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considerada um ser humano, mas um animal, ser inferior.
Trump dizer que a mulher era casada tem mais de uma relevância para nós,
podendo indicar uma espécie de camaradagem entre homens, o que teria feito com que ele não
insistisse mais e nem se chateasse tanto com a cantada fracassada. Mas também pode indicar que
a mulher é sempre vista como propriedade pertencente a outrem, nunca a ela mesma.
A parte mais execrável da fala é a última, que reduz a mulher a uma parte de seu
corpo, chamada pelo candidato de pussy, o que mostra novamente a animalização feminina,
uma vez que o léxico também se refere a gatinho. Temos aqui, novamente, a mulher reduzida,
objetificada. Um objeto de dar prazer ao homem, independentemente da situação, ocasião ou
vontade. Bulter (1997) postula que só há sujeito através da linguagem; a partir do momento que
se nomeia algo, ele passa a existir e é através da fala que há sujeito, ou seja, “[...] ser nomeado
é também uma das condições pelas quais o sujeito é constituído na linguagem [...]” (BUTLER,
1997, p. 2 – tradução minha). A autora também mostra a importância das filiações de memória,
principalmente no discurso injurioso:
O sujeito que diz as palavras socialmente injuriosas é mobilizado por aquele longo fio
de interpelações injuriosas: o sujeito atinge um estado temporário de citar esse dizer,
em performar a si mesmo como origem desse dizer (BUTLER, 1997, p. 50 – tradução
minha).
[...] nenhum termo ou declaração pode funcionar permanentemente sem a
acumuladora e dissimuladora historicidade de força. Quando um termo injurioso
machuca [...], machuca justamente através do acúmulo e dissimulação de sua força. O
sujeito que diz a calúnia, está citando-a, fazendo comunidade linguística com a
história dos falantes (BUTLER, 1997, p. 51-52 – tradução e adaptação minhas).
Assim sendo, podemos entender que ao nomear a mulher como um animal,
Trump faz dela um objeto, e isso é possível graças a uma rede de memória que sustenta e
legitima essa posição ideológica patriarcal machista no discurso.
Após o vazamento do áudio, mais de 20 mulheres procuraram jornais com
denúncias de assédio sexual contra o presidenciável. Em um vídeo, Trump assume o que disse
e pede desculpas se ofendeu alguém. Muito comum em pedidos de desculpas, “desculpa se
alguém se sentiu ofendido”, não é um pedido sincero uma vez que não assume o próprio erro e
sim terceiriza a culpa para aquele que se sentiu ofendido dizendo, em outras palavras, que o
erro é de quem se ofende por um motivo ou por outro, e não de quem diz a ofensa em si.
Para além disso, ele também chega a dizer que suas palavras “bobas” são muito