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DE ARRIANO DE NICOMÉDIA André Luiz Leme

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ASCENSÃO E LEGITIMAÇÃO <strong>DE</strong> ALEXANDRE, O GRAN<strong>DE</strong>, NA “ANÁBASE<br />

<strong>DE</strong> ALEXANDRE MAGNO” <strong>DE</strong> <strong>ARRIANO</strong> <strong>DE</strong> <strong>NICOMÉDIA</strong><br />

<strong>André</strong> <strong>Luiz</strong> <strong>Leme</strong><br />

Orientador: Renan Frighetto<br />

Nosso trabalho se propôs à uma análise da construção da figura histórica de<br />

Alexandre, o Grande (356-323 a.C.), na obra Anábase de Alexandre Magno. Datando do<br />

século II d.C., esta obra foi escrita por Arriano de Nicomédia (80/95-175 d.C.), um alto<br />

funcionário da administração imperial romana, e seu tema compreende a narrativa histórica<br />

da expedição militar de Alexandre contra os persas. O recorte temporal adotado para nosso<br />

estudo no documento foi o período da ascensão e legitimação de Alexandre à realeza<br />

macedônia e também à condição de hegemon dos gregos (correspondente aos anos de<br />

336 a.C. à 334 a.C.). Ao mesmo tempo em que criticamos o modo como Arriano<br />

representa o personagem histórico Alexandre, atentamos também para como o presente<br />

vivido pelo autor se manifesta na composição da obra. Portanto, para uma melhor<br />

compreensão da Anábase, tornou-se necessário compreender o contexto da Grécia e<br />

Macedônia do século IV a.C. e também do Império Romano do século II d.C.<br />

Nosso trabalho com a fonte compreendeu duas etapas. Inicialmente, realizamos<br />

uma análise mais específica sobre os diferentes acontecimentos que Arriano relatou,<br />

verificando como o autor construiu cada momento do processo de ascensão e legitimação<br />

de Alexandre, criticando várias das informações que ele apresenta – apoiados numa<br />

historiografia recente acerca do tema, cujos principais nomes são Claude Mossé, Arminda<br />

Lozano Velilla e Fernández Nieto. Na segunda etapa, com base nos principais aspectos<br />

levantados e reunidos na etapa anterior, buscamos caracterizar um sentido mais amplo para<br />

a obra. Ou seja, foi buscar a impressão sobre o que o todo da obra (no período específico<br />

analisado) queria transmitir acerca de Alexandre e o que, de forma intencional ou não,<br />

deixa entender sobre a época de Arriano e ao próprio motivo de sua escrita.<br />

Durante a análise da fonte criticamos o modo como o autor apresenta a ascensão de<br />

Alexandre à realeza macedônia: por ser filho do rei morto, Felipe II, Alexandre é sagrado<br />

rei e, imediatamente após, encontrava-se já liderando o exército macedônio –<br />

reivindicando, perante as poleis gregas, a chefia da expedição contra os persas. Arriano<br />

apresenta uma ascensão sem entraves, praticamente sem dificuldades para Alexandre. No<br />

entanto, a historiografia recente combate esse ponto de vista generalizante. Lozano Velilla,


por exemplo, afirma que o princípio hereditário não era uma regra absoluta na monarquia<br />

macedônia. Por isso, haveria sim outros candidatos na disputa pelo trono real, competindo<br />

com Alexandre 1 . Portanto, a questão da ascensão de Alexandre teria se demonstrado muito<br />

mais complexa do que aquela apresentada por Arriano. Mas por que ele teria então<br />

simplificado tal momento? Acreditamos que, ao optar por não esclarecer melhor essa<br />

questão, o autor estaria mesmo poupando Alexandre de qualquer questionamento primeiro<br />

sobre a legitimidade de sua ascensão. Sua figura histórica, portanto, começa a ser moldada<br />

mais pelo seu lado positivo. Segundo Mossé, a ascensão de Alexandre teria sido garantida<br />

apenas quando ele buscou um fortalecimento no exército, sua verdadeira base de apoio<br />

para vencer seus concorrentes ao trono e legitimar sua posição como novo monarca 2 . Por<br />

isso, vemos um Alexandre, na narrativa de Arriano, que buscou logo ratificar sua posição<br />

como novo líder (hegemon) da expedição contra os Persas – cumprindo o desejo de<br />

expansão prometido anteriormente por Felipe II e certamente ambicionado pelo exército.<br />

Arriano apresenta um Alexandre que irá enfrentar uma série de dificuldades para<br />

manter e legitimar sua posição como novo monarca. Deste modo, se o autor não<br />

demonstrou anteriormente qualquer forma de contestação à ascensão de Alexandre na<br />

Macedônia, o mesmo não pode ser dito em relação à Grécia (Tebas) e aos povos<br />

fronteiriços (Trácia). São revoltas que surgem e que configuram situações de risco ao novo<br />

rei. Destarte, sentimos agora as várias conseqüências da transição do reinado. Alexandre,<br />

frente às circunstâncias de cada momento, aparece agindo rapidamente, utilizando-se da<br />

violência e punindo severamente os rebelados (como exemplos frente aos demais). Punia-<br />

se os revoltos, mas também beneficiava-se os aliados, principalmente com acordos de<br />

união. Em suma, trata-se de um modo agressivo de fazer política, mas que demonstra a<br />

preocupação do macedônio em garantir a união do mundo grego e pacificar sua retaguarda<br />

antes de partir rumo ao Oriente. Paulatinamente, vai legitimando cada vez mais sua<br />

posição. Importante destacar que Arriano encontra espaço, em diferentes momentos da<br />

narrativa histórica, para sempre exaltar o personagem Alexandre. Este, no geral, é visto<br />

como um homem de várias virtudes: tolerante, prudente, versátil, destemido, corajoso e<br />

portador de um “vivo interesse”, um sentimento que o leva à realização de grandes feitos.<br />

Aos poucos, delineia-se a personificação de um líder ideal – ou seja, um grande exemplo<br />

de comando.<br />

1 LOZANO VELILLA, A. El mundo helenístico. Madrid: Editorial Sintesis, 1992, p.28.<br />

2 MOSSÉ, C. Alexandre, o Grande. Trad. Anamaria Skinner. São Paulo: Estação Liberdade, 2004, p.20.


Se a narrativa de Arriano, por um lado, nos aproximou de um Alexandre histórico<br />

no período de sua ascensão e legitimação (em contraposição a uma visão mais mítica do<br />

personagem) ela também nos ajuda compreender muito do momento em que a obra foi<br />

escrita. Alguns dos acontecimentos que o autor relata na história de Alexandre possuem<br />

relação com fatos vividos por ele em seu presente. Lembremos que Arriano esteve muito<br />

envolvido na política de seu tempo, sendo um dos homens de confiança do Imperador<br />

Adriano (76 – 138 d.C.). Compreender a importância da relação Arriano/Adriano torna-se<br />

fundamental para se estabelecer um sentido maior para a Anábase de Alexandre Magno.<br />

Inicialmente, notamos uma tentativa de paralelo passado/presente, na qual o autor<br />

vislumbra o exemplo de um líder ideal e virtuoso – que, por sinal, é um líder de base<br />

militar. Isso nos remete às circunstâncias do Império Romano de Adriano, onde se<br />

necessitava cada vez mais de líderes de cunho militar para a garantia da defesa e<br />

manutenção de um gigantesco Império. As ameaças bárbaras e de povos revoltosos, que já<br />

se intensificavam no século II d.C., nos remetem àquelas mesmas enfrentadas por<br />

Alexandre no século IV a.C., quando este pacificava seu reino. Por exemplo, um dos povos<br />

que Alexandre combate, os getas, tornar-se-ão os problemáticos dácios da época de<br />

Adriano. Se Arriano estigmatiza os dácios no passado é visando justificar a rebeldia que<br />

eles ainda demonstram no presente, legitimando-se assim uma ação coercitiva (de<br />

punição). Mas uma das propostas centrais que Arriano transmite, através do exemplo de<br />

Alexandre na sua luta pela pacificação do reino macedônio, é a idéia de união. Uma forte<br />

coesão interna, seja em termos de um reino ou um Império, seria peça fundamental para<br />

sua manutenção e prosperidade. Se Alexandre desejava a união do mundo grego, o mesmo<br />

quer Arriano para o mundo romano – e o responsável por fazer isso, claro, seria Adriano.<br />

Nosso trabalho, portanto, demonstrou como se deu a construção da figura histórica<br />

de Alexandre na Anábase de Alexandre Magno, tendo em vista o período específico da<br />

ascensão e legitimação do rei macedônio. Da nossa análise, pudemos perceber um<br />

Alexandre consciente, estratégico e que enfrentou, vencendo, várias dificuldades – surge<br />

assim um Alexandre mais histórico do que mítico. No entanto, consentimos sim que a obra<br />

de Arriano enalteça muito a figura de Alexandre. Mas não apenas a deste. Indiretamente, é<br />

a imagem do Imperador Adriano que se reflete a partir daquela de Alexandre. A idéia de<br />

uma trajetória de conquistas e sucesso é então compartilhada por ambos. Adriano surge<br />

como o personagem que continua uma tradição política – resgatada por Arriano na sua<br />

obra, quando este escreve a história de Alexandre.

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