Quando a equipe do CRD percebe que a pessoa já está melhorestruturada, aí a preocupação passa a ser com a busca de trabalhoConversa com profissionais e acesso aos computadores: pessoas e equipamentos disponíveis para osprimeiros contatos com uma nova perspectiva de vida, fora das ruas,das drogas e da prostituiçãoalas masculinas. Em outros, são colocadas na ala dos idosos.Nos albergues, tanto homens como mulheres têmcerta resistência às travestis.”Esse é outro trabalho que aos poucos vem sendodesenvolvido pela assistente social e pela psicóloga doCRD, além da CADS (Coordenadoria de Assuntosda <strong>Diversidade</strong> Sexual, da PMSP): visitar os alberguese conversar com as pessoas responsáveis – geralmenteuma assistente social – para que tratem com o devidorespeito a população LGBT. Mesmo sendo um equipamentopúblico ou conveniado, os funcionários nãochamam transexuais e travestis pelo seu nome social,como já exige a lei, sob a guarda da portaria municipalnº 51.180/10. Várias se queixam que foram colocadasem ala masculina. Tiveram que tomar banho segurandoa porta, que não tem trinco, com medo de abusose histórias de estupros que uma conta para outra.Marcelle Miguel conseguiu vaga permanente – operíodo é de seis meses – na ala feminina de umalbergue. Camila Rocha não. “Preferi dormir na ruacom meu ‘esposo’. Ele tinha ciúmes de me ver numaala com 200 homens”, diz.O CRD “trabalha com a proteção social básica,nos parâmetros do Sistema Único de Assistência Social(SUAS), que é fazer a acolhida do usuário eencaminhá-lo para a rede de serviços públicos”, explicaTais. “Atendemos as áreas específicas da diversidade,as demandas mais urgentes de alguém quechega da rua, se precisa de um lugar para dormir,uma ajuda psicológica. É a porta de entrada de umacasa de acolhida. Aos poucos vamos reconstruindosua história, muitos deles acabam retornando e passama fazer parte das oficinas, outros aparecem paraconversar, e outros não voltam mais.”Quando a equipe percebe que a pessoa já estáestruturada, caminhando, aí a preocupação é com otrabalho. “Fazemos o cadastro no site Emprega SãoPaulo e pesquisamos entrevistas. Com um trabalho,A DIVERSIDADE REVELADA35
A DIVERSIDADE REVELADA36a pessoa vai conseguir autonomia, que é o nosso objetivo”,completa Taís.Este, naturalmente, é o caminho ideal. A equipeestá lá para oferecer apoio e encaminhamento paracursos, vários deles ali mesmo no CRD. “Mas quemvai decidir é a pessoa”, diz a assistente social. “Háaqueles que preferem passar a noite no albergue, oumesmo na rua, tomar um banho e almoçar em algumcentro de assistência, passar a tarde aqui e ànoite voltar para o albergue ou voltar a dormir narua. Se a pessoa prefere assim, não interferimos nasua conduta. É possível que umdia ela perceba que a vida queestá levando não é aquela quequeria, e aí nós estamos aqui paraisso, para ajudá-la.”A transexual Suzy Silva, 25anos, tem o ensino médio e mudou-sedo Piauí para São Paulopara morar com o irmão, que égay. Foi nesse meio que conheceuo CRD. “Fizemos o cadastroda Suzy no Emprega São Paulo,ela foi chamada para uma entrevistanuma empresa de telemarketing,passou, e está desde oinício do ano trabalhando”, contaa assistente social Taís. DepoisSuzy trouxe a irmã, como costumamfazer os homens que vêmpara a cidade grande, conseguememprego e em seguida chamamo resto da família. Fora do trabalho,Suzy se dedica a pinturas eartesanato. “Passa por aqui paradar um ‘oi’ para as ‘filhas’”, comoelas costumam chamar as colegasmais novas e ainda em busca deum lugar.Suzy é um dos casos de sucessodo Balcão Solidário deOportunidades de Emprego, ummodelo que vem sendo testadopelo CRD como tentativa de resolveruma das maiores dificuldadesdessa população, a inserçãono mercado de trabalho. Éuma experiência inédita no país.“As travestis que chegam defora vêm cheias defantasias, acreditam quevão ganhar muito dinheiro,modificam o corpo comsilicone industrial, tomamhormônio, não ligam para operigo, querem ficarmontadas. E quando não dácerto entram na droga, sãoas mais vulneráveis”, relataAndreza Barbosa Trindade,orientadora sócio-educativado CRD, que percorre ruasda região central, fazendocontatos e encaminhando aspessoas ao CRD.“As que conseguemprogramas, ainda passam anoite no hotel. As que jáestão debilitadas, usam ocrack para suportarem. E asque não aguentam mais,vêm em procura de umalbergue. Mas o apelo dadroga é grande e muitasabandonam o albergue. Oque fazemos, em muitoscasos, é tentar diminuir osriscos e a vulnerabilidadedelas”, comenta Andreza.Trabalho não resolve tudo, mas para muitos é a condiçãopara sair da rua. Para chegar lá – diz Taís – épreciso passar por uma fila de preconceitos e discriminações.Para a maioria dessas pessoas, sem escolaridade,morador de rua ou profissional do sexo, abarreira é quase intransponível. Taís e Cristina Santosacompanham de perto as tentativas daqueles quese candidatam a um trabalho, somam mais fracassosdo que sucessos, mas são aprendizados para todos.Marcelle Miguel, hoje com 37 anos, foi técnicoem telecomunicações em grandes empresas enquantodisfarçou seu papel de homem, atéque se revelou transexual e as demissõese recusas de emprego serepetiram. Em quatro anos, foi doapartamento onde morava e dotrabalho de técnico que exercia,para o desemprego e o abrigo darua. Em junho de 2010, fez novemeses que freqüenta o CRD, ajudana cozinha e dorme em albergue.Não tem mais esperanças deter seus empregos de volta.Mikaela Rossini faz o caminhoinverso. Saiu da “pista” na condiçãode drogada, prostituída ebabadeira para encontrar no CRDum incentivo para começar denovo. Sabe muito de informática,lê clássicos da filosofia e já se preparapara a faculdade. Garanteque vai ganhar mais dinheiro naárea de tecnologia da informaçãodo que ganhava como travesti nanoite. Mikaela já pensa em serconsultora trabalhando em suaprópria casa, o que reduz o riscoda discriminação.Na classificação desse universo,ser travesti significa aquela que temmenor chance de um emprego. “Amaioria de nós não quer mesmo”,diz Claudia Coca, ex-drogada,prostituída, presidiária, bombadeirae hoje educadora social do CRD.“Pergunte a uma travesti se querser pedreiro ou faxineira? Nenhumaaceitaria essa sina”, diz.
- Page 5 and 6: PREFÁCIOO AMOR NADIVERSIDADEAureli
- Page 7 and 8: INTRODUÇÃOUM TEMAESTIGMATIZADOE I
- Page 9 and 10: A DIVERSIDADE REVELADA8homem e ele
- Page 13: A DIVERSIDADE REVELADA12À espera d
- Page 16 and 17: TRANSEXUAISE TRAVESTISRespeito e di
- Page 18 and 19: Foram 50 anos de olhos fechados, pa
- Page 20 and 21: Agnes Prado dos Santos, 28 anosAGNE
- Page 22 and 23: folheiam um livro, não ficam com a
- Page 24 and 25: Mikaela Rossini, 40 anosMIKAELA é
- Page 26 and 27: Ambulatório para travestis e trans
- Page 28 and 29: pelo Ambulatório de Transexuais do
- Page 30 and 31: Entrada do ambulatório doCRT DST/A
- Page 32 and 33: Verônica de Freitas, 20 anosA TRAN
- Page 34 and 35: Oficina de Pintura Artística em Ma
- Page 38 and 39: As oficinas do CRD - como a de Desi
- Page 40 and 41: Transexuais e travestis,CLASSIFICA
- Page 42 and 43: “NÃO SOU DOENTE MENTAL”diz ex-
- Page 44 and 45: Alexandre Santos é um personagem q
- Page 46 and 47: Quatro hospitais públicos foram cr
- Page 48 and 49: dedicar aos transexuais. Com o aume
- Page 50 and 51: Thaís di Azevedo, 60 anosA TRAVEST
- Page 52 and 53: As reuniões alternam a discussão
- Page 54 and 55: Renata Perón, 33 anosTODAS AS noit
- Page 56 and 57: A Coordenadoria deAssuntos da Diver
- Page 58 and 59: Para poderemse casar, oshomens eas
- Page 60 and 61: Vanessa Pavanello, 41 anos“A ciru
- Page 62 and 63: Cena da peça de teatro Hipóteses
- Page 64 and 65: Mudança noDOCUMENTOé prioridadeA
- Page 66 and 67: Oficina de Canto e Iniciação Musi
- Page 68 and 69: Visita às avenidas e guetosonde se
- Page 70 and 71: preservativo, tira o anel e rasga-o
- Page 72 and 73: Leo Moreira, 52 anos“MEU NOME art
- Page 74 and 75: Centenas de crianças e adultos, am
- Page 76 and 77: Camila Rocha, 20 anosCAMILA ROCHA,
- Page 78 and 79: que reúnem por mês, já descontad
- Page 80 and 81: Claudia Coca, 42 anosCLAUDIA COCA
- Page 82: Realização:Apoios:Departamento de