13.07.2015 Views

À guisa de Introdução: um Panorama Teórico - Claudio Naranjo

À guisa de Introdução: um Panorama Teórico - Claudio Naranjo

À guisa de Introdução: um Panorama Teórico - Claudio Naranjo

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

psicanalítica mo<strong>de</strong>rna: <strong>um</strong>a maldição que visita geração após geração é algo que já éconhecido <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a Antiguida<strong>de</strong>. A noção <strong>de</strong> <strong>um</strong>a socieda<strong>de</strong> doente é a essência das antigasconcepções indiana e grega da nossa época como a <strong>de</strong> <strong>um</strong>a “ida<strong>de</strong> das trevas”, <strong>um</strong>a“Kaliyuga” – <strong>um</strong>a era <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> queda a partir da nossa condição espiritual original.Não estou dizendo que os cuidados da mãe são tudo; os cuidados do api também sãoimportantes, e eventos posteriores po<strong>de</strong>m ter influenciado nosso <strong>de</strong>senvolvimento futuro,como está evi<strong>de</strong>nte nas tra<strong>um</strong>áticas neuroses <strong>de</strong> guerra. Os primeiros eventos, como aextensão do tra<strong>um</strong>a do parto, também po<strong>de</strong>m ter efeitos <strong>de</strong>bilitantes sobre o indivíduo. Semdúvida, a maneira pela qual as crianças são trazidas ao mundo nos hospitais constitui <strong>um</strong>choque <strong>de</strong>snecessário, e po<strong>de</strong>mos conjecturar que <strong>um</strong>a pessoa nascida na pen<strong>um</strong>bra e quenão leve <strong>um</strong> tapa nas costas para estimular a respiração po<strong>de</strong> estar melhor preparada pararesistir às futuras condições tra<strong>um</strong>áticas da vida – assim como a criança que tenha recebidoos cuidados a<strong>de</strong>quados da mãe no início da vida po<strong>de</strong> estar melhor preparada para assimilara situação tra<strong>um</strong>ática dos cuidados paternos ina<strong>de</strong>quados.Digamos que, utilizando a metáfora <strong>de</strong> Horney, tenhamos vindo ao mundo como asemente <strong>de</strong> <strong>um</strong>a planta que carrega consigo certas potencialida<strong>de</strong>s e que instintivamentetambém espera certos elementos em seu ambiente, como <strong>um</strong>a boa terra, água e sol.A experiência <strong>de</strong> Harlow com chimpanzés, décadas atrás, <strong>de</strong>monstrou, por exemplo,que <strong>um</strong> filhote <strong>de</strong> macaco não precisa apenas <strong>de</strong> leite, mas <strong>de</strong> algo peludo em que possa seagarrar, e que ele po<strong>de</strong> se transformar n<strong>um</strong> adulto <strong>um</strong> tanto normal se for posto em contatocom <strong>um</strong>a mãe <strong>de</strong> imitação coberta <strong>de</strong> veludo, mas não com <strong>um</strong>a mãe artificial feita <strong>de</strong>arame, mesmo que ela tenha <strong>um</strong>a garrafa no peito.Sem dúvida, as necessida<strong>de</strong>s h<strong>um</strong>anas para que a criança se transforme n<strong>um</strong> adultoque funcione plenamente são mais complexas, e existem muitas coisas que po<strong>de</strong>m darerrado, ou, dizendo o mesmo <strong>de</strong> <strong>um</strong>a maneira alternativa: existem muitas maneiras pelasquais a exigência <strong>de</strong> <strong>um</strong> amor suficientemente bom da parte dos pais é frustrada ou traída.Em alguns casos, por exemplo, o auto-envolvimento dos pais po<strong>de</strong> resultar em negligência,enquanto em outros a necessida<strong>de</strong> excessiva <strong>de</strong> mentir da parte dos adultos po<strong>de</strong> provocar ainvalidação da experiência da criança; em outros casos ainda, a ternura po<strong>de</strong> ser ofuscadapela manifestação da violência, e assim por diante.Digamos que nosso jeito <strong>de</strong> ser neste mundo inferior que passamos a habitar <strong>de</strong>poisque fomos expulsos do jardim do É<strong>de</strong>n – a personalida<strong>de</strong> com a qual nos i<strong>de</strong>ntificamos e àqual implicitamente nos referimos quando dizemos “Eu” – é <strong>um</strong> jeito <strong>de</strong> ser que adotamoscomo <strong>um</strong>a maneira <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r nossa vida e bem-estar através <strong>de</strong> <strong>um</strong> “ajustamento”, n<strong>um</strong>sentido amplo do termo, e que geralmente é mais <strong>um</strong>a rebelião do que <strong>um</strong>acompanhamento.Diante da falta daquilo <strong>de</strong> que precisa, a criança em crescimento preciso<strong>um</strong>anipular, e po<strong>de</strong>mos dizer que o caráter é, a partir <strong>de</strong> <strong>um</strong> ponto <strong>de</strong> vista, <strong>um</strong> mecanismocontramanipulador.Neste estado <strong>de</strong> coisas, portanto, a vida não é guiada pelo instinto, e sim por meioda persistência <strong>de</strong> <strong>um</strong>a estratégia <strong>de</strong> adaptação anterior que compete com o instinto einterfere com a “sabedoria” do organismo, no sentido mais amplo da expressão. Apersistência <strong>de</strong>ssa estratégia <strong>de</strong> adaptação anterior que po<strong>de</strong> ser compreendida no dolorosocontexto no qual ela surgiu e do tipo especial <strong>de</strong> aprendizado que a sustenta: não o tipo <strong>de</strong>aprendizado que ocorre espontaneamente no organismo em <strong>de</strong>senvolvimento,mas <strong>um</strong>aprendizado sob coação, caracterizado por <strong>um</strong>a fixi<strong>de</strong>z ou rigi<strong>de</strong>z especial docomportamento a que ele recorreu na situação inicial como <strong>um</strong>a reação <strong>de</strong> emergência.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!