A HISTÓRIA CONTADA PELA CAÇA OU PELO CAÇADOR? - PACS
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Alguns estudos mostraram que o próprio diretor da Embrapa teria reconhecido em algumas<br />
ocasiões a ausência da horizontalidade nos projetos de cooperação técnica (CAStRO e GOuLEt,<br />
2011). Outros explicitaram que ocorre a transferência, de um país para o outro, de um “pacote<br />
tecnológico determinado”, ainda que envolvidos num discurso de proximidade e simetria (CAStRO,<br />
GABAS, SABOuRIN, 2012).<br />
Situações como essas ficam mais evidenciadas no campo agrícola e do desenvolvimento rural.<br />
Castro, Gabas e Sabourin (2012) destacam que a atuação brasileira em Moçambique tem<br />
sido marcada pelo avanço não necessariamente proporcional entre dois modelos de desenvolvimento<br />
do mundo rural cujos traços maiores residem no avanço de uma agricultura de<br />
larga escala, direcionada para mercados mundiais conciliada com apoios à agricultura familiar.<br />
Entendemos que mais do que contraditórios, nos diversos instrumentos de atuação brasileira<br />
em Moçambique e Angola, as ações em torno desses projetos têm se mostrado, em grande<br />
medida, complementares. Ainda que com participações extremamente desiguais, boa parte<br />
das ações transferidas a esses países por meio da cooperação técnica tem incluído medidas<br />
voltadas para o fomento do agronegócio e políticas específicas de apoio à agricultura familiar<br />
e de promoção da segurança alimentar. As ações de cooperação que envolvem a Embrapa<br />
e o governo brasileiro em Moçambique têm sido emblemáticas nesse sentido: de um lado<br />
se avança no desenvolvimento de um plano diretor para a produção agrícola articulado com<br />
ações de financiamento e crédito para a vinda de produtores de soja brasileiros para a savana<br />
moçambicana, de outro inclui-se uma dimensão de participação da agricultura familiar e de<br />
replicação de políticas específicas para esse público como o Programa Aquisição de Alimentos,<br />
o Pronaf e o Mais Alimentos África.<br />
Essa lógica chama atenção para um último ponto da infuência da ação brasileira nesses países<br />
que é o conteúdo em grande parte “tecnicista” dos projetos implementados. Seus desenhos<br />
são, em grande parte, arquitetados sob a justificativa de aumento da produtividade e transferências<br />
de tecnologia em pacotes, e raramente para o fortalecimento de cadeias completas de<br />
abastecimento (o PAA pode ser uma exceção a essa regra). Ao mesmo tempo, alguns estudos<br />
(CAStRO e GOuLEt, 2012) entendem que não estaria em curso ainda um efetivo processo de<br />
adaptação das políticas e experiências brasileiras ao contexto africano. Mais do que transferir<br />
pacotes fechados de políticas e tecnologias, ainda estaria bastante recuado o processo de<br />
adaptação da experiência brasileira ao contexto africano que envolva um retorno reflexivo<br />
com especial atenção para os possíveis erros e negligências da própria experiência brasileira e<br />
uma maior participação de atores africanos na construção desse processo. Assim, como ficou<br />
marcado em experiências anteriores:<br />
“No setor do agronegócio, os brasileiros são aqueles que mais estão entrando. Os<br />
produtos são cana, milho, a importação e exportação de gado, muita maquinaria<br />
e técnicos. Aí os brasileiros tem estado a cometer um desastre. Há alguns anos<br />
atrás ficou na imagem das pessoas gado bovino que vinha do Brasil. tiveram até<br />
algumas atrizes [Regina duarte] a atuar nessa campanha (...). Mas o animal não<br />
se adaptou, e acabou morrendo. um animal que está acostumado a ser criado<br />
sob determinada alimentação, você traz pra um capim que não é o mais adequado...<br />
Várias vozes angolanas criticaram isso... Há esses projetos malucos dos<br />
biocombustíveis. Isto só acontece porque normalmente as instituições brasileiras<br />
entram nessa cadeia. Ou por via da assistência técnica, ou se associando a grupos