PROGRAMA do FESTIVAL 2006 em formato PDF - Companhia de ...
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16<br />
GIORNI FELICI (OS DIAS FELIZES)<br />
DE SAMUEL BECKETT | TEATRO<br />
COM O APOIO DO INSTITUTO ITALIANO DE CULTURA<br />
PICCOLO TEATRO DI MILANO<br />
ENCENAÇÃO DE GIORGIO STREHLER, REPOSTA POR<br />
CARLO BATTISTONI<br />
ITÁLIA<br />
Giorni Felici estreou-se <strong>em</strong> Maio <strong>de</strong> 1982<br />
com uma leitura dita “positiva”: um Beckett <strong>em</strong><br />
plena luz, quase priva<strong>do</strong> da aura niilista que<br />
muitas vezes caracterizava as interpretações cénicas.<br />
Para Strehler, Beckett era sobretu<strong>do</strong> um<br />
poeta e, explicava o encena<strong>do</strong>r, “quan<strong>do</strong>, como<br />
<strong>em</strong> Os Dias Felizes, a poesia grita com uma voz<br />
assim tão alta, o hom<strong>em</strong> não se nega: afirma-se”.<br />
Nascia <strong>de</strong>sta forma um espectáculo que<br />
teria interessa<strong>do</strong> o próprio Beckett, no qual, s<strong>em</strong><br />
se acrescentar palavras, mas através <strong>do</strong>s gestos,<br />
era sublinhada a vonta<strong>de</strong> da protagonista <strong>em</strong><br />
viver “até ao fim”.<br />
Franco Cor<strong>de</strong>lli, crítico <strong>do</strong> Corriere <strong>de</strong>lla<br />
Sera, escreveu o seguinte a propósito da interpretação<br />
<strong>de</strong> Giulia Lazzarini: “Trata-se <strong>de</strong> uma arte<br />
exorcista <strong>de</strong> afastar o mal, <strong>de</strong> o combater a<br />
golpes <strong>de</strong> florete. O chapéu encarna<strong>do</strong>, as costas<br />
possantes, os braços robustos, as maravilhosas,<br />
petulantes e fala<strong>do</strong>ras mãos. Ei-la. Giullia<br />
Lazzarini. Assim se perceberá o que é o teatro: um<br />
exercício <strong>de</strong> m<strong>em</strong>ória para combater o t<strong>em</strong>po,<br />
para não se ren<strong>de</strong>r nunca”.<br />
Samuel Beckett<br />
Assinala-se este ano o centenário <strong>do</strong> nascimento<br />
<strong>de</strong> Samuel Beckett (1906 – 1989: vi<strong>de</strong><br />
biografia na pág. 36), um <strong>do</strong>s maiores dramaturgos<br />
<strong>do</strong> século XX, cuja obra, inscrita na linha <strong>do</strong><br />
teatro <strong>do</strong> absur<strong>do</strong>, lança um olhar pessimista e<br />
<strong>de</strong>sencanta<strong>do</strong> (mas pleno <strong>de</strong> humor) sobre a<br />
condição humana. Peças como À Espera <strong>de</strong> Go<strong>do</strong>t<br />
e Dias Felizes farão para s<strong>em</strong>pre parte <strong>do</strong> cânone<br />
da dramaturgia mundial, quer pela sua originalida<strong>de</strong>,<br />
quer pelo seu simbolismo, quer pela capacida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> abordar a essência humana, <strong>de</strong>sligada <strong>de</strong> um<br />
espaço e t<strong>em</strong>po específicos: as suas personagens, <strong>em</strong><br />
cenários inóspitos, limitam-se a esperar que o<br />
t<strong>em</strong>po passe, agarran<strong>do</strong>-se a tarefas rotineiras<br />
para continuar a viver, à espera <strong>de</strong>… nada.<br />
O Festival <strong>de</strong> Almada assinala este centenário<br />
com a apresentação <strong>de</strong> três peças <strong>de</strong><br />
Samuel Beckett (Os Dias Felizes, À Espera <strong>de</strong> Go<strong>do</strong>t<br />
e To<strong>do</strong>s os que Ca<strong>em</strong>), uma peça <strong>de</strong> marionetas<br />
sobre a t<strong>em</strong>ática beckettiana (Nada, ou o Silêncio<br />
<strong>de</strong> Beckett) e uma exposição fotográfica <strong>de</strong>dicada<br />
ao dramaturgo irlandês.<br />
Giorgio Strehler<br />
Giorgio Strehler (1921 – 1997) diplomou-se<br />
na Accad<strong>em</strong>ia <strong>de</strong>i Filodrammatici <strong>em</strong> 1940, passan<strong>do</strong><br />
a integrar posteriormente algumas companhias<br />
itinerantes como actor. Realiza a sua<br />
primeira encenação <strong>em</strong> 1943, mas logo <strong>de</strong> seguida<br />
t<strong>em</strong> <strong>de</strong> procurar asilo político na Suíça, para<br />
escapar ao serviço militar. Aí estreia Calígula, <strong>de</strong><br />
Camus, <strong>em</strong> 1945. Em 1947 funda, juntamente<br />
com Paolo Grassi, o Piccolo Teatro di Milano, o<br />
primeiro teatro italiano <strong>de</strong> gestão pública e <strong>de</strong><br />
“teatro para to<strong>do</strong>s”. Renuncia à representação e<br />
chega a encenar <strong>de</strong>z espectáculos por ano. Quer<br />
dar a conhecer ao público italiano um repertório<br />
que este nunca conhecera, <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> à censura<br />
fascista. O enorme sucesso popular <strong>de</strong> Arlequim<br />
Servi<strong>do</strong>r <strong>de</strong> Dois Amos, <strong>de</strong> Gol<strong>do</strong>ni, que se manterá<br />
<strong>em</strong> cartaz durante mais <strong>de</strong> quarenta anos,<br />
assegura o renome <strong>do</strong> Piccolo.<br />
A partir <strong>de</strong> 1955 Strehler apresenta<br />
gran<strong>de</strong>s encenações, que ficaram para a história<br />
<strong>do</strong> teatro cont<strong>em</strong>porâneo: O Ginjal, <strong>de</strong> Tchecov, A<br />
Ópera <strong>do</strong>s Três Vinténs, <strong>de</strong> Brecht, <strong>em</strong> 1955,<br />
Baroufe à Chioggia, <strong>de</strong> Gol<strong>do</strong>ni, <strong>em</strong> 1964, e Os<br />
Gigantes da Montanha, <strong>de</strong> Piran<strong>de</strong>llo, <strong>em</strong> 1966.<br />
Colabora com gran<strong>de</strong>s cenógrafos como<br />
Luciano Damiani e Ezio Frigerio. Não renuncia à<br />
gran<strong>de</strong> tradição estética da cultura humanista<br />
europeia, levan<strong>do</strong>-a ao seu nível mais eleva<strong>do</strong>,<br />
mesmo quan<strong>do</strong> o acusavam <strong>de</strong> praticar um<br />
realismo fora <strong>de</strong> moda.