Ana em Veneza
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forma de um barril atÇ as canelas, e aà encerravase<br />
subitamente o seu curso avassalador – com as<br />
canelas de fora! Completavam essa visÜo do<br />
outro mundo os cabelos muitos curtos,<br />
encimados por duas penas iridescentes, alÇm de<br />
um enorme colar de pÇrolas despencado quase<br />
atÇ a cintura, um leque de plumas brancas numa<br />
das mÜos e uma sombrinha fechada, na outra.<br />
(TREVISAN, 1998, p. 32)<br />
Pod<strong>em</strong>os, atravÇs deste trecho do romance, identificar a tentativa<br />
de caracterizaÄÜo de JoÜo SilvÇrio <strong>em</strong> seu romance para mostrar todos<br />
os aspectos que circundavam as indagaÄÅes inerentes ao fenämeno da<br />
modernidade, <strong>em</strong> especial aos traÄos marcantes da cultura fin du siàcle.<br />
Mais minucioso do que a simples definiÄÜo de artista para<br />
Baudelaire Ç seu conceito de hom<strong>em</strong> do mundo. Em seu texto O pintor<br />
da vida moderna, o poeta francÑs declara que o verdadeiro artista Ç<br />
aquele que se entrega ao mundo, çs multidÅes, e que se deixa levar pelos<br />
devaneios suscitados pelo frenesi da sociedade moderna: “Hom<strong>em</strong> do<br />
mundo, isto Ç, hom<strong>em</strong> do mundo inteiro, hom<strong>em</strong> que compreende o<br />
mundo e as razÅes misteriosas e legàtimas de todos seus costumes;<br />
artista, isto Ç, hom<strong>em</strong> subordinado ç sua palheta como o servo ç gleba”<br />
(BAUDELAIRE, 1995, p. 855). Tal descriÄÜo do hom<strong>em</strong> do mundo nos<br />
r<strong>em</strong>ete ç descriÄÜo da figura do flÅneur 9 , esse ser das grandes cidades<br />
que se perde <strong>em</strong> seus labirintos, galerias e passagens, e que tambÇm<br />
surge com o desenvolvimento das grandes metrâpoles, ou seja, Ç um<br />
legàtimo cidadÜo da modernidade.<br />
Ressaltamos destarte as diversas andanÄas do personag<strong>em</strong><br />
Alberto Nepomuceno nÜo somente pelo Brasil (Nepomuceno viveu <strong>em</strong><br />
Fortaleza, Recife e depois na grande metrâpole do Brasil ImpÇrio, Rio<br />
de Janeiro), mas tambÇm <strong>em</strong> seu exàlio na Europa, <strong>em</strong> Roma e <strong>em</strong><br />
Berlim. Ele poderia configurar como um flÅneur, um transeunte que se<br />
perde na multidÜo das grandes metrâpoles e atravÇs desse ato consegue<br />
seu gozo e a elaboraÄÜo de seus fantasmas, material para a criaÄÜo de<br />
suas composiÄÅes musicais: “TrÑmulo de entusiasmo, Alberto decidiu<br />
comer nalguma osteria e passar a tarde caminhando a esmo, s<strong>em</strong><br />
qualquer preocupaÄÜo <strong>em</strong> se perder – o que, ao contrÉrio, desejava”<br />
9 O flÅneur Ç alguÇm que perambula s<strong>em</strong> compromisso por uma cidade, alguÇm que percorre as<br />
ruas s<strong>em</strong> objetivo aparente, mas secretamente atento ç histâria dos lugares por onde passa. Ele<br />
tambÇm Ç outro marginal, um andarilho bastardo da cidade.