VERBO jurídico Proibição <strong>de</strong> <strong>prova</strong> <strong>no</strong> <strong>âmbito</strong> <strong>do</strong> <strong>direito</strong> processo <strong>penal</strong>: escutas telefónicas e da valoração da <strong>prova</strong> proibida pro reo : 18a operabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> preceito <strong>do</strong> art. 449.º, n.º 1, alínea e) <strong>do</strong> CPP, queren<strong>do</strong> que ele funcionecomo uma válvula <strong>de</strong> escape <strong>do</strong> sistema, para obviar a situações em que a utilização <strong>de</strong> <strong>prova</strong>proibida enquanto fundamento da con<strong>de</strong>nação <strong>do</strong> argui<strong>do</strong> passe <strong>de</strong>spercebida a to<strong>do</strong>s ossujeitos processuais 60 .IV. É <strong>de</strong> salientar que inversamente ao que suce<strong>de</strong> <strong>no</strong> art. 449.º, n.º 1, alínea d) <strong>do</strong> CPP,neste caso específico não é necessário que a utilização da <strong>prova</strong> proibida tenha gera<strong>do</strong> gravesdúvidas sobre a justiça da con<strong>de</strong>nação, ou seja, não é necessário que a utilização <strong>de</strong>ssa <strong>prova</strong>60Embora não se trate <strong>de</strong> uma solução tão extrema como a da chamada “solução da impugnação” e sebaseie <strong>no</strong>s valores referi<strong>do</strong>s <strong>no</strong> texto, a verda<strong>de</strong> é que ela não respon<strong>de</strong> a questões como as seguintes: exigin<strong>do</strong>a mesma o <strong>de</strong>sconhecimento tanto <strong>do</strong> processo como <strong>do</strong> recorrente relativamente à utilização da <strong>prova</strong> proibida,como é que o tribunal po<strong>de</strong> saber se este último conhecia ou não a situação se tal não resultar <strong>do</strong>s autos ou elenada disser? E mais, será que se justifica que mesmo conhecen<strong>do</strong> o recorrente, antes <strong>de</strong> a con<strong>de</strong>nação transitarem julga<strong>do</strong>, a existência da <strong>prova</strong> proibida fundamenta<strong>do</strong>ra da <strong>de</strong>cisão, o mesmo não possa interpor recurso <strong>de</strong>revisão? Será que se justifica que alguém tortura<strong>do</strong> para obtenção <strong>de</strong> uma confissão e <strong>de</strong>pois se vê con<strong>de</strong>na<strong>do</strong>com base nela (<strong>de</strong>sconhecen<strong>do</strong> o tribunal o carácter proibi<strong>do</strong> da <strong>prova</strong>) não possa recorrer? Será que valores<strong>de</strong> ín<strong>do</strong>le material associa<strong>do</strong>s às <strong>proibições</strong> <strong>de</strong> <strong>prova</strong> po<strong>de</strong>m ser suplanta<strong>do</strong>s por valores adjectivos liga<strong>do</strong>s àauto-responsabilida<strong>de</strong> das partes e ao não uso <strong>de</strong> forma dilatória <strong>do</strong> processo. E, mesmo relativamente à <strong>de</strong>fesada figura <strong>do</strong> caso julga<strong>do</strong> con<strong>de</strong>natório po<strong>de</strong>mos citar CONDE CORREIA [O «Mito, 2010, cit., pp. 558 e 559],segun<strong>do</strong> o qual: “Se o cidadão injustamente con<strong>de</strong>na<strong>do</strong> tem <strong>direito</strong> à revisão da sentença, então o caso julga<strong>do</strong>con<strong>de</strong>natório só <strong>de</strong>verá resistir se for justo. […] Nenhuma <strong>de</strong>cisão injusta <strong>de</strong>verá resistir, mas também nenhuma<strong>de</strong>cisão justa <strong>de</strong>verá sucumbir. […] Nesta vertente, o caso julga<strong>do</strong> tem, assim, entre nós, como limiteinquestionável, a justiça da con<strong>de</strong>nação”.No fun<strong>do</strong>, tu<strong>do</strong> se resume à tentativa <strong>de</strong> encontrar um ponto <strong>de</strong> equilíbrio entre a <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> caso julga<strong>do</strong>,o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> lealda<strong>de</strong> e auto-responsabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s sujeitos processuais e o interesse na busca da verda<strong>de</strong> materiale pelo respeito <strong>do</strong>s mais elementares <strong>direito</strong>s fundamentais <strong>do</strong> cidadão, protegi<strong>do</strong>s pelas <strong>proibições</strong> <strong>de</strong> <strong>prova</strong>,<strong>do</strong>n<strong>de</strong> talvez se justifique a imposição <strong>de</strong> um “ónus” àquele que conheça a situação para que a invoque antes<strong>do</strong> trânsito em julga<strong>do</strong> da <strong>de</strong>cisão, afastan<strong>do</strong> assim o recurso <strong>de</strong> revisão quan<strong>do</strong> não o faça por mera táctica<strong>processual</strong>, dirigida ao uso dilatório <strong>do</strong> processo, mas já não assim se não tiver havi<strong>do</strong> arguição <strong>do</strong> vício por onão reputar eficaz, numa incorrecta avaliação jurídica levada a cabo pelo sujeito <strong>processual</strong> em causa. Nãopo<strong>de</strong>, <strong>no</strong> entanto, <strong>de</strong>scurar-se que será muito difícil distinguir o que é táctica <strong>processual</strong>, daquilo que é um erro<strong>de</strong> avaliação jurídica por parte <strong>do</strong> sujeito <strong>processual</strong>.Critican<strong>do</strong> veemente a orientação <strong>do</strong> STJ (relativamente ao n.º 1 <strong>do</strong> art. 449.º, al. d) <strong>do</strong> CPP) ao exigir o<strong>de</strong>sconhecimento <strong>do</strong>s factos e meios <strong>de</strong> <strong>prova</strong> antes da con<strong>de</strong>nação por parte <strong>do</strong> argui<strong>do</strong> para po<strong>de</strong>r interporrecurso <strong>de</strong> revisão, escreve CONDE CORREIA, O «Mito, 2010, cit., p. 593: “ […] os casos em que o argui<strong>do</strong>conhece os factos ou <strong>prova</strong>s, mas <strong>de</strong>sconhece a sua relevância para o julgamento, em que por qualquer ummotivo atendível ou <strong>de</strong>spreza apesar <strong>de</strong> serem importantes ou em que está impossibilita<strong>do</strong> <strong>de</strong> os apresentar, éesquecer o principal: a indisponibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s interesses em causa. Ninguém tem o <strong>direito</strong> <strong>de</strong> se <strong>de</strong>ixarcon<strong>de</strong>nar”. Prossegue o mesmo autor afirman<strong>do</strong> (p. 591) que o que a <strong>no</strong>ssa jurisprudência faz é importarargumentos <strong>do</strong> Direito Processual Civil para o Direito Processual Penal, afirman<strong>do</strong> a mesma que “dada aresponsabilida<strong>de</strong> das partes na condução <strong>do</strong> processo, é razoável que não se lhes permita a revisão da sentençaquan<strong>do</strong> forem responsáveis pela injustiça que invocam”. Veja-se com mais <strong>de</strong>talhe a citada obra <strong>do</strong> autor, naspp. 593 e segs. Relativamente ao fundamento <strong>de</strong> revisão que ora <strong>no</strong>s ocupa, enten<strong>de</strong> CONDE CORREIA, O «Mito,2010, cit., p. 601, <strong>no</strong>ta 1163, que não é <strong>de</strong> a<strong>do</strong>ptar a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Costa Andra<strong>de</strong> <strong>de</strong> impor uma certa <strong>do</strong>se <strong>de</strong> autoresponsabilida<strong>de</strong> aos sujeitos processuais, qualifican<strong>do</strong> esta orientação <strong>de</strong> ten<strong>de</strong>ncialmente restritiva,concluin<strong>do</strong> o autor que o <strong>no</strong>vum <strong>de</strong>ve i<strong>de</strong>ntificar-se “com a <strong>prova</strong> não valorada pelo juiz, mesmo queintroduzida <strong>no</strong> processo (<strong>prova</strong> <strong>no</strong>viter cognita), permite recuperar o valor g<strong>no</strong>siológico das <strong>prova</strong>s esquecidasou recusadas por aquele, ou então não indicadas tempestivamente pelo argui<strong>do</strong> ou <strong>de</strong>pois prescindidas. Umavez que não foram utilizadas <strong>no</strong> julgamento anterior, o seu eventual potencial probatório não ficou consumi<strong>do</strong>e, assim, é inquestionável que <strong>de</strong>vem ser consi<strong>de</strong>radas como <strong>no</strong>vas”. Aplican<strong>do</strong> esta i<strong>de</strong>ia ao campo <strong>do</strong> art.449.º, n.º 1 al. e) <strong>do</strong> CPP é <strong>de</strong> concluir que se a questão da <strong>prova</strong> proibida não foi apreciada pelo juiz, nem queo recorrente a conhecesse, como não foi <strong>de</strong>cidida pelo mesmo, a questão não foi consumida e, como tal, po<strong>de</strong>ser alvo <strong>de</strong> interposição <strong>de</strong> recurso <strong>de</strong> revisão.
CLÁUDIO LIMA RODRIGUES Proibição <strong>de</strong> <strong>prova</strong> <strong>no</strong> <strong>âmbito</strong> <strong>do</strong> <strong>direito</strong> processo <strong>penal</strong>: escutas telefónicas e da valoração da <strong>prova</strong> proibida pro reo : 19tenha posto em causa, <strong>de</strong> forma séria, a con<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminada pessoa. Isto, porque,como <strong>no</strong>ta CONDE CORREIA, aqui, “ não está em causa a (in) justiça substancial dacon<strong>de</strong>nação. Aquele vício <strong>processual</strong> é, portanto, suficiente para <strong>de</strong>struir o resulta<strong>do</strong> final,qualquer que ele seja. Devi<strong>do</strong> às graves insuficiências da meto<strong>do</strong>logia utilizada, o próprioveredicto <strong>–</strong> qualquer que ele seja <strong>–</strong> <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> dar as necessárias garantias. Num Esta<strong>do</strong> <strong>de</strong>Direito não po<strong>de</strong> ser aplicada uma pena sem intervenção legitima<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> um processo justo.Ele é o garante mínimo da aceitabilida<strong>de</strong> da <strong>de</strong>cisão” 61 .V. Por fim é <strong>de</strong> salientar que “não cabe <strong>no</strong> <strong>âmbito</strong> <strong>de</strong> um recurso <strong>de</strong> revisão verificar sefoi ou não feita <strong>prova</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> facto que consta da sentença con<strong>de</strong>natória, com oerróneo fundamento <strong>de</strong> que a falta <strong>de</strong> <strong>prova</strong>, ainda que manifesta, equivale ao uso <strong>de</strong> umméto<strong>do</strong> proibi<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>prova</strong>, pois esta última situação só se verifica se estiver abrangida porum ou por vários <strong>do</strong>s casos taxativamente enuncia<strong>do</strong>s <strong>no</strong> art.º 126.º <strong>do</strong> CPP” 62 .3. <strong>–</strong> AS PROIBIÇÕES DE PROVA NO CONTEXTO DAS ESCUTAS TELEFÓNICASI. Apura<strong>do</strong> o que <strong>de</strong>ve enten<strong>de</strong>r-se por <strong>proibições</strong> <strong>de</strong> <strong>prova</strong> e qual regime jurídico aque se encontram submetidas, cumpre atentar na aplicação <strong>de</strong>ste regime à violação <strong>do</strong>spressupostos estabeleci<strong>do</strong>s pelo legisla<strong>do</strong>r para a realização <strong>de</strong> uma escuta telefónica.Certo é que a não observância <strong>do</strong>s pressupostos materiais <strong>de</strong> realização <strong>de</strong> umaintercepção telefónica gera uma proibição <strong>de</strong> <strong>prova</strong>, por violação <strong>do</strong>s artigos 32.º, n.º 8 daCRP e 126.º, n.º 3 <strong>do</strong> CPP, uma vez que tais pressupostos são aqueles <strong>de</strong> que a lei faz<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r a a<strong>do</strong>pção <strong>do</strong> méto<strong>do</strong> <strong>de</strong> obtenção <strong>de</strong> <strong>prova</strong>. Mais concretamente, estamos peranteuma proibição <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> <strong>prova</strong> (por utilização <strong>de</strong> um méto<strong>do</strong> <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> <strong>prova</strong>proibi<strong>do</strong>), por violação <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong>s <strong>direito</strong>s liberda<strong>de</strong>s e garantias, que vai redundarnuma proibição <strong>de</strong> valoração das gravações assim obtidas, como estatuí<strong>do</strong> expressamente <strong>no</strong>art. 126.º, n.º 3 <strong>do</strong> CPP.Por conseguinte, atestada a violação <strong>do</strong>s artigos 187.º e/ou 188.º <strong>do</strong> CPP, estabelece oart. 190.º <strong>do</strong> CPP a nulida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses actos, pelo que tem-se posto a questão, entre nós, <strong>de</strong>saber se a nulida<strong>de</strong> a que se refere este preceito é exactamente a mesma nas situações emque se violem os pressupostos materiais <strong>de</strong> admissibilida<strong>de</strong> das escutas telefónicas (comassento legal <strong>no</strong> art. 187.º <strong>do</strong> CPP) e <strong>no</strong>s casos em que se violem as formalida<strong>de</strong>s dasoperações, previstas <strong>no</strong> art. 188.º <strong>do</strong> CPP.61Cf., CONDE CORREIA, O «Mito, 2010, cit., pp. 568 e 569.62Cf. Ac. <strong>do</strong> STJ <strong>de</strong> 08/04/2010; Processo n.º 12749/04.4TDLSB-A.S1; Relator: SANTOS CARVALHO.