Tàpies e seus Corpos: um Olhar Sexuado Anníbal Montaldi - Unesp
Tàpies e seus Corpos: um Olhar Sexuado Anníbal Montaldi - Unesp
Tàpies e seus Corpos: um Olhar Sexuado Anníbal Montaldi - Unesp
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
arte moderno, sobre el cual tanto ha influido posteriormente.”<br />
(TÀPIES, 2003:218) 38<br />
Pode-se dizer que a dessacralização seja <strong>um</strong> ponto culminante para que<br />
ele (<strong>Tàpies</strong>) saia da com<strong>um</strong> relação pintor-obra — trazida desde os artistas<br />
renascentistas e reforçada pela academia do séc. XIX — quando a importância do<br />
preciosismo técnico para a possível expressão artística e do acabamento se<br />
desintegralizem.<br />
Como dessacralizar sem abandonar a aura que a pintura tem como arte<br />
maior entre as belas-artes 39 ?<br />
Eis a questão! Cremos que o olhar tapiniano para as obras seja o mesmo<br />
de Duchamp. Se com Duchamp o olhar para o quadro desfez em sua soberania de<br />
“ser”, se o artista francês tratou a obra como <strong>um</strong> objeto qualquer à escolha e<br />
definição do artista, cabendo ao mesmo <strong>um</strong>a ressignificação do com<strong>um</strong>, sem que<br />
este com<strong>um</strong> deixasse de sê-lo, <strong>Tàpies</strong> também o fez. Porém, não cabe aqui a<br />
discussão sobre o desenrolar de Duchamp, da sua obra e da importância para a<br />
arte, mas sim a discussão sobre o modo que o olhar de <strong>Tàpies</strong> para a obra de<br />
Duchamp resultou em mudanças na sua própria produção. Assim, no caminhar de<br />
<strong>Tàpies</strong> a questão do “com<strong>um</strong>” na obra de arte retorna à pintura na elaboração<br />
não-prévia, na mundanidade dos materiais e no desprovimento da intenção. A<br />
grande magia tapiniana está em sacralizar o que já é, o oculto, o indizível e<br />
indecifrável, porém percebido, que pertence a todos, como se suas leituras sobre<br />
38 “(...) a (obra) de Marcel Duchamp me interessaram tanto, que estou seguro de que<br />
continuaram presentes em meu espírito e seguiram influenciando-me inconscientemente durante<br />
anos e anos. O absurdo da combinação dos objetos cotidianos, ou só sua presença retirada de<br />
<strong>seus</strong> lugares habituais, tem sido o paradoxo maior — comparável aos koans japoneses — que<br />
havia dado à arte moderna, sobre o qual havia influenciado posteriormente.” (Tradução livre do<br />
autor).<br />
39 Segundo a definição de Belas-Artes formulada durante o período renascentista, categorizava as<br />
artes entre belas-artes ou artes maiores. Integra-se nessa categoria a pintura, a escultura e a<br />
arquitetura; e as artes menores, o desenho, a gravura, a cerâmica, tecelagem etc. Tal<br />
categorização foi seguida durante quase quatro séculos, sendo, que após a Revolução Industrial e<br />
os movimentos contrários ao academicismo do séc. XIX, passou-se a considerar as artes em geral<br />
em artes visuais e artes aplicadas. Mesmo assim, se considerarmos a hibridez das linguagens<br />
artísticas, perderíamos todos esses classificatórios, tão importantes para o pensamento do séc.<br />
XIX e desconsideraríamos qualquer forma de classificação, a não ser a de arte.<br />
42