16.05.2013 Views

Carnaúba dos Dantas Portalegre Entrevista - Fundação Jose Augusto

Carnaúba dos Dantas Portalegre Entrevista - Fundação Jose Augusto

Carnaúba dos Dantas Portalegre Entrevista - Fundação Jose Augusto

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

<strong>Portalegre</strong> - Jardim <strong>dos</strong> cajus e borboletas<br />

Engenho faz alfenins artesanais<br />

Quem já comeu alfenim feito na hora?<br />

Todo final de tarde é de festa para os<br />

meninos do sítio Jenipapeiro, zona<br />

rural a 6 km do centro de <strong>Portalegre</strong>. As<br />

crianças correm até o engenho de cana do<br />

Jenipapeiro, em frente à igreja de Nossa<br />

Senhora de Fátima, para saborear o<br />

alfenim feito artesanalmente. O engenho<br />

fabrica também mel de engenho e duas<br />

mil rapaduras por dia.<br />

Segundo Luís da Câmara Cascudo, o<br />

alfenim, que o povo também chama<br />

alfeninho, é de origem árabe (al-fanid).<br />

O alfenim de <strong>Portalegre</strong> é bastante<br />

original. O melaço da cana, já depois de<br />

engrossar, é enrolado no talo da cana-deaçucar<br />

e balançado no vento até esfriar<br />

um pouco. O artesão, então, dá a liga<br />

com as mãos e faz o alfenim em formato<br />

de laços. O doce, quando está sendo<br />

puxado com as mãos para ficar mais<br />

uniforme, tem cor dourada.<br />

O escritor pernambucano Mario Sette,<br />

autor de “Senhora de Engenho”, definiu<br />

o alfenim como um “confeito alvíssimo,<br />

sólido mas delicado e quebradiço, muito<br />

agradável ao paladar, preparado com<br />

melado, que se deixa ao fogo até atingir<br />

um ponto especial, quando, então, se<br />

retira a massa do fogo, estendendo-a<br />

sobre um mármore ou qualquer outra<br />

superfície fria. Depois de parcialmente<br />

esfriada, puxa-se a massa com as mãos<br />

polvilhadas de goma até alvejar, e<br />

solidificar, podendo-se, antes, dar-lhe as<br />

mais variadas formas”.<br />

A cana utilizada no engenho Jenipapeiro<br />

vem do canavial da Boca da Pedra.<br />

O trabalho intenso começa às quatro<br />

da manhã e vai até o final da tarde.<br />

Evangelista Albino Lopes, 52 anos,<br />

trabalha “desde novo” no engenho. Para<br />

ele, que aprendeu o ofício com o pai<br />

Momélio Lopes, o calor intenso do lugar<br />

não é motivo para deixar de trabalhar.<br />

O engenho tem dois pisos. Na parte<br />

superior, a cana é moída no triturador<br />

motorizado e, na parte mais baixa, o<br />

parol recebe o caldo saído da moenda.<br />

O caldo de cana é despejado em seis<br />

caldeiras enfileiradas. Os caldeireiros<br />

mexem o caldo com cabaças de cuia até<br />

o líquido ficar no ponto de ir para um<br />

tacho de ferro.<br />

A garapa continua sendo mexida no tacho<br />

de ferro até ficar na consistência ideal.<br />

É do tacho que sai o melaço para fazer<br />

o alfenim. Para fabricar as rapaduras,<br />

o caldo grosso é despejado nas gamelas<br />

de madeira e, finalmente, enche as<br />

formas de madeira retangulares. Depois<br />

de esfriar, as rapaduras são retiradas<br />

e depositadas num quartinho anexo.<br />

Tudo feito conforme “seu” Evangelista<br />

aprendeu quando era menino.<br />

Dona Almira reza gente e bicho<br />

Quem entra na casa de Almira Maria<br />

de Souza, 76 anos, vê logo um quadro<br />

na sala com os dizeres “ao entrar nesta<br />

casa Deus te abençoe, ao sair Deus te<br />

acompanhe”. Os mais atentos podem<br />

notar um copo cheio d’água com duas<br />

sementes de mucunã sobre o armário da<br />

sala. As sementes, também conhecidas<br />

como olho de boi, são utilizadas como<br />

amuleto contra o mau olhado.<br />

Almira faz rezas desde que o marido<br />

Joaquim Pedro da Silva “sentiu uma<br />

fraqueza muito grande há mais de vinte<br />

anos”. A rezadeira diz ser filha de “um<br />

povo curador”. Maria Firmino, avó de<br />

Almira, e a bisavó também faziam rezas.<br />

“Eu dizia que não queria esta seita”,<br />

comenta. “Minha avó dizia que eu era<br />

uma menina de mão direita, de sorte.<br />

Aí passou muito tempo, meu marido<br />

adoeceu e comecei a fazer orações.<br />

Botava as mãos para cima e clamava a<br />

Deus e à Nossa Senhora”.<br />

Segundo conta, depois de presenciar a<br />

recuperação do marido, passou a acreditar<br />

no poder da oração e atender aos pedi<strong>dos</strong><br />

por rezas. “Joaquim, meu marido, vive<br />

bem há mais de vinte anos. Tudo que eu<br />

faço dá positivo. Primeiro vem Jesus, e na<br />

minha devoção é São Francisco e Nossa<br />

Senhora da Conceição”, diz, enquanto<br />

mostra uma imagem representando<br />

a Santíssima Trindade na mesinha de<br />

madeira da sala decorada com flores de<br />

plástico e duas velas acesas.<br />

A rezadeira lembra ainda da devoção por<br />

Santa Rosa e comenta o hábito de fazer<br />

as orações enquanto segura ramalhetes<br />

de flores. “Uso sempre rosas brancas e<br />

roupas brancas ou marrom. Não gosto<br />

de vestido florido”. Com o braço direito<br />

estendido, Almira toca a cabeça do fiel e<br />

faz o sinal da cruz. As rosas que utiliza<br />

são cultivadas no quintal da casa.<br />

As rezas são iniciadas com o Credo.<br />

Depois, Almira reza três Pai Nossos, três<br />

Ave Marias e termina a bênção com um<br />

Salve Rainha. A população de <strong>Portalegre</strong><br />

procura sempre a ajuda de Almira<br />

e também leva animais para serem<br />

reza<strong>dos</strong>.“Rezo tudo, gatinho, cachorro,<br />

porco...”.<br />

84 Dezembro 2004 Dezembro 2004<br />

85

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!