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Revista Dr Plinio 248

Novembro de 2018

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Apóstolo do pulchrum<br />

que fabricasse uma catedral desse material e a colocasse<br />

num panorama estudado para combinar com isso.<br />

O fato é que o vitral se fez sem a grande indústria. E<br />

nós poderíamos imaginar, com a evolução da indústria<br />

dos vitrais, igrejas todas feitas de vidro. De maneira que<br />

seria possível ir longe.<br />

Ademais, golpeado com jeito, esse material emite um<br />

som bonito. Imaginem uma igreja que seja o sino de si<br />

mesma, onde o toque não se dá no campanário, mas na<br />

parede da própria torre! Torres que vibram elas próprias<br />

como se fossem badalos postos no ar, de maneira a fazer<br />

corresponder em som a cor contemplada pelo olhar.<br />

É preciso dizer que fiquei com inúmeros mundos assim<br />

possíveis inacabados na mente. Sobretudo cores que eu vi<br />

de cá, de lá, de acolá, e que davam margem a imaginar<br />

universos possíveis dos quais esse vasinho era uma amostra.<br />

Creio que a matriz da inspiração artística é essa.<br />

Um perigo contra o qual é necessário precaver-se: um<br />

mundo vivido assim é tal que não se compreenderia dentro<br />

dele a dor e nem sequer a prova. Quer dizer, se imaginássemos<br />

um mundo de criaturas assim e que Deus resolveu<br />

impor a prova para elas, teríamos um suspense<br />

como se víssemos o Criador traindo a sua própria obra.<br />

Há uma dificuldade em instalar dentro disso a ideia de<br />

prova como, por exemplo, em compreender que Deus tenha<br />

permitido a entrada da serpente no Paraíso.<br />

O mais interessante é que só depois de ter passado pela<br />

prova compreendemos que tudo isso só toma sua perfeição<br />

para quem passou pela prova. Somente quando isso<br />

recebeu a trombada do oposto e se afirmou, é que propriamente<br />

justificou a sua existência.<br />

Donde poderia vir uma objeção: “Então o mal é necessário?”<br />

Não, o mal não é necessário, mas a prova é. Essas maravilhas<br />

devem existir em ordem de batalha contra o que<br />

as quer destruir. É nesta postura de ordem de batalha<br />

que elas adquirem uma espécie de plenitude de consistência<br />

que lhes dá força e dignidade.<br />

Um modo de relacionar-se<br />

próprio à visão beatífica<br />

Entra, então, um aspecto que à primeira vista não se<br />

imaginaria: um cavaleiro cuja armadura fosse feita deste<br />

material, mas inquebrantável, trazendo o próprio<br />

símbolo da delicadeza e do feérico na batalha mais feroz.<br />

Na Chanson de Roland, as despedidas entre Olivier e<br />

Roland dão ideia disso. Os dois iam morrer, encontravam-se<br />

numa situação em que estavam liquidados. Entretanto,<br />

a ternura com a qual ambos se tratam é enorme.<br />

Ouvi dizer, não sei se é verdade, que hoje em dia se tiram<br />

fotografias por onde se percebe a cor de certos corpos<br />

celestes, nos quais se vê reinar um colorido diferente<br />

do existente aqui na Terra.<br />

Poder-se-ia imaginar um mundo para o qual o colorido<br />

desse vasinho fosse como a luz do dia para nós, onde<br />

todas as pessoas se tratassem como o vermelho e o branco<br />

se “tratam” aqui, e que no interior de cada pessoa –<br />

não só fisicamente, mas moralmente – a luz brincasse<br />

como brinca neste objeto.<br />

Essas pessoas se compreenderiam e teriam uma espécie<br />

de avidez de se entenderem, uma necessidade de mútuo<br />

entendimento cordial superabundante, por onde se<br />

uniriam umas às outras numa perpétua troca de alegria<br />

com a “surpresa”, na consideração de que a outra existe.<br />

De maneira tal que indo à rua não se encontraria uma<br />

multidão de anônimos, mas de boas surpresas: “Oh,<br />

existe também este, aquele...!” As pessoas, sem se conhecerem,<br />

parariam, se saudariam e se alegrariam neste<br />

diapasão. E haveria, por assim dizer, um perpétuo sorriso<br />

de encantamento, um perene cântico e uma espécie de<br />

perpétua dança das pessoas se encontrando, se falando.<br />

O Céu deve ser assim.<br />

A questão é que existe um mundo de outras coisas que<br />

se prestam a considerações como estas. O objeto aqui<br />

analisado é uma gotícula que ocupou, nas minhas cogitações<br />

de criança, um pequeno espaço. Os jades, as porcelanas<br />

chinesas, os cristais da Boêmia, os esmaltes, os<br />

ônix, as mil coisas preciosas que há, exprimem uma ordem<br />

natural, filosófica, quiçá metafísica. Acenam para<br />

uma superior natureza, mas estão inteiramente dentro<br />

da nossa ordem natural. O sobrenatural está fora e acima.<br />

Não é inimigo; ao contrário, é amigo, bafeja, abençoa,<br />

mas se encontra diretamente acima.<br />

Para considerar como isso se instalaria na ordem sobrenatural,<br />

teríamos que imaginar como um objeto desses<br />

caberia na gruta de Belém, na noite de Natal.<br />

A ordem natural transposta<br />

para a clave sobrenatural<br />

Poder-se-ia fazer uma distinção entre a natureza do<br />

Céu empíreo, que ainda está na linha do natural, e a do<br />

metafísico. Aquilo que em nós é puramente espiritual<br />

enquanto contempla o que nos outros é também espírito;<br />

e, depois, o que em nós é espírito e contempla a Deus,<br />

portanto a essência divina, infinitamente acima de nós.<br />

São coisas inteiramente diferentes.<br />

Mas tudo isso, que seria uma contemplação árdua, difícil,<br />

pode-se resumir e acompanhar muito melhor, considerando<br />

a união das naturezas humana e divina em<br />

Nosso Senhor Jesus Cristo. N’Ele encontramos todas as<br />

belezas e excelências possíveis da ordem natural transpostas<br />

para a clave sobrenatural.<br />

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