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— A senhorita Bürstner está em casa?<br />

— Não — retrucou a senhora Grubach, sorrindo para atenuar a secura da resposta;<br />

mas logo se apressou a explicar, embora tardiamente, com razoável simpatia: — Está no<br />

teatro. Quer o senhor falar com ela? Quer que lhe diga alguma coisa?<br />

— Não, simplesmente desejava trocar algumas palavras com ela.<br />

— Infelizmente não sei quando voltará; quando vai ao teatro costuma vir tarde.<br />

— Não tem importância — disse K., que já se tinha voltado com a cabeça inclinada<br />

para a porta para sair —; apenas queria desculpar-me por ter-lhe ocupado esta manhã seu<br />

quarto.<br />

— Não é necessário, senhor K., o senhor é muito cuidadoso; a senhorita Bürstner<br />

nada sabe do que aconteceu. Saiu de casa hoje muito cedo e ainda não voltou; além do<br />

mais, já pus em ordem seu quarto. Veja-o o senhor mesmo.<br />

E assim dizendo abriu a porta do quarto da senhorita Bürstner.<br />

— Obrigado, acredito na senhora — retrucou K. sem deixar por isso de aproximarse<br />

da porta aberta. A lua iluminava placidamente o quarto a escuras. A julgar pelo que se<br />

podia ver, tudo voltara a colocar-se em seu lugar; nem mesmo a blusa pendia já da aldraba<br />

da janela. As almofadas do leito, iluminadas em parte pela luz da lua, pareciam erguer-se<br />

altas.<br />

— A senhorita Bürstner volta geralmente muito tarde — disse K, olhando fixamente<br />

a senhora Grubach como se esta fosse responsável de tal fato.<br />

— Como toda pessoa jovem! — retrucou a senhora Grubach em tom de desculpa.<br />

— Evidente, evidente — exclamou K. —; mas assim se pode ir longe demais.<br />

— É verdade — concordou a senhora Grubach. — Quanta razão tem o senhor,<br />

senhor K.! Talvez justamente neste caso. Claro está que não é meu propósito censurar a<br />

senhorita Bürstner; é uma boa moça, agradável, cordial, ordeira, pontual, trabalhadora,<br />

qualidades que estimo muito; mas a verdade é que precisaria ser mais ardilosa, mais<br />

discreta. Neste mês já a vi duas vezes em ruas afastadas acompanhada cada vez por um<br />

senhor diferente. Isto é algo que eu lamento muito e por Deus lhe asseguro que somente<br />

ao senhor o conto, senhor K. Mas não poderei deixar de falar também com ela mesma a<br />

respeito de seu procedimento. Além disso não é apenas isso o que me traz em suspeitas.<br />

— A senhora está inteiramente equivocada — retrucou K. cheio de cólera e<br />

sentindo-se quase impotente para escondê-la —, além do mais, visivelmente a senhora<br />

interpretou mal as minhas observações a respeito da senhorita Bürstner; não quis dizer isso.<br />

Previno-a que é melhor que se abstenha de falar com ela disso, pois a senhora está<br />

laborando em completo erro; conheço perfeitamente a senhorita Bürstner, de modo que<br />

estou em condições de afirmar que de modo algum é verdade o que a senhora diz. Claro<br />

está que talvez eu exorbite, pois não vou impedir a senhora de lhe dizer aquilo que mais lhe<br />

agrade. Boa noite.<br />

— Senhor K.! — exclamou a senhora Grubach em tom de súplica, enquanto se<br />

precipitava apressada atrás de K., o qual já havia aberto a porta de seu quarto. — De modo<br />

algum falarei com a senhorita; evidentemente, primeiro é preciso que continue a observá-la;<br />

apenas ao senhor lhe confiei o que sabia. Depois, esta é uma questão que deveria importar<br />

a cada um dos inquilinos, se é que desejam viver em uma pensão respeitável. Todos os<br />

meus esforços são no sentido de o conseguir.<br />

— Respeitável? — exclamou K. através da abertura da porta. — Se a senhora quer<br />

ter uma pensão respeitável deve começar por desfazer-se de mim.<br />

Então fechou a porta com um repelão sem mais atender aos suaves toques que ainda<br />

deu nela a senhora Grubach.<br />

Embora ainda não tivesse vontade de dormir, resolveu ficar ainda um momento<br />

acordado sem recostar-se e aproveitar essa oportunidade para fixar a hora em que<br />

retornava a sua casa a senhorita Bürstner. Talvez fosse também possível, por menos cabível

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