A HISTÓRIA CONTADA PELA CAÇA OU PELO CAÇADOR? - PACS
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os processos econômicos. Em Angola, vivenciamos um Estado marcadamente presente. O Estado<br />
está no policiamento e controle nas ruas (sequer era possível tirar fotografias em autorização!),<br />
na condução dos investimentos, com o controle sobre as empresas que entram e atuam<br />
no país, e no seio da sociedade civil, corporificado nas organizações de massa, filiadas ao partido,<br />
e que congregam mulheres, juventude e camponeses. Em muitos casos, o governo tem<br />
participação nos conselhos das próprias empresas ou pessoas com cargos públicos com alto<br />
poder decisório detém empresas que realizam obras públicas, o que muitos apontaram como<br />
forma de coletar “comissões” ou propinas. A impressão, por meio das conversas e entrevistas,<br />
é que o governo de Angola demonstra elevada capacidade de intervenção e organização da<br />
economia, mesmo que isso não seja feito de forma transparente e com participação social na<br />
tomada das decisões.<br />
Em Moçambique, ainda que o Estado permaneça importante em muitas dimensões da vida cotidiana,<br />
sua força no âmbito da economia nos pareceu menos evidente. A capacidade de coerção<br />
do Estado ficou evidente nas entrevistas quando se tratava da repressão de protestos e revoltas<br />
de populações e trabalhadores e de controle de posicionamentos críticos da sociedade civil por<br />
meio da infiltração de espiões nessas organizações 38 . Contudo, em Moçambique, muitos entrevistados<br />
relativizaram a força do Estado em conduzir os processos econômicos em curso no país,<br />
estando refém de uma lógica que obedece a um ciclo com raiz no endividamento público. Nesse<br />
sentido, o Estado moçambicano, muitas vezes, foi associado a uma suposta “incapacidade”<br />
de ação, controle e monitoramento sobre os investimentos em seu território, especialmente no<br />
que concerne às violações trabalhistas e às questões ambientais e de direitos das comunidades.<br />
deve-se isso ao contexto de um Estado que há pouco tempo foi surpreendido com descobertas<br />
de importantes reservas minerais, associado à insuficiência de quadros burocráticos qualificados<br />
e a uma forte ideologia liberal, reforçada pelo elevado grau de endividamento e dependência<br />
da ajuda externa. O resultado dessa equação é um Estado moçambicano que aparenta relativa<br />
fragilidade frente a gigantes empresas multinacionais e ao fluxo de recursos provenientes de<br />
cooperação e doações, necessárias para fechar as contas nacionais.<br />
O reconhecimento do governo do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) pelo<br />
governo Geisel em 1975 foi um fato constantemente lembrado por todos os atores entrevistados<br />
nesse país. Calcada fortemente nas suas imensas reservas de recursos minerais, Angola,<br />
tem apresentado nos últimos anos um crescimento econômico impressionante, em alguns<br />
anos chegando a 20% a.a.. Consolida-se, contudo, no país uma sociedade com imensa desigualdade<br />
econômica e social que, não obstante a diversidade das províncias do interior, em<br />
Luanda, pode ser categorizada em duas Angolas. de um lado, a pobreza extrema e a falta de<br />
acesso a serviços públicos e direitos humanos básicos a boa parte da população; de outro, uma<br />
pequena elite nacional e internacional com acesso ampliado aos rendimentos do petróleo e<br />
conectada com os fluxos de investimento do mercado global.<br />
38 - Informação coletada em entrevistas com organizações da sociedade civil, com acadêmicos e alguns membros do Estado críticos à<br />
utilização desses instrumentos.