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INTRODUÇÃO
Fundado em 2006 pela ativista negra Tarana Burke, o Movimento Metoo ganhou
novos contornos a partir de um tweet da atriz estadunidense Alyssa Milano em 2017, no qual
ela convoca todas as mulheres já assediadas a usarem a hashtag #metoo. O tweet surge em
resposta às denúncias feitas pelo jornal The New York Times contra o produtor hollywoodiano
Harvey Weinstein, acusado de assediar dezenas de mulheres. O que dá seguimento às denúncias
e o tweet da atriz é algo nunca antes visto, uma grande onda de acusações de assédio contra
homens poderosos. As antigas estruturas aparentemente inabaláveis que sustentavam as
produções cinematográficas hollywoodianas começam a ruir. Ninguém estava imune.
Produtores, atores, fotógrafos, CEOs, o título não importava mais, as denúncias não iriam parar.
As mulheres não iriam mais se calar. Carreiras renomadas foram parcialmente enterradas, como
as de Bill Cosby e Kevin Spacey 1 . Dizemos parcialmente pois, em diversos casos, apesar de
processos judiciais e acusações públicas, a carreira do acusado sofre um desgaste, mas continua,
como os diretores Roman Polanski e Woody Allen. 2 É nesse tsunami de denúncias que a
presente pesquisa nasce.
Pretendemos nesta pesquisa analisar um material heterogêneo, formado de
filmes, séries, documentários, livros e diversas materialidades, através do arcabouço teórico da
Análise do Discurso de linha francesa, a fim de constatarmos se o Movimento #metoo pode ser
considerado um acontecimento discursivo. Por se tratar de um material heterogêneo, o percurso
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Bill Cosby foi condenado em 2018 por três acusações de crime de abuso sexual cometidos em 2004. Kevin
Spacey perdeu contrato com a Netflix em 2018, com a interrupção da série House of Cards que seguiu sem o ator
e o filme Gore, que não foi lançado, um total de US$39 milhões. Após as denúncias contra Spacey, o ator não teve
mais produções lançadas e nem novos contratos assinados, chegando a ser substituído pelo ator Christopher
Plummer no filme Todo o Dinheiro do Mundo, que já estava praticamente finalizado quando o diretor Ridley Scott
decidiu pela substituição.
2
Roman Polanski, famoso diretor e produtor francês, é considerado fugitivo pela justiça estadunidense desde 1978
quando, após pagar fiança por ter sido preso em flagrante pelo estupro da modelo Samantha Geimer, de 13 anos,
fugiu para a Europa antes de nova prisão, nunca tendo sido julgado pelo caso. Apesar de ter sido preso em Zurique
em 2009, a justiça suíça negou sua extradição por falta de provas. Ainda assim, ganhou diversos prêmios após
1978, com destaque para o de melhor diretor em 2020 no Prêmio César, uma espécie de Oscar francês. Várias
atrizes se retiraram da cerimônia em forma de protesto e o debate “artista vs. obra” se reacendeu. Woody Allen,
diretor estadunidense, é acusado pela filha adotiva Dylan Farrow de tê-la abusado sexualmente aos 7 anos de idade.
A carta enviada ao The New York Times em 2014 detalha os acontecimentos. Mesmo assim, o diretor foi
considerado inocente em investigações em 1994. Em 2014 o diretor ganhou um prêmio honorário Cecil B.
DeMillie do Globo de Ouro, que premia anualmente alguém que contribuiu significativamente, ao longo de sua
carreira, para o mundo do entretenimento.