enfrentado forte resistência. E permanecemos protegidos pelo artigo 207 da Constituição Federal, que garante a autonomia universitária com clareza absoluta”. O professor Luis Miguel aponta que a autonomia universitária é a chave para que uma instituição de ensino se mantenha firme frente às tentativas de golpes na educação, sem ceder às pressões políticas, como em outros momentos da história. “A existência da Universidade depende do debate livre, da autonomia de pesquisa, de sua insubmissão aos poderes. Não temos como existir plenamente sem a democracia”. O que o ex-Ministro da Educação não esperava é que as tentativas de censura fossem o gatilho para um movimento de resposta. A primeira foi da UnB, que lançou nota reiterando compromisso “com a liberdade de expressão e opinião - valores fundamentais para as Universidades, que são espaços, por excelência, para o debate de ideias em um Estado democrático”. Depois, 13 Universidades se posicionaram em defesa da autonomia universitária e, atualmente, são mais de 100 cursos sobre o golpe de 2016 nas modalidades de aulas e atividades de extensão. “Centenas de colegas se levantaram não apenas para verbalizar solidariedade, mas para dividir comigo o ônus das perseguições. Foi um lindo movimento em defesa da universidade e, na circunstância, em defesa de um colega”, comentou Luis Miguel. Hila e Marta ocupam hoje o espaço das salas de aula como professoras. Hila destaca o poder do lecionar em Universidades que enfrentam tentativas de desqualificação. “Entrei como docente pensando em formar indivíduos que questionassem. É um pouco isso que a gente faz enquanto professor, tentamos compartilhar com os alunos coisas que julgamos importantes. A Universidade é um lugar por excelência de resistência. O ex-Presidente Lula falava que o pobre tinha que entrar na universidade. Por quê? Porque ela é capaz de dar um clique, abrir a mente das pessoas”. Como professora da Universidade Metodista de São Paulo durante a década de 1980, Marta relembra um projeto de extensão desenvolvido com o Movimento dos Sem Terra (MST), que visava a democratização da comunicação. Viajava para as áreas rurais para trabalhar de perto com pessoas “que entendiam mais da lida da roça do que do comunicar”, e vivenciou o poder de transformação da Universidade “o que é importante, como [o educador] Paulo Freire fala, é a nossa ação no mundo. A educação só tem sentido quando transforma”. Pra não dizer que falei das flores O Flores é um grupo que resiste fazendo pesquisa e extensão, existindo na docência, na militância dentro e fora da universidade. Daniela Auad é professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Casada com Cláudia Lahni, também professora da UFJF, construíram o Flores Raras, grupo de pesquisa em Comunicação, Educação e Feminismos. O Flores também se estrutura como coletivo, promovendo ações que buscam fazer circular o pensamento sobre questões de gênero, sexualidades, identidades, e as várias formas de ser mulher. A ação de grupos como o Flores dentro de universidades é uma resposta às opressões sofridas na sociedade. Nos 21 anos em que a Ditadura prevaleceu no país, além dos grupos políticos, eram também alvos de perseguição pessoas LGBTQ+ que militavam pelo direito à vida. Em 2014, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) apresentou, à então Presidenta Dilma Rousseff, relatório final que apontava perseguições contra gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais, alvos da intolerância do regime militar. O documento aponta que as violações eram muitas: torturas, espancamentos, ameaças, extorsões. Coletivos começaram a ser estruturados no final da década de 1970 em defesa à dignidade dos LGBTs. Em 2017, a UFJF realizou campanha para visibilidade lésbica, que incluiu docentes, técnicas administrativas, funcionárias e acadêmicas, com o intuito de levantar o debate acerca do machismo e da diversidade sexual. Daniela acredita que essa campanha, além de combater os discursos de ódio, possibilitou um conhecimento maior sobre o Flores Raras “Isso proporcionou que o grupo acolhesse estudantes do Brasil inteiro. Tenho cinco doutorandas: de Juiz de Fora, Paraná, Pernambuco, Belo Horizonte e do Rio de Janeiro. Todas elas pesquisam questões de gênero, educação, feminismos. Dessas mulheres, uma é branca, outra é indígena, duas são negras. Ou seja, temos uma variedade de raça importante na produção de pesquisa na pós”. A professora afirma que a variedade de sujeitos que constroem o Flores é um importante passo para a afirmação como cientistas. “Sabemos que essas são as mulheres que não são percebidas como cientistas e que não têm lugar na academia. Nós produzimos ciência, privilegiamos a acolhida dessas mulheres e lutamos por isso no interior da universidade”.
CURINGA | EDIÇÃO <strong>25</strong> 35