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GIOVANA OLIVEIRA DE RUSSI - PósDefesa

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considerada um ser humano, mas um animal, ser inferior.

Trump dizer que a mulher era casada tem mais de uma relevância para nós,

podendo indicar uma espécie de camaradagem entre homens, o que teria feito com que ele não

insistisse mais e nem se chateasse tanto com a cantada fracassada. Mas também pode indicar que

a mulher é sempre vista como propriedade pertencente a outrem, nunca a ela mesma.

A parte mais execrável da fala é a última, que reduz a mulher a uma parte de seu

corpo, chamada pelo candidato de pussy, o que mostra novamente a animalização feminina,

uma vez que o léxico também se refere a gatinho. Temos aqui, novamente, a mulher reduzida,

objetificada. Um objeto de dar prazer ao homem, independentemente da situação, ocasião ou

vontade. Bulter (1997) postula que só há sujeito através da linguagem; a partir do momento que

se nomeia algo, ele passa a existir e é através da fala que há sujeito, ou seja, “[...] ser nomeado

é também uma das condições pelas quais o sujeito é constituído na linguagem [...]” (BUTLER,

1997, p. 2 – tradução minha). A autora também mostra a importância das filiações de memória,

principalmente no discurso injurioso:

O sujeito que diz as palavras socialmente injuriosas é mobilizado por aquele longo fio

de interpelações injuriosas: o sujeito atinge um estado temporário de citar esse dizer,

em performar a si mesmo como origem desse dizer (BUTLER, 1997, p. 50 – tradução

minha).

[...] nenhum termo ou declaração pode funcionar permanentemente sem a

acumuladora e dissimuladora historicidade de força. Quando um termo injurioso

machuca [...], machuca justamente através do acúmulo e dissimulação de sua força. O

sujeito que diz a calúnia, está citando-a, fazendo comunidade linguística com a

história dos falantes (BUTLER, 1997, p. 51-52 – tradução e adaptação minhas).

Assim sendo, podemos entender que ao nomear a mulher como um animal,

Trump faz dela um objeto, e isso é possível graças a uma rede de memória que sustenta e

legitima essa posição ideológica patriarcal machista no discurso.

Após o vazamento do áudio, mais de 20 mulheres procuraram jornais com

denúncias de assédio sexual contra o presidenciável. Em um vídeo, Trump assume o que disse

e pede desculpas se ofendeu alguém. Muito comum em pedidos de desculpas, “desculpa se

alguém se sentiu ofendido”, não é um pedido sincero uma vez que não assume o próprio erro e

sim terceiriza a culpa para aquele que se sentiu ofendido dizendo, em outras palavras, que o

erro é de quem se ofende por um motivo ou por outro, e não de quem diz a ofensa em si.

Para além disso, ele também chega a dizer que suas palavras “bobas” são muito

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