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dos em constante improvisação. Exploração da<br />
ampla gestualidade e da mobilidade. Nada muito<br />
marcado, apenas sugerido, incompleto, urgente.<br />
A criação adquiria forma mais coletiva e apontava<br />
para uma subversão das regras do espetáculo.<br />
Os Monstros de Babaloo, do carioca Elyseu<br />
Visconti, é sem dúvida uma das grandes inscrições<br />
desta cinematografia. Filmado em apenas<br />
três ou quatro dias no Rio de Janeiro e em Niterói,<br />
é uma sátira trash ambientada no Brasil de 1970,<br />
ou melhor, na Ilha de Babaloo, onde se encontra<br />
Mr. Badu, industrial do setor de enlatados, sardinha<br />
e marmelada, além de proprietário de plantações<br />
de banana e exportador de quiabo. Badu<br />
é um inacreditável grosseirão que mal consegue<br />
falar, com uma boca funda de desdentado, as<br />
mãos calejadas e a pele curtida de sol, mais parecendo<br />
um pedreiro velho ou um cortador de cana.<br />
Tem compulsão por charuto, mulher e banana.<br />
Coloque uns óculos escuros horrendos, cordões,<br />
aneis, paletó, gravata borboleta e dá para imaginar<br />
a composição esdrúxula do tipo. É casado<br />
com madame Bouganvile, encarnada pela única<br />
Wilza Carla, a esbelta que virou uma das baleias<br />
mais conhecidas do Brasil, em atuação memorável,<br />
carregada de ânsia e fúria. Logo na primeira<br />
cena em que aparece está torcendo (diz a lenda, literalmente<br />
quebrando ou algo que o valha) o braço<br />
da empregada Frineia (deusa da beleza), uma<br />
fuxiqueira cheia de malícia e sensualidade vivida<br />
pela não menos singular Zezé Macedo, parodiando<br />
a si própria com todas as caras e bocas. Duas<br />
figuras do universo da chanchada, emblemáticas<br />
da conjunção do cômico e do monstruoso. Duas<br />
figurações da deformidade em nosso imaginário<br />
audiovisual. Completam o elenco, Helena Ignez,<br />
que nesta quadra brilhou numa série de filmes<br />
fundamentais, totalmente à vontade dentro desse<br />
esquema livre e debochado de atuação, como Boneca,<br />
filha do industrial, tendo por irmão caçula<br />
um “menino impossível”, sujo e mal-criado, tratado<br />
como débil mental. Betty Faria, com toda a libido<br />
estampada, é Gardênia e Tânia Scher, Divina,<br />
as prostitutas envolvidas com Badu. Tem ainda a<br />
babá das “crianças”, uma velha pequenina com<br />
as pernas incrivelmente arqueadas, coisa de circo.<br />
Agregue-se um padre, um secretário vivido pelo<br />
ator Kleber Santos, colocado como “gerente das<br />
fábricas”, na verdade um idiota metido a espertalhão<br />
cujo projeto genial era a criação do sorvete<br />
double face (“tanto se chupa de um lado, como se<br />
chupa de outro”), um motorista, um segurança e<br />
está armado o quadro. Registrando tudo, fotografia<br />
e câmera, a competência de Renato Laclete.<br />
Na Ilha de Babaloo todos querem se dar bem<br />
e para isso é preciso passar a perna e se livrar dos<br />
outros, pelo menos assim é o lance na família de<br />
Badu, instalada num bangalô cercado de jardins.<br />
Madame Bouganvile sonha em se ver livre do caçula<br />
insuportável, mas também do marido e da<br />
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