23 - Tribunal de Justiça Militar do Estado de Minas Gerais
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Os aspectos práticos <strong>de</strong>sta premissa po<strong>de</strong>m ser ressalta<strong>do</strong>s<br />
na seguinte indagação: se houvesse um policial<br />
civil atuan<strong>do</strong> conjuntamente com um policial militar, no<br />
caso concreto, haveria razões para permitir a aplicação<br />
da pena restritiva <strong>de</strong> direitos em benefício <strong>do</strong> policial civil<br />
e não permitir que o militar tivesse o mesmo tratamento?<br />
A condição <strong>de</strong> militar constitui causa idônea para<br />
que o Po<strong>de</strong>r Público ofereça uma resposta repressiva<br />
diferenciada? A resposta, certamente, é negativa.<br />
A professora Cármen Lúcia Antunes Rocha (1990,<br />
p. 99), que hoje empresta seu brilho ao Supremo <strong>Tribunal</strong><br />
Fe<strong>de</strong>ral, já afirmou que viola o princípio da igualda<strong>de</strong><br />
material conce<strong>de</strong>r <strong>de</strong>terminadas vantagens apenas<br />
para algumas categorias <strong>de</strong> profissionais <strong>do</strong> serviço<br />
público, enquanto outros, que <strong>de</strong>sempenham suas<br />
ativida<strong>de</strong>s em iguais condições e com as mesmas propostas<br />
<strong>de</strong> trabalho, ficam afasta<strong>do</strong>s <strong>do</strong> gozo <strong>de</strong> iguais<br />
direitos. A lição foi formulada para criticar o regime<br />
jurídico <strong>do</strong>s servi<strong>do</strong>res. No entanto, é inteiramente<br />
aplicável ao tema da aplicação das penas restritivas <strong>de</strong><br />
direitos, pois o raciocínio expressa a atuação <strong>do</strong> princípio<br />
da isonomia que está consagra<strong>do</strong> no caput <strong>do</strong><br />
art. 5° da Carta Constitucional.<br />
Denílson Feitosa Pacheco (2008, p. 246), por sua<br />
vez, tratan<strong>do</strong> especificamente da exigência <strong>de</strong> representação<br />
para os crimes <strong>de</strong> lesão corporal leve e culposa<br />
na <strong>Justiça</strong> <strong>Militar</strong>, inicia sua reflexão indagan<strong>do</strong><br />
se “po<strong>de</strong>ria a Lei n. 9.099/1995 tratar diferentemente<br />
o réu <strong>do</strong> processo penal militar relativamente ao réu<br />
<strong>do</strong> processo penal comum?” Em seguida, estabelece a<br />
seguinte premissa:<br />
[...] <strong>do</strong> ponto <strong>de</strong> vista <strong>do</strong> princípio constitucional da<br />
igualda<strong>de</strong>, é necessário se <strong>de</strong>terminar o elemento diferencial<br />
entre o réu <strong>do</strong> processo penal comum e o<br />
réu <strong>do</strong> processo penal militar que justifique o tratamento<br />
<strong>de</strong>sigual entre eles.<br />
Certamente, o fato <strong>de</strong> ser militar, por si só, não autoriza<br />
distinção <strong>de</strong> tratamento.<br />
Não haven<strong>do</strong> elemento diferencial que, <strong>de</strong> maneira<br />
idônea, possa justificar o tratamento diferencia<strong>do</strong> conferi<strong>do</strong><br />
aos militares estaduais tal tratamento <strong>de</strong>ve ser reconheci<strong>do</strong><br />
como inconstitucional, por violar o princípio<br />
da isonomia.<br />
6 LEGITIMIDADE E RACIONALIDADE DO DIREITO<br />
Cabe observar que a operação <strong>do</strong> sistema normativo<br />
não se fundamenta na teoria aristotélica da verda<strong>de</strong>, que<br />
busca encontrar correspondência entre <strong>de</strong>terminada assertiva<br />
e a realida<strong>de</strong> material. A operação <strong>do</strong> sistema<br />
normativo é orientada por meio <strong>de</strong> construção discursiva<br />
racional. O discurso jurídico é essencialmente prático<br />
e, para satisfazer a pretensão <strong>de</strong> correção, <strong>de</strong>ve ser<br />
fundamenta<strong>do</strong> racionalmente.<br />
Nas ciências naturais a racionalida<strong>de</strong> se expressa pela<br />
verda<strong>de</strong> <strong>de</strong> suas proposições. Mas, nas ciências valorativas,<br />
como é o caso <strong>do</strong> Direito, a racionalida<strong>de</strong> apenas<br />
po<strong>de</strong> conduzir à idéia <strong>de</strong> correção <strong>de</strong> suas assertivas.<br />
E a teoria <strong>do</strong> discurso racional como teoria da justificação<br />
jurídica, <strong>do</strong> prestigia<strong>do</strong> jurista Robert Alexy<br />
(2005, p. 5), já nos alertou para o fato <strong>de</strong> que a legitimida<strong>de</strong><br />
e a correção das <strong>de</strong>cisões judiciais estão intimamente<br />
ligadas à racionalida<strong>de</strong> que confere universalida<strong>de</strong><br />
às conclusões obtidas consensualmente.<br />
Muitos opera<strong>do</strong>res <strong>do</strong> Direito <strong>Militar</strong> racionalizam <strong>de</strong><br />
maneira equivocada as questões da <strong>Justiça</strong> <strong>Militar</strong>, por<br />
se basearem na premissa <strong>de</strong> que esta se presta à proteção<br />
<strong>do</strong>s princípios da hierarquia e disciplina.<br />
A Constituição da República estabelece que os princípios<br />
da hierarquia e disciplina são pilares organizacionais<br />
das instituições militares, que constituem apenas<br />
meios para a realização <strong>do</strong>s fins institucionais.<br />
Constituem fins das instituições militares da União,<br />
conforme o art. 142, a <strong>de</strong>fesa da pátria, a garantia <strong>do</strong>s<br />
po<strong>de</strong>res constitucionais, e a garantia da lei e da or<strong>de</strong>m.<br />
Por outro la<strong>do</strong>, constituem fins das instituições militares<br />
estaduais, nos termos <strong>do</strong> art. 144, a preservação<br />
da or<strong>de</strong>m pública, da incolumida<strong>de</strong> e <strong>do</strong> patrimônio<br />
das pessoas, no contexto <strong>do</strong> direito fundamental à segurança<br />
pública.<br />
Portanto, nem mesmo para as instituições militares<br />
a hierarquia e a disciplina constituem um fim em si mesmo.<br />
Constituem meios organizacionais peculiares que<br />
po<strong>de</strong>m conferir maior eficiência aos serviços públicos<br />
presta<strong>do</strong>s pelas instituições militares para o atendimento<br />
<strong>de</strong> suas missões constitucionais. Não po<strong>de</strong>m os juízes<br />
da <strong>Justiça</strong> <strong>Militar</strong> (que ressaltam sua integração ao<br />
Po<strong>de</strong>r Judiciário a partir <strong>de</strong> 1934) transformar os princípios<br />
organizacionais das instituições militares (meios)<br />
Revista <strong>de</strong><br />
ESTUDOS&INFORMAÇÕES<br />
Novembro <strong>de</strong> 2008 21