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Transformando corpos em pergaminhos - Nucleo de Humanidades ...

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Emilene Leite <strong>de</strong> Sousa<br />

diferi-lo <strong>de</strong> um Outro, i<strong>de</strong>ntificá-lo.<br />

O corpo funciona assim como mecanismo <strong>de</strong> m<strong>em</strong>ória que atua<br />

por toda a vida, on<strong>de</strong> pod<strong>em</strong> ser registradas as suas histórias, através<br />

<strong>de</strong> tatuagens ou cicatrizes. Escrever sobre o corpo requer – como na<br />

própria simbologia, <strong>de</strong> um social que se registra com força sobre a pele<br />

- um aparelho <strong>de</strong> intervenção que mediatize a relação da natureza<br />

com a cultura. São estes os instrumentos utilizados na escarificação,<br />

na produção da tatuag<strong>em</strong> e <strong>em</strong> toda a sorte <strong>de</strong> rituais <strong>de</strong> iniciação<br />

primitiva.<br />

A inscrição sobre o corpo organiza o espaço social: separa e<br />

articula ao mesmo t<strong>em</strong>po o texto e o corpo, a linguag<strong>em</strong> social e o<br />

pergaminho sobre o qual se inscreve. A inscrição transforma os <strong>corpos</strong><br />

individuais <strong>em</strong> corpo social, articulando-os apesar <strong>de</strong> toda a individualida<strong>de</strong>,<br />

formando um todo homogêneo, um grupo social, apesar da<br />

soma das diferentes partes.<br />

Esta inscrição não está apenas no nível da tatuag<strong>em</strong>, mas os<br />

acessórios, os brincos, a priori f<strong>em</strong>ininos, evi<strong>de</strong>nciam a <strong>de</strong>finição do<br />

corpo por meio do aço que agindo sobre ele o marca e organiza. Assim,<br />

introduz o social na carne pelo aço e não reconhece os <strong>corpos</strong> numa<br />

cultura, que não estejam modificados pelo instrumento.<br />

A transformação dos <strong>corpos</strong> pela inscrição funciona como registro<br />

da m<strong>em</strong>ória e produção <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s. Assim, conforme ocorre<br />

com a tatuag<strong>em</strong>, os sinais da aparência viram marcas <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>,<br />

<strong>em</strong>bora a tradução/leitura <strong>de</strong>sta i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> tenha s<strong>em</strong>pre mil possibilida<strong>de</strong>s,<br />

tornando a leitura dos <strong>corpos</strong> uma leitura caleidoscópica.<br />

No caso dos <strong>corpos</strong> marcados por cicatrizes e tatuagens, se o<br />

passado consiste <strong>em</strong> silêncio ou segredo, o corpo opera como arquivo<br />

vivo e revela mesmo aquilo que se <strong>de</strong>seja esquecer.<br />

Assim é o corpo do hom<strong>em</strong> na pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>: um pergaminho<br />

on<strong>de</strong> ele e a socieda<strong>de</strong>, atuando juntos, escrev<strong>em</strong> um texto. No corpo<br />

resi<strong>de</strong> a inscrição dos acontecimentos do dia-a-dia e da construção<br />

da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> nossos sujeitos portadores <strong>de</strong> <strong>corpos</strong> cada vez mais<br />

polifônicos. Uma construção individual por ser inscrita e significada<br />

pela história e pela linguag<strong>em</strong> não-verbal <strong>de</strong> seu sujeito portador; e,<br />

ao mesmo t<strong>em</strong>po, uma construção coletiva porque significada pelos<br />

olhos <strong>de</strong> cada um que o observa.<br />

Daí a importância <strong>de</strong> pensar a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> grupos ou indivíduos<br />

a partir da tatuag<strong>em</strong>, inscrição nos <strong>corpos</strong>. A tatuag<strong>em</strong> produz<br />

sentidos <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação individual e/ou coletiva.<br />

A arte das inscrições, marcas sobre os <strong>corpos</strong>, é utilizada <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

longa data. As razões para a sua manifestação variam no espaço e no<br />

66 Ciências Humanas <strong>em</strong> Revista - São Luís, V.5, n.2, <strong>de</strong>z<strong>em</strong>bro 2007

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