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sem. O cavaleiro era o homem<br />
virgem que se casava com a dama<br />
virgem; Cavalaria e virgindade<br />
eram complementares. A<br />
força dele era a do homem casto,<br />
puro, não a do cafajeste frequentador<br />
de botequins.<br />
No cavaleiro reluziam, com<br />
o brilho do aço, todas as qualidades<br />
do verdadeiro católico.<br />
Tanto quanto me lembre, os<br />
meus primeiros encontros com<br />
a Cavalaria foram saboreando<br />
esta palavra, e compreendendo<br />
que ela era como uma misteriosa<br />
pedra preciosa que não brilhava<br />
com a luz vinda de fora,<br />
mas com um fulgor proveniente<br />
de dentro. As palavras “Cavalaria”<br />
e “cavaleiro” pareciam-me<br />
ter em si mesmas uma beleza,<br />
uma dignidade, uma distinção<br />
extraordinárias. Eram como um<br />
brilhante ou um rubi que rutilava<br />
por si mesmo.<br />
Nos remotos anos de minha<br />
infância, usava-se a palavra<br />
“cavalheiro” um pouco mais do que hoje, e ela teve um<br />
importante papel em minha formação. Algumas vezes, recebi<br />
de minha governanta a recomendação de ser um cavalheiro.<br />
Por exemplo, fui educado junto com minha irmã e uma<br />
prima, e com certa frequência fazíamos passeios a pé para<br />
exercitar. As regras de educação, com vagos restos da<br />
Cavalaria, prescreviam que o cavalheiro deveria dar atenção<br />
e precedência à dama por esta ser mais frágil. E as<br />
duas meninas, às vezes, deixavam cair alguma coisa.<br />
Eu, perpetuamente distraído, começava por não notar<br />
aquele objeto jogado no chão. Primeira repreensão<br />
da Fräulein Mathilde: “Quem está com senhoras – imaginem<br />
menininhas de quatro, cinco anos... – deve prestar<br />
contínua atenção nelas para ver se não estão precisando<br />
de qualquer coisa. É assim que age um cavalheiro. Você<br />
não procedeu como um cavalheiro porque não estava<br />
com sua atenção fixa nelas para saber que cortesia deveria<br />
fazer. Agora vá e apanhe o objeto.”<br />
Eu pensava: “Vai me dar menos trabalho apanhar esse<br />
objeto do que brigar com essa alemã. Vou pegar para<br />
não ter amolação.” Pegava e dava para a menina que o<br />
tinha deixado cair. Mas a governanta continuava:<br />
“Não senhor, sorria! Na hora de entregar, precisa<br />
mostrar sua alegria por ter prestado serviço, sorria!”<br />
Cerco de Antioquia - Biblioteca Nacional, Paris, França<br />
Além disso, por<br />
vezes as crianças tendem<br />
a ser descuidadas<br />
quando estão à<br />
mesa, deixando cair<br />
comida, o que não é<br />
bonito. Quando isso<br />
se dava, logo vinha<br />
a recomendação:<br />
“Cavalheiro não deixa<br />
cair grãos de arroz, entretanto<br />
se acontece recolhe-<br />
-os não com seu dedo, mas<br />
com uma colher...” E assim<br />
tantas outras regras de<br />
educação. “Cavalaria” foi<br />
para mim uma palavra que<br />
tinha um som de ouro, mas<br />
batia como uma chicotada,<br />
e isso me fez extraordinariamente<br />
bem. v<br />
(Extraído de conferência<br />
de 26/5/1984)<br />
Jean Colombe (CC3.0)<br />
Flávio Lourenço<br />
Cavaleiro Templário<br />
Priaranza del Bierzo, Espanha<br />
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