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O século do nada - Suma Teológica

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desto, caminhava mansamente e sem ares de heroísmo para<br />

uma situação em que possivelmente teria de dar a vida. Povo<br />

manso, povo bom, pensava eu, mas também povo bobo e sem<br />

jeito. O que iria acontecer?<br />

Numa esquina ouvi uma conversa entre <strong>do</strong>is populares:<br />

— Parece que os tanques vão atacar o Palácio pela Rua<br />

Paissandu.<br />

— Não pode. O cara, você não sabe que é contra-mão?<br />

Perto <strong>do</strong> Palácio adensava-se a multidão, mas no meio <strong>do</strong>s<br />

homens canhestramente dispostos a dar a vida pela Pátria passavam<br />

meninos de bicicleta e moças risonhas e despreocupadas.<br />

Seria da mocidade, desta bateria nova e bem carregada, que<br />

eles tiram tamanha energia? Não. O povo to<strong>do</strong>, observan<strong>do</strong><br />

melhor, ostentava uma graciosa e leve coragem. Uma coragem<br />

humorística. E eu tive, de repente, a intuição viva e fulgurante<br />

da vitória desse génio brasileiro contra a substância que o<br />

ameaçava.<br />

Pouco depois chegou a primeira onda de notícias surpreendentes:<br />

os tanques tinham aderi<strong>do</strong> ao Governa<strong>do</strong>r, as Forças<br />

Armadas <strong>do</strong>minavam a situação, João Goulart fugira <strong>do</strong> Palácio<br />

das Laranjeiras, sem tempo de meter a fralda da camisa para<br />

dentro das calças. Pouco depois confirmava-se a notícia, e o<br />

povo brasileiro (com exceção <strong>do</strong>s intelectuais de esquerda e <strong>do</strong>s<br />

eclesiásticos paracomunistas) ficou saben<strong>do</strong> que Nossa Senhora<br />

ouvira nossas súplicas, que Deus nos salvara e que o instrumento<br />

escolhi<strong>do</strong> para este milagre fora o nosso bom solda<strong>do</strong><br />

de terra, mar e ar.<br />

Dois dias depois, em todas as cidades grandes <strong>do</strong> Brasil,<br />

o povo encheu as ruas com a Marcha da Família — com Deus<br />

pela Liberdade. Eu e quatro amigos estivemos perdi<strong>do</strong>s, imersos<br />

na mais densa multidão que jamais víramos reunida. Ali estava<br />

o que os intelectuais de esquerda chamavam de antipovo. Ali<br />

estava o sangue vivo de nosso bom Brasil. E eu então senti-me<br />

possuí<strong>do</strong> de uma enorme admiração por este povo singular que<br />

acabava de vencer uma Copa <strong>do</strong> Mun<strong>do</strong> no combate ao comunismo.<br />

Agradecen<strong>do</strong> a Deus os favores de exceção que de certo<br />

mo<strong>do</strong> não merecíamos, agradecia também os favores da natureza<br />

e das merecidas consequências. Grande povo! "A Europa<br />

curvou-se ante o Brasil" nos dias de Santos Dumont. Menino<br />

de quatro anos, cantei o pequeno hino de nossa projeção internacional.<br />

Velho, às portas <strong>do</strong>s setenta, cantava outro hino e<br />

candidamente prelibava a admiração universal diante da facilidade<br />

dançarina, graciosa, dionisíaca, com que o povo brasileiro<br />

pôs a correr os comunistas. (Mal sabia, na embriaguez de<br />

meu entusiasmo, que o mun<strong>do</strong> inteiro nos caluniaria. Os Esta<strong>do</strong>s<br />

Uni<strong>do</strong>s com base na superstição de sua liberal democracia, ou<br />

no seu "democratismo", e a Europa com base no esquerdismo<br />

que se apoderou <strong>do</strong>s meios de comunicação).<br />

Foi um <strong>do</strong>s mais belos espetáculos que vi. E tenho pena<br />

<strong>do</strong>s corações aliena<strong>do</strong>s que não tiveram a capacidade para acolher<br />

tão boa e tão bela alegria. Lembrei-me de uma página de<br />

Léon Bloy. A França acabara de marcar a vitória <strong>do</strong> Mame.<br />

Os jornais estavam encharca<strong>do</strong>s de júbilo, de esperança, de<br />

triunfo. Mas Léon Bloy folheava os jornais com cólera crescente,<br />

e depois com tristeza infinita. O que ê que o velho leão<br />

procurava nos cantos <strong>do</strong>s jornais? Lá está escrito em seu Diário:<br />

"Je cherche en vain le nom de Dieu".<br />

Ora, em nossa grande Marcha — cuja fotografia está<br />

diante de mim — não houve menção de um só nome <strong>do</strong>s tantos<br />

civis e militares que bem mereceram o aplauso <strong>do</strong> povo. Havia<br />

um só nome: o nome de Deus.<br />

O levante militar de 64 pôde expulsar <strong>do</strong>s postos de governo<br />

os comunistas, mas não pôde fazer o mesmo nas ordens<br />

religiosas, onde a infiltração se agravou com a cobertura <strong>do</strong>s<br />

bispos agora burocratiza<strong>do</strong>s ou motoriza<strong>do</strong>s na CNBB. Anos<br />

atrás D. Jaime Câmara, e muitos outros bispos <strong>do</strong> Brasil clamaram<br />

contra o perigo iminente e evidente da infiltração comunista,<br />

mas agora, ao sabor da chamada era pós-conciliar, e da<br />

liquidificação da autoridade episcopal, tornou-se ostensivo e<br />

agressivo o comunismo de padres desatina<strong>do</strong>s, e tornaram-se<br />

inevitáveis os atritos entre esse clero e o Governo. Um <strong>do</strong>s<br />

primeiros padres presos foi o lazarista que deixamos páginas<br />

atrás a ensinar marxismo em Ferros, perto de Belo Horizonte.<br />

Mais tarde foram presos <strong>do</strong>is padres assuncionistas franceses<br />

que ensinavam marxismo e que pertenciam à Ação Popular.<br />

Voa de Paris o Pe. Guillemin, superior <strong>do</strong>s assuncionistas<br />

que desde a primeira entrevista anunciou a nova-lgreja pós-conciliar,<br />

disse uma dúzia de asneiras em torno desse tema, e voltou<br />

ã Europa para levar a queixa à Comissão de Justiça e Paz que<br />

nesse tempo já era o que é e já estava preparada para repositório<br />

das reclamações esquerdistas. Mereci desse Superior Assuncionista<br />

uma carta suavemente injuriosa, mas nunca ten<strong>do</strong> consegui<strong>do</strong><br />

ser coleciona<strong>do</strong>r de coisa alguma não guardei o autó-<br />

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