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RACISMO EM MARIO FILHO: UMA ANÁLISE DA OBRA O NEGRO ...

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<strong>RACISMO</strong> <strong>EM</strong> <strong>MARIO</strong> <strong>FILHO</strong>: <strong>UMA</strong> <strong>ANÁLISE</strong> <strong>DA</strong> <strong>OBRA</strong> O <strong>NEGRO</strong> NO<br />

FUTEBOL BRASILEIRO A PARTIR <strong>DA</strong> QUESTÃO RACIAL NO FUTEBOL<br />

Palavras-chaves: racismo; identidade nacional; futebol<br />

Aluna: Fernanda Ribeiro Haag<br />

feerh_@hotmail.com<br />

Orientador: Prof. Dr. Luiz Carlos Ribeiro<br />

O presente trabalho se debruça sobre a produção do jornalista Mario Rodrigues<br />

Filho com o intuito de analisá-la e assim refletir sobre a questão racial e a identidade<br />

nacional brasileira no período que se estende até meados do século XX – tendo seu foco<br />

nas décadas de 20, 30 e 40 graças ao pensamento social e cultural da época e a ideologia<br />

integracionista de um governo forte e centralizador como o de Getúlio Vargas – e que de<br />

acordo com o legado literário de Filho foram pautadas basicamente pelo futebol. Pensar o<br />

futebol é atividade recente dos historiadores, possibilitado pelo advento da História<br />

Cultural, mas se revela importante, pois funciona como metáfora social e é tido como um<br />

dos pilares construtores de nossa identidade brasileira 1 , e aliado ao estudo de questões<br />

raciais merece ainda mais relevância. É com base nesse viés que a obra de Mario Filho se<br />

destaca, pois a sua análise possibilita refletir sobre essas questões relevantes no<br />

pensamento social do Brasil.<br />

Para a realização da pesquisa, além do respaldo da historiografia, escolheu-se<br />

dentro da produção do jornalista e se utilizou como fonte primária a obra O negro no<br />

futebol brasileiro. Definido esse objeto de estudo foi importante levar em consideração as<br />

duas edições do livro, a primeira edição foi publicada pela Editora Irmãos Pongetti no ano<br />

de 1947 e a segunda em 1964 pela Editora Civilização Brasileira e elas possuem diferenças<br />

claras. A versão publicada em 1964 teve trechos suprimidos do último capítulo para que<br />

fosse possível a inserção de dois novos capítulos, os quais teriam a função de dar mais<br />

legitimidade e maior poder argumentativo para a tese do autor de que o negro e o mulato<br />

conseguiram superar o racismo no Brasil através do futebol. Destaca-se que a análise de<br />

NFB consiste em examinar especificamente de que maneira o racismo é perceptível no<br />

interior da obra, considerando e se focando na forte ambiguidade presente quando se trata<br />

das questões raciais. Dessa forma, o trabalho visa perceber como o racismo se exprime no<br />

livro a partir de suas próprias contradições.<br />

Quanto à metodologia utilizada, destacam-se as categorias e o método utilizados<br />

pelas pesquisadoras Mariza Veloso e Angélica Madeira. 2 A abordagem realizada teve um<br />

viés amplamente culturalista, assim a cultura foi tida como patrimônio coletivo e o mais<br />

importante conjunto de símbolos e imagens contendo valores que focam na ideia de<br />

pertencer a instâncias coletivas, por isso há a necessidade de trabalhar com obras que<br />

construíram interpretações clássicas sobre a nossa cultura. 3 Dessa forma, as narrativas<br />

sobre o Brasil também se incluem nesse conjunto simbólico e se constituem como marcos<br />

nas construções das representações da cultura brasileira, sendo a obra do Mario Filho uma<br />

delas.<br />

A obra O negro no futebol brasileiro foi vista como uma narrativa ou discurso e<br />

como tal se configura como uma representação construída e não apenas como descrição<br />

1<br />

MURAD, Mauricio. O lugar teórico da Sociologia do Futebol. Revista do Núcleo de Sociologia do Futebol,<br />

Vol. 2, 1995, p. 106.<br />

2<br />

VELOSO, Mariza; MADEIRA, Angélica. Leituras Brasileiras: Itinerários no pensamento social e na<br />

literatura. São Paulo: Paz e Terra, 1999.<br />

3 Ibidem, p. 37.


naturalizada da realidade na qual está inserida, ou seja, não é tido apenas como duplicação<br />

ou cópia de um real, pelo contrário, é importante ressaltar a sua capacidade modeladora e<br />

constitutiva do próprio contexto do qual emerge, influenciando-o diretamente. Por isso,<br />

também foi importante perceber a circularidade e a legitimidade desse discurso na<br />

sociedade. 4 Ademais, foi levado em consideração como fator importante da análise as<br />

categorias intrínsecas à obra, como a de raça e racismo.<br />

A historiografia sobre o assunto é rica o que auxiliou muito na pesquisa. Para o<br />

esclarecimento e análise do contexto do Mario Filho e por conseguinte, da fonte se levará<br />

em conta as contribuições de Ângela Gomes, em Estado Novo. Ideologia e poder e Paulo<br />

Henrique Martins no seu texto A cultura política do patriarcalismo, explicitando a cultura<br />

política do Estado Novo. Para pensar a atuação do governo varguista no campo<br />

futebolístico o trabalho de Maurício Drummond, Os gramados do catete: Futebol e<br />

política na Era Vargas (1930-1945) e o de Luciano Banchetti e Felipe Machado, Nas<br />

arquibancadas e nas tribunas! O binômio futebol/política na vivência dos estádios durante<br />

o governo Vargas: Pacaembu e São Januário se mostraram importantes.<br />

A reflexão sobre a identidade nacional e a mestiçagem conta com o trabalho de<br />

Renato Ortiz com seu livro Cultura Brasileira & Identidade Nacional. E sobre a produção<br />

intelectual de Freyre e sua ligação com um projeto político estabelecido se trabalhou com<br />

os autores: Jesse Souza, em Uma interpretação alternativa do dilema brasileiro; Sandra<br />

Pesavento, Paraísos cruzados: Encantamento e desencantamento do mundo em Gilberto<br />

Freyre e Sérgio Buarque de Holanda.<br />

Com a intenção de compreender a vida, a obra e as realizações de Mario Filho e a<br />

sua relevância para o futebol e imprensa brasileiros se destaca um capítulo da obra Com<br />

Brasileiro não há quem possa! da socióloga Fátima Antunes.<br />

A produção de Mario Filho graças a sua relevância já foi amplamente discutida no<br />

interior da academia. Por tratar de questões raciais relacionadas diretamente ao futebol e de<br />

tanger o estudo e a própria construção da identidade nacional brasileira a obra desencadeou<br />

um debate acadêmico estimulante e duradouro e que se revela importante para a nossa<br />

pesquisa.<br />

Por um lado se tem o pesquisador Antônio Jorge Soares e em contrapartida se tem<br />

os denominados “novos narradores” – os quais receberam essa denominação do próprio<br />

Soares. Esse pesquisador defende que o NFB se configura não como um trabalho<br />

científico, mas como um romance literário que trata de “causos” – não necessariamente<br />

reais ou verdadeiros – do futebol com a finalidade de alimentar um ideal integracionista do<br />

país oriundo da política ideológica varguista e que se fundamenta na construção de uma<br />

identidade nacional do brasileiro, baseado na miscigenação e na figura do mulato. O foco<br />

na questão racial seria para exprimir a importância que o futebol teve no Brasil para o<br />

processo de democratização das relações raciais e para a ascensão social do negro.<br />

Ademais, Soares faz uma crítica forte aos “novos narradores”, acusando-os de realizar uma<br />

leitura utilitarista da obra de Mario Filho, pois eles apenas desenvolveram uma “pedagogia<br />

anti-racista” a partir de NFB. Eles também possibilitaram a permanência da ideologia<br />

contida na obra, dando a sua legitimação através do caráter científico e acadêmico. A<br />

crítica vai além, pois segundo o pesquisador os cientistas sociais utilizam de forma acrítica<br />

a obra e acabam por incorporar o viés nacionalista e o mito de harmonia social – por mais<br />

que eles relembrem que se trata de um mito – construído também pelo campo futebolístico<br />

e que está claramente contido na obra. Segundo Soares, a consequência de tomar o futebol<br />

e as relações raciais como elementos centrais da identidade brasileira é que acaba se<br />

apontando a raça como a causa da construção desse estilo próprio do futebol brasileiro, ou<br />

4 Ibidem, p. 53.


seja, como se fosse uma característica inata, natural, contida na própria raça e assim essa<br />

ideia acaba se configurando também com um viés racista, mesmo que no sentido inverso.<br />

Já os “novos narradores” – compostos basicamente pelos estudiosos Gordon<br />

Junior, Simoni Guedes, Ronaldo Helal e Hugo Lovisolo – tem abordagens e posições<br />

distintas de Soares. O NFB é tomado com significativa importância para a construção e<br />

compreensão da história do futebol brasileiro e considerada, talvez, como a mais completa<br />

fonte historiográfica levantada sobre o assunto e o acesso principal para compreender a<br />

democratização das relações entre raças no Brasil realizada através do futebol. Para<br />

contrapor a argumentação de Soares, os autores questionam o que denominam de sua<br />

“posição radical” em negar qualquer possibilidade de utilização histórica do texto do Mario<br />

Filho, pois para eles o pesquisador desqualificou totalmente a obra enquanto fonte<br />

primária. Defendem que mesmo sendo “causos” oriundos de histórias orais não<br />

necessariamente reais, o livro possibilita um acesso à história e à realidade e pensamento<br />

sociais do período e mesmo concordando que pode ser pensada como um romance épico<br />

isso não a desqualifica de nenhuma maneira e possibilita sim um tratamento histórico.<br />

Outra crítica vai tanger a questão racial, a qual para os novos narradores é negligenciada na<br />

obra de Soares assim como a dúvida em relação ao processo de relaxamento das tensões<br />

raciais no interior do universo futebolístico. Segundo eles, o autor marginaliza o fator<br />

racial enaltecendo apenas a questão referente ao amadorismo x profissionalismo, enquanto<br />

o mais aconselhável seria aliar e pensar as duas questões em conjunto. Por fim, há mais<br />

uma crítica dos “novos narradores” que tange a questão da identidade nacional. Eles<br />

concordam com Soares que toda a identidade nacional é construída e que o caso brasileiro<br />

não configura uma exceção, porém o autor defenderia que ela foi “inventada” pelo discurso<br />

nacionalista e intelectual do período e que essas especificidades no fundo não existiriam,<br />

os pesquisadores discordam amplamente, pois a identidade é construída pautada em algum<br />

fator de real e que só vai encontrar permanência se houver identificação e aceitação. Dessa<br />

forma, as culturas tendem a celebrar o que as diferencia das demais e no caso brasileiro<br />

isso aconteceria fortemente no futebol, pelo estilo próprio do Brasil de jogar bola e assim a<br />

obra de Mario Filho, no interior de sua moldura integracionista da democracia racial<br />

brasileira também estaria revelando alguma coisa do sentimento do ser e da identidade do<br />

brasileiro.<br />

É importante destacar o contexto no qual está inserido NFB possibilitando assim<br />

sua melhor compreensão. Entretanto, recorda-se que há duas edições escritas com quase<br />

vinte anos de diferença, localizadas dessa forma em realidades muito distintas. Porém, a<br />

segunda edição se conecta diretamente à conjuntura e ideologia da primeira, fator que será<br />

discutido novamente mais adiante.<br />

Sendo assim, nos prenderemos ao período da versão primeira que se configura<br />

entre as décadas de 20 a 40. Essa é uma época singular na história brasileira, marcada por<br />

diversas mudanças nos cenários social, político e cultural. No âmbito político ocorreram<br />

diversos eventos marcados por permanências e rupturas com a antiga política vigente.<br />

Mesmo com o advento do Estado Novo com um governo forte e centralizador acontece a<br />

manutenção e a continuidade da cultura política do patriarcalismo tão característico da<br />

Primeira República. Graças a isso a modernização política do Brasil se dá de forma única<br />

marcada por antigos ideais oriundos de uma sociedade hierárquica, escravocrata e de tom<br />

clientelista. O Estado Novo possuía uma política ideológica própria voltada para a nova<br />

construção da nacionalidade e visando a integração nacional. A nova identidade nacional<br />

do Brasil seria marcada pela harmonia entre todos e a singularidade do brasileiro. A missão


caberia, principalmente, aos intelectuais do período, revelando que o Modernismo não se<br />

configurou apenas como movimento cultural, mas encontrou ramificações políticas. 5<br />

O Movimento Modernista que encontrou permanências, não se restringindo<br />

apenas aos anos 20, se configurou como um novo pensamento, o qual objetivava como<br />

princípio básico fazer o Brasil adentrar na Modernidade, para isso era necessário que se<br />

pensasse sobre o nosso país, pois o pensamento desses intelectuais era que se<br />

conhecêssemos o particular alcançaríamos o universal, onde já se encontravam as nações<br />

mais desenvolvidas. É a partir dessa necessidade de se pensar o Brasil, compreender a sua<br />

formação e a sua configuração que vai se cunhando a identidade do brasileiro – e se faz<br />

uma revolução na historiografia brasileira. Para a missão de entender o país cabe destacar<br />

as obras principais de: Gilberto Freyre, Casa Grande & Senzala, Sérgio Buarque, Raízes<br />

do Brasil e Caio Prado Júnior, Formação do Brasil Contemporâneo. 6<br />

Gilberto Freyre e sua obra merecem destaque, pois influenciaram diretamente o<br />

trabalho de Mario Filho e encontraram longa permanência. Freyre possuía uma relação<br />

íntima com o Estado e sua intenção de integrar e pensar a nação. Com base nisso, o<br />

pernambucano vai se constituir como um criador da identidade brasileira. É na busca pela<br />

singularidade do Brasil que ele vai focar na mestiçagem ocorrida aqui e no advento de uma<br />

sociedade e culturas híbridas. Sua obra é marcada fortemente por ambiguidades e culmina<br />

com a criação do mito da democracia racial, defendendo que o Brasil se configuraria como<br />

um lugar ausente de racismo, onde todas as raças viveriam em harmonia.<br />

Na esteira desses acontecimentos se encontra a figura de Mario Rodrigues Filho.<br />

Assim como Gilberto Freyre era também pernambucano e o jornalismo sempre fez parte de<br />

sua vida. Seu pai, Mario Rodrigues era dono do jornal A manhã, no qual Mário Filho<br />

cuidou por um período da página de esportes e seu irmão era o também jornalista e cronista<br />

Nelson Rodrigues, que o apelidou de “criador de multidões”, graças a sua empreitada de<br />

transformar o futebol em um esporte de massa. É de extrema importância destacar que<br />

Mário Filho revolucionou toda a imprensa esportiva e influenciou diretamente o<br />

desenvolvimento do futebol no Brasil. 7<br />

O negro no futebol brasileiro é uma obra pioneira para a história do futebol no<br />

Brasil e tem significativa importância para compreender a construção dessa história. O<br />

livro – nas suas duas edições – é influenciado claramente pela ideologia da democracia<br />

racial construída a partir do pensamento freyriano. É importante destacar essa influência,<br />

pois é a partir disso que Mario Filho constrói todo o épico de seu livro. Crente no mito da<br />

harmonia social e principalmente, na singularidade da cultura brasileira, uma cultura<br />

híbrida e mestiça para ele, assim como para Freyre, e o futebol seria mais um campo no<br />

qual essa particularidade se manifestaria, existiria um “jeito brasileiro de jogar bola”. A<br />

importância do esporte vai além, pois seria o espaço que possibilitaria a maior ascensão de<br />

negros e mestiços naquele período (apesar dessa ideia encontrar forte permanência até<br />

hoje).<br />

Na obra de Filho o negro alcançaria essa ascensão social e o fim do racismo<br />

através do talento inato para jogar futebol, pois até no futebol o brasileiro – considerado<br />

por excelência o mulato, o mestiço – teria um jeito singular de ser, marcado pela mistura<br />

de todas as culturas e fortemente influenciado pelas características do negro, como a ginga,<br />

5<br />

MARTINS, Paulo Henrique N. A cultura política do patriarcalismo. Revista de Estudos de Sociologia<br />

Online, Vol. 1, 1995, p. 2.<br />

6<br />

VELOSO, Mariza; MADEIRA, Angélica. Leituras Brasileiras: Itinerários no pensamento social e na<br />

literatura. São Paulo: Paz e Terra, 1999, p. 41.<br />

7<br />

ANTUNES, Fátima Martin R. F. “Mário Filho: levantando o véu da alma brasileira” In: Com brasileiro,<br />

não há quem possa! Futebol e identidade nacional em José Lins do Rego, Mário Filho e Nelson Rodrigues.<br />

São Paulo: Editora UNESP, 2004, pp. 124-129.


a dança e o ritmo, transpostos para o futebol através do drible, da surpresa, das inovações<br />

de passes e jogadas, fatores que não ocorriam em outros países praticantes do esporte<br />

bretão. E seria a partir do âmbito futebolístico que se chegaria à harmonia plena entre as<br />

raças, pois é um espaço democratizante, o que decretaria a vitória da democracia racial<br />

freyriana.<br />

Importante ressaltar a estrutura geral do trabalho, o qual se dividiu em dois<br />

capítulos. O primeiro buscou compreender o contexto no qual está inserida a obra O Negro<br />

no Futebol Brasileiro, revelando suas ligações e sua circularidade no período. O segundo<br />

capítulo realizou uma revisão bibliográfica acerca da obra de Mario Filho e se empreendeu<br />

uma análise do livro enfatizando na percepção do racismo e nas contradições presentes<br />

durante a argumentação e construção do épico de ascensão do negro.<br />

Dessa forma, percebe-se que Mario Filho se inseria em um projeto maior de<br />

pensar o Brasil e de caracterizar a nossa identidade nacional. Projeto fundado basicamente<br />

pelo Movimento Modernista e que recebeu forte apoio do governo de Getúlio Vargas, o<br />

qual visava uma integração nacional e que teve um dos seus ápices com o legado de<br />

Gilberto Freyre.<br />

Cabe explicitar que como O negro no futebol brasileiro é uma obra muito rica e<br />

repleta de nuances a sua análise demanda mais estudos e um aprofundamento maior.<br />

Contando com isso e com os estudos realizados até agora, observa-se um fator muito<br />

relevante na obra, a existência de uma contradição no referente ao tema do racismo. Notase<br />

que Mario Filho é ambíguo, a ambiguidade sobre a questão racial pode ser demonstrada<br />

por alguns aspectos pressentes em seu livro: mesmo quando defende que há a ascensão<br />

social do negro ela se dá em consonância com a plena existência do racismo na sociedade,<br />

pois esse era um fenômeno social muito forte e incrustado no pensamento social, fator<br />

também muito relatado pelo próprio autor (como a exclusão de jogadores negros dos times<br />

grandes da cidade do Rio de Janeiro), assim a possibilidade do negro ascender socialmente,<br />

marcava mais uma forma de ele deixar de ser negro, como se houvesse uma mobilidade<br />

racial – passa a ser branco – e não social realmente, o que revela que o branco sempre seria<br />

o superior, parte-se desse pressuposto já naturalizado. Ao defender a ausência de racismo e<br />

harmonia entre as raças ocorre um silenciamento do próprio racismo, dificultando o<br />

combate a esse. E Mario Filho considera que os negros – pensando como raça – possuem<br />

características inatas, as quais favorecem o seu talento para jogar futebol, o que demonstra<br />

a permanência dos conceitos biológicos e raciais, contradizendo-se com a teoria de que<br />

todos possuem características iguais. Além de citar que os negros e mestiços seriam<br />

possuidores mais fortes de características animais e raciais, marcando uma permanência do<br />

antigo pensamento racialista. Assim, a defesa da democracia racial e, por conseguinte do<br />

fim do racismo, caminha na obra junto com preceitos racialistas e descrição de casos<br />

racistas dentro do futebol, campo que possibilitaria a maior ascensão social de negros e<br />

mestiços.

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