Guilhermina Jorge - Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa
Guilhermina Jorge - Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa
Guilhermina Jorge - Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
216 polifonia<br />
A língua portuguesa, mas isto também é ver<strong>da</strong><strong>de</strong> para outras<br />
línguas 3 , viu surgir, nos últimos <strong>de</strong>z anos, um número importante <strong>de</strong><br />
dicionários sobre a fraseologia em geral e mais especificamente sobre<br />
as expressões idiomáticas 4 . Acreditamos que este novo olhar sobre a<br />
cultura popular, sobre a língua do povo, se pren<strong>de</strong> com este novo<br />
contexto globalizante que atravessamos e a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> acentuar as<br />
particulari<strong>da</strong><strong>de</strong>s intrínsecas a uma cultura, a uma língua, salvaguar<strong>da</strong>ndo,<br />
assim, pela diferença, a sua própria i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Do mesmo modo, notamos um crescente fervor pela investigação<br />
em torno <strong>da</strong> idiomatici<strong>da</strong><strong>de</strong>, nas suas várias componentes científicas,<br />
acentuando o seu carácter interdisciplinar e registando uma alteração<br />
na concepção <strong>de</strong>ste objecto enquanto objecto <strong>de</strong> análise científica.<br />
Note-se que os anos oitenta e noventa foram fun<strong>da</strong>mentais para a<br />
implementação <strong>da</strong> vertente científica <strong>de</strong>ste objecto que até aí era visto<br />
por alguns linguistas (por exemplo, Guiraud, 1961) como o campo <strong>da</strong><br />
heterogenei<strong>da</strong><strong>de</strong>, do <strong>de</strong>svio, <strong>da</strong>s anomalias e, <strong>de</strong>ste modo, um campo<br />
diverso e pouco propício a análises ditas científicas 5 .<br />
As expressões idiomáticas (EIs) <strong>de</strong>screvem, pelas imagens que<br />
sugerem, o mundo real, os lugares, as experiências quotidianas, os<br />
sentires... Mantêm intacto o colorido <strong>de</strong> um povo, constituem uma voz<br />
rica <strong>de</strong> sabedoria que soube imprimir na linguagem a sua i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />
Este tipo <strong>de</strong> estruturas ilustra uma parte <strong>de</strong>sse saber, <strong>de</strong>sse colorido.<br />
Conhecê-las implica conhecer o povo, a cultura que lhes <strong>de</strong>u vi<strong>da</strong>,<br />
estabelecer entre elas e os homens relações, conhecer mais profun<strong>da</strong>mente<br />
a língua e as múltiplas formas <strong>de</strong> expressivi<strong>da</strong><strong>de</strong>. As expressões<br />
integram o melhor sistema <strong>de</strong> símbolos para representar uma i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
cultural.<br />
Constituem, pois, um objecto importante <strong>de</strong> uma língua natural,<br />
uma manifestação <strong>de</strong> um saber plural, um enriquecimento do idiolecto<br />
do sujeito, facilitam a comunicação, estabelecem conivências e partilhas.<br />
Por outro lado, permitem instituir um diálogo interdisciplinar,<br />
aproximando e salientando interrelações fun<strong>da</strong>mentais, permitindo<br />
3 A literatura em torno <strong>da</strong> fraseologia em geral aumentou consi<strong>de</strong>ravelmente nos<br />
últimos anos. Destaque-se sobre esta questão a relevância <strong>da</strong> investigação inglesa,<br />
francesa, russa e alemã, entre outras. As áreas <strong>da</strong> lexicografia, <strong>da</strong> sintaxe, <strong>da</strong> semântica<br />
e <strong>da</strong> psicolinguística foram algumas <strong>da</strong>s áreas mais contempla<strong>da</strong>s nestas<br />
abor<strong>da</strong>gens contemporâneas.<br />
4 Para o português, e sem querermos ser exaustivos, dispomos <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> <strong>de</strong>z dicionários<br />
publicados a partir dos anos oitenta, sendo a maior parte <strong>de</strong>les publicações<br />
dos anos noventa.<br />
5 Cite-se, a título <strong>de</strong> exemplo, alguns trabalhos <strong>de</strong>senvolvidos nos anos 80 para o<br />
francês por Ruwet (1982), Gross (1982), para o alemão Greciano (1983) e para o<br />
inglês Gibbs (1980 e 1985) e Lattey (1986).<br />
– UNIL –