Anne Caroline Nava Lopes - Outros Tempos
Anne Caroline Nava Lopes - Outros Tempos
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morrer transformam-se ao longo do tempo, visto que são indissociáveis da própria<br />
evolução das sensibilidades, que são, por sua vez, socialmente construídas.<br />
As atitudes em relação à morte e a imagem que a morte possui em nossa<br />
sociedade não podem ser entendidas a partir de uma perspectiva meramente<br />
psicológica de visibilidade e compreensão individual. Só a partir de uma perspectiva<br />
de dinâmica do imaginário coletivo podemos conferir significação social à<br />
experiência humana de deparar-se com sua condição finita.<br />
Na perspectiva de utilizar o imaginário sagrado da morte a partir das<br />
práticas sociais que circulavam em meio às elites no Ocidente, no Brasil e por<br />
extensão em São Luís no século XIX, busca-se pensar os ritos fúnebres e as<br />
práticas presentes no sistema cultural da morte percebendo sua mudança de<br />
sensibilidade. Acreditamos que as noções de representações 2 e reconfigurações<br />
podem nos auxiliar nessa empreitada na medida em que poderemos perceber o fato<br />
de que a sociedade gradualmente confere novos sentidos aos fenômenos sociais<br />
frutos da própria dinâmica que passa a conferir valor ao individualismo, laicização e<br />
humanismo.<br />
Ressalta-se, que este trabalho não tem como objeto de investigação as<br />
representações sobre a morte na cidade de São Luís no século XIX. Não é nossa<br />
proposta fazer uma espécie de História do Maranhão. O que desejamos aqui<br />
construir é uma análise sobre a mudança de sensibilidade sobre a morte no<br />
Ocidente e no Brasil do século XIX e isso se justifica pela necessidade de abordar a<br />
questão da mudança de sensibilidade fúnebre pela perspectiva da longa duração,<br />
afim de que possamos compreender uma dinâmica mais ampla das práticas sociais<br />
para então percebermos o processo atual de “desformalização” da relação com a<br />
morte.<br />
2 A noção de “representações” que aqui utilizamos está fundamentada em Roger Chartier, que aponta<br />
que estas são elementos que tentam reconstituir o imaginário de organizações sociais e de sua<br />
realidade, bem como de suas significações. Desse modo, para esse autor, os comportamentos<br />
sociais decorrem de um modo que as representações são incorporadas pelo sujeito, uma vez que se<br />
tratam de significações presentes num sistema de idéias dos costumes de uma época. Nesse<br />
sentido, utiliza-se nesse trabalho as noções de “representações”, pois para Chartier (1987, p. 17) “as<br />
representações do mundo social assim construídas, embora aspirem à universalidade de um<br />
diagnóstico fundado na razão, são sempre determinadas pelos interesses dos grupos que as forjam”.