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Anne Caroline Nava Lopes - Outros Tempos

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Percebe-se, pois, que as tradicionais práticas fúnebres sacralizadas<br />

conferem à morte uma ligação estrita com a noção de eternidade, com a noção de<br />

Deus e idéia de vida no “céu” ou no “inferno”. Por conta de todo esse imaginário<br />

religioso católico é que os sepultamentos eram realizados nas próprias Igrejas, em<br />

seus altares, paredes, solo e arredores.<br />

As igrejas católicas eram, por assim dizer, verdadeiros cemitérios.<br />

Enterrava-se pelas paredes, sob os altares, abaixo deles, próximo dos oratórios, no<br />

solo, em toda parte interior e arredores. As sepulturas dentro das igrejas eram<br />

lugares sagrados nessa cultura funerária.<br />

Quanto ao medo da morte, tem-se que o temor não era exatamente o de<br />

perder a vida terrena propriamente, mas sim o de não conseguir a obtenção da<br />

salvação da alma após a “passagem”.<br />

No ambiente da São Luís em meados do século XIX, o temor não era<br />

igual ao de hoje – perder a vida terrena que prezamos – mas o de não ser salvo, o<br />

medo de ir para o “inferno” ou mesmo para o “purgatório”, onde neste último espaço,<br />

ainda que transitoriamente, haveria para a alma pecadora expiações e penas a<br />

cumprir. Decorre de toda essa simbologia o discurso eclesiástico que enaltecia a<br />

vida eterna e que propagava o medo em torno do não alcance desse objetivo e que<br />

ao mesmo tempo controlava a vida dos fiéis impondo um ideal de vida incorruptível e<br />

“correto” segundo os preceitos religiosos.<br />

Outro aspecto importante das práticas ritualísticas mortuárias era o seu<br />

caráter social. Ressalta-se os momentos de existência de cortejos – morte<br />

espetáculo – velórios e sepultamentos, todos rituais públicos. Segundo Rodrigues<br />

(1981, p. 55):<br />

O momento em que saia o cortejo acompanhando o morto era o ápice da<br />

morte-espetáculo, onde a pompa poderia ser expressa tanto na quantidade<br />

de participantes como no aparato dos objetos funerários. A morte era um<br />

acontecimento social (grifo nosso) – tanto para quem morria como para os<br />

que ficavam. Em primeiro lugar, porque se morria em casa, na companhia<br />

dos parentes, amigos, padres, inclusive crianças. Raramente a solidão fazia<br />

companhia a um moribundo. Em segundo porque, desde o leito de morte,<br />

passando pelo velório, cortejo e sepultamento, clérigos e acompanhantes<br />

leigos se faziam presentes.<br />

Esse “processo de morrer” se desenvolvia em torno do moribundo,<br />

familiares, parentes, amigos e até desconhecidos. O ambiente do quarto era o lugar<br />

mais comum do fim da vida. Esse ambiente íntimo (o quarto) era considerado o lugar<br />

onde se morria, onde ocorria a vigília das agonias e tormentos da morte, onde

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