A Vida sob Efeitos do Transe - Repositórios Digitais da UFSC
A Vida sob Efeitos do Transe - Repositórios Digitais da UFSC
A Vida sob Efeitos do Transe - Repositórios Digitais da UFSC
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
III<br />
O Poder Constituinte <strong>da</strong> Escola: Olavo Bilac e<br />
Coelho Neto em Contos Pátrios.<br />
Chegamos, enfim, ao problema que de alguma forma ou outra sempre se insinuou<br />
na pesquisa. De que forma os autores analisa<strong>do</strong>s construíram o estatuto <strong>da</strong> escola frente a<br />
socie<strong>da</strong>de brasileira <strong>do</strong> início <strong>do</strong> século XX? Se, como vimos, a escola passaria a integrar<br />
estratégias biopolíticas de poder, ten<strong>do</strong> no corpo <strong>do</strong> educan<strong>do</strong> seu foco principal, ela<br />
também procuraria constituir a reali<strong>da</strong>de social brasileira de um mo<strong>do</strong> diferencia<strong>do</strong> <strong>da</strong>quele<br />
apresenta<strong>do</strong> pela primeira república. A escola tornar-se-ia um poder constituinte de uma<br />
nova ordem na medi<strong>da</strong> em que procura reformar o modelo constituí<strong>do</strong>. Qual seria o espaço<br />
de onde a escola poderia assumir politicamente a tarefa de constituir a reali<strong>da</strong>de social,<br />
política e econômica <strong>do</strong> Brasil? É consenso que pensa<strong>do</strong>res <strong>da</strong> época como Olavo Bilac<br />
tinham essa pretensão que, atualmente, pode parecer ilusória, na medi<strong>da</strong> em que a escola<br />
ca<strong>da</strong> vez mais perde poder <strong>sob</strong>re o corpo <strong>do</strong>s educan<strong>do</strong>s para outras tecnologias mais<br />
poderosas. Porém, precisamos investigar como se tornava possível no início <strong>do</strong> século XX<br />
acreditar que a escola poderia constituir um papel político tão importante.<br />
Primeiramente, acredito, seria necessário contrapor-se a qualquer concepção de<br />
educação que estivesse volta<strong>da</strong> tão somente à qualificação <strong>da</strong> força de trabalho. Como<br />
exemplo, podemos pensar no sistema educacional concebi<strong>do</strong> por Gustave Le Bon em<br />
Psicologia <strong>da</strong>s Multidões. 21 Esse autor, muito difundi<strong>do</strong> na época que estamos analisan<strong>do</strong>,<br />
criticava aquilo a que chamava de ensino latino. Os principais atributos deste ensino seriam<br />
o extenso conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong>s manuais que o educan<strong>do</strong> teria que decorar e repetir, esquecen<strong>do</strong>-se<br />
pouco tempo depois <strong>da</strong>quilo que decorou, e a preparação exclusiva para as carreiras<br />
burocráticas <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>. Assim, a escola não prepararia os educan<strong>do</strong>s para as funções<br />
práticas <strong>da</strong> indústria e <strong>do</strong> comércio modernos. A conseqüência principal desta educação<br />
21<br />
LE BON, Gustave. Psicologia <strong>da</strong>s Multidões. Lisboa, Topografia de Franscisco Luiz Gonçalves, 1909. 2º<br />
ed. Tradução de Agostinho Fortes.<br />
46