20.04.2024 Views

Jacques-Alain Miller - A teoria do parceiro-2

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

A teoria do parceiro

brotar da experiência psicanalítica. Se há sintoma, então não há relação

sexual, há não-relação sexual, há uma ausência de saber no real que

diga respeito à sexualidade.

É muito difícil demonstrar uma ausência de saber no real. O que,

na experiência analítica, nos situa diante desta ausência?

O que a experiência nos ensina em cada caso que se submete à

experiência analítica - Lacan nos fez perceber o seu valor e foi necessário

que o formulasse para que isso se tornasse evidente - é a função

determinante, em cada caso, de um encontro, um aleatório, um certo

acaso, um certo "não estava escrito".

Isto se expõe, se evidencia com bastante clareza, no relato que um

sujeito pode fazer da gênese de sua homossexualidade, ou o mau encontro,

instância que de alguma forma irrompe e à qual o sujeito atribui de

bom grado tanto sua orientação sexual quanto o encontro com certas

palavras que decidirão para ele os investimentos fundamentais que

condicionarão em seguida o modo pelo qual ele se remeterá à sexualidade.

Além disso, sabe-se que em todos os casos o gozo sexual se apresenta

sob a forma do traumatismo, ou seja, como não preparado por um

saber, desarmônico ao que já estava lá.

Dito de outro modo, a constância específica que pode ser balizada

na experiência analítica é exatamente a contingência, ou seja, é a própria

variabilidade o que localizamos como uma constante. Variabilidade

quer dizer que não há um saber pré-inscrito no real. Tal contingência

decide o modo de gozo do sujeito, e é nisso que ela torna evidente a

ausência de saber no real no que diz respeito ao gozo e à sexualidade:

um certo "não está escrito". Isso se encontra, e a partir daí o que funciona

como real de referência não é mais o «não cessa de se escrever",

mas sim o "não cessa de não se escrever", ou seja, a relação sexual

como impossível.

Lacan procurou investigar, de uma forma que eu ousaria dizer

torturante, a possibilidade de demonstrá-lo. O real de que se trata aqui

é absolutamente diferente do real da ciência. Como demonstrar uma

ausência de saber? Ele de bom grado permaneceu reservado quanto ao

termo demonstração. Eis por que pôde dizer: ''A experiência analítica

atesta um real, testemunha um real", como se, em nosso campo, a con~

tíngência regular, encontrada em todos os casos, atestasse o impossível.

De alguma forma, trata-se de uma demonstração do impossível pela

contingência.

É possível escrevê-lo no triângulo abaixo. O impossível, o "não

cessa de não se escrever" é o nome da não-relação sexual (NRS); o

155

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!