br />

131<br />

Von Ungern-Sternberg, T. (1996). “Countervailing Power Revisited”, International Journal of Industrial<br />

Organization, 14: 507-520.<br />

132<br />

Dobson, P. and M. Waterson (1997) “Countervailling Power and Consumer Prices”, Economic Journal, 107:<br />

418-430.<br />

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imposta pela consolidação, os sobreviventes ganham poder de compra sobre os<br />

fornecedores, o que tende a reduzir os preços grossistas, mas ganham poder de<br />

mercado sobre os seus clientes, e por isso capacidade para aumentar as suas<br />

margens. O efeito total dependerá do nível de concorrência na oferta do mercado<br />

a retalho. Em qualquer dos casos e nesta perspectiva, o contrapoder da procura,<br />

tem sempre o efeito positivo de melhorar a eficiência económica ao exercer uma<br />

pressão para a redução dos preços grossistas. Resta saber em que condições é<br />

que existe pass-through para o consumidor e até que nível ele ocorre.<br />

530. Em outros contextos Chen (2003) 133 mostra que contrapoder não melhora<br />

necessariamente a eficiência. Numa situação em que o fornecedor monopolista<br />

enfrenta uma procura composta por um retalhista dominante e uma “franja<br />

competitiva”, um aumento do poder de compra do retalhista dominante tende a<br />

reduzir o preço pago pelos consumidores. Esta redução pode porém, ocorrer às<br />

custas de uma perda de eficiência no aprovisionamento dos serviços de retalho, já<br />

que os demais retalhistas competitivos terão de baixar as quantidades adquiridas<br />

para fazer face ao preço mais baixo. Como consequência, a quantidade total<br />

aprovisionada no retalho poderá baixar conduzindo a um resultado ineficiente.<br />

Além disso, se o exercício de poder de compra não está relacionado com uma<br />

maior eficiência a jusante, a redistribuição da quota de mercado no retalho é<br />

artificial e, por isso, introduz uma distorção nesses mercados.<br />

531. Se na situação anterior o retalhista dominante tem dimensão nacional e os<br />

restantes têm uma dimensão local, perante o aumento do poder de compra o<br />

fornecedor pode aumentar os preços aos retalhistas locais e, neste caso, o<br />

countervailling power melhora o bem-estar de uns consumidores mas piora o de<br />

outros (Erutku, 2005) 134 .<br />

532. Uma outra situação em que existe poder de mercado dos dois lados sucede<br />

quando um monopsonista enfrenta fornecedores com uma estratégia de<br />

diferenciação de produto. Na ausência de exercício de poder de compra, cada<br />

fornecedor vende ao preço que iguala o custo médio de longo prazo. Quando o<br />

monopsonista impõe o seu poder de compra, oferecendo ao fornecedor um preço<br />

inferior ao por ele fixado mas ainda superior ao custo marginal, estes aceitarão o<br />

133<br />

Chen, Z. (2003). “Dominant Retailers and Countervailing Power Hypothesis”. RAND Journal of Economics,<br />

34: 612-625.<br />

134<br />

Erutku, C. (2005). “Buying Power and Strategic interactions”. Canadian Journal of Economics. 38: 1160-<br />

1172.<br />

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proposto e, a concorrência <strong>entre</strong> eles encarregar-se-á de igualar o preço ao custo<br />

marginal. Como resultado, o monopsonista consegue extrair as quase-rendas dos<br />

fornecedores. No longo prazo, este resultado pode forçar alguns fornecedores a<br />

sair do mercado, conduzindo a uma bilateralização do mesmo e,<br />

subsequentemente, a uma inversão nos termos de troca já que os sobreviventes<br />

têm agora mais poder de mercado e paralelamente a OFC do retalhista baixa.<br />

Além disso, neste caso a eventual descida do preço no retalho tem, como<br />

consequência uma redução na variedade de produtos e, por isso, o resultado<br />

sobre o bem-estar líquido do consumidor é, assim, ambíguo.<br />

A2.5.3. Agrupamentos de compras e/ou de negociação<br />

533. Quais os incentivos para formar um grupo ou central de compras e/ou de<br />

negociação (GC) 135 Um primeiro argumento, afirma que os GC se formam como<br />

resposta às ineficiências geradas pelos mercados de aprovisionamento<br />

monopolistas, que produzem um número significativo de produtos que são<br />

vendidos a preços excessivamente elevados. Este resultado de mercado é<br />

suficiente para incentivar os compradores a colectivamente oferecerem contractos<br />

de exclusividade a um subconjunto de fornecedores, em troca de preços mais<br />

baixos. Enquanto que os compradores no GC e os consumidores finais que deles e<br />

abastecem sairão beneficiados, os compradores fora do GC podem enfrentar<br />

preços mais elevados e menos fornecedores em virtude dos contractos de<br />

exclusividade, tendo como consequência a perda de bem-estar dos seus<br />

consumidores.<br />

534. De acordo com Dana (2003) 136 , os GC podem criar poder de compra ao<br />

anunciarem comprar apenas ao fornecedor que oferecer o preço mais baixo,<br />

induzindo um nível de concorrência mais elevado <strong>entre</strong> os fornecedores. Se<br />

houver algum grau de diferenciação nos produtos dos diversos fornecedores,<br />

embora alguns membros do grupo possam acabar por adquirir o produto que<br />

valorizam menos, o benefício esperado da redução de preço supera a perda<br />

associada à aquisição do produto errado.<br />

135<br />

Se o único objectivo do Grupo de Compras (GC) é obter poder de compra então toda a análise anterior é<br />

aplicável neste contexto.<br />

136 Dana, (2003). “Buyer Group as Strategic Commitments”. Mimeo. Northwest University, EUA.<br />

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535. Finalmente, os GC podem surgir como o resultado de economias de escala na<br />

tecnologia de distribuição do fornecedor, que torna mais vantajoso agregar as<br />

compras de vários clientes. Neste contexto ele pode oferecer descontos de<br />

quantidade, de forma a encorajar encomendas de maior dimensão, criando,<br />

assim, um incentivo para os pequenos compradores juntarem as suas<br />

encomendas.<br />

536. Do ponto de vista da concorrência, os GC levantam outro tipo de questões para<br />

além do exercício de poder de compra. A sua constituição pode criar um ambiente<br />

propício para que as negociações sobre os preços de aquisição se estendam,<br />

também, numa prática colusiva, às quantidades adquiridas por cada um dos<br />

membros, com o intuito de condicionar a oferta total nos mercados a jusante.<br />

Mesmo se essa prática não decorre de forma explícita, com os GC estão criadas as<br />

condições para que se observe uma colusão tácita dado que, neste caso, os<br />

concorrentes têm custos idênticos. Isto é tanto mais grave, quanto maior a quota<br />

detida pelos GCs no mercado a jusante.<br />

A2.5.4. Poder de compra e “Waterbed Effect”<br />

537. Quando o poder de compra é exercido como countervailing power pode, em<br />

muitas circunstâncias, ter como consequência um aumento do bem-estar do<br />

consumidor, desde que o retalhista faça o pass-through pelo menos parcial dos<br />

ganhos. Interessa, contudo, questionar se o aumento de poder de compra de<br />

certos retalhistas pode prejudicar a concorrência de tal forma que no final os<br />

consumidores sejam prejudicados. O que está em causa é a necessidade de se ter<br />

em conta ambas as dimensões vertical e horizontal do exercício de poder de<br />

compra sobre os fornecedores.<br />

538. Interessa por isso definir o conceito de poder de compra diferencial (“Differential<br />

Buyer Power” ou DBP), em que à melhoria nos termos de troca de uns retalhistas<br />

com poder de compra está associada a perda nos termos de troca de retalhistas<br />

com menor capacidade de negociação, produzindo uma redução na concorrência<br />

dos mercados a jusante que pode, no limite, prejudicar o conjunto dos<br />

consumidores em termos líquidos. A este potencial efeito colateral do exercício de<br />

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poder de compra de um retalhista sobre os seus concorrentes, denomina-se<br />

waterbed effect (WBE) 137 .<br />

539. O potencial WBE induzido pelo exercício de poder de compra por parte de um<br />

retalhista é, cada vez mais, um motivo de preocupação, por induzir um efeito em<br />

espiral em que os retalhistas mais fracos, ao verem os seus preços de aquisição<br />

aumentarem e as suas quotas e margens diminuírem, são no limite forçados a<br />

sair do mercado contribuindo, simultaneamente, para um reforço do poder de<br />

compra dos grandes retalhistas. Além disso, nesse processo, se o WBE for<br />

suficientemente forte, pode mesmo no curto prazo prejudicar alguns<br />

consumidores via aumento dos preços de alguns retalhistas.<br />

A2.6. Teorias de “Waterbed Effect”<br />

A2.6.1. “Waterbed Effect” induzido pela reacção do fornecedor<br />

540. Quando um retalhista exerce poder de mercado sobre um fornecedor, extraindo<br />

termos de compra mais vantajosos e reduzindo, por isso, o lucro do fornecedor,<br />

este pode reagir oferecendo termos de venda menos favoráveis aos restantes, de<br />

forma a compensar as perdas e recuperar os lucros perdidos. Existem várias<br />

reservas relativamente a esta teoria: por um lado, este mecanismo pressupõe que<br />

o fornecedor tem capacidade de em qualquer momento discriminar <strong>entre</strong><br />

compradores, o que não é inteiramente óbvio; e por outro lado, não é racional<br />

supor que um fornecedor que maximiza o lucro só a posteriori, e sem nenhuma<br />

alteração nas quantidades transaccionadas, exerce a sua capacidade de impor um<br />

preço mais elevado aos clientes sem poder de compra. É questionável que o facto<br />

de ter de conceder termos de compra mais vantajosos a um fornecedor, lhe<br />

confira capacidade para extrair vantagem sobre os outros retalhistas.<br />

541. Contudo embora de difícil racionalização, este tipo de efeito pode ocorrer se o<br />

fornecedor tiver uma visão “limitada” e concentrada apenas no curto prazo,<br />

preocupando-se apenas em obter uma determinada margem ou em cobrir os<br />

custos fixos. Esta interpretação é suportada por evidência empírica.<br />

137 A presença de um WBE deveria conduzir à existência de uma correlação negativa <strong>entre</strong> os termos de troca<br />

dos retalhistas com poder de compra e os termos de troca dos restantes, o que sugere uma forma<br />

quantitativa de detectar a sua presença após a determinação de uma medida para o “termo de troca”.<br />

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542. Nas duas teorias que em seguida se apresentam, o WBE resulta da interacção dos<br />

efeitos do exercício de poder de compra nos mercados a montante e a jusante,<br />

tendo por isso em conta o impacto das relações verticais <strong>entre</strong> fornecedores e<br />

distribuidores na estrutura dos mercados. Em ambas as teorias o mecanismo é tal<br />

que os distribuidores com poder de compra crescem em detrimento dos menos<br />

poderosos.<br />

A2.6.2. “Waterbed Effect” induzido pelo ajustamento da oferta nos<br />

mercados a montante<br />

543. A primeira teoria resulta de um processo de ajustamento na estrutura dos<br />

mercados a montante. O WBE está associado ao surgimento de um retalhista mais<br />

poderoso que, ao exercer o seu poder de compra, impõe descontos sobre os<br />

fornecedores, causando uma consolidação do mercado a montante que tenderá,<br />

com o passar do tempo, a assumir uma estrutura oligopolista.<br />

544. O que despoleta o WBE é o surgimento de retalhistas poderosos, associados a um<br />

movimento de consolidação e concentração do sector do retalho, cujo maior poder<br />

de compra exerce pressão sobre as margens dos fornecedores. Quantos mais<br />

fornecedores existirem num mercado competitivo (ou com pouca diferenciação) e<br />

com capacidade para aumentarem a sua produção em reacção a uma maior<br />

procura, maior a OFC dos retalhistas com poder de compra.<br />

545. O exercício constante deste poder de compra, conduz a um processo de<br />

consolidação no mercado a montante, via saída da indústria, fusões e restrições à<br />

entrada, que tem como consequência a sobrevivência de apenas alguns<br />

fornecedores 138 . Os sobreviventes, que agora coabitam num mercado<br />

predominantemente oligopolista, com um grau crescente de diferenciação do<br />

produto, e por isso menos competitivo, vêem restaurados os seus níveis de<br />

rentabilidade com quotas de mercado mais elevadas.<br />

546. Como consequência da nova estrutura de mercado, os retalhistas têm agora uma<br />

menor capacidade de exercer poder de compra. Por outro lado, mais diferenciação<br />

e eventualmente menos capacidade produtiva permite aos fornecedores<br />

138 O processo de consolidação será tanto mais rápido quanto maior o nível de concorrência a montante, em<br />

resultado das reduzidas rendas que existem nesse lado do mercado.<br />

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aumentarem os preços. Como resultado, a consolidação do mercado a montante<br />

tende a reduzir o valor da OFC do comprador.<br />

547. O resultado final sobre os termos de compra dos retalhistas depende da sua<br />

dimensão. Os mais pequenos, que em momento algum tiveram poder de compra<br />

sobre os fornecedores, verão os seus termos de compra deteriorados. De facto,<br />

todos os compradores no mercado a montante mais consolidado serão<br />

negativamente afectados – este é um resultado específico desta teoria. Contudo,<br />

a menos que o efeito de consolidação a montante seja desproporcionado, o<br />

aumento de poder de compra dos retalhistas de maior dimensão, que<br />

desencadeou a consolidação do mercado a montante, deveria garantir no final<br />

uma melhoria nas suas condições de compra.<br />

548. O impacto imediato do exercício de poder de compra recai sobre os produtores.<br />

De acordo com Dobson et al. (2001, cit.) a concorrência ao nível da produção<br />

pode ser distorcida. Os pequenos produtores, ao não conseguirem resistir à<br />

redução nos preços impostas pelo poder de compra dos distribuidores, terão de<br />

sair do mercado e apenas os mais eficientes sobreviverão. Contudo, no longo-<br />

prazo até a viabilidade dos produtores eficientes será posta em causa, já que o<br />

poder de compra tenderá a fixar os preços ao nível dos custos marginais,<br />

impossibilitando-os de recuperar os seus custos fixos. Neste contexto, mesmo os<br />

grandes produtores, podem deixar de investir e inovar os seus produtos.<br />

A2.6.3. “Waterbed Effect” como resultado da interacção <strong>entre</strong> poder<br />

de compra e poder de venda<br />

549. A segunda teoria assenta no argumento de como alterações nas vendas a retalho<br />

criam e ampliam DBP, e como nesse processo os retalhistas mais pequenos são<br />

colocados em desvantagem competitiva em relação aos retalhistas maiores. Nesta<br />

teoria o processo que origina o WBE é mais rápido.<br />

550. O WBE neste caso é desencadeado, por exemplo, por uma fusão, ou qualquer<br />

outro evento que conduz ao aumento na quota de mercado de um retalhista mas,<br />

pelo menos, parcialmente, em detrimento das quotas de mercado dos restantes<br />

retalhistas.<br />

551. O mecanismo de WBE resulta de a conquista de maior quota de mercado conferir<br />

ao retalhista maior ainda mais poder de compra permitindo-lhe, por isso, negociar<br />

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melhores termos de troca que serão, pelo menos parcialmente, passados aos seus<br />

clientes. Simultaneamente, a perda de quota dos retalhistas mais pequenos,<br />

agora com um menor volume de compras, diminui o seu poder de negociação<br />

perante os fornecedores, resultando em novos termos de compra ainda menos<br />

vantajosos. Enquanto um retalhista consegue obter condições de venda cada vez<br />

mais vantajosas, outros verão os seus preços cada vez menos competitivos. É<br />

neste ciclo vicioso que consiste o WBE.<br />

552. Nesse contexto o WBE reside na interacção do poder de compra com SP desde<br />

que haja pass-through para o consumidor. Os dois tipos principais de WBE<br />

considerado não são mutuamente exclusivos e podem reforçar-se e ampliar-se um<br />

ao outro. Se existe um WBE motivado pelo ajustamento no mercado a montante<br />

que deteriora o valor da OFC dos compradores na negociação com os<br />

fornecedores, então, este efeito de natureza dinâmica tende a reforçar e ampliar o<br />

efeito mais imediato estático que, opera mediante a deslocação do volume de<br />

vendas e logo de encomendas dos retalhistas mais fracos para os mais poderosos.<br />

A2.6.4. Factores que determinam a dimensão do “Waterbed Effect”<br />

553. Como, de acordo com a segunda teoria, o WBE resulta de ambos os tipos de<br />

retalhistas obterem preços (e descontos) relacionados com o volume das suas<br />

compras, o efeito será tanto maior quanto maior for a relação <strong>entre</strong> essas duas<br />

variáveis, já que quanto maior for a relação, pior serão as condições de aquisição<br />

dos retalhistas que perdem quota de mercado.<br />

554. Quanto maior a diferença <strong>entre</strong> os preços grossistas nos diferentes retalhistas<br />

maior o WBE. Esta observação está relacionada com a capacidade do fornecedor<br />

discriminar os preços, ou seja, com o seu poder de mercado. Quanto maior for<br />

esse poder, mais capacidade terá para infligir uma deterioração nos termos de<br />

compra de um retalhista, associada a uma redução no volume de compras.<br />

555. A dimensão do efeito depende também da sobreposição das áreas de influência<br />

dos retalhistas em causa. O WBE é tanto maior quanto mais um retalhista crescer<br />

à custa dos outros. Por isso uma condição para que esse efeito se faça sentir, e<br />

tenha uma magnitude considerável, é que a áreas de influência dos retalhistas<br />

sejam sobrepostas. Se existir bastante sobreposição então a transferência de<br />

quota de mercado será maior potenciando por isso o WBE.<br />

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A2.6.5. Anti-“Waterbed Effect”<br />

556. A obtenção de melhor condições de compra por parte de um retalhista, pode<br />

originar um “me-too-effect” em que os restantes fornecedores exigiriam que<br />

também lhes fosse concedido o mesmo desconto. Neste caso teríamos um anti-<br />

WBE. Este só ocorre se a concessão do desconto for tornada pública, e apenas<br />

para os retalhistas que têm uma capacidade negocial idêntica. Para os restantes,<br />

o WBE prevalece. Isto significa que o WBE é um fenómeno associado a estruturas<br />

de mercado assimétricas, e que num mercado a retalho oligopolista, WBE são<br />

menos prováveis de ocorrer do que quando existe um retalhista dominante que<br />

enfrenta uma franja competitiva.<br />

557. Outro tipo de anti-WBE pode ocorrer se os fornecedores decidirem conceder<br />

descontos aos retalhistas mais fracos de modo a “keep-them-in-business”. Os<br />

fornecedores podem achar vantajoso garantir a competitividade dos pequenos,<br />

como forma de evitar a perda de canais alternativos, e consequentemente<br />

garantir algum poder negocial através da preservação da sua OFC.<br />

A2.6.6. Implicações para a política de concorrência<br />

558. Em qualquer dos casos, como consequência do WBE, os retalhistas mais fracos<br />

verão a sua posição competitiva mais afectada. Interessa, por isso, analisar as<br />

consequências sobre o bem-estar do consumidor e o bem-estar social da<br />

ocorrência de tais efeitos.<br />

559. Em resultado da asfixia competitiva imposta pelos retalhistas que exercem poder<br />

de compra sobre o fornecedor, os pequenos retalhistas podem optar por sair do<br />

mercado, reduzir ainda mais a sua dimensão, ou adaptar a sua oferta de forma a<br />

evitar competir directamente com os rivais mais poderosos.<br />

560. Como consequência, embora no curto prazo os preços possam baixar em virtude<br />

da pressão competitiva dos retalhistas maiores, no longo prazo pode haver uma<br />

subida nos preços, em virtude da nova estrutura de mercado oligopolista ou até<br />

(localmente) monopolista. Por isso, nada impede que a redução de preços que<br />

levou ao processo de consolidação possa ser, de tal forma invertida que no final<br />

os preços são mais elevados.<br />

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561. Adicionalmente, se a capacidade competitiva estiver condicionada pela<br />

possibilidade de usufruir descontos significativos junto dos fornecedores, os<br />

efeitos de um WBE podem funcionar como uma barreira à entrada de novos<br />

retalhistas no mercado, a menos que estes o façam a uma escala suficientemente<br />

grande, que lhes permita usufruir das mesmas condições de compra por parte dos<br />

fornecedores. Como consequência o WBE pode contribuir para a monopolização<br />

(pelo menos a nível local) da actividade do retalho.<br />

562. Se o WBE é suficientemente forte, mesmo no curto prazo os consumidores (em<br />

média) podem ser prejudicados. Em resposta à descida nos preços dos grandes<br />

retalhistas, os restantes retalhistas, têm duas alternativas como resposta ao WBE:<br />

ou fazem “pass-through” para os seus clientes reflectindo o aumento dos custos<br />

sobre os seus preços, ou cedem à pressão competitiva e acompanham a sua<br />

diminuição. Quanto maior a magnitude do WBE maior a probabilidade dos preços<br />

dos retalhistas pequenos subirem, não sendo de excluir a hipótese desse aumento<br />

superar a descida nos preços do retalho dos compradores maiores, produzindo<br />

uma perda para o consumidor médio no curto prazo 139 .<br />

A2.7. Poder de compra e afectação eficiente<br />

563. Chen (2003) refere que o exercício de countervalling power pode, em algumas<br />

circunstâncias, produzir um equilíbrio de mercado ineficiente. O argumento é<br />

simples: se o exercício de poder de compra cria assimetrias <strong>entre</strong> compradores<br />

que não são justificadas por diferenças nos custos, a deslocação de quota de<br />

mercado de retalhistas sem poder de compra para retalhistas com poder de<br />

compra conduz a uma afectação ineficiente. Contudo, este argumento também se<br />

aplica no sentido inverso. Se a capacidade de obter poder de compra por parte<br />

dos grandes retalhistas advêm de maiores níveis de eficiência, então o exercício<br />

de poder de compra, ao permitir a apropriação de quota de mercado aos<br />

retalhistas mais pequenos, contribui para aumentar o nível de eficiência do<br />

mercado a jusante.<br />

564. O WBE pode ainda ter consequências negativas sobre o funcionamento eficiente<br />

do mercado de venda a retalho: primeiro, descontos concedidos a alguns<br />

139 Este efeito tem subjacente a existência de um grupo de consumidores sem acesso (fácil) aos grandes<br />

retalhistas, estando dependentes dos que enfrentam o WBE.<br />

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compradores que não estão relacionados com os custos podem conduzir a<br />

distorções na afectação de recursos; segundo, na medida em que a consolidação<br />

do retalho é induzida pelo exercício de poder de compra associado ao aumento do<br />

volume de compras num dado fornecedor, este processo pode gerar uma redução<br />

na variedade oferecida; terceiro, as decisões de investimento dos retalhistas<br />

podem, por um lado, ser adiadas devido à redução na concorrência ou ser<br />

objectivamente direccionadas para diminuir a quota de mercado e o crescimento<br />

dos rivais, provocando um WBE 140 .<br />

565. Por outro lado o acréscimo na disciplina concorrencial é sempre um incentivo para<br />

os retalhistas aumentarem os seus níveis de eficiência ou, alternativamente,<br />

venderem as suas actividades a retalhistas mais eficientes.<br />

566. Do ponto de vista do consumidor, a saída de mercado de pequenos retalhistas<br />

provocada pelo WBE, pode obrigar os consumidores a deslocações maiores 141 . Por<br />

outro lado, se retalhistas com poder de compra entram em novos mercados<br />

forçando os incumbentes a reduzir o espectro de produtos oferecidos, ou mesmo a<br />

sua retirada do mercado, fica por determinar qual o impacto final sobre o bem-<br />

estar do consumidor.<br />

567. Quando o retalhista com poder de compra também tem poder de mercado a<br />

jusante, este contrapoder de compra (“countervailling buyer power”) é susceptível<br />

de criar problemas de concorrência porque: (i) o exercício de poder de compra<br />

pode, em certas condições, causar dano para o consumidor já que, na ausência de<br />

concorrência no mercado a jusante não existem incentivos para que os ganhos<br />

sejam passados para os consumidores, e em caso de monopsónio gera uma perda<br />

líquida de bem-estar para a economia; e (ii) o retalhista pode abusar da sua<br />

posição dominante conferida pelo poder de compra, impondo ao fornecedor a<br />

prática de termos de troca menos vantajosos aos seus concorrentes (cf. Chen,<br />

2007, p. 36).<br />

568. Por outro lado, se o retalhista enfrenta um nível de concorrência elevado no<br />

mercado a jusante, o poder de compra por parte de uma grande retalhista<br />

140 Os retalhistas poderosos, podem exercer o seu poder de compra de formas não legais, nomeadamente,<br />

condicionando os termos de venda que os fornecedores impõem aos demais retalhistas.<br />

141 Na verdade, os pequenos retalhistas fecham porque os consumidores já se estão a deslocar.<br />

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permite obter preços mais baixos, mas a concorrência a jusante força o retalhista<br />

a passar uma parte dessa poupança para os consumidores (Chen, 2007) 142 .<br />

A2.8. Poder de compra e efeitos dinâmicos<br />

569. Até agora, o efeito do exercício de poder de compra em geral e de countervailling<br />

power em particular tem incidido, prioritariamente, sobre os preços. Interessa<br />

analisar qual o impacto do poder de compra sobre variáveis de longo prazo, como<br />

diversidade de produtos, investimento e inovação. Por exemplo, Chen (2004) 143<br />

chega ao resultado de que, embora o exercício de countervailling power possa,<br />

como esperado reduzir, os preços a jusante pode, por outro lado, causar uma<br />

redução na variedade dos produtos nos mercados a jusante tal que, a perda de<br />

bem-estar dos consumidores daí decorrente pode ser suficientemente grande de<br />

modo a gerar um bem-estar agregado (que tem em conta o efeito da redução de<br />

preços e da redução da variedade nos produtos) mais baixo.<br />

570. Por outro lado, Inderst and Wey (2005) 144 afirmam que o exercício de poder de<br />

compra pode aumentar a eficiência do fornecedor (produtor). De facto, de acordo<br />

com a teoria de negociação bilateral que serve de suporte à análise das relações<br />

<strong>entre</strong> fornecedores e distribuidores, o que confere poder negocial a cada uma das<br />

partes é a OFC. Por isso, o fornecedor tem incentivos em realizar investimentos<br />

que conduzam a inovações e/ou reduções nos custos dos seus produtos, que<br />

causam uma perda de poder de negociação do comprador com poder de compra<br />

em relação aos seus concorrentes, reduzindo por isso a sua OFC.<br />

571. Regra geral, na ausência de um acordo contratual <strong>entre</strong> fornecedores e<br />

compradores que vise partilhar as despesas em investimento e inovação do<br />

produto, são os primeiros que suportam estas despesas, na expectativa de que<br />

serão rentabilizadas aquando das negociações com os segundos. Isto sugere que<br />

se os compradores têm poder de compra e, por isso, capacidade para se<br />

142<br />

Chen (2007). “Buyer Power: Economic Theory and Antitrust Policy”, Research in Law and Economics, 22:<br />

17-40.<br />

143<br />

Chen (2004). “Monopoly and Product Diversity: The Role of Retailer Countervailing Power”. Carleton<br />

Economic Papers 04-19. Carleton University.<br />

144<br />

Inderst, R., and C. Wey (2005). “How Strong Buyers Spur Upstream Innovation”. Mimeo. London School<br />

of Economics.<br />

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apropriarem de uma parcela importante dos lucros futuros, então o fornecedor<br />

pode não ter incentivos suficientes para inovar e/ou investir.<br />

572. A existência destas dificuldades contratuais, não significa que os incentivos para<br />

inovar ou investir sejam reduzidos. Eles dependem não do nível absoluto dos<br />

lucros, mas dos lucros incrementais que são gerados com o investimento e estes<br />

não são, necessariamente, mais baixos se existirem compradores com poder de<br />

compra (Inderst and Mazzarotto, 2006) 145 .<br />

573. O investimento e inovação podem ser uma “arma” importante que possibilita abrir<br />

canais alternativos e assim reduzir o nível de dependência económica. Além disso,<br />

ao tornar o seu produto mais atractivo ou o seu processo produtivo mais eficiente,<br />

o fornecedor diminui o valor da OFC do retalhista, ao poder ameaçar fornecer<br />

apenas os seus concorrentes.<br />

574. Para aferir do impacto do poder de compra sobre a capacidade de investimento e<br />

inovação, interessa distinguir <strong>entre</strong> investimentos incrementais e inovação em<br />

produtos já existentes, de investimentos não incrementais tais como decisões de<br />

entrar em novos mercados ou fornecer um produto novo. No primeiro caso, que o<br />

poder de compra funciona como um incentivo, enquanto que no segundo caso,<br />

considerações sobre o valor absoluto dos lucros futuros são os factores<br />

relevantes.<br />

575. Outra questão prende-se com a origem do poder de compra. Se o poder de<br />

compra tem origem na exploração de marcas próprias por parte dos retalhistas,<br />

então os fornecedores de marca têm um incentivo muito forte a investir e inovar<br />

de modo a diferenciar suficientemente os seus produtos e assim garantir algum<br />

poder de negociação junto dos retalhistas. De facto, relativamente a uma situação<br />

em que só existem produtos de marca, a introdução de marcas próprias produz<br />

uma concorrência vertical forte <strong>entre</strong> as empresas a jusante e a montante, sobre<br />

a capacidade de inovação, de marketing, de produção etc., na cadeia da oferta e<br />

nas margens associadas.<br />

145<br />

Inders, R. and N. Mazzarotto (2006) “Buyer Power in Distribution”. Issues in Competition Law and Policy.<br />

Capitulo XX.<br />

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A2.9. Poder de compra e política de concorrência<br />

576. Só recentemente é que o fenómeno do exercício de poder de compra tem<br />

despertado o interesse da teoria económica. O problema de poder de compra no<br />

contexto da política de concorrência tem sido considerado de menor importância<br />

relativamente às preocupações com o abuso de “seller power” e seus efeitos sobre<br />

o bem-estar social. Contudo recentemente, a questão do exercício de poder de<br />

compra e os seus potenciais efeitos nocivos para o bem-estar social, tem<br />

levantado várias outras questões relativas à interpretação da aplicação da política<br />

de concorrência.<br />

577. A política de concorrência tem como principal enfoque a maximização do bem-<br />

estar do consumidor. Restrições à concorrência do lado da procura a montante<br />

não têm merecido tanta atenção como do lado da oferta a jusante, porque nem<br />

sempre têm um efeito negativo no consumidor final.<br />

578. Contudo recentemente, tem-se assistido ao surgimento de um novo paradigma da<br />

política de concorrência que tende a dar mais enfoque às relações <strong>entre</strong><br />

fornecedores e retalhistas em geral e à forma como estes exercem o seu poder de<br />

compra sobre aqueles. A tal não é alheio o facto de que, muitas vezes, o poder de<br />

compra estar associado e reforçar o poder de venda (SP), permitindo aprofundar<br />

posições dominantes que poderão ser prejudiciais para o consumidor.<br />

579. O próprio conceito de bem-estar do consumidor pode ser entendido numa<br />

perspectiva mais ampla do que a associada ao consumidor final no mercado a<br />

jusante, para representar o bem-estar agregado de longo prazo 146 .<br />

580. De acordo com Warwick and Murray (2009) a excessiva concentração da<br />

actividade do retalho a que o fenómeno de poder de compra está associado, tem<br />

suscitado um novo debate sobre a aplicação da política de concorrência. Por<br />

exemplo, o caso Tesco, em que a CC impôs um remédio que limitava a<br />

capacidade de expansão das lojas daquela insígnia, subsequentemente anulado<br />

pelo Competition Appeal Tribunal (CAT) em virtude de poder ter efeitos nefastos<br />

sobre os consumidores, vem sublinhar a importância de ponderar os efeitos de<br />

longo prazo sobre o bem-estar e os eventuais problemas estruturais causados<br />

146 Esta discussão foi levantada pelo Supremo Tribunal de Justiça na sua decisão no caso Weyerhaeuser Co.<br />

V. Ross-Simmons hrdwood Lumber Co. Inc. 127 S. Ct. 1069 (2007); cf. Werden, monpsony and the<br />

Sherman Act: Consumer Welfare in a New light (http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm<br />

?abstract_id=975992) sobre a análise do poder de compra nos termos da lei Antitrust norte americana.<br />

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pela excessiva concentração do sector do retalho, que não têm origem nos<br />

comportamentos anti-competitivos previstos no artigo 101 do TFUE nem podem<br />

ser atribuídos a condutas de abuso de posição dominante descritas no artigo 102<br />

do TFUE.<br />

581. A questão das restrições verticais e outras obrigações contratuais impostas aos<br />

fornecedores pelo poder de compra dos grandes distribuidores têm sido objecto<br />

de (re)análise por parte das autoridades nacionais da concorrência e pela CE.<br />

582. Por exemplo, Competition Commission do Reino Unido elaborou um código de<br />

conduta – “Groceries Supply Code of Practice” (GSCOP), com o objectivo de<br />

promover a eliminação de certas práticas relacionadas com: negociação justa;<br />

alterações retrospectivas de condições; preços e pagamentos; promoções; etc.<br />

Como exemplo de uma prática abrangida por este código, um retalhista não pode,<br />

directa ou indirectamente, exigir que um fornecedor financie os custos de uma<br />

promoção; um retalhista não pode, excepto em certas condições pré-definidas,<br />

directa ou indirectamente exigir a um fornecedor que faça qualquer tipo de<br />

pagamento como condição para que os seus produtos sejam expostos, etc.<br />

583. Alguns países, nos quais se inclui Portugal (Decreto-Lei nº370/93, de 29 de<br />

Outubro), têm legislação que visa proteger os fornecedores de certas práticas<br />

negociais abusivas. São os casos de por exemplo a França e a Alemanha. Contudo<br />

a aplicabilidade destas disposições, “esbarra” com a dificuldade de se provarem as<br />

práticas em causa e com a ausência de denúncias por parte dos fornecedores que<br />

têm receio de represálias que possam sofrer.<br />

A2.9.1. Definição do mercado relevante<br />

584. A análise de um caso de antitrust é constituída por pelo menos três partes:<br />

definição do(s) mercado(s) relevante(s), determinação de poder de mercado em<br />

cada um deles, e verificação dos efeitos anti-competitivos.<br />

585. Um caso de poder de compra requer uma análise em dois níveis da cadeia<br />

vertical: Por um lado, a definição do(s) mercado(s) a jusante, que pode ser<br />

efectuada da forma convencional usando o teste do monopolista hipotético, já que<br />

um retalhista é um vendedor no mercado a jusante. Por outro, a definição do(s)<br />

mercado(s) a montante onde se exerce o poder de compra tem de ser efectuada<br />

do lado do comprador e não do lado do vendedor, mas é definida simetricamente:<br />

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O mercado relevante é definido como o grupo mais reduzido de produtos e a área<br />

geográfica mais pequena na qual um único hipotético comprador (monopsonista)<br />

imporia e sustentaria uma redução significativa e não transitória do preço abaixo<br />

do seu nível normal (interpretado como o nível de preço competitivo). No fundo é<br />

o mercado com menor dimensão, em área e em termos de produtos incluídos,<br />

onde o retalhista consegue exercer o seu poder de compra.<br />

586. Do lado do comprador aquela definição suporta-se no conceito de substituibilidade<br />

do lado do vendedor, ou seja, na capacidade que o vendedor tem de encontrar<br />

compradores alternativos. Interessa por isso considerar os factores que<br />

determinam os custos de “switching” para o fornecimento de outros clientes.<br />

A2.9.2. Conceito de posição dominante: Visão tradicional<br />

587. O critério fundamental que permite a um comprador exercer poder de compra não<br />

é apenas a sua dimensão relativamente aos seus fornecedores, mas também se<br />

ele enfrenta concorrência efectiva, actual ou potencial, na aquisição dos produtos<br />

do fornecedor. Por isso, para quantificar o poder de um fornecedor deve recorrer-<br />

se ao cálculo da quota do retalhista no(s) mercado(s) a montante tendo em conta<br />

as vendas para todos os compradores nesse mercado relevante, e não apenas<br />

aqueles compradores que concorrem com o retalhista no mercado a jusante.<br />

588. Uma quota elevada não é condição suficiente nem necessária para a existência de<br />

poder de compra. Há que ter em conta a existência de barreiras à entrada no lado<br />

da compra no mercado a montante. Se estas existirem o retalhista incumbente,<br />

mesmo não tendo uma quota muito elevada, terá de se preocupar menos com a<br />

OFC dos seus fornecedores.<br />

589. Contudo em dois casos envolvendo o retalho alimentar, Carrefour/Promodes (cit.)<br />

e REWE/ADEGK 147 , a Comissão usou o critério de dimensão relativa para aferir da<br />

posição dominante do comprador. Em ambos os casos a Comissão considerou que<br />

se o comprador detém uma quota nas vendas de um fornecedor que ultrapasse os<br />

22% então ele era tido como indispensável para o fornecedor.<br />

147 Decisão de 23 de Junho 2008, COMP/M.5047-“REWE/ADEGK”.<br />

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A2.9.3. Conceito de posição dominante e de dependência económica<br />

590. O conceito de dominância é fundamental na determinação da existência de poder<br />

de compra por parte de um comprador. De uma forma simplista, pode afirmar-se<br />

que um fornecedor é economicamente dependente de um comprador se não é<br />

viável para o fornecedor perder o comprador como cliente, podendo este permitir-<br />

se a perder esse fornecedor. Para que exista, ela terá de ser sempre unilateral, no<br />

sentido em que não afecta o comprador.<br />

591. É por isso necessário estabelecer se um fornecedor tem acesso a canais de<br />

distribuição alternativos. Isto requer que se tenha em conta a dimensão do<br />

comprador a substituir e a dos compradores alternativos potenciais 148 . O<br />

fornecedor terá tanto mais dificuldade em substituir um comprador quanto menos<br />

compradores ou canais alternativos existirem. Neste contexto, é importante aferir<br />

qual a quota de mercado (relevante para ao fornecedor) do retalhista em causa.<br />

592. Outro factor a ter em conta na determinação do grau de dependência económica é<br />

o eventual exercício da função de “gatekeeper” dos produtos do fornecedor por<br />

parte do comprador. Neste caso o fornecedor depende do retalhista para fazer<br />

chegar os seus produtos ao consumidor final. Nestas circunstâncias, poder ser<br />

mais difícil para o fornecedor substituir um retalhista pequeno mas monopolista<br />

no seu mercado do que um grande retalhista inserido num contexto competitivo.<br />

Por outro lado, a dependência será menor se, por exemplo, os fornecedores<br />

venderem, pelo menos parcialmente, a sua produção, directamente aos<br />

consumidores nos seus outlets.<br />

593. Dobson, Waterson and Chu (1998) 149 , comparam o exercício da função de<br />

“gatekeeper” e o nível de dependência que daí advém com o problema de acesso<br />

a uma infra-estrutura essencial. A questão é que para determinados fornecedores<br />

as grandes superfícies são fundamentais para que os seus produtos cheguem aos<br />

consumidores. Estes não têm outra forma economicamente viável de colocar os<br />

seus produtos que lhe ofereça o mesmo benefício económico. Esta linha de<br />

raciocínio, mais do que teoricamente justificada, constitui claramente um alerta<br />

para o grau de vulnerabilidade dos fornecedores em relação à grande distribuição<br />

148 Note-se que a obtenção de novos contratos com compradores alternativos, requer que o fornecedor<br />

apresente uma proposta mais vantajosa do que aquela de que actualmente usufruem.<br />

149 Dobson, P., Waterson, M., and A. Chu (1998). “The Welfare Consequences of The Exercise of Buyer<br />

Power”. Office of Fair Trading, Research Paper No. 16.<br />

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nos mercados europeus, e sugere que o grau de dependência económica é maior<br />

do que o sugerido pelas medidas usualmente utilizadas.<br />

594. Na determinação dos canais alternativos há que ter em conta a rapidez com que o<br />

fornecedor consegue encontrar outro comprador caso haja ruptura de<br />

fornecimento. Esta questão está associada à existência de barreiras à entrada no<br />

sector. Se estas não existirem ou forem suficientemente baixas, pode ser<br />

relativamente fácil para o fornecedor encontrar novos clientes. Contudo, em<br />

sectores onde existem grandes retalhistas as barreiras à entrada são tipicamente<br />

elevadas, ora por razões legais, ou porque a entrada no mercado requer níveis de<br />

investimentos muito elevados, nomeadamente na criação de uma rede de<br />

distribuição e logística ou em publicidade e marketing.<br />

595. A existência de canais de distribuição alternativos não é suficiente para reduzir o<br />

grau de dependência, se ao fornecimento do bem ou serviço estão associados<br />

custos afundados que dificultam a capacidade do fornecedor reduzir o volume de<br />

vendas, em resposta a uma proposta menos vantajosa da parte do retalhista.<br />

Nesse caso, pode ser preferível para os fornecedores incorporar essas condições<br />

de venda ou, caso tenha poder de mercado, passá-las aos seus próprios<br />

fornecedores 150 .<br />

596. De acordo com Pozdnakova (2008) 151 , o critério principal para aferir se um<br />

fornecedor é economicamente dependente de um retalhista é a proporção das<br />

compras do retalhista nas vendas totais do fornecedor 152 . Quanto maior esta<br />

quota, maior o grau de dependência do fornecedor. Contudo, é também<br />

necessário comparar a perda nos lucros de ambos associada à ruptura do<br />

contrato, i.e., o valor das OFC de fornecedor e retalhista. O poder de negociação<br />

do comprador será tanto maior quanto menor a perda nos lucros decorrente da<br />

OFC.<br />

597. Como sempre, a adopção deste tipo de critérios suscita a questão de determinar<br />

qual o “benchmark” para a determinação do grau de dependência. No caso<br />

150 Isto sucede com os bens perecíveis, cujas características impedem que hajam atrasos na venda motivados<br />

pela tentativa de obtenção de melhores condições de venda.<br />

151<br />

Pozdnakova, A. (2009) “Buyer Power in the Retail Trading Sector: Evolving Latvian Regulation” European<br />

Competition Law Review, 8: 387-392.<br />

152 Esta interpretação não tem presente a existência de canais alternativos.<br />

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<strong>Relações</strong> <strong>Comerciais</strong> <strong>entre</strong> a <strong>Grande</strong> <strong>Distribuição</strong> <strong>Agro</strong>-<strong>Alimentar</strong> e os seus Fornecedores (Preliminar)<br />

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Rewe/Meinl 153 a CE tendo em conta os relatórios dos produtores (fornecedores)<br />

estabeleceu que, em média, um comprador que contribua para 22% ou mais do<br />

volume de negócios do fornecedor só pode ser substituído a um custo financeiro<br />

muito elevado.<br />

598. Contudo, tem de se ter em conta a importância do bem para o próprio retalhista.<br />

Tratando-se de um produto “âncora”, relativamente ao qual os consumidores têm<br />

um certo grau de lealdade, é necessário ter em conta o custo que o retalhista<br />

incorre ao não fornecer esses produtos. Os fornecedores de um produto com estas<br />

características estão obviamente menos dependentes. Mesmo assim, os<br />

retalhistas, ao oferecerem uma série de comodidades aos seus consumidores<br />

como one-stop-shopping, uma grande variedade de produtos etc., podem muitas<br />

vezes reduzir a importância da disponibilização desses produtos nas decisões dos<br />

consumidores sobre onde efectuar as suas compras.<br />

153 Decisão de 3 de Fevereiro 1999, COMP IV/M.1221 – “REWE/Meinl”.<br />

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A2.10. Poder de compra: Síntese conclusiva<br />

599. Os últimos anos têm assistido a uma verdadeira revolução na indústria da grande<br />

distribuição alimentar, que tem no aprofundar da internacionalização o seu<br />

próximo episódio. A grande escala a que operam os grandes retalhistas, possível<br />

mediante a introdução de tecnologias de ponta na gestão logística e de<br />

distribuição permitiu a obtenção de ganhos de eficiência. Regra geral estas<br />

alterações alteraram de forma positiva a forma como os consumidores se<br />

relacionam com o comércio a retalho. A possibilidade de efectuar “one-stop-<br />

shopping”, com disponibilidade de uma oferta de produtos bastante alargada, a<br />

possivelmente preços mais reduzidos, são benefícios assinaláveis.<br />

600. O peso crescente das grandes cadeias de distribuição é acompanhado por um<br />

aumento bastante significativo do seu poder de mercado perante os fornecedores.<br />

De facto, as relações comerciais nos mercados de aprovisionamento, agora<br />

caracterizadas por níveis de dependência económica bastante elevada por parte<br />

de alguns fornecedores, é uma característica preocupante desta nova realidade.<br />

601. A questão do poder de compra no contexto da politica de concorrência, do ponto<br />

de vista do bem-estar social tem merecido menos atenção do que as<br />

preocupações de abuso de poder de venda. Até à data, as autoridades de<br />

concorrência da EU não têm aberto casos de abuso de poder de compra. Contudo<br />

o facto do poder de compra estar no actual contexto do mercado da grande<br />

distribuição, cada vez mais associado a poder de compra nos mercados a jusante,<br />

através da vantagem comparativa que os grandes retalhistas conseguem obter<br />

pela negociação de condições de compra cada vez mais vantajosas junto dos<br />

fornecedores, e as possíveis consequências no nível de eficiência e equidade da<br />

afectação do mercado, tem suscitado um debate em torno do papel da politica de<br />

concorrência neste contexto.<br />

602. O poder de compra, que pode estar associado à capacidade de exploração de<br />

poder de mercado a jusante, pode ser prejudicial para o bem-estar geral se<br />

colocar em causa a viabilidade dos fornecedores e/ou a sua disponibilidade para<br />

investirem em novos processos e produtos. De facto, o acréscimo de poder de<br />

compra tem como situação limite, a sobrevivência apenas das marcas fortes,<br />

sendo que todos os demais produtos cuja identidade para o consumidor é fraca,<br />

tenderão a ser ver as suas margens reduzidas e eventualmente a serem<br />

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substituídos por produtos de marca própria. No final a diversidade na oferta será<br />

comprometida o que constitui uma perda para o consumidor.<br />

603. Apesar do exercício do poder de compra poder afectar negativamente tanto os<br />

mercados a jusante como a montante, do ponto de vista das regras de<br />

concorrência é difícil ignorar que podem existir ganhos económicos importantes.<br />

Sob certas condições já discutidas, a obtenção de melhores termos de troca nos<br />

mercados de aprovisionamento podem ser passados aos consumidores,<br />

traduzindo-se em preços mais baixos.<br />

604. Os potenciais problemas concorrenciais causados pelo poder de compra, têm sido<br />

tomados em consideração, como atestam as decisões sobre fusões nos casos<br />

Rewe/Meinl (cit.) e Kesko/Tuko (cit.), em que foi considerado que o aprofundar da<br />

consolidação no sector do retalho iria causar, no espaço europeu, uma redução<br />

ainda maior no nível de concorrência local.<br />

605. Este aspecto particular da consolidação do sector do retalho deve ser objecto de<br />

vigilância por parte das autoridades, não sendo de excluir a sua intervenção no<br />

sentido de impor desinvestimentos em certas lojas, de modo a garantir a<br />

existência de concorrência efectiva (ver Dobson (2003)). De facto os modelos de<br />

contrapoder mostram, que a eventual redução nos preços decorrente do exercício<br />

de poder de compra, pode facilmente ser compensada pelo aumento nos preços<br />

decorrente do reforço de “selling power” (ver Dobson and Waterson (1997)). Esta<br />

tem sido a evidência no sector de retalho alimentar no UK.<br />

606. O processo de internacionalização dos Grupos de compras, agora efectuadas num<br />

contexto global com parceiros transnacionais, que com o seus volumes de compra<br />

aprofundam o grau de dependência económica dos fornecedores, e exercem um<br />

grau de poder de compra sem precedentes é passível de a médio prazo<br />

redesenhar de novo o relacionamento <strong>entre</strong> os dois agentes nesses mercados.<br />

607. Uma concentração da oferta nos mercados a montante, que tenderá a laborar de<br />

acordo com as exigências da grande distribuição, quer a nível das características<br />

dos produtos, quer a nível de determinação de preços e condições de venda,<br />

nomeadamente no que diz respeito a restrições verticais que conduzam <strong>entre</strong><br />

outros contratos de exclusividade. Este tipo de relação é já frequente no sector<br />

dos produtos agrícola e frescos e constitui uma forma de “integração vertical”.<br />

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<strong>Relações</strong> <strong>Comerciais</strong> <strong>entre</strong> a <strong>Grande</strong> <strong>Distribuição</strong> <strong>Agro</strong>-<strong>Alimentar</strong> e os seus Fornecedores (Preliminar)<br />

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608. Outra tendência associada a esse processo, será o aumento da oferta de marcas<br />

próprias, que tenderá a “substituir” os produtos com uma fraca identidade perante<br />

os consumidores.<br />

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<strong>Relações</strong> <strong>Comerciais</strong> <strong>entre</strong> a <strong>Grande</strong> <strong>Distribuição</strong> <strong>Agro</strong>-<strong>Alimentar</strong> e os seus Fornecedores (Preliminar)<br />

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Glossário<br />

AdC – Autoridade da Concorrência<br />

APED – Associação Portuguesa de Empresas de <strong>Distribuição</strong><br />

CC – Comissão da Concorrência (Competition Commission) do Reino Unido<br />

CE – Comissão Europeia<br />

Centromarca – Associação Portuguesa de Empresas de Produtos de Marca (cf. http://<br />

www.centromarca.pt/)<br />

CIP – Confederação da Indústria Portuguesa<br />

CPAA – Comissão Permanente de Avaliação e Acompanhamento do Código de Boas<br />

Práticas <strong>Comerciais</strong><br />

DBP – Differential Buyer Power (Diferencial de poder de compra ou diferença <strong>entre</strong> poder<br />

de compra)<br />

DGCC – anterior Direcção Geral do Comércio e Concorrência<br />

DG COMP – Direcção Geral da Concorrência da Comissão Europeia<br />

DGCP – anterior Direcção Geral da Concorrência e Preços<br />

GDA – <strong>Grande</strong> distribuição alimentar, que reagrupa empresas retalhistas e grossistas no<br />

âmbito da distribuição de produtos de grande consumo, do ramo alimentar<br />

(mercearia, frescos, bebidas, lácteos e congelados) e não alimentar (produtos de<br />

higiene pessoal e de drogaria e bazar)<br />

GGR – <strong>Grande</strong>s Grupos Retalhistas, detentores de cadeias de supermercados e de<br />

hipermercados da insígnia da cadeia de âmbito nacional. Actualmente, operam 9<br />

GGR em Portugal, a saber os Grupos Aldi, Auchan (Jumbo e Pão de Açúcar),<br />

Carrefour (incluindo a rede Dia%/Minipreço), E. Leclerc, El Corte Inglés, ITMI<br />

(Intermarché e Ecomarché), Jerónimo Martins (Feira Nova e Pingo Doce no retalho<br />

e a cadeia Recheio no comércio por grosso), Modelo-Continente e Lidl. Estes grupos<br />

são a distinguir de grupos retalhistas de dimensão regional (v.g., os casos do Grupo<br />

A. C. Santos nos distritos de Lisboa e de Leiria e Alisuper no distrito de Faro).<br />

ha – Hectares (medida de área de exploração cerealífera)<br />

HORECA – Canal dos Hotéis, Restaurantes e Cafés.<br />

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<strong>Relações</strong> <strong>Comerciais</strong> <strong>entre</strong> a <strong>Grande</strong> <strong>Distribuição</strong> <strong>Agro</strong>-<strong>Alimentar</strong> e os seus Fornecedores (Preliminar)<br />

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IHH – Índice de concentração de Herfindahl-Hirschman, o qual corresponde à soma dos<br />

quadrados das quotas de cada operador de mercado. Valores deste índice <strong>entre</strong><br />

1000 e 1800 indicam um grau moderado de concentração e valores acima de<br />

1800 definem um mercado concentrado, onde a existência de práticas<br />

anticoncorrenciais é mais verosímil.<br />

JM – Grupo Jerónimo Martins, detentor das cadeias retalhistas Feira Nova e Pingo Doce,<br />

bem como da cadeia grossista Recheio<br />

MC – Grupo Modelo-Continente (Sonae <strong>Distribuição</strong>), detentor das cadeias retalhistas<br />

Modelo (supermercados) e Continente (hipermercados)<br />

MDD – Produtos de marca do distribuidor (também designados por produtos de “marca<br />

branca”), que são a contrastar com os produtos de marca dos produtores /<br />

fornecedores.<br />

OFC – Opção-fora-do-contrato<br />

OFT – Office of Fair Trading do Reino Unido<br />

RAA – Região Autónoma dos Açores<br />

RU – Reino Unido<br />

SAU – Superfície Agrícola Útil (expressa em hectares)<br />

SP – Seller power (poder de venda)<br />

TFUE – Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (substitui o Tratado CE)<br />

Tratado CE – Tratado que instituiu as Comunidades Europeias<br />

UNIARME – União de Armazenistas de Mercearia, CRL<br />

VN – Volume de negócios<br />

WBE – Waterbed Effect (vide Anexo 2).<br />

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