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N.º 187 - Novembro 2007 - 2,00 euros - Inatel

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N.<strong>º</strong> <strong>187</strong> - <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong> - 2,<strong>00</strong> <strong>euros</strong>


NA CAPA<br />

Foto: José Frade<br />

TEATRO DA TRINDADE:<br />

TRADIÇÃO E FUTURO<br />

o Teatro da Trindade – o INATEL-<br />

Trindade, desde 1962 – celebra, no<br />

próximo dia 30 de <strong>Novembro</strong>, 140<br />

anos ao serviço do Teatro, Ópera,<br />

Música, Canto, Cinema, Etnografia e<br />

Folclore.<br />

Destacável<br />

de 24 páginas<br />

FÉRIAS 2<strong>00</strong>8<br />

4<br />

EDITORIAL<br />

7<br />

CARTAS E COLUNA<br />

DO PROVEDOR<br />

8<br />

NOTÍCIAS<br />

12<br />

CONCURSO<br />

DE FOTOGRAFIA<br />

14<br />

TERRA NOSSA<br />

BELMONTE,<br />

O ÚLTIMO<br />

REFÚGIO<br />

DOS JUDEUS<br />

As ruas de Belmonte<br />

deslizam contorcidas<br />

em direcção ao Vale<br />

do Zêzere. O casario<br />

de paredes de pedra<br />

predomina numa<br />

paisagem urbana<br />

pontuada, aqui e ali,<br />

de fachadas coloridas<br />

e varandas de ferro<br />

forjado. É na zona<br />

baixa da vila, um<br />

bairro vincado de<br />

ruelas e casinhas de<br />

piso térreo chamado<br />

Marrocos, que<br />

emergem os vestígios<br />

mais visíveis da<br />

presença secular da<br />

comunidade judaica.<br />

18<br />

PORTUGAL<br />

NA EUROPA<br />

Em todo o mundo,<br />

milhões de crentes o<br />

invocam — ou como<br />

Santo António de<br />

Pádua ou como Santo<br />

António de Lisboa.<br />

Foi (é) as duas coisas;<br />

mas, para nós, foi<br />

acima de tudo o<br />

primeiro português a<br />

colocar a sua «marca»<br />

na Europa.<br />

20<br />

TERMAS EM<br />

PORTUGAL:<br />

OS BONS<br />

ARES DE<br />

CARVALHELHOS<br />

Envoltas pelo<br />

conjunto montanhoso<br />

do Barroso, as Caldas<br />

Santas de<br />

Carvalhelhos<br />

propiciam ao visitante<br />

quietude e bons ares,<br />

a que não é alheio o<br />

notável parque,<br />

recanto de frescura,<br />

cor, som e perfumes<br />

característicos de um<br />

lugar pleno de<br />

tranquilidade.<br />

Sumário<br />

22<br />

PAIXÕES António José<br />

de Almeida: mãos de<br />

ouro para a madeira<br />

26<br />

OLHO VIVO<br />

28<br />

A CASA NA ÁRVORE<br />

30<br />

PORTUGAL<br />

E A LUSOFONIA<br />

31<br />

O TEMPO E O<br />

MUNDO<br />

32<br />

VIAGENS<br />

NA HISTÓRIA<br />

33<br />

BOA VIDA<br />

50<br />

CLUBE TEMPO LIVRE<br />

56<br />

CHEFE SUGERE<br />

INATEL Entre-os-Rios:<br />

Cabrito assado à Padeiro<br />

57<br />

O TEMPO E AS<br />

PALAVRAS<br />

Maria Alice Vila<br />

Fabião<br />

58<br />

CRÓNICA<br />

Álvaro Belo Marques<br />

Revista Mensal: e-mail: tl@inatel.pt - Propriedade do INATEL (Instituto Nacional para Aproveitamento dos Tempos Livres dos Trabalhadores) Presidente: José Alarcão Troni Vice-<br />

Presidentes: Luís Ressano Garcia Lamas e Vítor Ventura Sede do INATEL: Calçada de Sant’Ana, 180, 1169-062 LISBOA, Tel. 21<strong>00</strong>27<strong>00</strong>0 Fax 21<strong>00</strong>27061, N<strong>º</strong> Pessoa Colectiva:<br />

5<strong>00</strong>122237 Director: José Alarcão Troni Editor: Eugénio Alves Grafismo: José Souto Fotografia: José Frade Coordenação: Glória Lambelho Colaboradores: Ana Santos, André Letria,<br />

Carlos Barbosa de Oliveira, Carlos Blanco, Eduardo Raposo, Francisca Rigaud, Gil Montalverne, Helena Aleixo, Humberto Lopes, Joaquim Diabinho, Joaquim Durão, José Jorge<br />

Letria, Lurdes Féria, Maria Augusta Drago, Marta Martins, Paula Silva, Pedro Barrocas, Pedro Soares, Rodrigues Vaz, Sérgio Alves, Suzana Neves, Tharuga Lattas, Vítor Ribeiro<br />

Cronistas: Alice Vieira, Álvaro Belo Marques, Artur Queirós, Baptista Bastos, Duarte Ivo Cruz, Maria Alice Vila Fabião, Fernando Dacosta, João Aguiar, Luís Miguel<br />

Pereira, Pedro Cid.. Redacção: Calçada de Sant’Ana, 180 – 1169-062 LISBOA Telef. 21<strong>00</strong>27<strong>00</strong>0 Fax: 21<strong>00</strong>27061 E-Mail tl@inatel.pt Publicidade: Tel. 21<strong>00</strong>27<strong>187</strong> Préimpressão<br />

e impressão – Lisgráfica, Impressão e Artes Gráficas, SA. Casal Stª Leopoldina, 2730-052 Queluz de Baixo. Telef. 2143454<strong>00</strong> Dep. Legal: 41725/90. Registo<br />

de propriedade na D.G.C.S. n<strong>º</strong> 114484. Registo de Empresas Jornalísticas na D.G.C.S. n<strong>º</strong> 214483. Preço: 2,<strong>00</strong> <strong>euros</strong> Tiragem deste número: 169.307 exemplares


Editorial<br />

Acapa da Tempo Livre do corrente<br />

mês reproduz o interior,<br />

oitocentista e romântico, do<br />

Teatro da Trindade – o INATEL-<br />

Trindade, desde 1962 – que, no próximo dia<br />

30 de <strong>Novembro</strong>, celebra 140 anos ao<br />

serviço do Teatro, Ópera, Música, Canto,<br />

Cinema, Etnografia e Folclore, na emble-<br />

4 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

Teatro da Trindade<br />

140 anos<br />

mática colina do Bairro Alto e zona lisboeta da Baixa-<br />

Chiado, candidata a património mundial da UNESCO.<br />

TRINDADE – 140 ANOS_<br />

A 30 de <strong>Novembro</strong> de 1867, o Teatro da Trindade abriu<br />

as suas portas ao público de Lisboa, em estreia de gala,<br />

com a presença da Família Real, representando o drama<br />

“A Mãe dos Pobres”, de Ernesto Biester, interpretada<br />

pela nata dos actores da época.<br />

Pelo Teatro do Bairro Alto passaram, em 140 anos, os<br />

melhores autores, compositores,<br />

maestros, encenadores e actores portugueses,<br />

com especial destaque<br />

para o Teatro e a Ópera.<br />

Em 1887, ainda pela mão do pai-fundador,<br />

o empresário e mecenas Francisco<br />

Palha, o Trindade apresentou a<br />

opereta francesa O Barba Azul, de<br />

Jacques Offenbach, cujo êxito estrondoso<br />

inspirou a frase inicial da Tragédia<br />

da Rua das Flores, de Eça de Queiroz: “Era no Teatro da<br />

Trindade, representava-se o Barba Azul”.<br />

O Trindade sempre teve vocação de Teatro-Escola.<br />

Escola de autores, de actores, de encenadores e de cantores.<br />

Pela sua direcção e palco passaram os empresários<br />

Sousa Bastos e sua mulher Palmira Bastos e Robles<br />

Monteiro e sua mulher Amélia Rey Colaço.<br />

Em <strong>187</strong>9, Serpa Pinto escolheu o Trindade para relatar<br />

à comunidade científica e aos cidadãos comuns a sua<br />

travessia de África.<br />

JOSÉ ALARCÃO<br />

TRONI<br />

O Trindade sempre<br />

teve vocação de<br />

Teatro-Escola. Escola<br />

de autores, de actores,<br />

de encenadores e de<br />

cantores<br />

Em 140 anos, pisaram o palco do Trindade,<br />

entre muitos outros, Adelina Abranches,<br />

Lucília Simões, Amélia Rey Colaço, Chaby<br />

Pinheiro, Aura Abranches, Nascimento<br />

Fernandes, Erico Braga, Palmira Bastos,<br />

Alves da Cunha, Robles Monteiro, Maria<br />

Matos, Álvaro Benamar, Eunice Muñoz,<br />

Carmen Dolores, Raul Solnado, Rui de<br />

Carvalho, Rui Mendes ou Victor de Sousa.<br />

Viana da Mota deu o seu primeiro concerto no Teatro<br />

da Trindade, aos 12 anos de idade.<br />

Adquirido, em 1962, pela FNAT – antecessora do INA-<br />

TEL – o Trindade, com gestão pública, vem constituindo,<br />

há 45 anos, oferta cultural permanente da grande<br />

Lisboa, nos domínios do Teatro, Ópera, Opereta,<br />

Zarzuela, Cinema, Canto, Dança, Fado, Revista, Etnografia<br />

e Folclore, tendo sedeado a Companhia Portuguesa<br />

de Ópera, criada em 1966, por Serra Formigal e<br />

extinta nos idos de 1975. A Companhia Portuguesa de<br />

Ópera era uma escola de canto lírico,<br />

por onde passaram Hugo Casais,<br />

Zuleica e Elsa Saque, Álvaro Malta,<br />

Luís França ou Fernando Serafim.<br />

Na terça-feira, 27 de <strong>Novembro</strong>, no<br />

salão nobre, pelas 18 horas, evocaremos<br />

os 140 anos do Trindade, na<br />

dupla vertente do Teatro e da Ópera.<br />

Na sexta-feira, dia 30, pelas 21h30,<br />

inauguraremos o ano comemorativo<br />

dos 140 anos – 30 de <strong>Novembro</strong> de <strong>2<strong>00</strong>7</strong> a 29 de<br />

<strong>Novembro</strong> de 2<strong>00</strong>8 – com um concerto, pela Orquestra<br />

do Algarve, dirigida pelo maestro Cesário Costa, onde<br />

serão interpretadas obras de Francisco António de<br />

Almeida, Rossini e Mozart.<br />

Convidaremos para o Concerto dos 140 anos as mais<br />

altas figuras do Estado, da Universidade, da Cultura,<br />

das Artes e do Espectáculo, assim como os nossos associados,<br />

dos quais cerca de 1<strong>00</strong> mil constituem o público<br />

fiel do Trindade e das suas itinerâncias.


Em <strong>2<strong>00</strong>7</strong>/2<strong>00</strong>8 passarão pelo Trindade diversos projectos<br />

teatrais, operáticos e de investigação – dos quais<br />

destaco o Trindade com Música, de Manuel Ivo Cruz - o<br />

Concerto de Ano Novo, dedicado à memória operática<br />

da velha sala do Bairro Alto, bem como, principalmente,<br />

a reactivação da Companhia Portuguesa de Ópera,<br />

como marca do INATEL, sedeada no Trindade.<br />

Falando de números e excluindo orçamento de investimento<br />

de um edifício classificado e candidato a<br />

património cultural da humanidade, o Trindade custa<br />

ao INATEL cerca de 1,3 milhões de <strong>euros</strong> anuais, com a<br />

expressiva taxa de retorno de bilheteira de mais de 30%,<br />

o que demonstra a qualidade da sua programação e a<br />

fidelidade de 1<strong>00</strong> mil associados.<br />

Considerando a desejável urgência de obras de<br />

grande reabilitação do Trindade – na fachada e no interior<br />

–, no âmbito do plano de reabilitação da Baixa -<br />

Chiado e sua candidatura à UNESCO, arrisco a previsão,<br />

no próximo ano de 2<strong>00</strong>8, das obras na fachada, e,<br />

no subsequente de 2<strong>00</strong>9, do início da recuperação global<br />

do interior.<br />

Como presidente do INATEL e director do Trindade,<br />

considero correcta, para 2<strong>00</strong>8 e 2<strong>00</strong>9, uma programação<br />

matricial que inclua uma peça de teatro, de grande qua-<br />

lidade, se possível, de autor português, e uma ópera,<br />

igualmente de referência.<br />

Entre estes dois eixos programáticos anuais, o conteúdo<br />

respeitará a tradição do Trindade, como teatro das<br />

classes média e popular, privilegiando a exibição de<br />

operetas, zarzuelas, comédias, revistas, fados, cinema,<br />

etnografia e folclore, afirmando-se o palco da sala principal<br />

e o salão nobre como a montra cultural e a sala de<br />

exposições do INATEL, em Lisboa.<br />

As representações serão, sempre que possível, acompanhadas<br />

de exposições temáticas e tertúlias no teatrobar<br />

e nos espaços não cénicos, com especial destaque<br />

para o salão nobre.<br />

Com excepção dos convites institucionais, as estreias<br />

do Trindade terão um preço simbólico de bilheteira, destinado<br />

a ligar, mais profundamente, o INATEL às causas<br />

sociais do quotidiano do nosso país, como seja, na<br />

quadra do Natal, precisamente o NATAL das nossas crianças<br />

doentes ou carenciadas.<br />

FESTINATEL_<br />

No sábado, dia 1 de Dezembro, pelas 17 horas, integrada<br />

nas comemorações do dia da Restauração, realizar-<br />

Outubro <strong>2<strong>00</strong>7</strong> TempoLivre 5


Editorial<br />

Editorial<br />

se-á, no Trindade, o III FESTINATEL, em recinto fechado,<br />

o qual pretende, por um lado, encerrar, simbolicamente,<br />

a agenda cultural do INATEL em <strong>2<strong>00</strong>7</strong>, e, por<br />

outro, constituir a mostra da oferta cultural dos nossos<br />

CCD – Centros de Cultura e Desporto – no domínio da<br />

Cultura Tradicional Portuguesa – festimúsica, folcloríada<br />

e teatrália – e da Cultura Tradicional de Língua<br />

Portuguesa, com a participação de grupos provenientes<br />

dos países e regiões da Lusofonia.<br />

FUNDAÇÃO_<br />

No rigoroso cumprimento do calendário do Governo – que<br />

pretende que a externalização do INATEL constitua “case<br />

study” de sucesso da Reforma Administrativa – S. Exa. o<br />

Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, em entrevista<br />

ao Jornal de Negócios, de 15 de Outubro, anunciou<br />

que a Proposta de Lei do Orçamento de Estado para 2<strong>00</strong>8<br />

incluirá o pedido de autorização legislativa para a transformação<br />

do INATEL em fundação de utilidade pública – concretizando-se<br />

o regresso à cultura fundacional do binómio<br />

FNAT – INATEL – bem como para a definição do respectivo<br />

estatuto de isenções e benefícios fiscais.<br />

Considerando a necessidade, constitucional e estatutária,<br />

da audição, no âmbito do processo legislativo da<br />

futura fundação, das Regiões Autónomas, Movimento<br />

Sindical e órgãos próprios do INATEL, prevejo que o<br />

próximo Estatuto esteja promulgado e publicado no<br />

decurso do primeiro semestre do próximo ano de 2<strong>00</strong>8.<br />

IVA - REEMBOLSO_<br />

O INATEL entregou à Administração Fiscal o pedido de<br />

reembolso de 7 milhões de <strong>euros</strong> de IVA, o que, na última<br />

década, um sistema informático anacrónico nunca<br />

havia permitido.<br />

Espero, agora, que os serviços de fiscalização do IVA<br />

desencadeiem o subsequente procedimento de auditoria<br />

e certificação do pedido de reembolso, destinado à<br />

óbvia clarificação da situação fiscal do INATEL a 31 de<br />

Dezembro de <strong>2<strong>00</strong>7</strong>, no seu último ano de existência<br />

como instituto público.<br />

SISTEMA SAP_<br />

Com a consultadoria do INESC – Instituto Nacional de<br />

Engenharia de Sistemas e Computação, da Univer-<br />

6 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

sidade Técnica de Lisboa - e do INA – Instituto Nacional<br />

de Administração, da Presidência do Conselho de<br />

Ministros - e a participação activa dos respectivos presidentes<br />

- Prof. Doutor José Tribolet e eng<strong>º</strong> Afonso Lucas –<br />

o INATEL vem refundando o seu sistema de organização<br />

e informática, com introdução de uma cultura<br />

empresarial, tendente, em poucos anos, à desejável “no<br />

paper administration”, ou seja, à gestão com o mínimo<br />

possível de recurso à burocracia e ao suporte de papel.<br />

Este enorme salto tecnológico e de mentalidade pressupõe<br />

o paralelo investimento e esforço na formação e<br />

reciclagem massiva da comunidade de trabalho, cujo<br />

programa, para 2<strong>00</strong>8, se encontra na recta final de negociação<br />

com o INA.<br />

TRATADO DE LISBOA_<br />

Está de parabéns a terceira e, previsivelmente, última<br />

Presidência Portuguesa da União Europeia e a nossa<br />

Diplomacia pela grande competência, dignidade e<br />

sucesso com que decorreu a negociação do Tratado de<br />

Lisboa, o novo Tratado Constitucional ou Reformador.<br />

Portugal prova, mais uma vez, que o mais velho<br />

Estado-nação da Europa Ocidental pode constituir o<br />

interlocutor adequado à obtenção do consenso generalizado<br />

dos 27 para a definição da estrutura orgânica e<br />

competências da União Europeia alargada e em<br />

vésperas de novos alargamentos.<br />

Parece encerrada a crise constitucional da União<br />

Europeia, subsequente à rejeição, pelos referendos da<br />

França e da Holanda, do projecto de Tratado<br />

Constitucional de Valery Giscard d’ Estaing.<br />

Pessoalmente, penso que Portugal – como país desenvolvido<br />

– não tem qualquer futuro fora da União<br />

Europeia. A onze anos de distância, recordo e saúdo a<br />

coragem política e o sentido estratégico de Mário Soares,<br />

quando, em 1986, integrou Portugal, como membro de<br />

pleno direito, na então CEE – Comunidade Económica<br />

Europeia – contra o parecer da fina flor dos economistas<br />

e empresários do tempo.<br />

Considero, ainda, como cidadão, que a Europa constitui<br />

matéria essencial e incontornável do quotidiano e<br />

futuro dos portugueses - no, ainda muito jovem, século<br />

XXI – pelo que a agenda europeia – incluindo o Tratado<br />

de Lisboa – deve ser explicada, discutida e referendada<br />

pela Nação Portuguesa, na qual reside a soberania de<br />

Portugal. ■


Mouraria<br />

Cartas<br />

Sou utente assíduo há já alguns anos do Ginásio da<br />

Mouraria na modalidade de Ginástica de Manutenção<br />

(…), onde os professores são realmente muito competentes<br />

e as aulas muito bem orientadas, animadas e diversificadas.<br />

Também o responsável das Instalações revela ser muito<br />

zeloso por tudo quanto é património, burilando tudo<br />

com mil carinhos e saberes. É nesta vertente da imagem,<br />

que me é particularmente grato, realçar o quanto aquele<br />

funcionário se mostra exímio no arranjo e manutenção de<br />

todo o espaço e vegetação, resultando desse esforço um<br />

local aprazível de cor e arranjos, de facto bem conseguidos,<br />

para quem, como eu, o visita pelo menos duas vezes<br />

por semana. Não resisti e recolhi algumas imagens<br />

fotográficas para partilhar com todo o <strong>Inatel</strong>.<br />

Por último: é pena este espaço lindo, bem no coração de<br />

Lisboa, não tenha mais divulgação e adeptos.<br />

João Rosado, Lisboa<br />

Sócios há 50 anos<br />

Completaram, este mês, 50 anos de ligação ao <strong>Inatel</strong>, os<br />

associados: Alcibiades Rodrigues Silva, Porto; Vitor<br />

Manuel Raposo Filipe, Alcabideche; Francisco Santos<br />

Barbara, Queluz.<br />

A correspondência para estas secções deve ser enviada para<br />

a Redacção de “Tempo Livre”, Calçada de Sant’Ana, 180 - 1169-<br />

062 Lisboa, ou por e-mail: tl@inatel.pt<br />

[ Kalidás Barreto ]<br />

COLUNA DO PROVEDOR<br />

Estamos em <strong>Novembro</strong> e embora todos os dias devam ser de<br />

solidariedade para com os que são excluídos, para os que<br />

procuram os contentores para se manterem vivos, para os que<br />

querem ser gente e não os deixam ser, numa onda de entontecedor<br />

consumismo, a verdade é que se aproxima o Dezembro e<br />

a volúpia luxuriante da compra que faz esquecer os que têm a<br />

consoada do lixo. Não vos darei conselhos, mas creio que vale<br />

a pena parar para pensar. Para onde caminhamos? A sociedade<br />

egoísta passa ao lado dos sentimentos de fraternidade festejando<br />

natais sem amor. É pois com prazer que ouço os comentários<br />

dos nossos associados, elogiando o INATEL e a peça que<br />

desde Outubro enobrece o palco do Teatro da Trindade.<br />

Com efeito valorizar a atitude cívica e histórica de Aristides<br />

de Sousa Mendes, cônsul português em Bordéus que em<br />

Junho de 1940, contrariando as ordens do Governo português,<br />

permitiu a fuga de milhares de judeus salvando-os da<br />

perseguição nazi é algo de nobre, notável e heróico.<br />

Transcrevo do último número da revista: “As palavras de<br />

Aristides de Sousa Mendes na sua defesa perante as<br />

acusações de desobediência que lhe foram dirigidas pelo<br />

regime de Salazar são um dos momentos altos da peça, sublinha<br />

Rui Mendes. “Todos eles - lembrou, então, o cônsul ao<br />

referir-se aos milhares de perseguidos que ajudou - são seres<br />

humanos, e o seu estatuto na vida, religião ou cor são totalmente<br />

irrelevantes para mim. Além disso as cláusulas da<br />

Constituição do meu país relativas a casos como o presente<br />

dizem que em nenhuma circunstância a religião ou as convicções<br />

políticas de um estrangeiro, o impediriam de procurar<br />

refúgio no território português. Eu sou cristão, e como tal<br />

acredito que não devo deixar esses refugiados sucumbir. E,<br />

assim contra ordens que, em meu entender, são vis e injustas,<br />

declaro que darei, sem encargos, um visto a quem quer que o<br />

peça”. Condenado à inactividade, impedido de trabalhar,<br />

Sousa Mendes ficou arruinado e acabou os seus dias vivendo<br />

da caridade alheia. Morreu em 1954 e só foi reabilitado pelo<br />

Estado Português em 1987. É por estes exemplos que digo<br />

que vale a pena ser português; é por isso que continuo a<br />

acreditar que vale a pena lutar por um mundo mais justo,<br />

certo de que não haverá paz social enquanto não houver<br />

justiça social. ■<br />

Tel: 21<strong>00</strong>27197 Fax: 21<strong>00</strong>27179<br />

e-mail: provedor@inatel.pt<br />

<strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong> TempoLivre 7


Notícias<br />

Turismo Social: desafio e oportunidade<br />

● Realizou-se, entre 2 a 5 de<br />

Outubro, em Riva del Garda, no<br />

norte de Itália, o Fórum Europeu do<br />

Turismo Social, organizado pelo<br />

BITS (Bureau Internacional du<br />

Tourisme Social) de cujo conselho de<br />

administração o INATEL é membro.<br />

Subordinado ao tema “O turismo<br />

social: protagonista do<br />

desenvolvimento económico e social<br />

na Europa”, o referido Fórum partiu<br />

da constatação que o turismo, na<br />

Europa, constitui, ao mesmo tempo,<br />

um desafio e uma oportunidade.<br />

Um desafio porque quase 40% dos<br />

8 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

cidadãos europeus não vão de férias,<br />

principalmente por razões<br />

económicas. Uma oportunidade,<br />

porque o turismo social pode<br />

contribuir para uma melhor coesão<br />

social e para uma igualização de<br />

oportunidades e, também, para o<br />

desenvolvimento económico das<br />

regiões através da ocupação da<br />

indústria turística bem como para o<br />

desenvolvimento económico-social<br />

sustentado no interior da União<br />

Europeia.<br />

Presente no encontro com uma<br />

delegação chefiada pelo seu vicepresidente,<br />

Vítor Ventura, o INATEL<br />

participou no painel sobre “O<br />

Turismo Social face à construção<br />

europeia”, com um trabalho sobre a<br />

experiência portuguesa na<br />

organização dos programas sociais<br />

de Turismo Sénior e de Saúde e<br />

Termalismo Sénior, cujo lançamento<br />

e gestão o governo português, desde<br />

sempre, tem confiado ao Instituto.<br />

A Assembleia Geral da CSIT (Confederação Internacional de Desporto para<br />

Trabalhadores) aprovou em Riga (Letónia), no passado mês de Outubro, o calendário<br />

de actividades para 2<strong>00</strong>8, que prevê a realização do Festival CSIT em<br />

Rimini, Itália, no próximo Verão.<br />

“Eça agora”<br />

● Na apresentação do<br />

colectivo e divertido livro, “O<br />

Código D’Avintes”, (“ o prazer<br />

de escrever a catorze<br />

mãos…”), Alice Vieira, Luísa<br />

Beltrão, João Aguiar, José<br />

Jorge Letria, José Fanha,<br />

Mário Zambujal e Rosa<br />

Lobato Faria, foram<br />

confrontados com o bem<br />

humorado desafio de Solnado<br />

que esperava, daí a um ano,<br />

assistir ao lançamento de “Os<br />

Naias”. Os sete, mais a<br />

editora, levaram a coisa a sério<br />

e aí está “Eça agora” que, num<br />

registo entre o queirosiano e a<br />

telenovela, e inspirado no<br />

enredo de “Os Maias”, nos dá<br />

um retrato vivo, irónico e<br />

singular da sociedade<br />

portuguesa neste início do<br />

século XXI. Modestos, mas<br />

arrasadores, os sete<br />

confessam: “certamente o Eça<br />

escreveria melhor mas não<br />

diria pior…”


Gala Sénior<br />

<strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

● Cerca de nove centenas seniores<br />

estiveram presentes, no Salão Preto e<br />

Prata do Casino Estoril, em mais uma<br />

edição da Gala Sénior, iniciativa que<br />

assinala o encerramento dos<br />

programas Turismo Sénior, Saúde e<br />

Termalismo Sénior e “Portugal no<br />

Coração” de <strong>2<strong>00</strong>7</strong>.<br />

Alarcão Troni, Presidente do <strong>Inatel</strong>,<br />

deu as boas vindas os seniores,<br />

representantes de vários recantos do<br />

país, e evocou a primeira década de<br />

programas, realçando os objectivos<br />

que estão na génese da criação destes<br />

programas, nomeadamente o<br />

combate à solidão, desemprego e<br />

assimetrias regionais e a promoção da<br />

hotelaria, estâncias termais e<br />

património cultural e arquitectónico<br />

do país.<br />

A anteceder o jantar e o espectáculo<br />

“Four” em cena no Casino, foram<br />

ainda distinguidos os melhores<br />

prestadores de serviço dos programas<br />

Turismo Sénior e Saúde e Termalismo<br />

Sénior, casos do <strong>Inatel</strong> um lugar ao Sol<br />

(Caparica) e do Grande Hotel Lisboa<br />

(S. Pedro do Sul) na categoria de<br />

melhor hotel; Termas de Monfortinho;<br />

o restaurante regional “Café Luso”; os<br />

agrupamentos Gisela Duarte, Duo<br />

Exclusivo, Casa do Povo de Corroios,<br />

Rancho Folclórico Pindelo dos<br />

Milagres, Rancho Folclórico de Porto<br />

Santo e Tuna Regional de Orgens; as<br />

palestras de Bruno Gato (alimentação<br />

saudável) e Carlos Paredes (Termas);<br />

as animadoras Rosicler Araújo e Ana<br />

Maciel.<br />

Foram, ainda, entregues, na Gala, os<br />

prémios aos vencedores do concurso<br />

de texto e fotografia dos programas<br />

seniores. Na categoria de Texto, o 1<strong>º</strong><br />

lugar coube a Maria Luísa Coutinho, o<br />

2<strong>º</strong> a João José Silva e 3<strong>º</strong> a Maria Amélia<br />

Amaro Almeida.<br />

Na categoria fotografia, o vencedor foi<br />

José Manuel Sampaio. O 2<strong>º</strong> e 3<strong>º</strong> e<br />

premiados foram, respectivamente,<br />

Maria Helena Santos e Álvaro Soares<br />

Monteiro.<br />

Maria Luísa<br />

Coutinho,<br />

vencedora do<br />

concurso de texto,<br />

e João Paulo<br />

Duarte, das Termas<br />

de Monfortinho,<br />

recebem os<br />

respectivos<br />

galardões<br />

<strong>Novembro</strong> Abril 2<strong>00</strong>6 <strong>2<strong>00</strong>7</strong> TempoLivre 9


Notícias<br />

Dia da retina<br />

● A Associação de Retinopatia de<br />

Portugal (ARP) assinalou o Dia da<br />

Retina, no passado dia 30 de<br />

Setembro, com inúmeras iniciativas<br />

de sensibilização e rastreios à<br />

Degenerescência Macular da Idade<br />

(DMI). Cinha Jardim e Luís<br />

Represas apadrinharam o evento<br />

que contou com Workshops de<br />

esclarecimento sobre a doença,<br />

aulas de ginástica e alguns<br />

momentos lúdicos.<br />

Recorde-se que a Degenerescência<br />

Macular da Idade (DMI) é a<br />

primeira causa de cegueira na<br />

“Évora, cidade do Automóvel Antigo”<br />

● O Diário do Sul e a Rádio<br />

Telefonia do Alentejo promovem nos<br />

próximos dias 17 e 18 de <strong>Novembro</strong><br />

a maior concentração de Motos e<br />

Automóveis Clássicos e Antigos da<br />

Península Ibérica e o “Circuito das<br />

Humor contra a discriminação<br />

● A exposição europeia de cartoon<br />

“Desigualdades, Discriminações e<br />

Preconceitos”, inaugurada em<br />

Outubro último pelo Ministro do<br />

Trabalho e da Solidariedade Social,<br />

Vieira da Silva, continua patente ao<br />

público, no átrio da Estação do<br />

Vieira da Silva entrega prémio a Ludo Goderis<br />

10 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

população acima dos 55 anos de<br />

idade e atinge, em Portugal, cerca<br />

de 3<strong>00</strong> mil pessoas, com mais de<br />

três mil novos doentes/ano.<br />

Muralhas”. A concentração irá reunir<br />

um grande número de viaturas que<br />

ficarão expostas em parque fechado<br />

e de forma a poderem ser apreciadas<br />

pelo público em geral, no Rossio de<br />

São Brás em Évora.<br />

Rossio, até 21 do corrente.<br />

Promovido pelo Instituto Nacional<br />

para a Reabilitação (INR) e Museu<br />

Nacional da Imprensa, no âmbito<br />

do “Ano Europeu da Igualdade de<br />

Oportunidades para Todos – Por<br />

uma Sociedade Justa”, o concurso e<br />

dirigiu-se exclusivamente a<br />

cartunistas europeus.<br />

Composta por cerca de 2<strong>00</strong><br />

desenhos, a mostra apresenta os<br />

premiados, as menções honrosas e<br />

os melhores trabalhos do Concurso<br />

Europeu de Cartoon sobre aquele<br />

tema. O vencedor foi Ludo Goderis<br />

(Bélgica), seguido de NAPO<br />

(França) e Musa Gumus (Turquia).<br />

“Coimbra vista<br />

por Miguel Torga”<br />

O Salão Teatro do INATEL em<br />

Coimbra vai ser palco, no<br />

próximo dia 24 de <strong>Novembro</strong><br />

de um espectáculo de<br />

homenagem a um dos<br />

grandes escritores<br />

portugueses de sempre. Sob o<br />

título “Coimbra vista por<br />

Miguel Torga”, o espectáculo -<br />

inserido nas comemorações<br />

do centenário do nascimento<br />

de Torga – terá a participação<br />

do grupo Quatro Elementos<br />

(José Santos Paulo – Tenor;<br />

Álvaro Aroso - Guitarra<br />

Portuguesa; Eduardo Aroso -<br />

Viola de Acompanhamento;<br />

José Carlos Teixeira - Baixo<br />

Acústico, do Choral<br />

Poliphónico de Coimbra<br />

dirigido pelo maestro Paulo<br />

Moniz, de um momento de<br />

dança contemporânea por<br />

Cláudia Afonso e<br />

Andreia Morado, além da<br />

participação de Teresa Ferreira<br />

e Augusto França na narração<br />

e declamação.


«A Desobediência» no Trindade<br />

● Na sala principal do Trindade continua em cena, até<br />

25 do corrente, a peça “A Desobediência”, de Luiz<br />

Francisco Rebello. A estreia da peça, encenada por Rui<br />

Mendes, sobre a figura do heróico diplomata português<br />

Aristides de Sousa Mendes, durante a ocupação de<br />

França pelo exército nazi, contou com a presença de<br />

numerosas individualidades e gente do teatro, casos,<br />

entre outros de, de Maria Barroso, José Miguel Júdice,<br />

Ruy Seabra, Serra Formigal, Maria Elisa, José Ruy,<br />

Augusto Portela, Carlos Fragateiro, José Manuel<br />

Castanheira, Luís Esparteiro, Vítor de Sousa, Joel<br />

Branco e familiares do ex-cônsul de Bordéus.<br />

III Congresso Ibérico de Termalismo<br />

● Turismo de saúde e bem-estar, saúde e medicina termal,<br />

boas práticas dos balneários termais, gestão e protecção da<br />

água mineral natural, foram alguns dos temas em foco no<br />

III Congresso Ibérico de Termalismo, que decorreu no<br />

Hotel Palácio do Estoril, em Outubro último.<br />

Organizado pela Associação das Termas de Portugal,<br />

com o apoio do <strong>Inatel</strong>, o congresso reuniu vários<br />

especialistas nacionais e estrangeiros, e muitas<br />

individualidades ligadas ao turismo e à exploração de<br />

balneários termais em Portugal, Espanha e Alemanha.<br />

No congresso para além das questões relacionadas com<br />

saúde, tratamentos, alimentação e beleza foi,<br />

igualmente abordado a importância da qualidade e<br />

certificação das estâncias termais por especialistas<br />

espanhóis e alemães, que apresentaram casos concretos<br />

sobre esta prática nos seus países.<br />

José Alarcão Troni, presidente de honra do congresso,<br />

salientou na sua comunicação “Turismo e Termalismo<br />

Social”, a importância do termalismo como “nova forma de<br />

encarar o lazer, respeitando o património ambiental e<br />

cultural”. O presidente do <strong>Inatel</strong> lembrou, a propósito, o<br />

Maria Barroso,<br />

presidente da<br />

Fundação Pro<br />

Dignitate, e Luiz<br />

Francisco Rebello,<br />

autor da peça, não<br />

faltaram à estreia<br />

de “A Desobediência”<br />

êxito dos programas seniores geridos pelo Instituto,<br />

encarados por franceses e italianos como casos de sucesso<br />

a ter em conta para os respectivos países. Alarcão Troni<br />

deu conta ainda do alargamento ao termalismo do<br />

protocolo luso-espanhol de turismo sénior. A futura<br />

instalação de spas nos centros de férias de Albufeira, S.<br />

Pedro do Sul e Caparica foi outra das novidades avançadas<br />

pelo presidente do <strong>Inatel</strong>.<br />

Abril 2<strong>00</strong>6 TempoLivre 11


[ 1 ]<br />

[ 1 ] Gracília Correia,<br />

Senhora da Hora<br />

Sócio n.<strong>º</strong> 122180<br />

[ 2 ] Paulo Amado,<br />

S. João da Madeira<br />

Sócio n.<strong>º</strong> 393614<br />

[ 3 ] Fernando Ledo,<br />

Viana do Castelo<br />

Sócio n.<strong>º</strong> 349141<br />

Menções Honrosas<br />

[ a ] João Vasco,<br />

Massamá<br />

Sócio n.<strong>º</strong> 434109<br />

[ b ] Mário Pereira,<br />

Granjas Novas<br />

Sócio n.<strong>º</strong> 278204<br />

[ c ] Fernando<br />

Máximo, Avis<br />

Sócio n.<strong>º</strong> 435473<br />

[ a ] [ b ]<br />

[ c ]


[2]<br />

[3]<br />

REGULAMENTO<br />

1. Concurso Nacional de Fotografia da<br />

revista Tempo Livre. Periodicidade<br />

mensal. Podem participar todos os<br />

sócios do <strong>Inatel</strong>, excluindo os seus funcionários<br />

e os elementos da redacção e<br />

colaboradores da revista Tempo Livre.<br />

2. Enviar as fotos para: Revista Tempo<br />

Livre - Concurso de Fotografia, Calçada<br />

de Sant’Ana, 180 - 1169-062 Lisboa.<br />

3. A data limite para a recepção dos trabalhos<br />

é o dia 10 de cada mês.<br />

4. O tema é livre e cada concorrente<br />

pode enviar, mensalmente, um máximo<br />

de 3 fotografias de formato mínimo de<br />

10x15 cm e máximo de 18x24 cm., em<br />

papel, cor ou preto e branco, sem qualquer<br />

suporte.<br />

5. Não são aceites diapositivos e as<br />

fotos concorrentes não serão devolvidas.<br />

6. O concurso é limitado aos sócios do<br />

<strong>Inatel</strong>. Todas as fotos devem ser assinaladas<br />

no verso com o nome do autor,<br />

direcção, telefone e número de associado<br />

do <strong>Inatel</strong>.<br />

7. A Tempo Livre publicará, em cada<br />

mês, as seis melhores fotos (três premiadas<br />

e três menções honrosas), seleccionadas<br />

entre as enviadas no prazo<br />

previsto.<br />

8. Não serão seleccionadas, no mesmo<br />

ano, as fotos de um concorrente premiado<br />

nesse ano<br />

9. Prémios: cada uma das três fotos<br />

seleccionadas terá como prémio um fim<br />

de semana (duas noites) para duas pessoas<br />

num dos Centros de Férias do<br />

<strong>Inatel</strong>, durante a época baixa, em<br />

regime APA (alojamento e pequeno<br />

almoço). O premiado(a) deve contactar<br />

a redacção da «TL»<br />

10. Grande Prémio Anual: uma viagem<br />

a escolher na Brochura <strong>Inatel</strong> Turismo<br />

Social até ao montante de 1750 Euros. A<br />

este prémio, a publicar na revista<br />

Tempo Livre de Setembro de 2<strong>00</strong>8, concorrem<br />

todas as fotos premiadas e publicadas<br />

nos meses em que decorre o<br />

concurso.<br />

11. O júri será composto por dois<br />

responsáveis da revista Tempo Livre e<br />

por um fotógrafo de reconhecido<br />

prestígio.


TERRA NOSSA<br />

BELMONTE<br />

O último refúgio dos Judeus<br />

Do terraço do castelo medieval, varanda privilegiada para sentir<br />

o ambiente local, Belmonte parece uma mancha de casas<br />

de pedra aninhada como uma concha ao longo da encosta<br />

do Monte da Esperança.<br />

A PAISAGEM é surpreendente:<br />

aos pés da fortaleza, emerge uma<br />

atmosfera de outro tempo evocada<br />

pela pequenez e simplicidade das<br />

capelas de São Tiago, Santo António<br />

e Calvário e do Panteão dos<br />

Cabrais, onde repousa o túmulo de<br />

Pedro Álvares Cabral; ao fundo, já<br />

no limite do perímetro da vila, vislumbram-se<br />

as casinhas de piso<br />

térreo da Antiga Judiaria, sinais da<br />

presença secular dos judeus; a noroeste<br />

sobressai a muralha natural<br />

da Serra da Estrela, com o vale do<br />

Vista do Vale do Zêzere<br />

14 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

Zêzere alongando-se repleto de<br />

sementeiras; e a leste, em direcção a<br />

Espanha, espraia-se uma interminável<br />

terra acidentada e deserta,<br />

outrora palco de guerras com Leão<br />

e Castela.<br />

Belmonte deriva da palavra latina<br />

belli-monti, que significa montes de<br />

guerra. O castelo, com a sua impressionante<br />

Torre de Menagem e<br />

as suas altas muralhas, é ainda hoje<br />

um símbolo da política de contenção<br />

dos invasores e repovoamento<br />

da linha fronteiriça desen-<br />

volvida nos reinados de D. Afonso<br />

III, D. Dinis e D. João I. Com uma<br />

localização privilegiada para a vigilância<br />

do território, esta fortificação<br />

acabou por ser uma peça<br />

avançada da defesa do território,<br />

residência e centro da organização<br />

administrativa, político e judicial.<br />

Fernão Cabral I, primeiro alcaidemor<br />

do castelo e pai de Pedro<br />

Álvares Cabral, foi o mentor da<br />

adaptação do castelo em área residencial,<br />

uma inovação que ficaria<br />

conhecida como o Paço dos Cabrais<br />

e do qual não restam praticamente<br />

vestígios. No exterior do castelo,<br />

uma cruz de madeira de Pau Santo<br />

cravada na rocha, réplica daquela<br />

que Pedro Álvares Cabral mandou<br />

levantar na primeira missa celebrada<br />

no Brasil, evoca a descoberta do<br />

Brasil, em 15<strong>00</strong>.<br />

Como não podia deixar de ser,<br />

Belmonte tem também uma estátua<br />

de Pedro Álvares Cabral, nascido<br />

nesta terra em 1467, mas este não é o<br />

sinal mais visível do antigo poder da<br />

família Cabral. Em pleno centro da<br />

vila, sobressai a imponência de dois<br />

edifícios dos Cabrais: o Solar, cujo<br />

brazão em mármore se destaca entre<br />

as obras de remodelação para aqui


Pormenor do centro de Belmonte e, em baixo, vista do castelo e da sua impressionante torre de menagem


TERRA NOSSA<br />

Em cima: Tulha dos Cabrais e o Panteão dos Cabrais. Em baixo: vista da antiga judiaria e da nova sinagoga, estátua de Pedro Álvares<br />

Cabral e igrejas de Sto. António e Calvário vistas do castelo<br />

GUIA<br />

A NÃO PERDER<br />

Zona do Castelo<br />

Em escassas centenas de<br />

metros, concentram-se<br />

alguns dos monumentos<br />

mais importantes de<br />

Belmonte: castelo, Igreja de<br />

São Tiago, do século XIII,<br />

Panteão dos Cabrais e<br />

Capela de Santo António,<br />

ambos do século XV, e<br />

Capela do Calvário, do<br />

século XIX.<br />

Tulha<br />

O antigo armazém dos pro-<br />

16 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

dutos agrícolas e rendas<br />

rurais da família Cabral<br />

acolhe hoje o Ecomuseu do<br />

Zêzere. No interior deste<br />

edifício maciço, construído<br />

no século XVIII, faz-se uma<br />

viagem pelo rio Zêzere na<br />

perspectiva do património<br />

natural e cultural, privilegiando-se<br />

a fauna, flora,<br />

uso do solo e povoamento.<br />

Museu Judaico<br />

Inaugurado em 2<strong>00</strong>5, ilustra<br />

a história da comunidade<br />

judaica na região. É<br />

o primeiro museu do<br />

género em Portugal. E tem<br />

mais de uma centena de<br />

peças originais da Idade<br />

Média até ao século XX.<br />

COMER<br />

● Pousada do Convento,<br />

Tel.: 275 910 3<strong>00</strong><br />

● Restaurante Hotel Belsol,<br />

Quinta do Rio, Tel.: 275 912<br />

206<br />

DORMIR<br />

● Hotel Belsol, Quinta do<br />

Rio, Tel.: 275.912.206,<br />

www.hotelbelsol.com<br />

● Pousada do Convento<br />

de Belmonte,<br />

Tel.: 75.910.3<strong>00</strong><br />

CONTACTOS<br />

● Posto de Turismo, Praça<br />

da República, Tef./Fax.: 275<br />

911 488<br />

● Museu Judaico, Rua da<br />

Portela, n<strong>º</strong>4, Tel.: 275 913<br />

505 (Encerra: segundafeira,<br />

1<strong>º</strong> de Maio, 25 de<br />

Dezembro e 1 de Janeiro)


Edifício da Biblioteca Municipal,<br />

antiga Câmara Municipal,<br />

e vista da rua principal de Belmonte<br />

instalar o Museu dos Descobrimentos,<br />

e a Tulha, uma casa maciça<br />

onde eram guardadas as rendas<br />

anuais dos produtos agrícolas.<br />

As ruas de Belmonte deslizam<br />

contorcidas em direcção ao Vale do<br />

Zêzere. O casario de paredes de<br />

pedra predomina numa paisagem<br />

urbana pontuada, aqui e ali, de<br />

fachadas coloridas e varandas de<br />

ferro forjado. É na zona baixa da<br />

vila, um bairro vincado de ruelas e<br />

casinhas de piso térreo chamado<br />

Marrocos, que emergem os vestígios<br />

mais visíveis da presença secular<br />

da comunidade judaica. Era<br />

aqui a Antiga Judiaria.<br />

Ao longo das ruas da Fonte da<br />

Rosa, onde foi construída a Nova<br />

Sinagoga, do Olival e do Inverno as<br />

ombreiras das portas conservam<br />

ainda cruzes gravadas na pedra,<br />

indicação de que estas casas acolheram<br />

Cristãos-Novos. Quando D.<br />

Manuel I impôs aos judeus portugueses,<br />

em 1496, a conversão forçada<br />

ao cristianismo ou o exílio, Belmonte<br />

tornou-se um refúgio para a<br />

comunidade judaica. Por causa da<br />

perseguição da Inquisição, instituída<br />

em 1536, os Cristãos-Novos,<br />

como não podiam professar a sua<br />

religião publicamente, praticaram<br />

em segredo as tradições e costumes<br />

judaicos.<br />

O segredo desta comunidade<br />

criptojudaica só foi revelado em<br />

1925, com a publicação do estudo<br />

“Os Cristãos-Novos em Portugal no<br />

Século XX”, da autoria do judeu<br />

polaco Samuel Schwarz. Hoje, mais<br />

de 5<strong>00</strong> anos após a conversão forçada<br />

ao cristianismo, a comunidade<br />

judaica de Belmonte reúne ainda<br />

cerca de 150 pessoas, tem constituição<br />

legal desde 1988, conta com um<br />

rabi para as cerimónias principais, e<br />

dispõe de uma Nova Sinagoga,<br />

inaugurada em 1996, de um cemitério<br />

e de um museu próprios. E o<br />

museu, apesar de ter apenas dois<br />

anos de existência, é já uma das principais<br />

atracções turísticas da vila: por<br />

ano, recebe em média 15 mil visitantes,<br />

em especial americanos, canadianos<br />

e israelitas. ■<br />

António Sérgio Azenha [texto e fotos]<br />

<strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong> TempoLivre 17


PORTUGAL NA EUROPA<br />

A primeira voz portuguesa<br />

Os relatos de milagres e as lendas tecidas à sua volta quase ocultam,<br />

aos olhos do grande público, a figura e a estatura de Santo António de<br />

Lisboa — que é também, como se sabe, Santo António de Pádua:<br />

aquele que pregava aos peixes perto de Rimini e os peixes vinham à<br />

tona de água para o ouvir; o santinho casamenteiro e que nos ajuda a<br />

encontrar objectos perdidos se lhe rezarmos o responso apropriado.<br />

O MESMO que, cerca de quinhentos<br />

anos após a sua morte, assentou<br />

praça no Regimento de Infantaria 19<br />

(Cascais), no Regimento de Infantaria<br />

2 (Lagos), no Regimento de<br />

Infantaria 13 (Peniche), no corpo de<br />

fuzileiros de Moçambique e também<br />

na Índia e ainda nas milícias de<br />

Pernambuco, Brasil, sendo que passou<br />

por vários postos: de soldado a<br />

tenente-coronel em Portugal e a general<br />

no Brasil. Enfim, o mesmo que<br />

anda com o Menino Jesus ao colo.<br />

Tudo isso é tradicional, simpático,<br />

e, em muitos casos, mesmo, enternecedor.<br />

Mas, como referimos,<br />

toda essa «carga» quase esconde a<br />

verdadeira estatura do homem que<br />

é ainda hoje o segundo nome mais<br />

ilustre da ordem franciscana, logo a<br />

seguir ao próprio São Francisco de<br />

Assis; o homem que foi um dos<br />

maiores pregadores europeus e,<br />

verdadeiramente, a primeira voz<br />

portuguesa a fazer-se ouvir nos púlpitos<br />

da Europa e em escolas como<br />

as de Toulouse, Montpellier e Bolonha;<br />

o homem que a Santa Sé canonizou<br />

menos de um ano depois da<br />

sua morte, o que é — passe o termo<br />

— um verdadeiro recorde.<br />

Santo António nasceu em Lisboa,<br />

bem perto da Sé, por volta de 1190,<br />

18 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

em pleno reinado de D. Sancho I:<br />

Portugal, como reino independente,<br />

estava, portanto, no início, sob o<br />

governo do seu segundo rei. O<br />

nome que recebeu no baptismo foi<br />

Fernando de Bulhões — a lenda<br />

apressar-se-á a arranjar-lhe antepassados<br />

ilustres, uma casa real pelo<br />

lado da mãe e Godofredo de Bouillon<br />

pelo do pai… coisa de somenos:<br />

ele próprio virá a ter importância<br />

suficiente para dispensar pergaminhos<br />

nebulosos.<br />

A Sé tinha uma escola, onde<br />

Fernando aprendeu as primeiras<br />

letras e estudou Gramática e Artes.<br />

A vocação religiosa manifestou-se<br />

muito cedo: pelos quinze anos,<br />

entrou na comunidade dos cónegos<br />

regrantes de Santo Agostinho, em<br />

São Vicente de Fora. Mas o jovem<br />

Fernando não era apenas um devoto<br />

e um místico, também tinha sede<br />

de leituras e de saber, por isso não<br />

tardou a transferir-se para o mosteiro<br />

de Santa Cruz de Coimbra.<br />

MÍSTICA E ACÇÃO<br />

É importante, para nós, compreender<br />

que Santa Cruz, com a sua riquíssima<br />

biblioteca, foi a grande escola<br />

de Fernando de Bulhões, onde<br />

ele recebeu a maior parte da sua formação.<br />

Segundo parece, terá sido<br />

ordenado sacerdote em 1220, ainda<br />

naquele mosteiro; mas já então<br />

entrara nele aquilo a que poderemos<br />

chamar de «febre apostólica».<br />

De facto, este homem tem um carácter<br />

contraditório: místico, dado à<br />

oração e à meditação, é também um<br />

verdadeiro activista, ansioso por<br />

lutar, realizar, converter. Ora, três<br />

anos antes de ser ordenado, em<br />

1217, começam a passar por Santa<br />

Cruz grupos de franciscanos lançados<br />

na senda da pregação e da conversão<br />

de gentios… Fernando sente-se<br />

atraído e impressionado; sobretudo,<br />

com um grupo que em<br />

1219 se dirige a Marrocos, pronto a<br />

converter os muçulmanos à fé


Igreja de Sto. António, em Lisboa<br />

cristã. Menos de um ano depois,<br />

voltam ao mosteiro os entusiastas<br />

missionários — melhor, os seus<br />

ossos: são os santos mártires de<br />

Marrocos.<br />

Era um desafio ao seu ardor apostólico.<br />

No ano seguinte, Fernando<br />

pedia admissão na ordem franciscana,<br />

tomava o nome de António e,<br />

à primeira oportunidade, embarcava<br />

para o norte de África. Mas,<br />

pouco após a chegada, as febres<br />

atacaram-no. Teve de render-se,<br />

tomou um navio de regresso à<br />

pátria. Só que uma tempestade<br />

levou a embarcação até à Itália — e<br />

essa tempestade foi providencial,<br />

pois assim começou a «carreira<br />

europeia» do futuro santo. Em 1221,<br />

assistiu ao Capítulo Geral da Ordem,<br />

convocado por São Francisco<br />

de Assis no regresso da sua viagem<br />

ao Egipto; e o ambiente ali vivido<br />

impressionou-o profundamente.<br />

Foi esse, talvez, o motivo pelo qual<br />

se recolheu ao eremitério de<br />

Montepaolo, para se entregar à<br />

meditação.<br />

No entanto, o retiro não vai durar<br />

muito tempo: em breve um grupo<br />

de noviços se desloca a Forli para<br />

receber a ordenação. Frei António<br />

acompanha-os e calha que seja ele a<br />

fazer-lhes a homilia…<br />

O PODER DO VERBO<br />

Essa pregação é decisiva, porque<br />

toda a assistência fica maravilhada,<br />

empolgada, com o poder oratório<br />

de Frei António. Não tarda que São<br />

Francisco lhe confie a missão de<br />

ensinar Teologia aos outros irmãos.<br />

Em Bolonha, São Francisco ouve-o<br />

e fica impressionado com os seus<br />

conhecimentos e a força do seu<br />

verbo. António passa a França; ensina,<br />

como já foi referido, em Toulouse<br />

e Montpellier, mas também<br />

em Limoges. Ataca as heresias; contesta,<br />

sobretudo, os cátaros. Dãolhe<br />

as missões mais difíceis. Mais<br />

uma vez, afirma a sua vocação de<br />

«místico activo», de meditante e<br />

lutador.<br />

São Francisco de Assis morre em<br />

1226; António volta a Itália, para<br />

participar no Capítulo Geral que<br />

elege o sucessor. Este, Frei João<br />

Parente — que, segundo a tradição,<br />

lhe vestira o hábito franciscano,<br />

anos antes, em Portugal —, mandao<br />

para a Lombardia, como dirigente<br />

e pregador.<br />

E assim passam os derradeiros<br />

anos de António, que acaba a sua<br />

vida em Pádua, a 13 de Junho de<br />

1231. Cerca de onze meses mais<br />

tarde, o Papa Gregório IX assinará a<br />

bula de canonização. Resta ainda<br />

lembrar que, em 1946, Pio XII<br />

proclamou Santo António Doutor<br />

da Igreja.<br />

Resta, também, recordar que a<br />

veneração de que ele é alvo não se<br />

limita, obviamente, à Europa cristã.<br />

Em todo o mundo, milhões de<br />

crentes o invocam — ou como Santo<br />

António de Pádua ou como<br />

Santo António de Lisboa. Foi (é) as<br />

duas coisas; mas, para nós, foi<br />

acima de tudo o primeiro português<br />

a colocar a sua «marca» na<br />

Europa — e da melhor forma, já<br />

que (aceitemo-lo para além das<br />

nossas convicções pessoais) o fez no<br />

domínio da cultura e do espírito. ■<br />

João Aguiar<br />

<strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong> TempoLivre 19


TERMAS EM PORTUGAL [7]<br />

Os bons ares de<br />

CARVALHELHOS<br />

No sopé de um castro pré-romano classificado e envoltas pelo<br />

conjunto montanhoso do Barroso, as Caldas Santas de Carvalhelhos<br />

propiciam ao visitante quietude e bons ares, a que não é alheio o<br />

notável parque, recanto de frescura, cor, som e perfumes característicos<br />

de um lugar pleno de tranquilidade.<br />

20 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong>


EM CARVALHELHOS, abundam os<br />

indícios da presença Celta, o que nos<br />

leva a crer que as propriedades<br />

destas águas já seriam conhecidas<br />

destes povos. Em 1830, este local era<br />

frequentado por um grande número<br />

de pessoas, que o apelidaram de<br />

«Caldas Santas». Em 1915, foi dado o<br />

Alvará para a exploração oficial das<br />

nascentes, e as águas engarrafadas e<br />

«engarrafonadas» por processos<br />

primitivos começaram a vender-se<br />

no país e a ser exportadas para o<br />

antigo Ultramar, Brasil e para a<br />

Venezuela, tal como foram enviadas<br />

para o Corpo Expedicionário Português<br />

durante a Grande Guerra. Em<br />

1941, constituiu-se a Empresa<br />

Caldas Santas de<br />

Carvalhelhos, que adquiriu<br />

os direitos da concessão,<br />

iniciando-se o<br />

processo de modernização<br />

das instalações de<br />

engarrafamento, sendo<br />

que, em 1961, as primeiras<br />

máquinas manuais<br />

foram substituídas<br />

por uma linha automática<br />

e, no ano seguinte, foi<br />

remodelada a primeira<br />

unidade de oficina. Entre<br />

1967 e 1972, entraram em<br />

funcionamento, respectivamente,<br />

uma segunda e terceira linhas<br />

de engarrafamento e de gaseificação.<br />

Este avanço nos processos de<br />

engarrafamento e comercialização<br />

da água foi acompanhado pela modernização<br />

das instalações balneares,<br />

a partir dos anos 70. Alguns projectos<br />

não tiveram concretização em<br />

obra, mas a construção do actual balneário<br />

permitiu melhorar as condições<br />

de tratamento das doenças da<br />

pele e dos aparelhos digestivo e circulatório,<br />

graças aos elementos hiposalinos<br />

e hipotérmicos das águas, o<br />

Pormenor do Balneário<br />

bicarbonato, o sódio, o flúor e a sílica.<br />

Se as águas do seu balneário são<br />

pródigas em fazer bem, ao serem<br />

administradas, à semelhança de um<br />

medicamento, numa aplicação íntima<br />

que afecta directamente a concepção<br />

e experiência dos corpos,<br />

também os sentidos são activados<br />

pela ambiência natural, que evoca<br />

sensações. Os aquistas usufruem de<br />

um parque frondoso de grande<br />

interesse botânico e paisagístico,<br />

onde predominam as espécies autóctones<br />

– como o Carvalho Roble, o<br />

Carvalho Negral e o Castanheiro –<br />

dispostas nas plataformas do terreno,<br />

serpenteadas por levadas de<br />

água que refrescam o ambiente e<br />

estimulam os sentidos de quem está<br />

e de quem passa.<br />

É um local de virtudes, tendo os<br />

ingredientes necessários e complementares<br />

aos efeitos objectivos medicinais<br />

da água. Este recurso natural<br />

é, aliás, uma das imagens de marca<br />

do concelho de Boticas.<br />

Para além das termas, existe um<br />

número considerável de moinhos:<br />

uns, azenhas de roda vertical de<br />

propulsão superior e rodízios; outros,<br />

moinhos de roda horizontal.<br />

Ambos foram fundamentais para<br />

uma economia associada à moagem<br />

intensiva do centeio das casas rurais.<br />

Numa região em que ainda predomina<br />

a actividade de carácter agropastoril<br />

e o autoconsumo, a implantação<br />

da propriedade e do investimento<br />

industrial deu-se muito escassamente.<br />

Na zona de Carvalhelhos,<br />

de pequena altitude e mais povoada,<br />

os moinhos existem em grande<br />

número e dispersos ao longo das linhas<br />

de água que asseguram os caudais<br />

necessários ao seu funcionamento<br />

e são, presentemente, um<br />

bom motivo de contacto do turista<br />

com um património cada vez mais<br />

raro em Portugal, mas que neste concelho<br />

existe em quantidade<br />

apreciável.<br />

Para além deste valor<br />

cultural, o aquista pode<br />

apreciar os produtos<br />

gastronómicos da região.<br />

Se, nesta altura do<br />

ano, está a pensar em<br />

deslocar-se a Carvalhelhos,<br />

não perca a Feira<br />

do Mel de Barroso e da<br />

Carne Barrosã, onde<br />

estes dois produtos, de<br />

qualidade genuína e de<br />

Origem Protegida, estão<br />

em particular destaque.<br />

Descubra ainda a singular<br />

Rede de Tabernas do Alto<br />

Tâmega, onde se come e bebe junto<br />

das tradições mais ricas. Bem características<br />

são a Cozinha da Eugénia<br />

e a Taberna do Tio João, ambas em<br />

Carvalhelhos. Aqui, não se trata das<br />

águas que curam, mas há uma qualquer<br />

semelhança entre o repasto e a<br />

espiritualidade das «águas santas»,<br />

porque em ambas existem energias<br />

benéficas com efeitos positivos,<br />

desde que tomados com considerada<br />

moderação. ■<br />

Jorge Mangorrinha<br />

Helena Gonçalves Pinto<br />

<strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong> TempoLivre 21


A CASA NA ÁRVORE | SUSANA NEVES<br />

A árvore do totem<br />

No Parque da Pena, em Sintra, há uma árvore que ninguém resiste fotografar:<br />

é uma Thuja Plicata gigante, cujas pernadas da base do tronco invadem o chão<br />

e depois fazendo cotovelo elevam-se vários metros no ar.<br />

Importada da costa oeste da América do Norte,<br />

por volta de <strong>187</strong>0, esta conífera centenária – à<br />

semelhança de outros espécimes exóticos, distribuídos<br />

pelos oitenta e cinco hectares do Parque<br />

– foi trazida para Portugal por desejo de D. Fernando II<br />

(1819-1885) e sua segunda esposa, a jovem cantora lírica<br />

Elise Hensler, Condessa D`Edla (1836-1929).<br />

Sobrevivente do violento ciclone de Fevereiro de<br />

1941, tal como o majestoso Eucalyptus Obliqua (plantado<br />

no dia do controverso casamento, a 10 de Junho de<br />

1869), esta Thuja Plicata não perdeu os ramos inferiores,<br />

como aconteceria no seu habitat natural, nem foi<br />

podada de forma a garantir o protagonismo do tronco<br />

central. Na realidade, graças a esta circunstância – bastante<br />

criticada nos anos 60, por Mário Azevedo Gomes,<br />

neto da Condessa e professor catedrático jubilado de<br />

silvicultura do Instituto Superior de Agronomia – a<br />

árvore ganhou em aparato o que perderia na sua<br />

“forma específica”, próxima dos estudos dendrológicos.<br />

Dir-se-ia que as árvores, tal como as pessoas, quanto<br />

mais excêntricas melhor.<br />

Apesar dos cerca de 137 anos e das suas admiráveis<br />

proporções, a Thuja Plicata – localizada junto à Feteira<br />

da Condessa, com vista sobre a Fonte dos Passarinhos –<br />

é ainda relativamente pequena, comparada com os<br />

exemplares que Thomas Pakenham fotografou, no<br />

Lago Quinault e em Kalaloch, no Estado de<br />

Washington. Segundo o autor de “A Volta ao Mundo em<br />

80 Árvores” (Le Tour du Monde en 80 Arbres, Éditions<br />

du Chêne, 2<strong>00</strong>2), se o primeiro espécime americano<br />

pesa cerca de 5<strong>00</strong> toneladas, no tronco do segundo é<br />

possível entrarem várias pessoas.<br />

Não tendo qualquer fissura, a Thuja Plicata do<br />

Parque da Pena (com uma altura superior a 30 metros)<br />

apresenta, no entanto, um aspecto igualmente possante,<br />

benéfico, alienígena e associativo, ou não fosse<br />

ela potencialmente um totem.<br />

Conhecida entre os índios da costa ocidental da<br />

América do Norte, de onde é nativa, por Western Red<br />

Cedar ou Arbore vitae (assim a designam os<br />

Kakawaka`wakw) esta árvore é a matéria prima na qual<br />

28 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

os totens são esculpidos, veículo da comunicação com os<br />

espíritos dos antepassados e os animais que os protegeram.<br />

Emblema de grupo, colorido ou não, o totem<br />

atrai a comunidade festivamente, podendo a sua elevação<br />

ser acompanhada de um potlach, ou seja a cerimónia<br />

de dádiva e desperdício de bens acumulados.<br />

Segundo a sabedoria dos índios da América do Norte,<br />

mesmo sem ser transformada em totem, a Thuja Plicata<br />

emana um poder espiritual tão forte que é transmissível<br />

desde que alguém a ela se encoste. A designação de<br />

Arbore vitae ou árvore da vida tem ainda um significa-


do iminentemente prático, uma vez que era o pilar da<br />

sobrevivência tribal. Com a sua madeira construíam-se<br />

cabanas, canoas, máscaras e lanças, com a sua casca<br />

faziam-se adornos cerimoniais para o cabelo, vestuário<br />

e utensílios domésticos, com as suas folhas e raízes e<br />

sementes fabricavam-se remédios contra a tuberculose,<br />

doenças de fígado, escorbuto e febre.<br />

Por estas razões, o respeito e a conservação dos<br />

gigantes arbóreos da floresta exigiam todas as diligências:<br />

por exemplo, nenhuma mulher subiria a uma<br />

Thuja Plicata para a colheita da casca, sem antes<br />

D. Fernando II<br />

(1819-1885) e sua<br />

segunda esposa, a<br />

jovem cantora lírica<br />

Elise Hensler,<br />

Condessa D`Edla<br />

(1836-1929)<br />

realizar uma cerimónia propiciadora, e caso fossem<br />

necessárias apenas algumas tábuas para fazer uma casa<br />

seriam retiradas do tronco sem abater a árvore.<br />

À plantação das várias thujas em Sintra – em 1886, há<br />

notícia de “dúzias”, pertencentes às espécies aurea,<br />

dumosa, plicata, occidentalis, etc – não deve ter sido<br />

alheia a influência do cunhado da Condessa D`Edla, o<br />

silvicultor americano John Slade, casado com a sua irmã<br />

Mina Louise.<br />

As particularidades do longo namoro entre D.<br />

Fernando II e a futura Condessa D`Edla (o<br />

título é-lhe conferido no casamento) faziam<br />

adivinhar a expansão do projecto florestal de<br />

Sintra, iniciado pelo rei consorte, no tempo de D. Maria<br />

II. É que, no jardim da sua casa de solteira – onde ainda<br />

hoje, a partir da rua se avista uma árvore de grande<br />

porte – ela e o rei-artista (é reconhecido o seu talento de<br />

barítono e gravador, além de ter sido também coleccionador<br />

e mecenas de arte) já se dedicavam a várias<br />

experiências botânicas. “Muitos annos residiu a amante<br />

de D. Fernando no prédio, n<strong>º</strong> 68, da Rua dos Remédios,<br />

à Lapa (...) Depois do casamento dos infantes, o viúvo<br />

rei passava dias e noites inteiras com Madame Hensler.<br />

Cuidavam ambos do jardim, onde se cultivavam plantas<br />

exóticas e raras (...)”, relata Maximo Estrella, na obra<br />

“O Perfil da Condessa D`Edla – Madrasta D`El Rei D.<br />

Luís I”, Lisboa, 1886.<br />

Numa cidade avessa às árvores, como bem observou<br />

Baudelaire de visita pela Capital, que felicidade para D.<br />

Fernando II (de origem austríaca) encontrar uma<br />

estrangeira cosmopolita (nascera na Suíça mas iniciara<br />

a carreira artística nos Estados Unidos) que além de<br />

artista partilhasse a mesma paixão pela natureza.<br />

Que lhe importavam as más línguas, ou a censura do<br />

filho rei, D. Pedro V, quando este lhe abria a porta de<br />

madrugada, não fossem os criados perceber as horas a<br />

que recolhia sua majestade. Do Paço das Necessidades<br />

até à Lapa todos caminhos iam dar à Rua dos<br />

Remédios. E sem a teimosia destes encontros, o Parque<br />

da Pena seria certamente bem diferente do que é. ■<br />

<strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong> TempoLivre 29


PORTUGAL E A LUSOFONIA | PEDRO CID<br />

Contra a pena de morte<br />

A abolição de pena de morte em todo o mundo é um dos objectivos do Governo<br />

de Portugal, neste segundo semestre de <strong>2<strong>00</strong>7</strong>, em que desempenha a Presidência<br />

da União Europeia.<br />

Inscrever essa meta nos objectivos da<br />

presidência portuguesa tem uma forte carga<br />

simbólica, que importa salientar, ou não<br />

tenha sido Portugal o primeiro país da<br />

Europa, e um dos primeiros do mundo a abolir a<br />

pena capital, no último período do séc. XIX, já lá<br />

vai mais de um século.<br />

Adicionalmente, vale a pena referir que em<br />

todos os países de expressão portuguesa, nunca<br />

vigorou a pena de morte o que também é motivo<br />

de orgulho para todos os cidadãos lusófonos.<br />

Em pleno século XXI, que é muito mais do que<br />

do que o ciclo de luzes (que os nossos antepassados<br />

históricos vislumbraram há trezentos anos),<br />

graças aos avassaladores progressos das novas<br />

Tecnologias, em todas as áreas do conhecimento<br />

humano, fazer uma campanha contra a pena de<br />

morte, parece uma ideia bizarra e uma postura<br />

desadequada. Só o não é pela crueza dos factos: A<br />

pena de morte existe e é ainda uma prática habitual,<br />

quer em países onde há um défice em relação<br />

aos direitos humanos, como em países que são<br />

democracias estabilizadas e onde se defende, no<br />

discurso político e com toda a veemência, a liberdade<br />

e o progresso.<br />

A aplicação e administração da Justiça é uma<br />

obrigação dos Estados organizados, sendo dever<br />

dos cidadãos cumprir as leis. Uma justiça célere,<br />

atempada e acessível a todos os cidadãos, e não<br />

apenas àqueles com maior poder económico, é<br />

igualmente um imperativo das sociedades e constitui,<br />

aliás, um calcanhar de Aquiles em Estados<br />

onde ela é lenta, cara e muitas vezes inacessível a<br />

todos.<br />

A aplicação da justiça é um tema decisivo nas<br />

sociedade contemporânea, e por isso mesmo no<br />

espaço que tem na língua portuguesa o principal<br />

instrumento comum de comunicação. O direito<br />

penal vive em constante evolução, num debate<br />

nunca acabado em relação aos direitos e garantias,<br />

quer daqueles que são vítimas, quer dos prevaricadores,<br />

cuja inocência se presume até ao trânsito<br />

30 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

em julgado de uma condenação. Muitos defendem<br />

que há excessos de garantias para os presumíveis<br />

criminosos e criticam as malhas largas<br />

que as leis lhes facultam, para fugir às suas responsabilidades.<br />

Acriminalidade assumiu, a nível global – e<br />

vivemos um tempo cada vez mais intenso<br />

da globalização - uma dimensão<br />

nunca antes vista, com implicações<br />

gravosas para os Estados e para os cidadãos. É por<br />

isso, ou também por isso, que a aplicação da pena<br />

de morte ainda persiste e contra a qual se torna<br />

imperativo continuar a lutar para que ela deixe de<br />

figurar como último recurso na aplicação da<br />

justiça. Na desorientação em que por muito lado<br />

anda a aplicação da justiça, é tentador pensar que<br />

a pena de morte é um poderoso meio preventivo<br />

contra a criminalidade. Mas é incontroverso que<br />

temos de unir esforços para fazer com que ela seja<br />

abolida em todo o mundo. Por isso andou bem a<br />

Presidência portuguesa ao inscrever nos seus<br />

propósitos a abolição da pena de morte. ■


O TEMPO E O MUNDO | DUARTE IVO CRUZ<br />

Três temas da UE.PT<br />

Trata-se da Presidência Portuguesa da União Europeia. Nesta época de novos<br />

e maravilhosos meios de comunicação escrita, a sigla tem razão de ser...<br />

Eos temas são o boicote da Polónia à iniciativa contra<br />

a pena de morte, a cimeira Portugal - África e o já<br />

chamado Tratado de Lisboa. Relativamente aos dois<br />

últimos, vale a imponderabilidade da própria periodicidade<br />

da revista. E constata-se que retomamos aqui assuntos<br />

e matérias que já têm sido versados em artigos próprios ou<br />

alheios, nas páginas da TL. Não perdem actualidade, tenham<br />

ou não ocorrido já.<br />

Ocorreu já, a comemoração, digamos assim, da política<br />

1. concertada de abolição da pena de morte. Mas como<br />

sabemos, houve que a deslocar do âmbito da UE para o<br />

âmbito do Conselho da Europa por “imposição” da Polónia.<br />

Mau sinal, mas sobretudo sinal insólito de uma política de<br />

desconfiança do actual Governo de Varsóvia face ao contexto<br />

comunitário. Reconhece-se a situação histórica e a conjuntura<br />

política da Polónia, que tem razões seculares para desconfiar<br />

dos vizinhos, tem razões, as mais honrosas, para afirmar<br />

a sua soberania e actua no estrito plano da legalidade comunitária<br />

- mas a verdade é que são cada vez mais difíceis as<br />

relações no âmbito de uma politica comunitária comum livremente<br />

aceite por Varsóvia, que aderiu espontaneamente e<br />

obviamente não vai sair...<br />

Diga-se que o problema é de somenos, mas não deixa de<br />

constituir, repita-se, mais uma sinalização de dificuldades que<br />

poderão surgir em assuntos substanciais. Cabe evidentemente<br />

a cada Estado Membro definir a sua política, mas o<br />

compromisso europeu implica adequações à política comum.<br />

Até parece ridículo escrevê-lo! Mas é assunto que será, à<br />

frente, retomado e em planos mais complexos e mais institucionais.<br />

Ainda por cima, e tal como João Aguiar recorda na<br />

ultima edição da TL, Portugal tem o formidável mérito<br />

histórico da primazia europeia na abolição da pena de morte:<br />

O que valeu o elogio de Vitor Hugo: “A Europa imitará<br />

Portugal”. A Polónia que tanto sofreu ao longo dos séculos e<br />

não aplica a pena de morte, precisaria de criar este pequeno<br />

mas altamente simbólico entrave?<br />

O PM português, no exercício da Presidência da UE, o<br />

2. Presidente da Comissão Europeia, que como sabemos é<br />

antigo PM português, e o Alto Comissário das Nações Unidas<br />

para os Refugiados, que como sabemos, é também antigo PM<br />

Português, manifestam-se categoricamente no sentido da con-<br />

veniência da realização da Cimeira UE - África prevista para<br />

Lisboa em Dezembro próximo. A referência, perfeitamente<br />

redundante, a nacionalidades, cargos e currículos, acima<br />

feita, serve para enfatizar o altíssimo nível e o prestígio pessoal,<br />

mas também nacional, da politica externa portuguesa.<br />

E o assunto assume maior destaque no plano das relações<br />

com África. Curiosamente, o trauma de termos sido o ultimo<br />

país a descolonizar, nas condições que se sabem e na sequencia<br />

de uma guerra que bem se conhece, não prejudica o papel<br />

histórico e politico da diplomacia portuguesa em muito mais<br />

países do que os cinco PALOPS: em parte porque, sobretudo<br />

na África a Sul do Sahará, a presença histórica e efectiva de<br />

Portugal e de portugueses, comerciantes, agricultores ou<br />

quadros superiores, é ainda hoje muito significativa.<br />

Ora bem: dos 27 Estados membros da UE, destaca-se neste<br />

contexto o Reino Unido, pelo seu contencioso directo e bilateral<br />

com o Zimbabwe, país com o qual, aliás, Portugal mantém<br />

relações diplomáticas a nível de Embaixador residente,<br />

justificadas inclusive pela presença de uma importante comunidade<br />

portuguesa. Ninguém de bom senso dirá que a<br />

posição do Governo de Londres é despicienda, ou que lhe faltam<br />

razões, que as tem e profundas. Mas se a UE for” seleccionar”<br />

os seus interlocutores africanos, ou de outras partes do<br />

mundo, em termos de abordagem global, teria muito que<br />

fazer... inclusive o Reino Unido, que mantém relações politicas<br />

e económicas com Países também muito pouco<br />

recomendáveis. É muito incómoda a presença de certos dirigentes,<br />

e é lamentável a ausência de outros, mas a UE tem<br />

uma politica própria e global, que Portugal, na Presidência terá<br />

de gerir em termos diplomáticos. E, tal como escreveu Pedro<br />

Cid na última edição da TL, a cimeira não pode ser uma oportunidade<br />

perdida.<br />

E finalmente o Tratado de Lisboa. Neste momento, nada<br />

3. podemos acrescentar par além das boas perspectivas da<br />

sua celebração no quadro da Presidência Portuguesa e, novamente,<br />

haverá que ponderar as razões de alguns Estados<br />

membros, nos quais se inclui novamente a Polónia, que de<br />

facto tem sido um parceiro agitado! É prematuro acrescentar<br />

nesta fase seja o que for, mas torna-se cada vez mais óbvia a<br />

necessidade de bom senso e sentido comunitário europeu, o<br />

que representa cedências de cada um dos Estados Membros,<br />

mas também respeito pela soberania de cada um deles.■<br />

<strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong> TempoLivre 31


VIAGENS NA HISTÓRIA | JOÃO AGUIAR<br />

A teimosia<br />

Desta vez, para realizarmos convenientemente a nossa viagem na História,<br />

seria preciso seguir o exemplo de Santo António ao produzir o milagre<br />

da ubiquidade — difícil, porque nenhum de nós é santo.<br />

Ou seja, teríamos de fazer várias viagens<br />

ao mesmo tempo. Para simplificar, proponho<br />

somente três incursões no passado,<br />

a primeira das quais a Massangano,<br />

no século XVII.<br />

Massangano fica na margem direita do rio Cuanza,<br />

em Angola. Tem uma inegável importância na história<br />

colonial, porque foi palco de vários combates. Mas o<br />

que interessa, aqui, é o período que vai de 1641 a 1648.<br />

Durante esses sete anos,<br />

Luanda esteve em poder dos<br />

holandeses, que passaram,<br />

na prática, a dominar Angola<br />

— mas não a totalidade do<br />

território: as autoridades portuguesas<br />

foram entrincheirar-se<br />

em Massangano, que<br />

se tornou a capital portuguesa<br />

de Angola. Em 1648, Salvador<br />

Correia de Sá expulsou<br />

os holandeses de Luanda e<br />

os portugueses de Massangano<br />

foram finalmente socorridos.<br />

Esta crónica não é um hino de louvor ao colonialismo<br />

(português ou holandês); mas a História não é<br />

alterável. O que quero salientar, aqui, é a furiosa persistência<br />

(a teimosia!) com que os portugueses se<br />

agarraram àquela praça empoleirada sobre o Cuanza.<br />

No princípio dos anos 70 (século XX, claro), visitei<br />

Massangano; e, mesmo então, a vista das ruínas —<br />

igreja, fortaleza, tribunal, enfim, os edifícios de uma<br />

administração reduzida mas decida a funcionar —<br />

era impressionante. Como puderam resistir naquela<br />

solidão, militarmente acossados de todas as partes e<br />

sujeitos às febres que levaram muitos deles? Que<br />

teimosia foi aquela?<br />

Segunda viagem: será breve, porque já me referi ao<br />

assunto em crónica anterior: o segundo cerco de Diu,<br />

em 1546. Durou seis meses e quando D. João de<br />

Castro pôde finalmente intervir e libertar a praça, já<br />

esta não era muito mais que uma grande ruína, mas<br />

32 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

onde ainda se combatia. De fins de Abril a <strong>Novembro</strong><br />

de 1546, os sitiados, homens e mulheres, combateram<br />

com raiva. Recusaram as propostas de rendição com<br />

honra, que lhes permitiriam partir levando os seus<br />

haveres. Não podemos, hoje, imaginar o que terão<br />

sido aqueles seis meses na fortaleza de Diu. Uma vez<br />

mais: teimosia!<br />

E a terceira viagem vai mais longe no tempo e é mais<br />

vasta no espaço: refiro-me a toda a história da implantação<br />

portuguesa no<br />

Oriente. Um historiador inglês<br />

bem conhecido, o Prof.<br />

Charles Boxer, dá-nos uma<br />

perspectiva de estrangeiro,<br />

que é sempre bom ter em<br />

conta quando é honesta (como<br />

é o caso), mesmo se por<br />

vezes algo incorrecta ou<br />

injusta. No seu livro «O<br />

Império Marítimo Português»,<br />

Boxer faz notar, com<br />

justeza, que se fala muito<br />

das conquistas portuguesas no Oriente, mas que fala<br />

pouco das várias tentativas falhadas que antecederam<br />

essas conquistas. E comenta, em substância, que os<br />

portugueses mostraram uma enorme tenacidade, uma<br />

enorme determinação (uma enorme teimosia!) na<br />

construção do seu império marítimo.<br />

Como o leitor compreendeu, era à teimosia<br />

que eu queria chegar com estas viagens.<br />

Ponhamos de lado as possíveis motivações<br />

e as explicações — bravura, força espiritual,<br />

sede de riquezas e de poder, ardor religioso,<br />

ganância, tudo isso esteve presente em proporções<br />

diversas, mas não é, aqui, o meu tema. O meu tema é<br />

a persistência, a coragem da teimosia que os portugueses<br />

mostraram em vários momentos da sua<br />

história, e não só nestes que acabo de referir. Como<br />

país e como povo, somos um caso de teimosia.<br />

E que falta ela nos faz, hoje…! ■


BOAVIDA<br />

CONSUMO<br />

Até que ponto os<br />

produtos biológicos vão<br />

de encontro às<br />

expectativas e<br />

preocupações dos<br />

consumidores?<br />

Pág. 34<br />

MÚSICAS<br />

Dois cd’s a reter: as<br />

melhores<br />

interpretações de Maria<br />

Callas e a banda<br />

original de “Fados”, de<br />

Carlos Saura.<br />

Pág. 39<br />

FILMES MEMÓRIA<br />

Saudavelmente<br />

polémico, o filme Fados<br />

é um mergulho<br />

apetecível na nossa<br />

secular e enevoada<br />

identidade<br />

Pág. 43<br />

INFORMÁTICA<br />

Tal como as<br />

capacidades trazidas<br />

pelo digital, os<br />

elementos à nossa<br />

disposição não param<br />

de se aperfeiçoar para<br />

melhoria da foto digital.<br />

Pág. 46<br />

LIVRO ABERTO<br />

Dois livros sobressaem:<br />

“Ler Como um<br />

Escritor”, de Francine<br />

Rose, e “Manual de<br />

Escrita Criativa II”, de<br />

Luís Carmelo.<br />

Pág. 36<br />

NO PALCO<br />

Em destaque: “Contos<br />

da Emigração”, na<br />

Barraca, e “Sweeney<br />

Todd”, no Teatro Aberto,<br />

em co-produção com o<br />

Teatro Nacional<br />

D.Maria II.<br />

Pág. 40<br />

À MESA<br />

São muitos os milhares<br />

de Portugueses com<br />

dificuldade em juntar<br />

dinheiro para preparar<br />

uma refeição de<br />

qualidade.<br />

Pág. 44<br />

AO VOLANTE<br />

Construtor envolvido na<br />

defesa do ambiente, a<br />

Peugeot fez a redução<br />

das emissões de gases<br />

com efeito estufa uma<br />

prioridade.<br />

Pág. 47<br />

ARTES<br />

Atenção, até 20 de<br />

<strong>Novembro</strong>, na Valbom,<br />

a uma exposição de<br />

João Vieira, uma<br />

referência da pintura<br />

portuguesa<br />

contemporânea<br />

Pág. 38<br />

CINEMA EM CASA<br />

Propostas para<br />

<strong>Novembro</strong>: “Ocean´s<br />

13” e “Zodiac”, para o<br />

grande público, e<br />

“Ararat” e “Para<br />

Sempre Mozart”, para<br />

cinéfilos mais atentos.<br />

Pág. 42<br />

SAÚDE<br />

De todas as<br />

localizações da zona,<br />

as que de longe podem<br />

ser mais perigosas são<br />

as que afectam a pele<br />

da face, junto aos olhos<br />

e ouvidos.<br />

Pág. 45<br />

PALAVRAS DA LEI<br />

A lei não atribui a<br />

natureza de parte<br />

comum apenas ao que,<br />

imperativamente, é<br />

descrito no artigo 1421<strong>º</strong><br />

do Código Civil.<br />

Pág. 48<br />

<strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong> TempoLivre 33


BOAVIDA<br />

Consumo<br />

Produtos biológicos<br />

Um número crescente de consumidores opta pelos produtos de agricultura biológica. Questões de<br />

saúde, ambientais e alimentares estão na base desta preferência, mas até que ponto estes produtos vão<br />

de encontro às expectativas e preocupações dos consumidores?<br />

Carlos Barbosa de Oliveira<br />

Asegurança alimentar é<br />

uma das questões que,<br />

nesta primeira década do<br />

século XXI, coloca mais<br />

questões e levanta maiores problemas<br />

aos consumidores.<br />

Compreende-se que assim seja,<br />

porque a alimentação é a base da<br />

saúde e a indústria alimentar esconde<br />

ainda uma série de práticas, segredos<br />

e detalhes, cujos efeitos na<br />

saúde dos consumidores se desconhecem.<br />

O registo de alguns “incidentes” na<br />

cadeia alimentar ocorridos durante<br />

as duas últimas décadas tem também<br />

contribuído para agravar o sentimento<br />

da insegurança dos consumidores<br />

em relação ao que comem, o que<br />

resulta numa maior sensibilização<br />

das pessoas para as questões nutricionais.<br />

Simultaneamente, tem-se<br />

assistido a uma crescente procura,<br />

por parte dos consumidores, de produtos<br />

biológicos, considerados mais<br />

saudáveis e amigos do ambiente.<br />

A agricultura biológica distinguese<br />

de outros métodos de produção<br />

agrícola por manter – e até melhorar<br />

- a fertilidade e a actividade biológica<br />

dos solos através de práticas não<br />

poluentes. Uma vez que respeita os<br />

mecanismos ambientais de controlo<br />

de pragas e doenças e evita o uso de<br />

pesticidas sintéticos, herbicidas e fertilizantes<br />

químicos, hormonas de<br />

crescimento, antibióticos e manipulações<br />

genéticas, os seus efeitos estendem-se<br />

à pecuária, onde é dada<br />

particular atenção ao bem estar dos<br />

animais e à sua alimentação, que é<br />

feita na maioria das situações, essen-<br />

cialmente à base de produtos da<br />

própria exploração agrícola.<br />

Continuam a existir, porém, alguns<br />

obstáculos à comercialização e fidelização<br />

dos consumidores a estes produtos,<br />

que passo a enunciar.<br />

Ao contrário do que já acontece em<br />

muitos países europeus, a venda de<br />

produtos de origem biológica, nas<br />

grandes superfícies, tem uma dimensão<br />

quase irrisória em Portugal, não<br />

indo, aparentemente, ao encontro<br />

dos desejos e preocupações de quem<br />

os pretende adquirir. Os locais onde<br />

é possível encontrar maior variedade<br />

de produtos de venda são normalmente<br />

pouco convidativos para a<br />

maioria dos consumidores, que prefere<br />

fazer as suas compras naquelas<br />

catedrais do consumo cheias de<br />

arrebiques modernaços, onde as pessoas<br />

se acotovelam em amplas<br />

artérias com nomes soando a paraísos<br />

tropicais, ornamentadas de<br />

árvores cheirando a plástico, onde<br />

repousam pássaros de cântico electrónico,<br />

ao desafio com o rumorejar<br />

de fontes virtuais. Os consumidores<br />

não estão, na generalidade, abertos<br />

a fazer o esforço adicional de se<br />

deslocarem às lojas especializadas<br />

ou às cooperativas de produtores<br />

para aí comprarem os produtos<br />

biológicos, nem habituados<br />

a deslocar-se a mercados<br />

regulares em espaço aberto –<br />

como é o caso do que regularmente<br />

se realiza no Príncipe Real em Lisboa.<br />

Frequentemente, os consumidores<br />

declaram não optar pelos produtos<br />

biológicos por serem caros. O preço<br />

34 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong> ilustração: André Letria


dos produtos biológicos (por vezes<br />

elevado se o compararmos, por<br />

exemplo, com refeições preparadas,<br />

alimentos précozinhados ou congelados)<br />

resulta do próprio modo de<br />

produção - custos com a certificação<br />

e mãodeobra adicional - e da extensão<br />

do circuito de distribuição, uma<br />

vez que os produtos biológicos passam<br />

por vários intermediários,<br />

desde os produtores até aos retalhistas,<br />

já que existe uma considerável<br />

dispersão geográfica dos produtores<br />

e é reduzida a expressão da quantidade<br />

produzida/transformada de<br />

produtos biológicos. Neste contexto,<br />

a implementação de circuitos de distribuição<br />

mais curtos (do produtor<br />

ao retalhista ou do produtor à central<br />

de compras do retalhista), permitirá<br />

reduzir, e muito, os preços dos<br />

produtos biológicos junto do consumidor<br />

final.<br />

Existe ainda outro obstáculo a<br />

ultrapassar, que se prende com o<br />

processo de certificação dos produtores.<br />

O problema tem sido ultrapassado<br />

através da venda directa a particulares<br />

de produtos ainda não certificados,<br />

mas cuja qualidade é assegurada<br />

por um técnico que acompanha<br />

a actividade dos produtores<br />

que estão em fase de conversão.<br />

Torna-se fundamental estimular os<br />

produtores, derrubando as barreiras<br />

do processo moroso de certificação e<br />

ajudá-los a escoar os seus produtos.<br />

Finalmente, a utilização abusiva<br />

por parte de várias marcas de produtos<br />

alimentares de termos como “<br />

bio”, ou “eco”, na denominação dos<br />

seus produtos - que não correspondi-<br />

am a qualquer propriedade biológica,<br />

mas eram apenas um engodo comercial<br />

- gerou grande confusão junto<br />

dos consumidores. A legislação<br />

europeia, aprovada em Julho, veio<br />

pôr alguma ordem e ajudar os consumidores<br />

a reconhecer este tipo de<br />

alimentos com mais fiabilidade, ao<br />

impor regras mais claras e transparentes<br />

na rotulagem e publicidade dos<br />

produtos provenientes da agricultura<br />

biológica. Para além de determinar<br />

que só os produtos que contenham,<br />

no mínimo, 95% de ingredientes<br />

biológicos poderão exibir o logotipo<br />

comunitário que os avaliza como<br />

sendo de facto biológicos, a legislação<br />

impõe a obrigatoriedade de indicação<br />

do local de produção e proíbe a utilização<br />

de organismo geneticamente<br />

modificados (OGM). ■


BOAVIDA<br />

Livro aberto<br />

Escrita Criativa, Shakespeare,<br />

Garcia Marquez e Aquilino<br />

É cada vez maior o número de pessoas que se interessam pelo universo da escrita criativa, por certo<br />

com o propósito de virem a tornar-se elas próprias escritoras e, em, muitos casos, de fazerem dessa<br />

actividade um modo de vida.<br />

José Jorge Letria<br />

Pessoalmente, nunca acreditei<br />

que estes cursos<br />

dessem talento a quem o<br />

não tem ou que transformassem<br />

em escritores pessoas com<br />

muito mais jeito para a agricultura<br />

ou para a enfermagem. No entanto,<br />

deve ser reconhecido que existem<br />

regras, princípios e métodos que,<br />

sendo ensinados por quem sabe e<br />

ilustrados com os exemplos certos,<br />

podem contribuir para que os interessados<br />

passem a escrever melhor<br />

e, sobretudo, a respeitar regras basilares<br />

e estruturantes. Quanto ao<br />

estilo, isso depois passa a ser assunto<br />

de cada um, já que mal andará<br />

quem na escrita criativa pretender<br />

moldar o estilo de quem ali está<br />

para aprender.<br />

Vêm estas considerações a propósito<br />

da edição recente de dois<br />

livros de qualidade para quem se<br />

interessa por esta matéria: “Ler<br />

Como um Escritor”, de Francine<br />

Rose, com a chancela da Casa das<br />

Letras, e “Manual de Escrita Criativa<br />

II”, de Luís Carmelo, com a<br />

chancela de Publicações Europa-<br />

América. No primeiro, uma professora<br />

da Universidade de Harvard<br />

familiariza-nos com os os truques e<br />

os tiques de estilo de alguns dos<br />

maiores escritores de sempre, fornecendo<br />

pistas fundamentais e elementos<br />

de referência para os atentos<br />

aprendizes da escrita criativa.<br />

36 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

No segundo, estamos perante o<br />

segundo volume de uma obra de<br />

grande fôlego e rigor académico<br />

assinada por um escritor com obra<br />

narrativa de qualidade e com um<br />

assinalável percurso de docência<br />

universitária. Portanto, para quem<br />

está interessado em saber como se<br />

escreve, para quem se escreve e de<br />

que modo se escreve, aqui ficam<br />

duas sugestões a ter em conta.<br />

“ATLAS DAS NUVENS”, de David<br />

Mitchell, da Dom Quixote, é um<br />

dos grandes livros de ficção publicados<br />

nos últimos anos a nível<br />

mundial. O autor viveu no Japão e<br />

reside agora na Irlanda, tendo este<br />

sido o seu quarto romance. Já muito<br />

premiado, citado e discutido, “Atlas<br />

das Nuvens” foi integrado na lista<br />

dos 1<strong>00</strong>1 melhores livros de todos<br />

os tempos, tendo sido finalista do<br />

prestigiante Booker Prize.<br />

APOSTA FORTE e de grande qualidade<br />

da Teorema é “Shakespeare –<br />

A Biografia”, do consgrado biógrafo<br />

Peter Akroyd. Estamos em presença<br />

de uma obra biográfica luminosa e<br />

de grande fôlego, que nos faz<br />

acreditar que Shakespeare existiu<br />

mesmo e que foi tão genial como<br />

reconhecemos que foi. Um livro<br />

que se lê como se de uma grande<br />

obra romanesca se tratasse, pois é<br />

escrito com um estilo brilhante e<br />

uma pujança narrativa inultrapassáveis.<br />

A não perder. Da mesma<br />

editora é o delicioso “Novas Aventuras<br />

do Menino Nicolau”, volume<br />

três, da dupla Goscinny e Sempé.<br />

Ainda com a chancela da Teorema e<br />

a reter pela qualidade são os seguintes<br />

títulos: “Angus – o Deus<br />

Celta do Amor e dos Sonhos”, de<br />

Alexander MacCall Smith, apeça de<br />

teatro “Pedro I”, de Manuel Poppe<br />

e o surpreendente e cativante exercício<br />

sobre a literatura que dá pelo<br />

título de “O Último Leitor”, obra de<br />

Ricardo Piglia, um argentino nascido<br />

em 1940 e há muito com créditos<br />

firmados.<br />

A Campo das Letras acaba de editar<br />

a obra-prima de Ruben Fonseca<br />

“A Grande Arte”, obra de referência<br />

da ficção brasileira das últimas<br />

décadas, e o ensaio “A Minha TV É<br />

um Mundo”, de Sara Pereira, sobre


a programação para crianças na era<br />

do ecrã global. Por seu turno, a Dom<br />

Quixote acaba de lançar “A Revoada”,<br />

o primeiro romance de Gabriel<br />

Garcia Marques, texto que evidencia<br />

as qualidades únicas que viriam<br />

a consagrar e a universalizar o grande<br />

escritor colombiano.<br />

Fernão Mendes Pinto é, sem dúvida,<br />

uma das figuras mais fascinantes<br />

da História e da literatura<br />

portuguesas, pela forma como deu<br />

testemunho do que foi o lado antiheróico<br />

da gesta descobridora e<br />

imperial. Por isso, deverá dizer-se<br />

que o livro “Fernão Mendes Pinto –<br />

um Aventureiro Português no Extremo<br />

Oriente”, do jornalista e<br />

investigador Fernando António<br />

Almeida, com a chancela da Câmara<br />

Municipal de Almada, é, pelo seu<br />

rigor analítico e narrativo, uma obra<br />

de leitura obrigatória para quem<br />

quiser, com o detalhe possível e não<br />

especulativo, conhecer o homem e o<br />

autor que escreveu “Peregrinação”<br />

no Pragal, mesmo do outro lado de<br />

Lisboa, numa quinta em que encontrou<br />

recolhimento e sossego para<br />

pensar e escrever. A não perder.<br />

No ano da comemoração do centenário<br />

do nascimento de Miguel<br />

Torga, mais dois oportunos lançamentos,<br />

com a chancela da Dom<br />

Quixote: “Vindima” e “O Senhor<br />

Ventura”, obras marcantes na bibliografia<br />

do escritor, tendo a segundo<br />

sido já adaptada ao cinema.<br />

“O RESTO É SILÊNCIO”, da Oficina<br />

do Livro, representa a oportunidade<br />

de o leitor português conhecer um<br />

dos maiores escritores latino-americanos<br />

do século XX. Refiro-me a<br />

Augusto Monterroso, distinguido<br />

com os prestigiados prémios Juan<br />

Rulfo e Príncipe das Astúrias. Nascido<br />

na Guatemala em 1921, Monterroso<br />

foi considerado o mestre<br />

absoluto do conto mínimo, por<br />

dominar com inexcedível mestria a<br />

técnica dos relatos breves. Este livro,<br />

no entanto, contém uma narrativa<br />

de maior fôlego. Nele se conta,<br />

através de testemunhos vários, a<br />

história de Eduardo Blas, cidadão<br />

de San Blas. Estamos em presença<br />

de uma verdadeira obra-prima da<br />

narrativa contemporânea. Merecedora,<br />

por todas as razões, da atenção<br />

e do interesse dos estudantes de<br />

escrita criativa e de todos os restantes<br />

leitores. A não perder.<br />

Também da Oficina do Livro e na<br />

onda das séries de televisão sobre<br />

médicos e hospitais, é “Serviço e<br />

Urgência”, de Conceição Queiroz, um<br />

conseguido trabalho de reportagem<br />

sobre esse mundo em que a cada hora<br />

se vive a experiência dos limites.<br />

ENTRE AS OBRAS de ficção narrativa<br />

portuguesas e estrangeiras<br />

recentemente lançadas contam-se:<br />

“Castelos de Cartão”(Dom Quixote),<br />

da espanhola Almudena Grande,<br />

“Em Silêncio Amor”, de Luís Soares,<br />

e “A Imperfeição do Mestre”, de<br />

Joaquim Mestre, ambos da Oficina<br />

do Livro, “Canário”, do mediático<br />

Rodrigo Guedes de Carvalho, pivot<br />

dos telejornais da SIC, “Ressurreição<br />

– O Evangelho Perdido”, de<br />

Tucker Malarkey, de Publicações<br />

Europa-América, e o breve e excelente<br />

“Requiem Por um Camponês<br />

Espanhol”, do espanhol Ramón J.<br />

Sender, um dos grandes narradores<br />

da Espanha contemporânea. Para<br />

quem gosta de livros sobre cães,<br />

recomenda-se “Copper-uma Vida<br />

de Cão”, de Annabel Goldsmith, em<br />

que um cão de sociedade narra na<br />

primeira pessoa as suas deliciosas e<br />

assombrosas aventuras assentes na<br />

relação com o mundo dos humanos.<br />

“Onde Fica o Sítio que nos Faz<br />

Falta?”, de Mário Bruno Cruz, é a<br />

mais recente aposta da Teorema na<br />

área da poesia.<br />

Chama-se “Aquilino Ribeiro – Um<br />

Genial Escritor Português”o livro de<br />

homenagem ao grande escritor<br />

cujos restos mortais foram agora<br />

trasladados para o Panteão Nacional.<br />

Neste livro editado pela AVIS –<br />

Associação para o Debate de Ideias<br />

e Concretizações Culturais em<br />

Viseu juntam-se testemunhos e depoimentos<br />

de destacados nomes da<br />

cultura, da política e da sociedade,<br />

todos eles destacando a importância<br />

do legado do autor de “A Casa<br />

Grande Romarigães”. ■<br />

<strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong> TempoLivre 37


Rodrigues Vaz<br />

BOAVIDA<br />

Artes<br />

Expressionismos de João Vieira<br />

abrem nova temporada artística<br />

A abrir a nova temporada, a Galeria Valbom está a apresentar, até ao próximo dia 20, a exposição<br />

“Expressionismus”, de João Vieira, artista que se tornou numa referência fundamental<br />

na pintura portuguesa contemporânea.<br />

De novo, «O modo peculiar<br />

que João Vieira utiliza<br />

para construir narrativas,<br />

articuladas com outras<br />

práticas culturais e sociais, adquire<br />

sempre um festivo carácter performativo»,<br />

como escreveu Raquel Henriques<br />

da Silva a propósito da sua última<br />

exposição neste mesmo espaço.<br />

A exposição encontra-se estruturada<br />

em três núcleos: o primeiro<br />

apresenta “Os Quatro Elementos”,<br />

de reminiscências maçónicas, com o<br />

subtítulo “La Danse”, retoma depois<br />

as suas caligrafias sob o lema celebratório<br />

da “obra de arte na era da<br />

sua reprodutibilidade técnica”, com<br />

“Repetições”, e termina com a nova<br />

série “Caretos”, apresentando máscaras<br />

em três dimensões.<br />

O catálogo abre com um texto do<br />

artista que vale por todo um programa<br />

interventivo, e que é, antes de<br />

mais, uma atitude face ao actual<br />

panorama das nossas Artes Plásticas.<br />

OBRAS RECENTES<br />

DE PEDRO CABRITA REIS<br />

A Galeria Fernando Santos, Porto,<br />

apresenta, por seu lado, até ao próximo<br />

dia 10, uma exposição de obras<br />

recentes de pintura e escultura de<br />

Pedro Cabrita Reis, um dos nomes<br />

mais sonantes da arte portuguesa<br />

actual.<br />

Pedro Cabrita Reis iniciou o seu<br />

percurso artístico nos primeiros anos<br />

38 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

Composição de João Vieira<br />

da década de oitenta. Como assinala<br />

João Pinharanda, este artista «Tem no<br />

desenho um referente técnico dominante<br />

– no sentido em que é no<br />

traçado das linhas que define a composição,<br />

as formas e os espaços das<br />

suas obras. E tem a pintura como território<br />

de afirmação – porque usa o<br />

tema da construção (construção-<br />

/desconstrução do mundo) como a<br />

sua base discursiva».<br />

A partir do final daquela década a<br />

sua carreira entra numa nova fase<br />

em que a escultura e a instalação se<br />

lhe apresentam como destino inevitávele<br />

o ajudam a entrar no mercado<br />

internacional ao mesmo tempo<br />

que se ia impondo a nível interno,<br />

para o que muito contribuiu a sua<br />

aposta decidida numa criação artística<br />

que foi sempre ousada a nível<br />

de formas.<br />

“THE CITY”, DE ALLEN JONES<br />

Conhecido como um dos principais<br />

representantes da Pop Art inglesa,<br />

ao lado de Peter Blake, David<br />

Hockney e Richard Hamilton, Allen<br />

Jones, cujas obras mais recentes<br />

podem ser vistas, até dia 8, na<br />

Galeria Antóno Prates, Lisboa,<br />

soube como eles evitar deliberadamente<br />

as severas críticas de algumas<br />

manifestações do modernismo, em<br />

prol de uma arte que era tanto visual<br />

como verbal, figurativa e abstracta,<br />

criação e apropriação, arte manual<br />

e produção em massa. Recorrendo<br />

a processos subtis e provocatórios,<br />

com muito sarcasmo e ironia<br />

à mistura, nas suas pinturas<br />

Allen Jones utiliza manequins femininos<br />

para denunciar a condição de<br />

mulher-objecto.<br />

FÉNIX (RE)NASCE NO ALENTEJO<br />

Entretanto, pintura de José Grazina<br />

e escultura de Carlos Ramos apresentam-se<br />

até dia 19, na Galeria<br />

Fénix, sita no Parque Industrial de<br />

Vendas Novas, apoiada por uma loja<br />

de artigos de restauração artística.<br />

José Grazina, natural de Redondo,<br />

é já senhor de um vasto curriculum<br />

apesar dos seus apenas 43 anos.<br />

Nesta mostra, continuam a observar-se<br />

as fisionomias, mais ou<br />

menos tímidas, características da<br />

obra deste autor, que se revelam por<br />

entre a atmosfera amena da sua pintura<br />

diáfana, cheia de leveza e<br />

encantamento. Carlos Ramos, por<br />

seu turno, continua a jogar com<br />

diferentes materiais de uma maneira<br />

tão lúdica como eficiente,<br />

apresentando uma escultura quase<br />

desprovida de volumes onde os<br />

“grafismos” são uma constante. ■


Vítor Ribeiro<br />

O fado segundo<br />

Carlos Saura<br />

”Fados” é o título do mais recente filme de Carlos Saura e é,<br />

simultaneamente, o título do CD entretanto editado, no qual se<br />

integra a banda sonora da fita.<br />

Um belo trabalho<br />

sobre o fado, em<br />

particular, e um<br />

importante contributo<br />

para o estudo da<br />

diáspora daquele género<br />

musical.<br />

Apaixonado pelos estilos<br />

musicais mais genuínos, o<br />

realizador espanhol concebeu<br />

anteriormente trabalhos<br />

sobre o flamenco e o<br />

tango. Faltava-lhe o fado,<br />

sobre o qual diz: “Cresci<br />

com ele, com a voz e a presença<br />

de Amália”. No que se<br />

refere ao filme explica: “Tratei de<br />

abrir novas perspectivas, aprofundar<br />

o espaço onde o fado se abre<br />

para o futuro”.<br />

De Portugal até ao Brasil, passando<br />

por Cabo Verde e pela Andaluzia,<br />

Carlos Saura cruza sonoridades,<br />

estabelece comparações, ora<br />

a solo, ora através de duetos surpreendentes,<br />

obrigando-nos a redescobrir<br />

o fado, muito para além<br />

dos limites que ancestralmente formatam<br />

o nosso imaginário musical<br />

colectivo.<br />

A lista de intérpretes escolhidos<br />

pelo cineasta evidencia o percurso<br />

destes “Fados”: Carlos do Carmo,<br />

Kola San Jon, Ricardo Rocha e<br />

Jaime Santos, Mariza, Toni Garrido,<br />

Camané, Catarina Moura, Cuca Roseta,<br />

Alfredo Marceneiro, Lila<br />

Downs, Argentina Santos, Brigada<br />

Victor Jara, Lura, Caetano Veloso,<br />

Chico Buarque de Holanda, Miguel<br />

Poveda, Vicente da Câmara, Maria<br />

da Nazaré, Ana Sofia Varela, Carminho,<br />

Ricardo Ribeiro e Pedro<br />

Moutinho.<br />

A propósito, Carlos do Carmo salienta:<br />

“A obra deste grande cineasta,<br />

que passa pela sua visão sobre<br />

o tango e o flamenco, seria incompleta<br />

se não passasse pelo fado; é<br />

um projecto de dimensão mundial”.<br />

Carlos Saura pretendia “ir mais<br />

além”. E conseguiu.<br />

A “ÚNICA” MARIA CALLAS<br />

Maria Callas morreu há 30 anos,<br />

ficando até hoje sem sucessora.<br />

“Única” é o título genérico do duplo<br />

CD recentemente editado entre<br />

BOAVIDA<br />

Músicas<br />

nós e no qual se integram 33 fantásticas<br />

interpretações da maior soprano<br />

de todos os tempos.<br />

Após a sua primeira apresentação<br />

no La Scala de Milão, em 1950, Maria<br />

Callas não mais deixou de impressionar<br />

multidões um pouco por<br />

todo o mundo, até 1965, ano em<br />

que abandonou os palcos.<br />

A vida de Maria Callas ficou também<br />

marcada por uma atribulada<br />

relação com o armador<br />

grego Aristóteles Onassis, que<br />

acabou por ser determinante<br />

na carreira da cantora.<br />

Na colectânea agora publicada,<br />

apresentam-se alguns<br />

dos principais desempenhos<br />

de Callas, designadamente<br />

em a “Tosca” e “Madame Butterfly”,<br />

assim como uma interpretação<br />

de “Casta Diva”,<br />

que a cantora representou<br />

cerca de 90 vezes ao longo da<br />

sua carreira.<br />

Além de obras de Verdi,<br />

Bizet e Rossini surgem-nos<br />

ainda actuações de Callas na<br />

Ópera de Paris, cidade onde<br />

morreu aos 53 anos, em Setembro<br />

de 1977. ■<br />

<strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong> TempoLivre 39


BOAVIDA<br />

No Palco<br />

40 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

Contos da Emigração<br />

Baseado em textos de vários autores portugueses, este espectáculo musical encenado<br />

pela Barraca, retrata várias das imensas histórias sobre a emigração portuguesa, ao longo<br />

de várias décadas, até 18 de <strong>Novembro</strong>.<br />

Maria Mesquita<br />

Os textos são de vários<br />

autores nacionais, entre<br />

eles João de Melo, Dias<br />

Melo, Ferreira de Castro,<br />

entre outros. Todos eles têm em<br />

comum o facto de falarem sobre<br />

uma das maiores características do<br />

nosso país, a emigração que sempre<br />

nos fez procurar uma nova vida<br />

noutro lugar.<br />

Nesta encenação em forma de<br />

musical “personagens reconhecíveis<br />

destes autores cruzam-se numa<br />

espécie de rede feita dos mais<br />

belos itinerários de emigrantes da<br />

nossa ficção. O espectáculo fala das<br />

aspirações, dos sacrifícios, das alterações<br />

de vida, das frustrações e<br />

dos triunfos, dos gostos, daquele<br />

grupo social que tanta riqueza económica<br />

trouxe ao nosso país.<br />

Da irrisão à emoção, actores e<br />

Contos da emigração<br />

público vão viajando de camioneta,<br />

de barco, de comboio e até num<br />

pau-de-arara sertanejo, experimentando<br />

sentimentos que certamente<br />

vão ajudar a conhecer melhor aquela<br />

gente que continua a ser os “outros”<br />

portugueses.” Falar desses<br />

“outros” portugueses era, desde há<br />

muito, projecto da Barraca.<br />

Como diz Maria do Céu Guerra,<br />

“Lá fomos, enganados, de camioneta<br />

com Olga Gonçalves e com ela rumámos<br />

de comboio para a Alemanha;<br />

fomos à guerra com João de Melo;<br />

fomos para a América com um clandestino<br />

a bordo, pela mão de<br />

Rodrigues Miguéis e com ele embarcamos<br />

num sonho americano; fomos<br />

à baleia com Dias de Melo à boleia de<br />

Melville; entrámos numa história<br />

negra com Manuela Degerine, num<br />

pesadelo xenófobo falado em<br />

francês. Por fim regalámo-nos a contrariar<br />

a “tragédia” da emigração com<br />

o texto mais engraçado do espectáculo.<br />

De como falar nunca tive dúvidas.<br />

Em primeiro lugar queria fazê-lo a<br />

várias vozes. Escolher histórias boas,<br />

que para mim são histórias onde há<br />

poesia, crueldade, verdade e contradição.<br />

Depois, olhar para elas com<br />

o meu olhar. O meu, aquele onde se<br />

caldeia o que sou com o que vi, aquele<br />

que não é de mais ninguém e isso<br />

basta para ser original.”<br />

SWEENEY TODD<br />

Mito urbano, história de terror<br />

macabra, realidade dos factos. Algo<br />

é certo, Sweeney Todd continua a<br />

assustar as pessoas, mesmo em<br />

forma de musical cómico, trazido<br />

outra vez aos palcos nacionais por<br />

João Lourenço e a sua equipa do<br />

Teatro Aberto, até dia 30 de<br />

Dezembro.<br />

Em co-produção com o Teatro<br />

Nacional D.Maria II, João Lourenço,<br />

Vera San Payo de Lemos, José Fanha<br />

e agora, com o apoio do Maestro<br />

João Paulo Santos, trazem 10 anos<br />

depois, com uma nova abordagem e<br />

encenação de palco o musical<br />

Sweeney Todd, segundo a versão<br />

de 1979 de Stephen Sondheim.<br />

Não se sabe ao certo se o tal barbeiro<br />

assassino existiu ou não, mas<br />

pensa-se que a sua lenda remonte ao<br />

século XV, com origem numa balada<br />

medieval francesa: um homem chamado<br />

Sweeney Todd, barbeiro de<br />

profissão que matava os seus clientes<br />

e que, com a ajuda de uma mulher,<br />

sua cúmplice, utilizaria os seus corpos<br />

para o recheio de empadas.


Sweeney Todd (Contra)Tempo<br />

Esta história foi transmitida de<br />

geração em geração, tomando principal<br />

relevância na então moralista<br />

sociedade britânica dos séculos<br />

XVIII e XIX, onde pôde ser comparada<br />

a Drácula de Bram Stoker,<br />

cujo principal objectivo, era, tal<br />

como com a lenda do barbeiro,<br />

retratar a sociedade da época, com<br />

toda a sua corrupção moral e capital.<br />

Sweeney Todd é, afinal mais uma<br />

vítima da violência que toma as ruas<br />

e as cidades, acabando por ele<br />

mesmo contar com a pena dos<br />

espectadores, devido às circunstâncias<br />

que o levam a matar – a injustiça<br />

e uma pena que o levam a afastar-se<br />

da mulher e da filha. A pergunta<br />

que se faz é se existe regeneração<br />

moral na sua “persona”, uma vez<br />

que atinge um estatuto de herói<br />

trágico. Contar a sua vida num<br />

musical não evita contudo os<br />

momentos mais bizarros, negros,<br />

cómicos e dramáticos que a mesma<br />

acarreta, o suspense e a surpresa<br />

estão lá, e nesta nova encenação, a<br />

contenção das interpretações e a caracterização<br />

expressionista, dão o<br />

tom duro que é necessário.<br />

A transposição para o século XX,<br />

tornou esta bizarria num dos muitos<br />

mitos urbanos, histórias que sendo<br />

impensáveis de ocorrerem, não são<br />

totalmente desprovidas de algum<br />

sentido, nem tão pouco são impossíveis<br />

de existir. Segundo João<br />

Lourenço, a história de Sweeney<br />

Todd permanece actual: “as diversas<br />

motivações para o exercício da justiça<br />

pelas próprias mãos, o poder, o di-<br />

FICHAS TÉCNICAS<br />

CONTOS DA EMIGRAÇÃO<br />

A partir de textos de Ferreira de<br />

Castro, José Rodrigues Miguéis,<br />

Dias de Melo, João de Melo,<br />

Manuela Degerine, Olga Gonçalves;<br />

Dramaturgia, Encenação e Espaço<br />

Cénico: Maria do Céu Guerra;<br />

SWEENEY TODD<br />

Ficha Técnica: de Stephen<br />

Sondheim; Libreto: Hugh Wheeler;<br />

baseado numa peça de Christopher<br />

Bond; Versão: João Lourenço | José<br />

Fanha | Vera San Payo Lemos;<br />

Dramaturgia: Vera San Payo De<br />

Lemos; Encenação: João Lourenço;<br />

Direcção Musical: João Paulo Santos;<br />

Cenografia: Jochen Finke; Figurinos:<br />

Renée Hendrix; Coreografia: Carlos<br />

Prado; Desenho de Luz: João<br />

Lourenço | Melim Teixeira; Solistas:<br />

Mário Redondo (Sweeney Todd) |<br />

Ana Ester Neves (Sra. Lovett) | Carla<br />

Simões (Johanna) | Carlos<br />

Guilherme (Bedel) | Henrique Feist<br />

(Tobias) | José Corvelo (Juiz Turpin)<br />

| Marco Alves Dos Santos (Anthony)<br />

| Sílvia Filipe (Mendiga) | Tiago<br />

Sepúlveda (Pirelli)<br />

(CONTRA)TEMPO<br />

De David Ives; Encenação: Paula<br />

Sousa; Tradução: Paulo Oom;<br />

Intérpretes: Maria d’Aires, Patrícia<br />

Bull, Paula Sousa, Paulo B., Rogério<br />

Jacques, Teresa Faria, Vítor Oliveira.<br />

nheiro, a vingança passional, temas<br />

que, infelizmente continuam na<br />

ordem do dia”, afirmando também,<br />

em jeito de conclusão: “Existe em<br />

Sweeney Todd aquela fórmula mágica<br />

que determinados espectáculos,<br />

de cinema, teatro ou música, têm:<br />

quem o viu, nunca mais o esquece!”<br />

(CONTRA)TEMPO<br />

A Teatroesfera volta à acção teatral<br />

este mês com a peça (contra)Tempo,<br />

do autor americano David Ives, numa<br />

série de curtas interpretações apostando<br />

no humor sobre a nossa vida quotidiana<br />

e sobre o mundo em que vivemos.<br />

O Teatroesfera foi tão feliz com<br />

David Ives, com o espectáculo Uma<br />

Questão de Timing (2<strong>00</strong>4) que o encena<br />

pela segunda vez revelando ao<br />

público novas peças curtas do que<br />

será talvez “o escritor mais engraçado<br />

da América de hoje”. O mundo,<br />

segundo David Ives, é um local muito<br />

estranho, e as suas peças constituem<br />

um teste virtual de stress à linguagem<br />

– e à capacidade de desorientação e<br />

prazer do público. “Teatro que põe o<br />

cérebro a fazer aeróbica e faz cócegas<br />

ao coração...”. Não há ninguém que<br />

escreva hoje e nos revele com tanta<br />

consistência e claridade o modo como<br />

vivemos e representamos as nossas<br />

pretensões. David Ives recebeu em<br />

1994 o prestigioso Outer Critics Circle<br />

Palyright Award por “All in the<br />

Timing”. Foi eleito – pelo New York<br />

Magazine – um dos 1<strong>00</strong> americanos<br />

mais inteligentes. Ives é um cómico<br />

mordaz que voltou a pôr teatra na<br />

escrita teatral.”. ■<br />

<strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong> TempoLivre 41


BOAVIDA<br />

Cinema em casa<br />

Sérgio Alves<br />

OCEAN`S 13<br />

> Danny Ocean e o seu<br />

grupo só têm uma razão para<br />

mais um ambicioso e arriscado<br />

golpe – defender um dos<br />

seus. Quando<br />

Willy Bank, o<br />

implacável<br />

dono de um<br />

casino em<br />

Las Vegas,<br />

engana um dos membros<br />

originais da equipa (Reuben<br />

Tishkoff), Danny e os outros<br />

juntam-se uma vez mais,<br />

desta feita com o objectivo de<br />

esvaziar os cofres a Bank. Na<br />

noite de abertura da torre do<br />

novo casino, Ocean e o seu<br />

grupo vão magoar o orgulho<br />

de Bank, procurando que a<br />

torre não receba o prémio<br />

Cinco Diamantes.<br />

TÍTULO ORIGINAL: Ocean`s<br />

Thirteen REALIZAÇÃO: Steven<br />

Soderbergh COM: George<br />

Clooney, Brad Pitt, Matt<br />

Damon, Andy Garcia, Don<br />

Cheadle, Bernie Mac, Al<br />

Pacino, Ellen Barkin; EUA, cor,<br />

<strong>2<strong>00</strong>7</strong>,122m<br />

ZODIAC<br />

> Baseado em factos verídicos<br />

que marcaram a área da<br />

Baía de São Francisco,<br />

Zodíaco é um dos grandes<br />

filmes do ano. Enquanto um<br />

42 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

Comercial e alternativo<br />

Dois filmes para o grande público e outros tantos<br />

para um circuito alternativo, são as novidades<br />

de agrado certo para o vasto universo<br />

cinéfilo. “Ocean´s 13” e “Zodiac”, películas<br />

assassino em série aterroriza<br />

a baía de São Francisco e<br />

ilude a polícia com as suas<br />

cifras e cartas, investigadores<br />

em quatro jurisdições procuram<br />

o homicida. O caso<br />

tornar-se-á uma obsessão<br />

para quatro homens à medida<br />

que as suas vidas e carreiras<br />

são construídas e<br />

destruídas pelo trilho interminável<br />

de pistas: um tímido<br />

cartoonista, Robert<br />

Graysmith; um jornalista<br />

cínico e experiente Paul<br />

Avery; um ambicioso inspector<br />

de homicídios,<br />

David<br />

Toschi e o seu<br />

parceiro, discreto<br />

e meticuloso,<br />

o<br />

Inspector<br />

William Armstrong.<br />

TÍTULO ORIGINAL: Zodiac<br />

REALIZAÇÃO: David Fincher<br />

COM: Jake Gyllenhaal, Mark<br />

Ruffalo, Robert Downey Jr.,<br />

Anthony Edwards, Chloë<br />

Sevigny, Brian Cox,<br />

EUA,cor,, <strong>2<strong>00</strong>7</strong>,158m<br />

ARARAT<br />

> O canadiano Atom<br />

Egoyan propõe-se filmar as<br />

memórias das suas raízes<br />

arménias e em particular a<br />

destruição do povo arménio<br />

pelo império turco durante a<br />

de registo assumidamente comercial foram êxito global,<br />

mas “Ararat” e “Para Sempre Mozart”, com menos êxito<br />

de bilheteira, são propostas de elevado mérito e qualidade<br />

para os amantes de um outro cinema.<br />

1<strong>º</strong>guerra mundial. Arshile<br />

Gorky pinta o retrato da<br />

mãe. O filme da vida de um<br />

realizador. Um adolescente<br />

de ascendência arménia<br />

tenta passar a fronteira e<br />

tenta também perceber os<br />

ideais que levaram o pai à<br />

morte. Uma rapariga está<br />

disposta a tudo para esclarecer<br />

a morte do pai. Uma<br />

professora de<br />

História<br />

serve-se da<br />

história de<br />

Gorky e do<br />

genocídio dos<br />

arménios para esquecer a<br />

sua própria história. Um<br />

actor interpreta um papel,<br />

sem medir as consequências.<br />

Há apenas uma história que<br />

têm em comum: a da<br />

Arménia… Em suma, um<br />

manifesto politico de cariz<br />

assumidamente pessoal e<br />

autobiográfico.<br />

TÍTULO ORIGINAL: Ararat;<br />

REALIZAÇÃO: Atom Egoyan<br />

COM: Arsinée Khanjian, Christ.<br />

Plummer, David Alpay, Elias<br />

Koteas, C. Aznavour, Marie-<br />

Josée Croze, Eric Bogosian,<br />

Bruce Grenwood.Canadá<br />

/França 2<strong>00</strong>2, 111m, cor<br />

PARA SEMPRE MOZART<br />

Jovens actores planeiam<br />

encenar uma peça em<br />

Sarajevo, local que a guerra<br />

transformou num inferno.<br />

Para além desta, há uma<br />

outra história onde um<br />

velho realizador faz um casting<br />

para um filme, com<br />

imensas dificuldades no<br />

meio de uma zona tão dilacerada…Quatro<br />

filmes que<br />

não formam forçosamente<br />

um, tal como os muros de<br />

uma casa tomados individualmente.<br />

De um filme ao<br />

outro, não encontramos<br />

mais que um<br />

realizador -<br />

melhor dizendo,<br />

um autor<br />

que explora<br />

ou que é<br />

explorado. O filme da<br />

intranquilidade, em que a<br />

guerra - o teatro das operações<br />

- persegue o teatro. E<br />

o cinema persegue a guerra,<br />

e tanto num como noutro,<br />

não se ligará importância<br />

aos actores que deverão,<br />

portanto, resgatar-se. Ficará<br />

a música. Mais uma vez é<br />

preciso saber virar a página<br />

da partitura - da vida.<br />

E marcar o compasso.<br />

TÍTULO ORIGINAL: Forever<br />

Mozart REALIZAÇÃO: Jean Luc-<br />

Godard COM: Madeleine Assas,<br />

Frédéric Pierrot, Ghalia Lacroix,<br />

Vicky Messica, Harry Cleven,<br />

França, cor, 80m,1996


Fernando Dacosta<br />

Uma canção portuguesa<br />

Saudavelmente polémico, o filme Fados é um mergulho apetecível na nossa secular<br />

e enevoada identidade<br />

Aideia revela-se excelente:<br />

fazer uma obra cinematográfica<br />

sobre a expressão<br />

musical que criámos,<br />

a partir da melancolia interior e<br />

errância exterior que nos caracterizam.<br />

Única no mundo, essa expressão<br />

musical acabou por receber<br />

o nome de fado, cantado nas tabernas<br />

de Lisboa por rufiões e prostitutas,<br />

e no bojo das naus por marujos<br />

e aventureiros; depois, a aristocracia<br />

seduziu-se por ele (a paixão do<br />

Conde do Vimioso e da Severa ganhou,<br />

no imaginário nacional, contornos<br />

mitológicos), o mesmo acontecendo<br />

com os estrangeiros de passagem<br />

e os turistas de veraneio.<br />

No fim da primeira metade do<br />

século XX uma jovem surgida dos<br />

bairros populares da capital imprimiu-lhe<br />

uma ascensão inimaginável<br />

que o universalizou, prestigiou,<br />

endeusou, através da sua voz,<br />

do seu magnetismo, da sua genialidade.<br />

Cineasta de excepção, o espanhol<br />

Carlos Saura teve o desejo de fixar<br />

(como fizera, na Argentina, com o<br />

Tango) a génese do fado no filme<br />

Fados – intitulado no plural.<br />

Sem adoptar um modelo cinematográfico<br />

rígido, o realizador misturou<br />

ficção com documentário, personagens<br />

reais com figuras encenadas,<br />

linguagens da sétima arte<br />

com narrativas do pequeno écran.<br />

Nomes angulares são, ao longo<br />

dos tempos, evocados e recortados<br />

fazendo sobressair os que se tornaram,<br />

vão tornando referências no<br />

Carlos Saura<br />

seu universo. Mariza, Carlos do<br />

Carmo, Argentina Santos, Ana Sofia<br />

Varela, a que se juntam os brasileiros<br />

Caetano Veloso e Chico Buarque<br />

fazem-se rostos desses fados –<br />

maneira subtil de unir, alargar<br />

espaços em elos de espirais intermináveis.<br />

O papel dos jovens intérpretes<br />

mostra-o com irreversibilidade.<br />

Do passado recente, alguns<br />

recebem a luz, a energia. Mariza<br />

repete de Amália (presente-ausente<br />

na obra de Saura) reportórios,<br />

roteiros (Carnegie Hall, Disney<br />

Concert Hall), vestidos (sedas pretas<br />

rodadas), reportórios, palmas,<br />

delírios, melancolias.<br />

Ser de excepção, Amália foi uma<br />

das pessoas mais (intuitivamente)<br />

inteligentes que tivemos na preservação<br />

da intocabilidade que a<br />

habitava. Consciente do poder da<br />

sua voz (Maria Callas, Edite Piaff e<br />

ela foram as maiores cantoras do<br />

século XX), cedo percebeu que<br />

necessitava de criar uma expressão<br />

própria para se impor. A facilidade<br />

BOAVIDA<br />

Filmes com memória<br />

com que, criança ainda, dominou o<br />

fado dos tugúrios gordurosos de<br />

Lisboa fê-la ambicionar mais. Compreendendo<br />

- lhe a excepcionalidade<br />

(nada existia de parecido na<br />

música internacional), sentindo-lhe<br />

a hipnose (o fascínio dos que o<br />

ouviam era flagrante), Amália comete<br />

a ousadia de reincarná-lo com<br />

outras (novas) vestes, espaços, conteúdos,<br />

expressividades, sonoridades,<br />

grandezas.<br />

Dominando-o com mestria dálhe,<br />

pela postura (altiva) do corpo e<br />

pela palavra (superior) que lhe<br />

imprime, “alturas de incenso”.<br />

A dolente «canção de Lisboa»<br />

tem, vislumbra-a e assume-a, uma<br />

originalíssima arquitectura de centelha<br />

operática.<br />

Duas pessoas tornam-se-lhe decisivas<br />

na metamorfose que enceta: Ilda<br />

Aleixo, estilista que criará, durante 30<br />

anos, os espantosos paramentos que<br />

lhe imprimem movimentos sacerdotais<br />

únicos (fulgurados por diamantes<br />

de divindade pagã), e Alain<br />

Oulman, compositor aristocrata que<br />

a põe a cantar Camões (e outros<br />

grandes poetas) ante a estupefacção<br />

de uma inteligentsia escandalizada e<br />

chã. O mundo inteiro, de Tóquio a<br />

Nova Iorque, venera-a. É uma diva.<br />

Faz-se a figura mais universal da<br />

nossa cultura, da nossa língua (com<br />

Pessoa e Saramago) no século XX.<br />

O filme de Saura, que não vai<br />

directamente por esse caminho,<br />

acaba, no entanto, por arquear-se<br />

ao peso da sua omissão – precisamente<br />

o mais visível do que tudo o<br />

que nele se vislumbra e lhe dá<br />

memória. ■<br />

<strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong> TempoLivre 43


Pedro Soares<br />

BOAVIDA<br />

À mesa<br />

Contudo, é possível fazer<br />

refeições de grande qualidade<br />

nutricional, a<br />

baixo custo e apetecíveis<br />

para toda a família. Basta para tal<br />

juntar os alimentos correctos e nas<br />

devidas proporções. O objectivo é<br />

encontrar fontes baratas de proteína,<br />

qualidade no fornecimento<br />

energético e um balanço na ingestão<br />

de fibra, vitaminas e minerais. Para<br />

que tal aconteça é importante delinear<br />

quatro estratégias essenciais<br />

primeiro lugar, teremos<br />

que encontrar fornecedores<br />

de energia de<br />

1.Em<br />

qualidade que permitam<br />

o trabalho braçal e intelectual ao<br />

longo do dia e, ao mesmo tempo,<br />

sejam fornecedores adequados de<br />

substâncias protectoras. Esses produtos<br />

são relativamente baratos e<br />

fáceis de encontrar. São as leguminosas<br />

(feijão, grão, lentilha, ervilha<br />

que devem engrossar sopas e acompanhar<br />

os pratos), o pão integral ou<br />

de mistura (nas pequenas refeições<br />

ou mesmo a acompanhar o almoço<br />

e jantar), a batata mais a massa e o<br />

arroz pouco polido ou até integral.<br />

Existem hoje no mercado diversas<br />

variedades de pão mais escuro, de<br />

leguminosas, de massas e arrozes<br />

que permitem confeccionar pratos<br />

saborosos, com aromas variados<br />

ao longo da semana e<br />

a muito baixo custo. O<br />

consumo regular destes<br />

alimentos, permite ao<br />

organismo, e de forma fácil,<br />

44 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

Poupar à mesa<br />

Os números divergem, mas são muitos os milhares de Portugueses que diariamente têm<br />

dificuldade em juntar dinheiro para preparar uma refeição de qualidade.<br />

obter glicose a qual é<br />

imprescindível para<br />

o funcionamento do<br />

sistema nervoso central,<br />

algumas células do<br />

rim e glóbulos vermelhos. Entre<br />

outras funções, o amido e a fibra<br />

presentes nestes produtos alimentares<br />

servem de alimento à flora<br />

intestinal prevenindo o aparecimento<br />

de diversos cancros do aparelho<br />

digestivo e trazendo benefícios<br />

consideráveis ao aparelho circulatório.<br />

segundo objectivo<br />

é encontrar fontes baratas<br />

de proteína da<br />

2.O<br />

mais alta qualidade<br />

que fazem crescer os mais pequenos,<br />

construir músculo de qualidade<br />

e lutar contra a doença. Estas<br />

encontram-se em dois grupos de<br />

alimentos baratos, o leite e seus<br />

derivados e os ovos. Sem leite…<br />

muito dificilmente existem ossos e<br />

dentes saudáveis. O leite é bom<br />

fornecedor de cálcio e vitaminas,<br />

em especial a Vit. A. Os ovos têm<br />

um equilíbrio extraordinário de<br />

aminoácidos essenciais. Por exemplo,<br />

um adulto que bebe 2 copos de<br />

leite por dia e ingere 1 ovo, apenas<br />

necessita de fazer uma pequena<br />

refeição de peixe ou carne (1<strong>00</strong>-<br />

125g) para obter a sua dose diária<br />

de proteínas de origem animal.<br />

terceiro objectivo é<br />

ingerir gordura de<br />

qualidade. Aqui entra<br />

3.O<br />

o azeite, um dos alimentos<br />

em que não vale a pena<br />

poupar na qualidade mas sim na<br />

quantidade. O azeite virgem deve<br />

ser utilizado para as sopas, saladas e<br />

para temperar e cozinhar. Os ácidos<br />

gordos e vitaminas presentes no<br />

azeite são muito importantes para<br />

as membranas das células e regulam<br />

diversos processos metabólicos no<br />

nosso organismo. Poupe-se<br />

na gordura perigosa dos<br />

folhados, pastéis e croissants<br />

e invista-se na gordura<br />

saudável do azeite…mas<br />

com parcimónia.<br />

quarto objectivo é o<br />

de encontrar (a preços<br />

reduzidos) e introdu-<br />

4.O<br />

zir na alimentação<br />

diária a maior quantidade possível<br />

de hortícolas e frutos. Na sopa, a<br />

acompanhar refeições e na sobremesa,<br />

de forma a se consumirem<br />

cerca de 4<strong>00</strong>g por dia<br />

destes alimentos, decisivos<br />

no controlo do<br />

peso e na prevenção<br />

das doenças oncológicas<br />

e vasculares que tanto nos<br />

afligem. Para encontrar a melhor relação<br />

preço /qualidade é importante<br />

consumir os vegetais da época e se<br />

possível não perder de vista tudo o<br />

que um quintal ou pequena horta<br />

de família ou vizinhança pode produzir.<br />

Depois é cortar o supérfluo alimentar,<br />

caro e de má qualidade nutricional<br />

(doces, refrigerantes excessivamente<br />

açucarados, bolos, folhados…)<br />

e investir na culinária saudável,<br />

inventiva e saborosa. Bom apetite<br />

e muito prazer a baixo custo. ■


M. Augusta Drago<br />

Oestado de má nutrição e<br />

tristeza em que vive diminui<br />

a sua imunidade<br />

e, leva a que tenha<br />

maior risco de contrair infecções.<br />

Uma tarde destas a Sra. B. pediu<br />

uma consulta com urgência e quando<br />

entrou no meu gabinete vi que<br />

estava pálida e mais combalida do<br />

que de costume. Contou que nos<br />

três dias que antecederam a consulta,<br />

tinha estado de cama, com febre,<br />

arrepios de frio, mal-estar geral e<br />

que naquele dia lhe aparecera uma<br />

dor nas costas, que mal conseguiu<br />

caracterizar, localizada num dos<br />

lados e com um “formigueiro” que<br />

vinha até à parte anterior do tórax.<br />

Na observação que fiz da doente<br />

verifiquei que no local onde dizia<br />

doer era visível uma zona avermelhada,<br />

com pequenas bolhas centrais<br />

cheias de líquido. A história da<br />

doente e esta observação são características<br />

da infecção pelo vírus herpes<br />

zóster.<br />

O vírus herpes zóster que, nas crianças,<br />

causa a varicela, fica depois<br />

da doença a residir no corpo<br />

humano (nos gânglios dos nervos<br />

espinais ou cranianos) e pode aí<br />

permanecer toda a vida, sem causar<br />

sintomas. Mas se, por qualquer<br />

razão, a imunidade diminui, (como<br />

no caso da Sra. B.) ele volta a manifestar-se<br />

e as lesões podem aparecer<br />

Herpes zóster:<br />

da varicela à zona<br />

com várias localizações, sempre nas<br />

zonas de influência dos nervos afectados.<br />

Estas apresentações são vulgarmente<br />

conhecidas por “zona”.<br />

Tal como a varicela das crianças,<br />

também a zona é muito contagiosa<br />

durante o período em que as vesículas<br />

(bolhas) estiverem com líquido.<br />

Só depois de todas as vesículas<br />

estarem “secas” é que deixa de ser<br />

contagiosa. Durante esse<br />

período, o doente não<br />

deve partilhar a roupa<br />

ou limpar-se com outras<br />

toalhas que não<br />

sejam as suas.<br />

De todas as localizações<br />

da zona, as<br />

que de longe podem<br />

ser mais perigosas são<br />

as que afectam a pele<br />

da face, junto aos olhos<br />

e ouvidos, porque se o<br />

nervo auditivo for afectado<br />

pode provocar a surdez<br />

permanente. Do mesmo modo se,<br />

por extensão da lesão, o vírus afectar<br />

os olhos, a córnea (parte anterior<br />

do olho) pode ulcerar e as estruturas<br />

subjacentes inflamarem. O<br />

resultado deste processo é o<br />

aparecimento de cicatrizes permanentes<br />

com consequente perda de<br />

visão.<br />

Para evitar estas situações extremas<br />

é preciso tratar o mais precocemente<br />

possível as lesões herpéticas<br />

da face, para o que existem medica-<br />

BOAVIDA<br />

Saúde<br />

A Sra. B. tem 68 anos e uma longa lista de problemas de saúde e não só. Aquele que mais a faz sofrer<br />

é viver sozinha. O marido morreu há mais de dez anos e os filhos, dois “rapazes”,<br />

moram longe e só raramente a vêm visitar. Uma das consequências do seu abandono é não se<br />

alimentar convenientemente. Habitualmente come bolos e bebe chá na pastelaria do bairro.<br />

mentos anti-virais eficazes, mas que<br />

só o médico deve receitar. Quando<br />

estão em perigo os órgãos da visão e<br />

da audição, é obrigatório consultar<br />

quer o otorrinolaringologista, quer<br />

o oftalmologista.<br />

A dor herpética é uma nevralgia,<br />

isto é, dói o nervo e a região onde<br />

ele se situa. Tem a característica<br />

de ser<br />

mal definida: O doente<br />

tem dificuldade<br />

em dizer como é<br />

esta dor. Dói ao mais<br />

leve toque na região<br />

afectada – se for na<br />

cabeça o doente não<br />

se consegue pentear.<br />

Esta dor causa frustração<br />

a médicos e doentes,<br />

porque não responde ao<br />

tratamento convencional da<br />

dor. Mesmo com uma abordagem<br />

específica, pode ser difícil<br />

debelar.<br />

A nevralgia herpética pode, por<br />

vezes, preceder a lesão ou não<br />

chegar a ser dor, o doente refere<br />

uma sensação de formigueiro na<br />

zona afectada. Há casos em que a<br />

dor se torna crónica, depois de<br />

terem sarado as lesões.<br />

Está provado que a melhor maneira<br />

de prevenir a nevralgia herpética<br />

é iniciar administração de<br />

medicamentos anti-virais na fase<br />

mais precoce da doença. ■<br />

medicofamilia@clix.pt<br />

<strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong> TempoLivre 45


BOAVIDA<br />

Tempo informático<br />

Tal como as capacidades trazidas pelo digital, os elementos à nossa<br />

disposição não param de se aperfeiçoar para nos dar melhores<br />

fotografias digitais. As câmaras estão por aí, cada vez com maior<br />

qualidade e preços mais acessíveis. Melhorar as que tirámos<br />

eventualmente em férias torna-se cada vez mais fácil.<br />

Gil Montalverne<br />

Temos sempre referido<br />

aqui as novas<br />

versões do<br />

Adobe Photoshop,<br />

o software de edição de<br />

imagem mais utilizado pelos<br />

profissionais. Mas mesmo para esses e<br />

para os utilizadores mais exigentes<br />

porque não utilizar o Photoshop<br />

Lightroom que simplifica todas as<br />

operações essenciais para melhorar as<br />

fotografias? Pois é isso precisamente<br />

que ele faz. Até agora em versão Mac,<br />

a Adobe acaba de colocá-lo para<br />

Windows. O Software não substitui o<br />

Photoshop mas dá ao utilizador todas<br />

as ferramentas essenciais para efectuar<br />

uma enorme série de processos desde<br />

a importação, catalogação, manipulação<br />

e de tal modo que o ficheiro original<br />

é aquele que fica sempre arqui-<br />

As molduras<br />

digitais estão<br />

cada vez mais<br />

baratas<br />

Fotografia digital<br />

46 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

vado. As transformações são<br />

instruções que ficam guardadas<br />

podendo sempre aceder-se<br />

às múltiplas hipóteses<br />

criadas. E isto é extremamente<br />

importante e só possível<br />

com o Lightroom.<br />

“UMA FOTOGRAFIA jamais estará<br />

acabada no momento em que se pressiona<br />

o disparador da máquina”.<br />

Estas são palavras do fotógrafo<br />

Joel Santos no seu<br />

recente livro Fotografia<br />

Digital com Adobe Photoshop<br />

Lightroom editado<br />

pela Centro Atlântico. E<br />

de facto, tanto para amadores<br />

como profissionais,<br />

isto é verdade. Sempre assim foi na<br />

fotografia e mais ainda na digital. Joel<br />

Santos explica-nos neste livro que<br />

aconselhamos como se consegue<br />

neste novo software da Adobe chegar<br />

ao momento em que a imagem é<br />

de facto a que nos agrada, quer reproduza<br />

com exactidão aquilo que vimos<br />

ou melhoremos determinados aspectos<br />

que as condições ambientais não<br />

permitiam. Com exemplos práticos,<br />

seguidos passo a passo, Joel Santos<br />

explica, ensina e ajuda-nos a alcançar<br />

os nossos próprios objectivos. O<br />

Lightroom torna-se a ferramenta<br />

ideal para quem faz fotografia digital.<br />

EXISTEM muitas maneiras de mostrar<br />

as fotografias. E se antigamente<br />

se utilizavam em casa álbuns e as velhas<br />

molduras de família, hoje enviamo-las<br />

pela Net, fazemos slide-show<br />

no PC ou visionamos no televisor.<br />

Mas há mais. Já aqui falámos nas<br />

molduras digitais. Estão cada vez<br />

mais na moda e mais baratas. A marca<br />

AGFA, bem conhecida do<br />

tempo da fotografia clássica,<br />

apresenta pela mão da<br />

NetBit uma série de modelos<br />

que vão de 2 simples<br />

frontais intermutáveis,<br />

a slides-shows de<br />

álbuns em JPG, vídeo,<br />

leitor de cartões, MP3, comando<br />

remoto, etc. Consulte www.netbit.pt<br />

(Tel: 213 616 310). ■<br />

ajuda@gil.com.pt


Novo Peugeot 308<br />

Qualidade e eficácia<br />

Primeiro modelo de série da marca a inaugurar uma designação<br />

que termina com o algarismo 8, o 308 fez a sua entrada no mercado<br />

no passado mês de Setembro.<br />

Carlos Blanco<br />

OPeugeot 308 capitaliza<br />

sobre os pontos fortes do<br />

seu predecessor, do qual<br />

se venderam em seis<br />

anos mais de três milhões de<br />

unidades, graças ao seu conceito<br />

baseado numa arquitectura semi-elevada,<br />

a uma estética, uma habitabilidade,<br />

uma luminosidade e um comportamento<br />

unanimemente reconhecidos.<br />

Viatura de uma nova geração,<br />

o 308 cultiva os conhecimentos<br />

e desenvolve novos argumentos com<br />

benefício, nomeadamente, para<br />

eficácia ambiental e para a qualidade.<br />

Construtor envolvido na defesa do<br />

ambiente, a Peugeot fez a redução<br />

das emissões de gases com efeito estufa<br />

uma prioridade. Tal como acontece<br />

com os últimos modelos da<br />

marca, o 308 integrou, desde a sua<br />

concepção, todos os aspectos rela-<br />

cionados com a protecção do ambiente.<br />

Nesta perspectiva, foi dada<br />

uma atenção muito importante à<br />

aerodinâmica, de modo a optimizar<br />

as performances. O 308 apresenta<br />

uma resistência ao ar limitada (Scx de<br />

0,67 e Cx de 0,29), garantia de uma<br />

redução do consumo de combustível<br />

e das emissões de CO2.<br />

O 308 recebe seis motorizações,<br />

entre as quais três a gasolina de consumo<br />

moderado desenvolvidas em<br />

parceria com o BMW Group, e três<br />

diesel Hdi, uma das quais com um<br />

nível de emissões de 120g de CO2<br />

por quilómetro em ciclo misto.<br />

Para além das motorizações, os<br />

responsáveis pela concepção do 308<br />

utilizaram diferentes alavancas orientadas<br />

para uma acção eficaz a<br />

favor do ambiente. Assim, o 308 dispõe<br />

de uma caixa de velocidades<br />

manual assistida, de uma direcção<br />

assistida electro-hidráulica e, ainda,<br />

BOAVIDA<br />

Ao volante<br />

de pneus inéditos Michelin Energy<br />

Saver, que contribuem para uma<br />

redução significativa dos consumos<br />

e, em consequência, das emissões<br />

poluentes. Finalmente, a aplicação da<br />

directiva europeia relativa ao tratamento<br />

dos veículos em fim de vida<br />

traduziu-se por uma escolha de<br />

materiais que permitem a reciclagem<br />

ou a valorização de 99% do 308.<br />

A qualidade ocupou também uma<br />

posição central no dispositivo industrial<br />

implementado para a fabricação<br />

do 308, dando lugar a uma estratégia<br />

de lançamento em duas fases. Assim,<br />

a sua subida em cadência envolverá,<br />

num primeiro tempo, o coração de<br />

gama constituído pela versão de<br />

cinco portas e por quatro motorizações,<br />

antes de avançar, numa segunda<br />

fase, para a versão de três portas e<br />

para outras motorizações.<br />

Os preços deste novo modelo da<br />

marca do Leão, que vem substituir a<br />

série 307, situa-se entre os 19.630 e<br />

os 36.670 <strong>euros</strong>.<br />

O CARRO DO MÊS<br />

Este mês, o destaque vai para o modelo<br />

CEE’D da Kia, distinguido com<br />

5 estrelas nos testes de segurança do<br />

Euro NCAP. O CEE’D, com sete anos<br />

de garantia, é um carro que desafia<br />

todas as nossas expectativas. Com<br />

preços a partir dos 16.595 <strong>euros</strong>, o<br />

CEE’D, no seu modelo CRDi de<br />

1,6cc, 115 cavalos e velocidade máxima<br />

de 188 km/hora, tem um consumo<br />

médio de 4,7 litros. ■<br />

<strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong> TempoLivre 47


BOAVIDA<br />

Palavras da lei<br />

Infiltração<br />

de água<br />

em Logradouro<br />

? Moro<br />

num condomínio com seis fracções para habitação.<br />

De acordo com a escritura de propriedade horizontal, os<br />

logradouros afectos às fracções do rés-do-chão são da propriedade<br />

exclusiva dos condóminos que aí moram. Esses<br />

logradouros têm uma parte de área que serve de cobertura a<br />

garagens na cave. Através do logradouro pertencente a um dos<br />

condóminos, que serve de terraço de cobertura na garagem, verificaram-se<br />

infiltrações de água das chuvas, sem que, no entanto,<br />

tenha havido qualquer negligência do proprietário da fracção<br />

do rés-do-chão. Alguns condóminos dizem que a reparação dos<br />

estragos devem ser imputados ao condómino proprietário do logradouro;<br />

também dizem que este último é quem tem o acesso<br />

exclusivo ao logradouro, o que não o caracteriza como sendo<br />

parte comum. Quem deve ser responsável pelas obras?<br />

Fernando Francisco Lopes, Sócio n.<strong>º</strong> 47229<br />

Pedro Baptista-Bastos<br />

Alei atribui a natureza de<br />

parte comum não só ao<br />

que, imperativamente, é<br />

descrito no artigo 1421<strong>º</strong> do<br />

Código Civil como tal, assim como,<br />

por outro lado, a tudo o que não esteja<br />

descrito na escritura de propriedade<br />

horizontal como pertença exclusiva<br />

de um condómino.<br />

Um logradouro ou um quintal são<br />

partes comuns de um edifício, de<br />

acordo com a al. a) do n.<strong>º</strong> 1 do art.<br />

1421<strong>º</strong> do C. Civil; no entanto, na escritura<br />

de propriedade horizontal pode<br />

afectar-se essa parte comum ao uso<br />

exclusivo de um condómino, que resida<br />

num rés-do-chão, como é o caso.<br />

Essa afectação é permitida de acordo<br />

com o artigo 1421<strong>º</strong>, n<strong>º</strong> 3 do C. Civil.<br />

Quem tenha a si afectada uma<br />

parte comum, um logradouro, para<br />

seu uso exclusivo está obrigado a<br />

mantê-lo e conservá-lo em bom estado.<br />

Assim, concluímos que a lei pode<br />

afectar ao uso exclusivo de um condómino<br />

uma parte comum do edifício,<br />

um logradouro, e que há uma<br />

obrigação, a cargo do condómino, de<br />

manutenção e conservação dessa<br />

parte comum.<br />

É imprescindível examinarmos<br />

sempre o título constitutivo da propriedade<br />

horizontal, de modo a termos<br />

a noção do seguinte: apesar do<br />

logradouro estar afectado a este<br />

condómino, ainda assim pode estar<br />

definido nesse mesmo documento<br />

como parte comum? Isto serve-nos<br />

para definirmos a imputação da responsabilidade<br />

por danos decorrentes<br />

de infiltrações ou ao condómino ou à<br />

administração. Desde já agradeço a<br />

este sócio o ter enviado o documento<br />

de propriedade horizontal.<br />

Da análise do mesmo, verificamos<br />

que o logradouro em causa é pertença<br />

para uso exclusivo do condómino<br />

residente do rés-do-chão, não<br />

estando definido como parte comum<br />

do edifício na escritura de propriedade<br />

horizontal.<br />

O condómino será o responsável<br />

pelas reparações das infiltrações, se<br />

lhe forem imputáveis, por negligência<br />

ou culpa na conservação do bom<br />

estado do logradouro.<br />

No entanto, não há qualquer culpa<br />

ou negligência imputáveis a este<br />

condómino, não violando, assim, a<br />

obrigação de manutenção do logradouro.<br />

Essas infiltrações podem ter<br />

ocorrido apesar da boa manutenção<br />

do logradouro feita pelo condómino<br />

residente no rés-do-chão, o que é natural;<br />

assim, tem que ser a administração<br />

a fazer as reparações de impermeabilização<br />

na garagem. ■<br />

48 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong> ilustração: André Letria


1<br />

2<br />

3<br />

4<br />

5<br />

6<br />

7<br />

8<br />

9<br />

10<br />

11<br />

12<br />

13<br />

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15<br />

SOLUÇÕES<br />

1-QUIMERA; AMURADA. 2-ITEM; UNS; RENO. 3-AVES; ALOTA;<br />

SOTA. 4-DOM; TRATAIS; SEM. 5-ES; CR; SAS; IA; SA. 6-M; ORAI; S;<br />

ABRA; S. 7-PLAINO; PREDIZ. 8-P; ATRO; B; AROS; V. 9-EL; OE; ARU;<br />

IR; SE. 10-SIM; MALÁSIA; CAL. 11-EGAS; SISAL; CUBO. 12-ACOR;<br />

SAI; TIRO. 13-TREMULA; SAUDARA.<br />

Xadrez > por Joaquim Durão<br />

Do argentino Arnoldo Ellerman, com dezenas de prémios nos<br />

concursos de problemas de variadíssimos países, foi dos compositores<br />

mais brilhantes e super-activos no século passado. O que<br />

segue ganhou o 1<strong>º</strong>. Prémio do W. Morning and D. Gazette, 1934.<br />

AS BRANCAS JOGAM E DÃO MATE EM 2 LANCES<br />

Harry Nelson Pillsbury (5.12.<strong>187</strong>2 – 17.06.1906), depois de Paul<br />

Morphy e com Frank James Marshall, foi uma primeira grande<br />

figura do xadrez norte-americano no dealbar do século passado. A<br />

partida que segue ilustra um tema conhecido (o assalto ao roque<br />

através do sacrifício B x PTR+), mas com uma continuação menos<br />

corrente.<br />

Pillsbury-Judd, Saint Louis, 1899. Gambito de dama 1. d4 d5 2. c4<br />

e6 3. Cc3 b6 4. Cf3 Bb7 5. Bf4 Bd6 6.Bxd6 Dxd6 7.cxd5 Bxd5<br />

(Obviamente é sempre um risco entregar o centro. Melhor seria<br />

7….exd5) 8. e4 Bb7 9. Tc1 a6 10. Bd3 Ce7 11.0-0 0-0 (Parece tudo<br />

calmo e controlado, apenas com a supremacia branca no centro. E<br />

este vai ser o factor suficiente.) 12.e5 Dd8 (12…. Dc6?? 13. Be4 Cd5<br />

14. Cxd5 etc.) 13. Bxh7+ (O clássico assalto ao roque) Rxh7 (Se não<br />

tomar, Cg5 igualmente) 14. Cg5+ Rh6 (Se 14…. Rg8 15. Dh5 Te8 16.<br />

Dxf7+ Rh8 17. Dh5+ Rg8 18. Dh7+ etc.) 15. Dd2 Rg6 16. Ce2 !<br />

Cd5 (A exposição do rei preto é fatal e acabará rendido forçadamente)<br />

17. Dd3+! Rxg5 18. f4+ Rh6 19. Dh3+ Rg6 20. f5+ exf5 21.<br />

Txf5 Th8 22. Dg4+ Rh7 23. Txf7 e as pretas rendem-se pois o mate<br />

é impossível de parar. 23. Dg8 ou 23. Tg8 24. Dh5++.<br />

50 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

PASSATEMPOS CLUBE TEMPO LIVRE<br />

Palavras Cruzadas > por Tharuga Lattas<br />

Horizontais: 1-Ilusão; Parte interior da borda que serve de parapeito<br />

ao navio. 2-O mesmo; Certos; Rio da Europa norte-ocidental. 3-Uma<br />

das divisões dos vertebrados; Lota; Dama. 4-Aptidão; Cuidais;<br />

Excepto. 5-Pertences; Cromo (s.q.); Senhoras; Caminhava; Sua. 6-<br />

Rezai; Angra. 7-Planície; Vaticina. 8-Escuro; Argolas. 9-0; Símbolo de<br />

unidade electromagnética; Sapo do Amazonas; Sair; Igreja episcopal.<br />

10-Anuência; País do sudeste-asiático; Óxido de cálcio. 11-Nome<br />

pessoal masculino; Nome de uma planta vulgar, própria das regiões<br />

quentes, muito utilizada na indústria de tecidos grosseiros;<br />

Hexaedro regular. 12-Azedume; Ausenta-se; Detonação. 13-Que<br />

treme; Cumprimentara.<br />

Verticais: l-Paro-real; Avalie. 2-Avoz do lobo e de outras feras; Atar. 3-<br />

O mesmo; Remoinho de água; Enfade (fig.). 4-Período de tempo;<br />

Vila portuguesa do distrito de Portalegre; Ruído. 5-Prep. de “lugar”;<br />

Atraiçoarem; Ruténio (s.q.). 6-Aspecto; Filha de Cadmo e de<br />

Harmónia e mulher de Atamas, rei de Tebas; Carta de jogar de uma<br />

só pinta. 7-Liçoes; Aplana. 8-Apontamentos; Carvão incandescente.<br />

9-Hastes; Trajais, 10-Nesse lugar; Lavra; Suf. nom. de origem latina,<br />

designativo, sobretudo, do “lugar onde os animais se recolhem”. 11-<br />

Antiga cidade da Caldeia, pátria de Abraão; O maior território da<br />

Ásia setentrional; Tratamento familiar. 12-Velhaco; Paixão; Guerreiro<br />

valente (fig.). 13-Aniversário; Lamentos; Pároco. 14-Marecimentos<br />

(fig.); Paladar. 15-Patroas; Pele de cordeiro com a sua lã.<br />

SOLUÇÕES<br />

Interessantíssima chave de sacrifício singelo 1.<br />

Db4 ameaçando 2. Db8 mate; se 1…. Bxb4, 2.<br />

Bg3++; se 1…. Cxe6 2. Cd7++; se 1…. Cb5<br />

2.Df4++


Este cupão só é válido na compra<br />

de 1 livro constante da nossa secção<br />

“ Novos livros ”, onde está incluído<br />

o preço de venda ao público<br />

(PVP) e respectiva Editora<br />

Clube<br />

TempoLivre<br />

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NOTA: os cupões para aquisição de Livros são válidos até ao final do ano de <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

DESCONTO<br />

2,74<br />

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VALIDADE<br />

31de Dezembro/<strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

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Remeter para<br />

Clube Tempo Livre –<br />

LIVROS, Calçada de<br />

Sant’Ana n<strong>º</strong> 180 –<br />

1169-062 Lisboa, o<br />

seguinte:<br />

● Pedido, referenciando<br />

a editora e o título<br />

da obra pretendida;<br />

● Cheque ou Vale dos<br />

Correios, correspondente<br />

ao valor (PVP)<br />

do livro, deduzindo<br />

2,74 <strong>euros</strong> de desconto<br />

do cupão.<br />

● Portes dos Correios<br />

referente ao envio da<br />

encomenda, com<br />

excepção do<br />

estrangeiro, serão<br />

suportados pelo Clube<br />

Tempo Livre. Em caso<br />

de devolução da<br />

encomenda, os custos<br />

de reenvio deverão ser<br />

suportados pelo<br />

associado.


CLUBE TEMPO LIVRE NOVOS LIVROS<br />

EDITORA ULISSEIA<br />

A MARCA DO DIABO<br />

Rennie Airth<br />

344 pg. | 21,49 (PVP)<br />

Um brilhante inspector da<br />

Scotland Yard está<br />

reformado e desfruta de<br />

uma pacata existência no<br />

campo. Mas é subitamente<br />

perturbado por uma<br />

descoberta macabra: nos<br />

campos que cercam a sua<br />

casa jaz o corpo destroçado<br />

de uma menina da aldeia,<br />

brutalmente assassinada.<br />

Convencido que não se<br />

trata de um crime isolado,<br />

as evidências apontam para<br />

um suspeito ligado às redes<br />

de espionagem<br />

internacional.<br />

EDITORIAL PRESENÇA<br />

OS GUARDIÃES DO<br />

CREPÚSCULO<br />

Serguei Lukiánenko<br />

352 pg. | 20 (PVP)<br />

Anton, Guardião da Noite,<br />

regressa sozinho a Moscovo<br />

para passar calmamente o<br />

último dia férias, quando<br />

recebe um telefonema do<br />

chefe, Guesser. Uma carta<br />

anónima denunciara que<br />

um Ser Diferente revelou a<br />

um humano a existência da<br />

sua espécie e se prepara<br />

para pôr em prática o até aí<br />

impensável acto de<br />

transformar um humano<br />

num Ser Diferente, o que<br />

ameaça todos os reinos da<br />

Penumbra. Agora Anton<br />

tem pela frente um delicado<br />

trabalho de detective, para<br />

investigar todos os<br />

possíveis suspeitos,<br />

humanos ou não<br />

UMA ESCOLHA POR<br />

AMOR<br />

Nicholas Sparks<br />

256 pg. | 18 (PVP)<br />

Passado na costa da<br />

Carolina do Norte, o livro<br />

aborda as consequências<br />

de diversas escolhas feitas<br />

por Travis Parker, um<br />

veterinário, e pela sua<br />

vizinha Gabrielle Holland,<br />

assistente médica. Travis<br />

levava uma vida tranquila<br />

até Gaby fazer parte dela. E<br />

o mesmo se poderá dizer de<br />

Gaby que mantinha uma<br />

relação de longa data com o<br />

namorado até se apaixonar<br />

perdidamente por Travis.<br />

A MORTE DE THEO VAN<br />

GOGH<br />

Ian Buruma<br />

208 pg. | 15 (PVP)<br />

O cineasta holandês Theo<br />

van Gogh foi surpreendido<br />

por um jovem muçulmano<br />

que disparou sobre ele em<br />

plena luz do dia numa rua<br />

de Amesterdão, em 2<strong>00</strong>4. O<br />

motivo mais óbvio, o filme<br />

Submission, considerado<br />

uma ofensa ao Islão. Ian<br />

Buruma rumou então ao<br />

país que se orgulhava de<br />

ser o modelo da tolerância e<br />

do multiculturalismo e<br />

apresenta um retrato<br />

recheado de contradições,<br />

um microcosmos dos<br />

grandes desafios que se<br />

apresentam às sociedades<br />

do século XXI.<br />

EUROPA-AMÉRICA<br />

A BELA DIETA DA<br />

INFIDELIDADE<br />

Lou Harry e Eric<br />

Pfeffinger<br />

296 pg. | 19,99 (PVP)<br />

Três casais partilham o<br />

mesmo problema: os<br />

maridos pesam mais de 130<br />

quilos e nem tudo é uma<br />

questão de músculos.<br />

Preocupadas, as esposas<br />

congeminam um plano para<br />

os pôr na linha. Se<br />

conseguirem emagrecer<br />

uns bons quilos poderão<br />

passar a noite com uma<br />

prostituta de luxo. É claro<br />

que é pura invenção, mas,<br />

à medida que os maridos<br />

começam a perder os<br />

quilos, as mulheres iniciam<br />

uma busca frenética para<br />

encontrar a prostituta ideal.<br />

COPPER – UMA VIDA DE<br />

CÃO<br />

Annabel Goldsmith<br />

2<strong>00</strong> pg. | 15,50 (PVP)<br />

Uma divertida história de<br />

um herói canino que conta<br />

suas assombrosas<br />

aventuras, amores e, claro,<br />

a vida na alta sociedade.<br />

Copper não era um cão<br />

vulgar. Por vezes descarado<br />

mas sempre encantador,<br />

carismático e com uma<br />

propensão para arranjar<br />

sarilhos, este sábio rafeiro<br />

— ou cruzado, como ele<br />

preferia — teve uma vida<br />

impressionante.<br />

RESSUREIÇÃO – O<br />

EVANGELHO PERDIDO<br />

Tucker Malarkey<br />

348 pg. | 23,90 (PVP)<br />

A obra baseia-se em<br />

acontecimentos actuais<br />

envolvendo os Evangelhos<br />

Perdidos de Nag Hammadi.<br />

Suprimidos por oficiais da<br />

Igreja, estes textos<br />

sagrados desapareceram há<br />

quase dois mil anos e foram<br />

redescobertos<br />

inesperadamente no<br />

deserto a sul do Cairo, nos<br />

anos de 1940. À volta<br />

destes decorreram notáveis<br />

acontecimentos e a autora<br />

teceu um emocionante e


excitante conto de amor e<br />

guerra, religião e<br />

assassinatos.<br />

O MANUAL PERDIDO DE<br />

INSTRUÇÕES PARA A<br />

VIDA<br />

Joe Vitale<br />

2<strong>00</strong> pg. | 18,98 (PVP)<br />

Repleto de lições de vida, o<br />

autor usa o humor e<br />

pequenos episódios<br />

divertidos para apresentar<br />

passos práticos que os<br />

leitores podem dar para<br />

tomar o controlo das suas<br />

vidas, vencer todos os<br />

obstáculos e encontrar a<br />

realização plena.<br />

ROMA EDITORA<br />

NOVO MEMORIAL DO<br />

ESTADO APOSTÓLICO –<br />

PRIMEIRA CRÓNICA DOS<br />

LÓIOS<br />

Paulo de Portalegre<br />

240 pg. |15 (PVP)<br />

É uma narrativa<br />

memorialista sobre os<br />

primórdios de uma das<br />

congregações religiosas<br />

mais inovadoras e<br />

importantes do séc. XV: a<br />

Congregação de São João<br />

Evangelista, cujos membros<br />

eram vulgarmente<br />

conhecidos por Lóios. Uma<br />

fonte de grande importância<br />

histórica e cultural, até<br />

agora inédita, que contribui<br />

para os conhecimentos de<br />

reforma eclesiástica do séc.<br />

XV, nos quais os Lóios<br />

surgem como uma original<br />

família religiosa que<br />

estabelece relações<br />

culturais e institucionais<br />

com os reformistas italianos.<br />

GRAMÁTICA HISTÓRICA<br />

Liberto Cruz<br />

140 pg. | 10 (PVP)<br />

Não é uma gramática no<br />

sentido exacto do termo. É<br />

mais um inteligente -<br />

porque acutilante num<br />

tempo em que a repressão<br />

e a censura reinavam - jogo<br />

de palavras fonético,<br />

morfológico, sintáctico e<br />

semântico. Que dá gosto<br />

jogar, também nos dias de<br />

hoje, quer pelo seu fino<br />

recorte irónico, quer pelo<br />

seu lado intemporal.<br />

A obra publicada em 1971,<br />

assinada por Álvaro Neto, é<br />

o retrato do país e a sua<br />

leitura distrai e faz pensar.<br />

TEXTO EDITORA<br />

A MINHA DOR TEM O TEU<br />

NOME<br />

Hanife Gashi<br />

272 pg. | 16.99 (PVP)<br />

Hanife Gashi cresce feliz no<br />

Kosovo e conhece o destino<br />

de muitas mulheres<br />

muçulmanas: um<br />

casamento arranjado pelos<br />

pais que representa o fim<br />

dos seus sonhos. Após fuga<br />

por questões politicas para<br />

a Alemanha tira a carta de<br />

condução e um curso de<br />

alemão, actos que lhe<br />

valem abusos físicos por<br />

parte do marido.<br />

Entretanto, a oposição feroz<br />

do marido ao namoro da<br />

filha de 16 anos traz<br />

consequências ainda mais<br />

trágicas.<br />

O PINÁCULO<br />

William Golding<br />

208 pg. | 16,99 (PVP)<br />

O Deão Jocelin tem uma<br />

visão: Deus escolheu-o para<br />

erigir um magnificente<br />

pináculo na sua catedral. O<br />

pedreiro encarregado da<br />

obra desaconselha-o<br />

fortemente, pois a velha<br />

catedral foi construída sem<br />

fundações. Mesmo assim, o<br />

pináculo ergue-se, octógono<br />

sobre octógono, cume sobre<br />

cume, até os pilares<br />

começarem a estremecer e<br />

o solo a afundar.<br />

OSSOS PERDIDOS<br />

Kathy Reichs<br />

288 pg. | 19,99 (PVP)<br />

Nos sombrios dias de<br />

Dezembro, Temperance<br />

Brennan viaja até Montreal<br />

para testemunhar como<br />

perita num julgamento por<br />

homicídio. Devia estar a<br />

rever os seus<br />

apontamentos, mas, em vez<br />

disso, está a escavar na<br />

cave de uma pizaria. E<br />

agora, os restos mortais de<br />

três jovens mulheres são<br />

postos a descoberto. Como<br />

vieram aqui parar? Quando<br />

morreram?<br />

SINAIS DE FOGO<br />

TOP 1<strong>00</strong> REMÉDIOS<br />

CASEIROS<br />

Sarah Merson<br />

128 pg. | 14,45 (PVP)<br />

Um valioso compêndio de<br />

sabedoria e conhecimentos<br />

tradicionais que revela<br />

como remédios<br />

consagrados pelo tempo<br />

podem melhorar o nosso<br />

bem-estar.<br />

Propriedades curativas de<br />

1<strong>00</strong> tratamentos naturais<br />

experimentados e testados<br />

ao longo dos séculos com<br />

receitas fáceis e baratas de<br />

chás, emplastros e de<br />

tratamentos alimentares.<br />

Venha descobrir como o chá<br />

de mirtilo pode aliviar a<br />

tosse e a guacamole<br />

controlar o nível de<br />

colesterol.


CLUBE TEMPO LIVRE ROTEIRO<br />

BEJA<br />

Cultura<br />

FEIRA: dias 1 a 4 – feira dos<br />

Santos em Alvito; dias 9 a<br />

11 - RuralBeja no Parque de<br />

Feiras e Exposições, em<br />

Beja.<br />

BRAGA<br />

Cultura<br />

ESPECTÁCULOS: dia 10 às<br />

21h – Festival de Folclore do<br />

R. Folclórico da Casa do<br />

Povo de Calendário, em<br />

Famalicão; dia 10 às 22h -<br />

O Conjunto Típico “Estrelas<br />

de S. Vicente” de Fafe, em<br />

Escudeiros; dia 17 às 21h45<br />

- Conjunto de Guitarras de<br />

Manuel Lima na Grande<br />

Noite do Fado, no Parque de<br />

Exposições de Braga.<br />

CINEMA: dia 9 às 21h na<br />

Casa do Povo de Apúlia; dia<br />

13 às 15h na Casa do Povo<br />

de Fermentões; dia 16 às<br />

21h no Centro Cultural de<br />

Moreira Cónegos; dia 23 às<br />

21h Centro Rec. Cult.<br />

Campelos; dia 29 ás 21h na<br />

Assoc. Cult. Valdosende;<br />

dia 30 às 21h na Casa do<br />

Povo de Apúlia.<br />

CURSOS: Danças de Salão e<br />

Latino Americanas, Artes<br />

Decorativas, Bordados<br />

Regionais, Tapeçarias de<br />

Arraiolos, Canto, Teatro,<br />

Reciclagem Artística e<br />

Costura, Pintura e Viola<br />

Clássica na Delegação.<br />

Desporto<br />

FUTEBOL: sáb. e dom. -<br />

várias Jornadas<br />

ATLETISMO: dia 5 e 11 às<br />

10h – provas de Corta-<br />

Mato, em Guimarães; dia 25<br />

- Provas Especiais de<br />

Estrada, 27<strong>º</strong> G.P. Candoso S.<br />

Tiago em Guimarães.<br />

ANDEBOL: dia 9 – Torneio<br />

de Outono em Guimarães.<br />

54 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

DAMAS: dia 28 –<br />

Campeonato Nacional<br />

Equipas, informações na<br />

Delegação<br />

GINÁSTICA: Classes na<br />

Delegação de Braga e<br />

Pavilhão de Guimarães.<br />

JUDO: Classes de Infantis,<br />

Juvenis e Adultos na<br />

Delegação.<br />

COIMBRA<br />

<br />

Roteiro <strong>Inatel</strong> de actividades culturais e desportivas<br />

Cultura<br />

MÚSICA: dia 3 às 21h30 -<br />

Tuna Mouronhense no<br />

Centro Comunitário Dr.<br />

Jaime Ramos em Miranda<br />

do Corvo e Coro dos<br />

Pequenos Cantores de<br />

Coimbra no Seminário<br />

Maior de Coimbra; dia 4 às<br />

16h - Jazz pelos Dixie<br />

Gringos Jazz Band no<br />

Centro Comunitário Dr.<br />

Jaime Ramos em Miranda<br />

do Corvo; dia 21 às 21h30 -<br />

Coro dos Professores de<br />

Coimbra na Casa<br />

Municipal da Cultura de<br />

Coimbra.<br />

EXPOSIÇÃO: até ao dia 16 -<br />

Fotografias do “Concurso<br />

de Fotografia a Monsenhor<br />

Nunes Pereira” na Casa<br />

Municipal da Cultura de<br />

Coimbra; dia 28 às 17h -<br />

Inauguração da Exposição<br />

bio-bibliográfica e iconográfica<br />

em homenagem a<br />

Monsenhor Nunes Pereira<br />

em Côja.<br />

MESA REDONDA: dia 3 -<br />

Apreciação crítica da obra<br />

do artista Nunes Pereira na<br />

Galeria Almedina em<br />

Coimbra<br />

TEATRO: 22<strong>º</strong> Ciclo de Teatro<br />

de Outono, Projecto<br />

Tchéckov em um Acto,<br />

informações na Delegação<br />

CURSOS: Viola/Violino,<br />

Bandolim/Cavaquinho,<br />

Acordeão/Concertina,<br />

Órgão/Piano, Sopros (diver-<br />

sos) e Formação Musical, na<br />

Delegação.<br />

GUARDA<br />

Cultura<br />

WORKSHOP: dia 3 às 15h -<br />

Workshop “Novas Formas<br />

de Espectáculo na<br />

Etnografia”, no Auditório do<br />

Centro de Interpretação da<br />

Serra da Estrela, Seia.<br />

Desporto<br />

ATLETISMO: dia 18 às 10h -<br />

8ª Subida Vale de Sameiro,<br />

Manteigas;<br />

BTT: dia 10 às 9h - Passeio<br />

de S. Martinho, na Guarda;<br />

dia 18 às 10h - 8ª Subida<br />

Vale de Sameiro,<br />

Manteigas; dia 25 às 9h -<br />

Invernal de Btt “ Cidade da<br />

Guarda”.<br />

DAMAS: dia 11 às 14h -<br />

Torneio Damas de Melo em<br />

Gouveia.<br />

MARCHA: dia 11 às 9h -<br />

Marcha Regional e<br />

Magusto, na Guarda; dia<br />

18 às 9h - Subida ao Vale de<br />

Sameiro, Manteigas.<br />

TIRO: dia 17 às 14h -<br />

Torneio em Figueira Castelo<br />

Rodrigo.<br />

LEIRIA<br />

Cultura<br />

WORKSHOP: dia 17 às 15h –<br />

Workshop “Manutenção e<br />

Preservação do Traje”, no<br />

Auditório do Centro<br />

Associativo e Municipal de<br />

Leiria.<br />

LISBOA<br />

Cultura<br />

CONCERTO: dia 17 às 17h30<br />

– Concerto pela Sociedade<br />

Filarmónica Incrível Aldeia<br />

Grandense, na Associação<br />

de Moradores, Cultura e<br />

Recreio de Fonte Grada,<br />

Torres Vedras.<br />

T EATRO DA T RINDADE<br />

Sala Principal:<br />

A DESOBEDIÊNCIA – até ao<br />

dia 25 (4ª-f a Sáb. às 21h30<br />

e Dom. às 16h)<br />

ANTES DE COMEÇAR – até<br />

ao dia 22 de Dez. (Sáb. às<br />

16h, 3ª a 6ª<strong>º</strong>feira às 14h30)<br />

CONCERTOS: dia 28 às<br />

21h30 - Pedro Jóia; dia 29<br />

às 21h30 - Nancy Veira; dia<br />

30 às 21h30 - Orquestra do<br />

Algarve (Concerto<br />

Comemorativo 140 Anos do<br />

Trindade)<br />

Sala Estúdio:<br />

2 PERDIDOS NUMA NOITE<br />

SUJA – até ao dia 18 ( 4ª-f. a<br />

Sáb. às 22h e Dom. às 17h)<br />

LIBRAÇÃO – de 23 a 2 de<br />

Dez. ( 4ª-f. a Sáb. às 22h e<br />

Dom. às 17h)<br />

Teatro-Bar:<br />

VINHO VADIO – de 8 a 24<br />

(5ª-f a Sáb. às 23h)<br />

SANTARÉM<br />

Cultura<br />

TEATRO: dia 4 às 16h – “O


Gato das Botas” pelo Grupo<br />

“Teatrinho” no Centro<br />

Recreativo e Cultural da<br />

Freguesia de Carregueiros.<br />

Desporto<br />

ACTIVIDADES BÁSICAS:<br />

Classes de Ginástica (2ª e<br />

5ª feiras às 17h30),<br />

Aeróbica (3ª e 5ª feiras às<br />

17h30 e 18h30),<br />

Hidroginástica (2ª e 4ª<br />

feiras às 10h15, 3ª e 5ª<br />

feiras às 09h15, 19h15 e<br />

20h).<br />

SETÚBAL<br />

Cultura<br />

FADOS: dia 9 às 21h30 - “<br />

Noite de Fados” no<br />

Auditório da Delegação; dia<br />

10 às 21h - Noite de Fados<br />

em Palmela.<br />

BAILE: dia 16 e 30 às 14h30-<br />

Baile Sénior na Delegação.<br />

VIANA DO CASTELO<br />

Cultura<br />

ESPECTÁCULOS: dia 3 às<br />

21h30 - “Carreço<br />

Fashion” Danças de<br />

Salão, Desfile de Moda e<br />

Música na Sociedade<br />

Instrução Recreio de<br />

Carreço; dia 11 às 15h –<br />

“Associmusica” na<br />

Associação Juvenil de<br />

Deão; dia 16, 17, 18 de<br />

<strong>Novembro</strong> – “X Serão e<br />

XII Encontro Nacional de<br />

Tocadores de Concertina<br />

e Cantadores ao Desafio”,<br />

em Valença; dia 24 às 22h<br />

- Homenagem “Tributo a<br />

Manuel de Samonde”,<br />

Tocador de Concertina, no<br />

Teatro Sá de Miranda.<br />

Desporto<br />

PEDESTRIANISMO: dia 13 às<br />

9h - “Romeiros de S. João<br />

de Arga” na Serra D`Arga<br />

VISEU<br />

Cultura<br />

MAGUSTO: dia 10 às 19h –<br />

Magusto de São Martinho,<br />

em São Martinho de<br />

Orgens.<br />

Desporto<br />

TÉNIS DE MESA: dia 3 às<br />

14h30 - Torneio de<br />

Regularidade no Pavilhão<br />

Municipal em Carregal do Sal.<br />

MALHA: dia 4 às 14h – II<br />

Torneio Núcleo<br />

Sportinguista Santa Comba<br />

Dão, no Campo de Futebol<br />

Dr. Esteves Faria.<br />

TIRO AO ALVO: dia 17 às 14h<br />

- Torneio no Pavilhão<br />

Gimnodesportivo do <strong>Inatel</strong><br />

em Viseu<br />

MALHA E DAMAS: dia 17 às<br />

14h - Torneio no Pavilhão<br />

Gimnodesportivo do <strong>Inatel</strong><br />

em Viseu


A CHEFE SUGERE<br />

LUZIA AZEVEDO| INATEL ENTRE-OS-RIOS<br />

Cabrito assado à Padeiro<br />

É sabido que cabrito assado com batatas assadas é<br />

um prato bem Português, servido em várias regiões<br />

de Norte a Sul, geralmente associado a dias festivos.<br />

A designação “à padeiro” surge da tradição de assar<br />

o cabrito e as batatas no forno tradicional do pão. Na<br />

zona de Entre-os-Rios o cabrito assa-se depois de ter<br />

estado numa rica marinada de vinho, alho, louro,<br />

banha de porco, entre outros ingredientes, que<br />

conferem ao cabrito a tenrura e apuram o sabor.<br />

INGREDIENTES PARA 4 PESSOAS:<br />

14<strong>00</strong> g de cabrito; 250 g de cebola, 4 dentes de alho,<br />

80 ml de vinho branco maduro, banha de porco q.b.,<br />

12<strong>00</strong> g de batatas, 1 ramo de salsa, 1 limão, louro q.b.,<br />

sal q.b., piri-piri q.b., colorau q.b..<br />

PREPARA-SE ASSIM:<br />

Prepara-se o cabrito de véspera (parte-se, lava-se e<br />

escorre-se). Faz-se uma pasta com um pouco de<br />

banha, a cebola cortada em meia-lua, o alho, o louro,<br />

o vinho branco, o sal, o piri-piri, o sumo de limão, a<br />

salsa e o colorau.<br />

Unta-se o cabrito com esta pasta e guarda-se no<br />

frigorífico, deixando marinar durante 24 horas. No<br />

dia seguinte, coloca-se o cabrito a assar durante cerca<br />

56 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

de 2 horas, em forno médio (cerca de 2<strong>00</strong><strong>º</strong>C).<br />

Enquanto assa, adiciona-se um pouco de vinho<br />

branco e mexe-se regularmente.<br />

As batatas para assar são cortadas aos gomos.<br />

Colocam-se em água e sal e escorrem-se antes de<br />

serem postas a assar. Deverá reservar-se uma parte<br />

da pasta que serviu para untar o cabrito, para que as<br />

batatas assem nesse molho. Junta-se um pouco de<br />

vinho branco para que não se agarrem ao fundo e<br />

vai-se mexendo. Rectifica-se o tempero.<br />

Serve-se o cabrito com as batatas e arroz branco,<br />

preferencialmente acompanhado de legumes<br />

cozidos.<br />

COMPOSIÇÃO NUTRICIONAL POR PESSOA:<br />

• 43,2 g de proteínas; • 28,1 g de gordura; • 70 g de<br />

hidratos de carbono; • 7,1 g de fibra; • 676 kcal<br />

INFORMAÇÕES E RESERVAS:<br />

INATEL ENTRE-OS-RIOS<br />

Torre, 4575-416 Portela - Penafiel<br />

Tel: 255 616059 - Fax: 255 615170<br />

Email: cf.erios@inatel.pt


O TEMPO E AS PALAVRAS | MARIA ALICE VILA FABIÃO<br />

São vidas...<br />

Das figuras amadas fica o eco / da sua refulgência de figuras./ São quase mágoa de sítio / em que, havendo-se já apagado a lua,<br />

brilhasse ainda o vácuo / duma presença para sempre nula./ E, contudo, o firmamento / se ilumina das máculas nocturnas / desses<br />

ecos amados entre lágrimas / na sua refulgência de figuras.<br />

Fernando Echevarría, in: Sobre os Mortos, Ed. Afrontamento, Porto, 1991<br />

Oprimeiro a regressar foi o Isaak, o droguista da<br />

esquina – disse-me, falando de um tempo passado,<br />

em que eu não sabia o que era a guerra. –<br />

Contaram-me que chegou ao anoitecer –<br />

prosseguiu. – Vinha esquelético e andrajoso e arrastava-se<br />

com dificuldade por entre as casas que ainda se mantinham<br />

de pé. Ao chegar à esquina, parou. Parecia perdido.<br />

Subitamente, pôs-se a cantar com voz roufenha e a fazer<br />

vénias diante da porta, que, como muitas outras da rua,<br />

tinha sido fechada com tábuas e pregos. Todos pensaram<br />

tratar-se de um louco, porque, com aquela barba e aquela<br />

grenha, ninguém imaginava que fosse o Isaak. Afinal,<br />

acabaram por compreender que ele não estava a cantar, mas<br />

sim a entoar, em hebraico, uma oração, uma espécie de<br />

lamento que, antes da guerra, se ouvia na antiga Sinagoga,<br />

em véspera do Sabath. Só o reconheceram quando se sentou,<br />

apático, na soleira da porta da casa que tinha sido a<br />

dele. Algumas pessoas tentaram ajudá-lo; outras aproximaram-se<br />

apenas para verificar se era realmente verdade<br />

haver sobreviventes. Escondido atrás daquela juba nojenta,<br />

porém, ele parecia cego e surdo a tudo o que o rodeava.<br />

Uma mulher pôs-lhe na frente uma tigela com duas batatas.<br />

Nem lhes tocou. Tinha sido o primeiro a chegar, segundo<br />

diziam. E veio só, é claro. Contava-se que, durante muito<br />

tempo, todos os dias à tardinha ia à estação: “A minha mulher<br />

chega hoje”, dizia. E ali ficava, no cais, à espera, com um<br />

sorriso nos lábios. Até que um dia, deixou de ir à estação.<br />

Quatro ou cinco dias mais tarde regressou o segundo, um<br />

velho que morava um pouco mais abaixo e foi trazido numa<br />

carroça de feno por um lavrador das imediações, que o<br />

tinha ajudado a sobreviver, escondendo-o num palheiro.<br />

Extremamente fraco, deitou-se no chão, ao comprido, a<br />

beijar a soleira da porta e a agradecer a Deus o ter-lhe<br />

permitido viver em liberdade.<br />

Durante uma semana não regressou mais ninguém.<br />

Era Maio, e havia muito que os salgueiros-chorões do<br />

parque se tinham coberto do verde-lagarta explosivo das<br />

Primaveras holandesas. Era a primeira Primavera em<br />

liberdade.<br />

- A seguir – continuou –, chegaram dois jovens – os dois<br />

irmãos que ainda lhe vendem o peixe, na Lange Visstraat.<br />

Consta que dormiram durante três dias seguidos e que os<br />

vizinhos os ouviam chorar alto durante o sono. Aliás, diziase,<br />

só acordaram com o choro da primeira mulher que<br />

regressara e em quem só eles reconheceram a irmã<br />

adolescente que, três anos antes, os Alemães tinham levado<br />

com o resto da família. Tinha sido uma das vítimas do Dr.<br />

Mengele, dizia-se, à boca pequena.<br />

(Quando a conheci, na peixaria, teria os seus quarenta,<br />

continuava a silenciar sobre o assunto, mas havia muito já<br />

que tinha deixado de ocultar com a manga aquele número<br />

misterioso tatuado a negro na face interior do braço. De<br />

quando em vez, deixava de ser vista. Enlouquecia, dizia-se.)<br />

Ameia dúzia de Judeus do bairro que sobreviveram<br />

nos campos de concentração alemães ou<br />

escondidos algures regressou logo após o fim da<br />

guerra, ao longo das últimas semanas de Maio.<br />

- Nessa altura, ainda eu estava no campo de concentração<br />

japonês de Tjideng – acrescentou, com voz<br />

pensativa. Fugi dos nazis, para Batávia – do espeto para a<br />

sertã! Durante mais de três anos, nada soube do meu<br />

marido, que andava num petroleiro, nas linhas do<br />

Oriente. Nem ele de mim. (“Entre duas palavras, a<br />

voz/perde o equilíbrio/ escorrega no próprio reflexo”.) De<br />

súbito, os olhos iluminam-se-lhe: - Foi com os “Japs” que<br />

aprendi as primeiras palavras portuguesas: Pan (pão) e<br />

Kappa (capa). Garpo, mantêga, bandera e mesja, aprendi<br />

com os Indonésios. Sorri.<br />

Para ela, a salvação chegara apenas em Agosto, com<br />

Hiroshima e Nagazaki. Doía-lhe, disse, dever a vida à<br />

bomba atómica, que tantas vidas e sofrimento custara. Mas<br />

era a verdade.<br />

Ela e o marido tinham sido os últimos a regressar, quase<br />

um ano mais tarde. Olho-a, na fotografia amarelada: - “A<br />

caminho de Priok – 11.2 .42. A nossa última hora”.<br />

Onde, agora, todos?<br />

Mais uma vez, os crisântemos florescem aqui por toda a<br />

parte. Impossível esquecer que, para os que partiram, não<br />

haverá mais regresso. Inútil ir à estação.<br />

O texto escreve-se - exilada dele ou exilada nele, reconto.<br />

Lá fora, alguém suspira: - São vidas!... ■<br />

<strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong> TempoLivre 57


O tigre da Malásia<br />

Andávamos a preparar há um mês o primeiro<br />

folhetim radiofónico da Rádio Moçambique.<br />

Várias sugestões foram consideradas, ponderadas,<br />

relidas. A nossa memória foi buscar<br />

ao sótão, entre poeiras e teias de aranha, logo à entrada,<br />

Ponson du Terrail, Victor Hugo, o pai e o filho<br />

Dumas, Jules Verne, além de outros. No meio ou entretanto,<br />

vinham achegas de todos os lados, sugestões,<br />

pareceres, e perguntas. Muitas. Tema moderno ou antigo?<br />

Político ou aventuroso? Com muitos beijos à mistura<br />

como nos filmes de aventuras ou não?<br />

Finalmente, fizemos uma ampla lista que apresentámos<br />

vaidosos à consideração superior. Tendo ela decidido, e<br />

bem, por uma obra e autor não citados na longa e estafante<br />

lista: Sandokan, o Tigre da Malásia, de Emílio Salgari.<br />

Toda a equipa ficou tão contente com esta escolha<br />

como se tivesse de novo descoberto a penicilina.<br />

Possuía tudo o que era necessário; todos os ingredientes<br />

clássicos e imortais: amor, intriga, ciúme, traição,<br />

morte, luta contra os poderosos, combates marítimos,<br />

tiros, beijos, arrebatamentos patrióticos e amorosos,<br />

tendo até um toque de cultura ocidental com a Pérola<br />

de Labuan, uma menina inglesa de alta estirpe e estonteante<br />

beleza, a estudar o Fur Elise, de Beethoven, no<br />

piano que havia na mansão do governador inglês.<br />

Querem melhor?<br />

Reuniu-se então uma equipa para fazer a adaptação,<br />

nela figurando o poeta e jornalista Leite Vasconcelos<br />

que, com muito humor, dizia que pertencia à Frelima, a<br />

Frente de Libertação da Malásia. Por esta sua graça, foilhe<br />

atribuído o papel de Lord Brooks, que desempenhou<br />

com muita elegância e, obviamente, “british style”.<br />

Muitas e interessantes situações ocorreram durante as<br />

gravações mas uma das mais relevantes foi a fuga pela<br />

floresta de Sandokan, seguido de perto, se bem me lembro,<br />

por Tremal-Naik. Ele, para conseguir correr, tinha<br />

de abrir caminho à catanada à direita e à esquerda, vigorosamente.<br />

Fomos então gravar, comandados pelo<br />

sonoplasta Carlos Silva, para a zona de eucaliptos nos<br />

terrenos da Feira Internacional. Aliás, do outro lado da<br />

rua. Então, o que é que o povo viu, parado, espantado,<br />

confuso e boquiaberto? Um respeitável senhor de cabelo<br />

branco, à frente, com um ferro na mão a dar pancada<br />

nas árvores à direita e à esquerda, um técnico de som a<br />

captar com um gravador portátil, um ajudante e, a<br />

58 TempoLivre <strong>Novembro</strong> <strong>2<strong>00</strong>7</strong><br />

CRÓNICA |ÁLVARO BELO MARQUES<br />

fechar, o realizador. Todos berravam, arfavam, corriam<br />

às voltas das árvores e suavam… As pessoas assistiam e<br />

por certo pensavam que éramos doidos ou que se tratava<br />

do ritual de uma nova seita contra a natureza, pois<br />

pancada nas árvores não faltava.<br />

Um menino dos seus dez anos que vinha pelo trilho<br />

dos eucaliptos com uma gaiola de pássaros na mão,<br />

estava estático, sem saber se deveria agachar-se para<br />

não ser visto ou atirar a gaiola fora e desatar a fugir<br />

com quanta força tivesse. E os olhos dele por certo já<br />

tinham visto muita coisa ruim.<br />

Conseguimos fazer a gravação antes da chegada da<br />

polícia.<br />

Contudo, a mais “significativa” situação passou-se no<br />

último andar da Rádio Moçambique: no enorme salão<br />

de festas, que permitiu a gravação de um som<br />

necessário ao longo de vários episódios, principalmente<br />

nas abordagens e no final das reuniões com<br />

Sandokan. Como se necessitava de muitas vozes (não<br />

sabíamos ao certo quantas pessoas levava um parau), o<br />

mesmo sonoplasta já referido foi buscar todo o pessoal<br />

masculino da discoteca, mais os companheiros que foi<br />

encontrando pelo caminho. No final eram cerca de 30<br />

ou mais os tigres que, bem-dispostos, fizeram a abordagem<br />

ao salão de festas.<br />

Estes candidatos a lugar-tenente de Sandokan,<br />

tinham de berrar várias vezes, a plenos pulmões,<br />

“Morte aos Ingleses”, com mais gana e<br />

força que o povo português nas ruas, em 1891,<br />

aquando do ultimato.<br />

E começou-se a gravação, com várias repetições, como<br />

sempre acontece. Estava tudo a ir bem quando alguém<br />

se lembrou de que tínhamos as janelas todas abertas,<br />

para não haver eco, e do outro lado da rua estavam os<br />

Ingleses, por certo a tomar chá gelado na sua<br />

Embaixada, rodeada de jardins copiados de Kensington.<br />

Parámos precisamente quando à porta surgiu a cabeça<br />

de um segurança, com a arma na mão, a olhar espantado<br />

e ofegante para nós. Tinha ouvido, no piso térreo, os<br />

nossos berros e subido as escadas a correr.<br />

Explicámos o que se passava e o porquê daquela gritaria.<br />

Compreendeu perfeitamente, mas afastou-se a<br />

abanar a cabeça e a murmurar: “Morte aos Ingleses?<br />

Porquê?” ■

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