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Deixe que o sol da manhã esqueça de se erguer a leste

Vá devagar, minha linda lua, vá devagar.

Lembro que sentei no sofá instalado no palco como se fosse um trono, segurando

a mão de Soray a, diante de uns trezentos rostos ou quase isso, todos olhando para

nós. Fizemos ayena masshaf, que é quando nos entregam um espelho e põem um

véu sobre as nossas cabeças para que, sozinhos, possamos contemplar a imagem

um do outro. Olhando o rosto sorridente de Soray a naquele espelho, na

privacidade momentânea que o véu nos proporcionava, sussurrei para ela, pela

primeira vez, que a amava. E o seu rosto ficou vermelho, como se tivesse sido

tingido com hena.

Tenho uma vaga lembrança das travessas coloridas com chopan kabob, sholehgoshti

e arroz com laranja azeda. Vejo baba sentado no sofá, entre nós dois,

sorrindo. Lembro de homens, encharcados de suor, dançando a tradicional attan,

formando uma roda, pulando, girando cada vez mais rápido ao ritmo febril da

tabla, até que a grande maioria não agüentava mais e acabava saindo da roda.

Lembro de ter desejado que Rahim Khan estivesse lá.

E lembro de ter me perguntado se Hassan também teria se casado. E se tivesse,

que rosto teria contemplado no espelho por baixo do véu. Que mãos pintadas de

hena teria segurado.

POR VOLTA DAS DUAS HORAS DA MANHÃ, a festa se transferiu do salão

de banquetes para o apartamento de meu pai. O chá voltou a rolar e a música

tocou até que os vizinhos chamaram a polícia. Mais tarde, naquela mesma noite,

menos de uma hora antes do nascer do sol, e depois que os convidados tinham

finalmente ido embora, Soray a e eu nos deitamos juntos pela primeira vez. A

vida toda, tinha estado cercado de homens. Nessa noite, descobri a ternura de

uma mulher.

FOI SORAYA QUE SUGERIU QUE ELA viesse morar com baba e comigo.

— Pensei que você preferisse que tivéssemos uma casa só para nós — disse eu.

— Com kaka jan doente como está? — retrucou ela. Seus olhos me diziam que

aquela não era a maneira ideal de se começar um casamento. Eu a beijei.

— Obrigado — disse.

Soraya passou a cuidar de meu pai com a maior dedicação. Preparava o chá e

as torradas para ele de manhã, e o ajudava a se levantar e a se deitar. Dava-lhe

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