Educação ArtísticaUma releitura do mundo, uma releitura da vidaSandra MartinsNuma sala apertada e desprovida deconforto, crianças e adolescentes se revezampara viajar no mundo mágico <strong>das</strong>artes. O passeio “virtual” se dá através <strong>das</strong>ofici<strong>na</strong>s de desenho e pintura do projetoVivendo através da arte, coorde<strong>na</strong>do porEdejô Éware, ou o agente cultural EdvalPereira Lopes. A iniciativa busca valorizaro conhecimento que o aluno possui e atuacomo um transformador de novas ideiasabrindo um leque de informações sobrearte e cidadania, além de oferecer outras opções, não só de lazer, mas também deperspectivas profissio<strong>na</strong>is.Para Vaneli Chaves, diretora adjunta da Escola Estadual Professor Henny de MendonçaGama, no bairro de Vila Lage, São Gonçalo, o projeto ultrapassou os muros daunidade escolar – única no município com Educação de Jovens e Adultos (EJA) nostrês turnos. Na sua percepção, esta ação serviu como uma bem-sucedida estratégiafacilitadora de acesso da comunidade à escola. “Achamos por bem não fechar estetrabalho para os alunos da escola e abri-lo para a comunidade. O retorno tem sidopositivo: há os que voltaram a estudar, e há outros que começaram a tomar contada escola porque o filho está aqui dentro. E isso construiu uma relação harmônicacom a comunidade.” Atualmente, 70% do público atendido é oriundo da localidadee arredores.Respeito, dedicação,cordialidade, afeto,tolerância. Estes sãoalguns dos ingredientesencontrados entre umapincelada e outra dosalunos <strong>das</strong> ofici<strong>na</strong>s deartes. Os jovens sãoincentivados a desenvolversuas potencialidadesno traço, pintura,escultura, convívio <strong>social</strong>,argumentação e postura20 Jor<strong>na</strong>l Educar
Os alunos são incentivadosa desenvolversuas potencialidadesno traço,pintura, escultura,convívio <strong>social</strong>, argumentaçãoe postura.poucos, os jovens descorti<strong>na</strong>m suas incli<strong>na</strong>çõesOs temas são escolhidos pelos alunos e astécnicas, aprimora<strong>das</strong> com apoio do professor. Aosartísticas, passam a ser mais observadores, maisrevistas, ilustrações,livros de artes,material doadoe outros quesão reciclados. Astelas para as pinturaspodem terNo segundo semestredo ano, são escolhidos os dez melhoresde papelão ou desensíveis, organizados e discipli<strong>na</strong>dos, sem perdervindo de caixaso frescor da sua imaturidadetrabalhos que compõem uma exposição aberta ao público duranteevento escolar. “Dá gosto ver o orgulho estampado no rosto dospais ao verem os trabalhos de seus filhos. Crianças que, por vezes,apresentam problemas comportamentais em outras escolas ou emcasa”, disse Vaneli.O projeto reúne algumas ideias de fácil assimilação cuja linguagemé adaptada conforme a faixa etária, além de possuir uma diversidadede linguagens artísticas como: reciclagem, teatro, artes plásticas,canto, desenho, pintura. A dinâmica inicia-se com a própria mistura dogrupo – meninos e meni<strong>na</strong>s. O respeito é condição fundamental parao convívio no meio <strong>social</strong>, daí a cordialidade, o afeto e a tolerânciaserem trabalhados intensamente, de forma lúdica, com a utilização detécnicas teatrais e de dança. “Uma mímica de zanga ou de surpresadiz muito mais do que um grito”, ensi<strong>na</strong> Edejô.Como primeira estratégia, trabalha-se a palavra, a persuasão.Para sensibilizar o aluno a respeitar a diversidade e heterogeneidadeno mundo, Edejô lança propostas de percepção do outro comoele é. Assim, são debatidos os padrões estabelecidos <strong>na</strong> sociedade,que são desconstruídos. “O ‘belo’ passa a ter outra conotação. Ascrianças aprendem a valorizar o meio ambiente em que vivem apartir da percepção dos pequenosfrutas; um pedaço de lápis colado em uma caneta usada servirá comose fosse novo. Uma embalagem de óleo diesel vai ser transformadaem máscara. Pelo menos é o que vislumbra Jo<strong>na</strong>tam ao identificaros olhos e o <strong>na</strong>riz da “máscara”. “Artista é isso. Vê um trabalho artísticoonde ninguém percebe. É isso que eu quero: que ele consigadescobrir arte nessas peque<strong>na</strong>s coisas, no lixo”, elogia o oficineiro.O projeto Vivendo através da arte interage com outras discipli<strong>na</strong>s noseventos culturais da escola. E, no cotidiano <strong>das</strong> ofici<strong>na</strong>s, o aluno terá quese conciliar com a Matemática, já que lida com medi<strong>das</strong>, proporções,perspectivas; com a História, pois aprenderá um pouco sobre outrasculturas, como a chinesa, de onde saíram os primeiros desenhos a <strong>na</strong>nquim.Com a Química, as pesquisas podem ser sobre os componentes<strong>das</strong> tintas e varia<strong>das</strong> experiências com cores e texturas, por exemplo.Os temas escolhidos pelos alunos são aprimorados com apoio doprofessor. Com o transcorrer do desenvolvimento do traço, o jovemdescobre suas incli<strong>na</strong>ções artísticas que serão potencializa<strong>das</strong>. “Amaioria dessas crianças vai sair daqui com 60% de base para desenhoe sem recursos. Este trabalho as ajuda a se desenvolver, a fazer umareleitura do mundo, uma releitura da vida. E a arte tem este poder,já que caminha junto com a educação”, disse Edejô, ao salientar quenão adianta querer separá-la da educação.detalhes, como a textura <strong>das</strong> folhas,as diferenças étnico-culturaisencontra<strong>das</strong> <strong>na</strong>s imagens que servemCom metodologia desenvolvida a partir da vivênciacotidia<strong>na</strong>, os alunos foram estimulados a driblara falta de material usando a criatividade. Assim,uma antiga caixa de frutas pode ser desmontada esua madeira preparada para servir como tela parapintura a óleo. O suporte de papelão do papelPorque é ela que vai me levara um grande arquiteto, a um grandemuseólogo. “A Bia disse que vai serde modelo, <strong>na</strong>s nuanças <strong>das</strong>podem ser comercializa<strong>das</strong>higiênico poderá ser transformado em pulseiras, quecores que se alteram conforme aluminosidade a que são expostasetc.”.A metodologia foi desenvolvidaa partir da vivência do agentecultural em várias áreas <strong>das</strong> artes– teatro, dança, pintura, desenho,artesa<strong>na</strong>to. Como material pedagógicosão utilizados folhetos,arquiteta. E vai, porque ela já colocouisso <strong>na</strong> sua cabecinha”. Por si<strong>na</strong>l, oforte da meni<strong>na</strong> de 10 anos é a criaçãode facha<strong>das</strong> de residências, castelos,detalhes de portas.Para muitos, estar ali é tambémum momento de lazer. É como se láelas pudessem ser crianças e aprenderalgo que lhes dá muito prazer. “Elaspodem viajar através <strong>das</strong> figuras queJor<strong>na</strong>l Educar 21