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O século do nada - Suma Teológica

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E finalmente temos os binómios forma<strong>do</strong>s por termos realmente<br />

opostos e antagónicos. Exemplos:<br />

Anarquia — Ordem<br />

Comunismo — Regime de dignidade da pessoa humana<br />

Liberalismo — Princípio da autoridade.<br />

No primeiro caso, o <strong>do</strong>s termos opcionais, podemos e devemos<br />

escolher um deles conforme as exigências de uma dada conjuntura<br />

apreciada por nosso sistema de convicções. Em princípio, é moralmente<br />

neutra esta ou aquela forma de governo que não contrarie a<br />

lei natural. O calor de nossas convicções poderá, acidentalmente, valorizar<br />

demais a república ou a monarquia, poderá até chegar a excessos<br />

de radicalização, como chegaram os monarquistas da Action Française.<br />

Posso entretanto admitir que Maurras, Bernanos e outros, por<br />

uma acuidade especial, empírica, para o caso concreto da lamentável<br />

experiência francesa <strong>do</strong> princípio <strong>do</strong> <strong>século</strong>, tivessem razão no<br />

paralelismo que estabeleciam entre república (ou democracia) e anarquia.<br />

Posso até admirá-los sem necessidade de retocar minhas pacatas<br />

e assentadas convicções republicanas. Mesmo nos casos em que<br />

nenhum preceito moral determine uma escolha e a correlata recusa,<br />

resta ainda a margem para a ponderação de qual das duas soluções<br />

será melhor em relação aos mil e um vasos capilares <strong>do</strong> caso concreto.<br />

A experiência da história mostra que os homens são capazes<br />

de se empenhar com o mais afoguea<strong>do</strong> fervor nos desempates onde<br />

não há nenhuma indicação nítida de princípios morais. Talvez para<br />

compensar a insegurança ou a obscuridade da percepção <strong>do</strong>s contingentes,<br />

criamos em nós uma ênfase calorosa que muita vez maís se<br />

destina ao uso interno <strong>do</strong> que ao proselitismo exterior.<br />

Mas deixemos essas digressões e voltemos ao nosso esquema<br />

E-D.<br />

No segun<strong>do</strong> caso estão os termos em falso antagonismo que<br />

pedem complementação. É curiosa a tendência com que o jogo E-D,<br />

que Monnerot chama de "solecismo político", tem de introduzir antagonismos<br />

falsos e desconhecer a necessidade da conjunção <strong>do</strong>s opostos;<br />

coisa que prova a tendência de tal jogo à inimizade. No caso<br />

lembramos o binómio justiça e ordem que, pelo senso comum, antes<br />

de grandes especulações, pede complementação aos gritos. Veremos<br />

no tópico seguinte um eloquente exemplo de mau funcionamento <strong>do</strong><br />

jogo E-D, que mais parece ter si<strong>do</strong> inventa<strong>do</strong> para confundir <strong>do</strong> que<br />

para aclarar as ideias.<br />

No terceiro caso estarão os verdadeiros antagonismos que, a<br />

rigor, constituem o assunto da imensa polémica interna de nosso fim<br />

de civilização, de que tentamos fazer em to<strong>do</strong> este livro uma conden-<br />

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sacão. Mais adiante, no tópico que se refere ao revolucíonarismo,<br />

voltaremos a considerar este assunto na pauta especial <strong>do</strong> jogo esquerda-direita;<br />

mas antes disso precisamos desenvolver um pouco<br />

mais as consequências desse jogo falso e falsea<strong>do</strong>r em que tantos "intelectuais"<br />

se deixaram envolver.<br />

A estranha cegueira <strong>do</strong>s "intelectuais" no jogo E-D<br />

O exemplo seria irrelevante e desprezível se o fôssemos buscar<br />

em algum <strong>do</strong>s "progressistas" católicos de nossos dias que se distinguem<br />

pela fecundidade na tolice. Para provar o intrínseco defeito<br />

<strong>do</strong> utensílio, coloco-o nas mãos de um homem honesto e competente:<br />

o filósofo Yves Simon, discípulo de Maritain e autor de livros<br />

sérios como, por exemplo, UOntologie du Connaitre, Desclée de<br />

Brouwer. Mas é no livro escrito no exílio e publica<strong>do</strong> em 1941, (3)<br />

no meio da tempestade de emoções trazidas pela queda de Paris,<br />

que nós melhor apreciaremos o que o "intelectual" Yves Simon diz<br />

quan<strong>do</strong> utiliza o aparelho E-D. Na página 128, a propósito da guerra<br />

da Abissínia, lemos:<br />

Os adversários de Mussolini eram os homens <strong>do</strong> nascente Proni Populaire<br />

e mais um grande número de católicos. Quanto à direita, quanto<br />

aos conserva<strong>do</strong>res e reacionários, quanto ao parti<strong>do</strong> nacionalista, quanto<br />

àqueles que chamei "guardiães da cidade" — esses se levantaram como<br />

um só homem contra a Sociedade das Nações, contra o direito internacional,<br />

contra os trata<strong>do</strong>s assina<strong>do</strong>s pela França, e apoiaram a agressão<br />

italiana.<br />

Ao pé da página, arrependi<strong>do</strong> de ter escrito "como um só<br />

homem", Y.S. admite algumas raras exceções. Não sabemos se em<br />

algum lugar definiu o que entende por "homem de direita" e agora<br />

nos diz que essa espécie de homem comportou-se da maneira acima<br />

descrita, ou se é precisamente nesse comportamento que devemos ver<br />

uma definição de "homem de direita". Na verdade, em cada texto<br />

onde aparece esse tipo baixa<strong>do</strong> <strong>do</strong> arquétipo tem-se a penosa impressão<br />

da mesma recorrência: "Aqueles homens que chamo de direita<br />

(e que to<strong>do</strong>s nós sabemos como são feitos) comportaram-se como<br />

homens de direita".<br />

Não consigo ver no mesmo saco, com o mesmo cheiro e mesmo<br />

gosto os reacionários, os conserva<strong>do</strong>res e os fascistas que apoiaram<br />

o feito de Mussolini avec un enthusiasme jievreux. Se queremos<br />

definir os homens "de direita" como os defensores da "ordem", da<br />

"tradição" e da autoridade, ou como os homens apega<strong>do</strong>s à segu-<br />

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