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Gnose em Revista - Intranet - Uemg

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24<br />

desenvolvimento do capitalismo adotado no Brasil 2 . Esse<br />

modelo caracteriza-se por duas tendências. Primeiro,<br />

pelo fortalecimento do Estado <strong>em</strong> detrimento da<br />

sociedade civil. Segundo, pela prática da “transformação<br />

pelo alto”, modalidade de desenvolvimento histórico<br />

que implica a exclusão das massas populares das<br />

decisões fundamentais. Assim, a sociedade brasileira<br />

sofreu o peso de uma ideologia autoritária fort<strong>em</strong>ente<br />

diss<strong>em</strong>inada por toda a população, manifesta num<br />

conjunto de práticas que combinam valores oligárquicos<br />

e estatais que limitaram a intervenção da sociedade<br />

civil na política (COUTINHO, 1988). Tal configuração<br />

político-cultural asseguraria aos dirigentes do Estado<br />

margens excessivamente amplas de atuação a salvo de<br />

mecanismos de controle da sociedade.<br />

Resultados e discussão<br />

Não obstante, importantes transformações<br />

ocorridas durante as últimas três décadas do século<br />

XX levaram alguns autores, ainda que comprometidos<br />

com a concepção de d<strong>em</strong>ocracia presente nos<br />

clássicos, a afirmar<strong>em</strong> alterações no comportamento<br />

dos brasileiros que levariam a vigência de um novo<br />

padrão de relacionamento entre Estado e sociedade.<br />

As transformações apontavam para um fortalecimento<br />

do nível de organização e mobilização da sociedade,<br />

fenômeno que foi interpretado como um grande<br />

incr<strong>em</strong>ento da cidadania no Brasil.<br />

Segundo os autores do final do século XX, como<br />

Carlos Nelson Coutinho (1988), Francisco Weffort<br />

(1992), Eder Sader (1988), Evelina Dagnino (2002), que<br />

acompanharam esse processo, as transformações pelas<br />

quais a sociedade brasileira passou naquele período<br />

teriam alterado o padrão tradicional de relacionamento<br />

entre Estado e sociedade no Brasil. Essa alteração teve<br />

início com fortalecimento da sociedade civil ocorrido<br />

durante a década de 1970, como fruto e reação ao projeto<br />

de desenvolvimento imposto pelo Regime Militar (1964-<br />

85), que consistia num amplo processo de modernização<br />

impl<strong>em</strong>entado sob uma forma política autoritária.<br />

As mudanças desencadeadas pelo Regime Militar,<br />

com destaque para o “milagre econômico” (1968-<br />

1974), alteraram significativamente e de forma bastante<br />

acelerada a morfologia da sociedade brasileira. A<br />

população se deslocou para as grandes e médias cidades,<br />

passando a estrutura d<strong>em</strong>ográfica do país de rural a<br />

urbana; a industrialização ganhou um impulso de grandes<br />

proporções, baseado na intervenção estatal e na entrada<br />

<strong>em</strong> massa das multinacionais, resultando no surgimento de<br />

novas camadas sociais; somando-se a isso, a experiência do<br />

terror de Estado despertou amplas camadas da população<br />

para as virtudes da d<strong>em</strong>ocracia e para a organização da<br />

sociedade civil. Enfim, o país se modernizou, tornando-se<br />

uma sociedade imensamente mais complexa do que era<br />

antes do Golpe de 64 (VIANNA, 1997).<br />

A ampliação da divisão social do trabalho e a<br />

urbanização decorrente do esforço modernizador<br />

do Regime Militar acarretaram um aumento da<br />

diversidade de interesses na vida política do país. Isso<br />

acabou se constituindo <strong>em</strong> fator de desestabilização<br />

do regime à medida que suscitava expectativas e<br />

d<strong>em</strong>andas novas, mais complexas e mais volumosas <strong>em</strong><br />

relação ao papel do poder público, e isso justamente<br />

a partir de um momento <strong>em</strong> que era declinante a<br />

capacidade de acomodação do sist<strong>em</strong>a econômico<br />

devido à crise do petróleo de 1973 3 . Sendo assim, o<br />

Regime Militar tornou-se incapaz de cooptar política<br />

ou economicamente os setores da sociedade que até<br />

então lhe havia dado sustentação, o que deu início a<br />

uma forte crise de legitimidade do regime.<br />

Por fora das instituições tradicionais de agr<strong>em</strong>iação da<br />

população, como partidos, câmaras legislativas, sindicatos<br />

e associações de massa, naquele período, começaram<br />

a surgir uma série de organizações independentes que<br />

buscavam manifestar as d<strong>em</strong>andas sociais reprimidas<br />

pelos militares. A <strong>em</strong>ergência desses movimentos sociais<br />

foi decorrente das condições de repressão extr<strong>em</strong>ada<br />

contra a expressão política dos interesses populares, sendo<br />

que o bloqueio dos canais institucionais de representação<br />

causou o aparecimento de múltiplas organizações isoladas<br />

e fragmentadas, porém espalhadas por todo o tecido da<br />

sociedade civil (SADER, 1988).<br />

O fato é que durante a década de 1970, surgiram<br />

ou renovaram-se centenas de associações não<br />

imediatamente vinculadas a partidos políticos, mas que<br />

articulavam e davam identidade a grupos de pessoas,<br />

influenciavam seus comportamentos e veiculavam<br />

interesses. Um olhar sociológico sobre essas<br />

associações permite perceber que nesse processo de<br />

organização da sociedade brasileira - ao contrário do<br />

que ocorreu na Europa, onde os movimentos sociais<br />

da década de 1970 foram heg<strong>em</strong>onizados por grupos<br />

de classe média, como o ecologista ou o hippismo -<br />

2 O padrão ou modelo de desenvolvimento do capitalismo no Brasil recebeu diversas denominações. Florestan Fernandes denomina-o de Capitalismo<br />

Dependente, enquanto Carlos Nelson Coutinho e os gramscianos tratam-no como Modernização Conservadora. São apenas dois ex<strong>em</strong>plos dentre vários.<br />

No entanto, apesar das diferenças, mantêm certa unidade quanto aos aspectos acima citados.<br />

3 As elevações do preço do petróleo acarretaram uma severa recessão na economia mundial, diminuindo, sobr<strong>em</strong>aneira, o volume de reservas monetárias<br />

internacionais disponíveis para <strong>em</strong>préstimos. O Brasil, sendo o terceiro maior importador mundial de petróleo e o maior devedor entre os países <strong>em</strong><br />

desenvolvimento, foi atingido duramente por essa crise energética. Surgia assim, inevitavelmente, uma profunda ameaça ao crescimento econômico devido<br />

ao forte crescimento das despesas com a importação de petróleo.<br />

v. 1 - n. 1 - Fevereiro 2011 - p. 23-28<br />

José Henrique Singolano Néspoli

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