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Guilhermina Jorge - Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa

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220 polifonia<br />

escrever como o autor escreveria em português” 11 . Com a tradução <strong>da</strong><br />

fraseologia esta posição torna-se problemática. O tradutor propõe uma<br />

transposição por equivalências próprias <strong>da</strong> língua <strong>de</strong> chega<strong>da</strong>. Tradução<br />

ou a<strong>da</strong>ptação? Escrita ou re-escrita? Autor-tradutor? Ou autor –<br />

autor tradutor? 12<br />

G. Misri, ao reflectir sobre a tradução <strong>da</strong>s expressões lexicaliza<strong>da</strong>s<br />

na perspectiva <strong>da</strong> teoria interpretativa <strong>da</strong> tradução, rejeita e con<strong>de</strong>na a<br />

tradução palavra a palavra ou tradução literal e constrói um enquadramento<br />

teórico que privilegia a equivalência pensa<strong>da</strong> em termos <strong>de</strong><br />

quatro componentes (informativa, hierárquica, colocativa e <strong>de</strong> conformi<strong>da</strong><strong>de</strong>)<br />

13 . A. Berman opõe-se a esta perspectiva e diz-nos que isso leva<br />

à “<strong>de</strong>struição <strong>da</strong>s expressões”, substituir uma expressão idiomática<br />

pelo seu equivalente é, segundo o autor, um acto <strong>de</strong> etnocentrismo. Jogar<br />

com a equivalência é atentar contra a matéria falante <strong>de</strong> uma língua.<br />

Traduzir, na perspectiva do autor, não é procurar equivalências.<br />

Substituir é esquecer que existe <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> nós uma consciência-<strong>da</strong>-<br />

-lexicalização que i<strong>de</strong>ntificará a nova lexicalização como o estrutura-<br />

-irmã <strong>de</strong> uma lexicalização local. Berman <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> não uma simples<br />

palavra a palavra mas um jogo com os significantes, privilegiando os<br />

jogos <strong>de</strong> palavras, as sonori<strong>da</strong><strong>de</strong>s, os efeitos... Atentar contra a matéria<br />

falante <strong>de</strong> uma língua é, segundo nós, <strong>de</strong>struir a sua própria i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

14 .<br />

A tradução <strong>de</strong>ve ser encara<strong>da</strong> como interacção. Traduzir é estabelecer<br />

um contacto, que está em interacção com outros contactos. Traduzir<br />

é também, por vezes, esbarrar com contextos culturais marcantes<br />

<strong>de</strong> um povo, <strong>de</strong> uma cultura, e que, só dificilmente, encontram eco<br />

numa outra cultura, numa outra língua.<br />

Partimos do pressuposto que estes lexemas contêm e ilustram a<br />

sabedoria popular, são repositórios e carregam às suas costas o peso<br />

<strong>da</strong> história <strong>de</strong> uma língua, mais ou menos longa, transportando ao<br />

longo <strong>de</strong>sse percurso valores que se foram cristalizando, tornando-se<br />

estáticos e transparentes para o falante <strong>de</strong>ssa língua, mas constituindo<br />

11 Cf. a entrevista <strong>de</strong> António Cabrita a José Colaço Barreiros (Jornal Expresso,<br />

Janeiro <strong>de</strong> 1995).<br />

12 Traduzir expressões como ‘passar as passas do Algarve’ ou ‘meter o Rossio na rua<br />

<strong>da</strong> Betesga’ por expressões equivalentes existentes numa outra língua pressupõe,<br />

do nosso ponto <strong>de</strong> vista, per<strong>da</strong> e apagamento do texto <strong>de</strong> parti<strong>da</strong> <strong>de</strong> referentes culturais<br />

importantes para a construção do sentido. A procura <strong>de</strong> equivalentes não <strong>de</strong>veria<br />

levar a esse apagamento. No entanto, estamos convictos que não existe uma<br />

solução i<strong>de</strong>al para a tradução <strong>da</strong>s expressões idiomáticas e que a noção <strong>de</strong> per<strong>da</strong><br />

acompanha o acto tradutológico em geral.<br />

13 Cf. Misri (1990), pp. 143-163.<br />

14 Cf. Berman (1985), “La traduction <strong>de</strong> la lettre ou l’auberge du lointain”, in Les<br />

Tours <strong>de</strong> Babel.<br />

– UNIL –

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