APÊNDICE A - Um olhar microscópico do sistema nervoso
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<strong>APÊNDICE</strong> A - <strong>Um</strong> <strong>olhar</strong> <strong>microscópico</strong> <strong>do</strong> <strong>sistema</strong> <strong>nervoso</strong><br />
UM OLHAR MICROSCÓPICO DO SISTEMA NERVOSO<br />
* Maria Tereza Duarte de Souza<br />
INTRODUÇÃO<br />
Este texto foi organiza<strong>do</strong> não com o objetivo de esgotar o assunto o<br />
que não é nossa intenção e sim auxiliar o aluno <strong>do</strong> Curso de Terapia<br />
Ocupacional, de Fisioterapia e Fonoaudiologia na compreensão de um tema de<br />
suma importância para os profissionais destas áreas aborda<strong>do</strong> na disciplina<br />
Histologia, ou seja, aspectos histológicos e histofisiológicos <strong>do</strong> <strong>sistema</strong><br />
<strong>nervoso</strong>. Para tanto, buscamos o auxílio de autores como Lent e Gartnner que<br />
se dedicam ao estu<strong>do</strong> da neurociência e da histologia.<br />
ESTUDANDO O TECIDO NERVOSO - UMA VISÃO MICROSCÓPICA<br />
São limitadas as possibilidades de compreensão da organização<br />
estrutural <strong>do</strong> <strong>sistema</strong> <strong>nervoso</strong>, se ficarmos restritos à observação<br />
macroscópica. A observação microscópica <strong>do</strong> <strong>sistema</strong> <strong>nervoso</strong> foi um passo<br />
histórico de suma importância para a Neurociência, ocorri<strong>do</strong> ao final <strong>do</strong> século<br />
XIX, o que possibilitou estudar as unidades funcionais <strong>do</strong> <strong>sistema</strong> <strong>nervoso</strong> -<br />
neurônios e gliócitos.<br />
Os NEURÔNIOS são classicamente considera<strong>do</strong>s como a unidade<br />
morfofuncional fundamental <strong>do</strong> <strong>sistema</strong> <strong>nervoso</strong>, e o gliócito como unidade de<br />
apoio. Entretanto, como veremos mais adiante, a importância destas células<br />
cresceu muito em tempos recentes, depois que se constatou que elas lidam<br />
com sinais também, embora de tipo diferente. Segun<strong>do</strong> Lent (2001), sinais<br />
químicos de orientação de crescimento e da migração <strong>do</strong>s neurônios durante o<br />
desenvolvimento, de comunicação entre eles durante a vida adulta de defesa e<br />
reconhecimento na ocorrência de processos patológicos e outras funções.<br />
Os neurônios, sen<strong>do</strong> unidades funcionais, não operam isola<strong>do</strong>s e<br />
sim em conjuntos que associa<strong>do</strong>s formam os circuitos ou redes neurais.<br />
Entretanto, os circuitos neurais serão amplamente estuda<strong>do</strong>s em Fisiologia,<br />
portanto, neste texto consideraremos o neurônio isoladamente, apenas para<br />
entendermos sua estrutura e propriedades fundamentais.
Como toda célula, o neurônio apresenta uma membrana plasmática<br />
que envolve um citoplasma conten<strong>do</strong> organelas com diferentes funções e um<br />
núcleo onde encontra-se o material genético. O que diferencia os neurônios<br />
das demais células é sua morfologia adaptada para o processamento de<br />
informações e a variedade <strong>do</strong>s seus tipos morfológicos.<br />
<strong>Um</strong>a de suas propriedades é a capacidade de gerar impulsos<br />
elétricos que funcionam como unidades de informações, processan<strong>do</strong><br />
informações a respeito <strong>do</strong> meio ambiente externo e interno comandan<strong>do</strong> assim<br />
ações musculares, ativan<strong>do</strong> glândulas e códigos complexos que veiculam<br />
pensamentos, emoções, e memória no ser humano.<br />
O corpo celular ou pericário <strong>do</strong> neurônio contém um núcleo e o<br />
citoplasma. O núcleo é geralmente esférico ou ovóide, localiza<strong>do</strong> centralmente,<br />
com cromatina dispersa, o que indica intensa atividade de síntese, embora<br />
neurônios menores possam apresentar a cromatina heterocondensada. O<br />
nucléolo é bem visível.<br />
O citoplasma ocupa to<strong>do</strong> o interior da célula nervosa e sua<br />
constituição é bastante complexa. Nele encontram-se proteínas organizadas na<br />
forma de fibrilas, que compõem o citoesqueleto responsável pela manutenção<br />
da forma <strong>do</strong> neurônio e da mobilização <strong>do</strong>s neurônios jovens durante o<br />
desenvolvimento, garantin<strong>do</strong> sua migração das regiões germinativas para sítios<br />
distantes <strong>do</strong> organismo embrionário. O citoesqueleto é um <strong>do</strong>s responsáveis<br />
por emitir, alongar ou retrair ativamente os prolongamentos <strong>do</strong>s neurônios.<br />
Convém ressaltar que o citoesqueleto constitui um <strong>sistema</strong> de<br />
transporte de moléculas sinaliza<strong>do</strong>ras, nutrientes, fatores tróficos e de<br />
vesículas membranosas que se movem <strong>do</strong> soma até as extremidades <strong>do</strong>s<br />
prolongamentos assim como no senti<strong>do</strong> oposto.<br />
O citoesqueleto compõem-se de três estruturas principais:<br />
microtúbulos, neurofilamentos ( neurofibrilas) e os microfilamentos (actina).<br />
O conhecimento da real importância deste componente<br />
citoplasmático é melhor avalia<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> nos defrontamos frente a defeitos<br />
graves funcionais que podem surgir no cérebro de i<strong>do</strong>sos porta<strong>do</strong>res da<br />
Doença de Alzheimer, cujas proteínas fibrilares apresentam alterações<br />
degenerativas que se acumulam de forma desorganizada em novelos no<br />
citoplasma neuronal.
No citoplasma encontra-se abundante retículo en<strong>do</strong>plasmático<br />
rugoso -RER - com muitas cisternas paralelas, principalmente em neurônios<br />
motores, estas cisternas juntamente com os poliribossomos, aparecem como<br />
aglomera<strong>do</strong>s de material basófilo, quan<strong>do</strong> cora<strong>do</strong>s com corante básico,<br />
denomina<strong>do</strong>s de corpúsculos de Nissl.<br />
Bogliolo (1976) faz referência que as lesões no corpo celular <strong>do</strong>s<br />
neurônios faz com que a célula reaja com alterações mínimas ou graves,<br />
agudas ou crônicas, evolutivas ou não, de maneira inespecífica ou específica.<br />
<strong>Um</strong>a das alterações, precoce, é a dissolução <strong>do</strong>s corpúsculos de Nissl<br />
(cromatólise), com déficit na síntese protéica.<br />
O RER, está presente também nas regiões dendriticas, porém com<br />
cisternas pequenas, espalhadas. Não encontra-se RER no cone de<br />
implantação <strong>do</strong> axônio, entretanto existe REL no axônio.<br />
Segun<strong>do</strong> Gartner (1999) muitos neurônios apresentam abundante<br />
REL espalha<strong>do</strong>s no corpo celular se estenden<strong>do</strong> para dendritos e axônio<br />
forman<strong>do</strong> as cisternas Hipolemais, abaixo <strong>do</strong> plasmalema. Supõem-se que sua<br />
função esteja relacionada com o seqüestro de cálcio.<br />
No citoplasma <strong>do</strong> corpo celular está presente o complexo de Golgi<br />
bem desenvolvi<strong>do</strong> e perinuclear. Para Gartner esta organela está relacionada à<br />
produção de neurotransmissores ou de enzimas essenciais à sua produção no<br />
axônio.<br />
Numerosas mitocôndrias estão espalhadas pelo citoplasma <strong>do</strong> corpo<br />
celular, dendritos e axônios, entretanto são mais abundantes nos terminais<br />
axônicos, estan<strong>do</strong> em constante movimento ao longo <strong>do</strong>s microtúbulos.<br />
Nos neurônios adultos na sua maioria apresentam um único<br />
centríolo e segun<strong>do</strong> Gartner (1999) parece ser uma estrutura vestigial nos<br />
neurônios.<br />
Os dendritos são as terminações sensoriais aferentes <strong>do</strong>s neurônios.<br />
A maioria <strong>do</strong>s neurônios possue múltiplos dendritos nascen<strong>do</strong> cada um <strong>do</strong><br />
corpo celular ramifican<strong>do</strong>-se muitas vezes em ramos cada vez menores. Na<br />
base <strong>do</strong>s dendritos encontram-se as organelas habituais, exceto complexo de<br />
Golgi.
As ramificações dendriticas resultam em numerosas terminações<br />
sinápticas, permitin<strong>do</strong> que um neurônio receba e integre múltiplos impulsos.<br />
Segun<strong>do</strong> Lent o aumento da área de receptividade resulta da<br />
presença em alguns dendritos de numerosas espinhas (espícular para<br />
Gartner), projeções com uma esférula na extremidade, sobre as quais se<br />
formam contatos sinápticos.<br />
Segun<strong>do</strong> Lent (2001 p. 73) recentemente, tem-se atribuí<strong>do</strong> às<br />
espinhas dendríticas grande importância funcional, pois verificou-se que elas<br />
constituem micro compartimentos privilegia<strong>do</strong>s que concentram íons e<br />
pequenas moléculas influentes na transmissão de informações entre neurônios.<br />
Para Lent, o padrão das espinhas de um neurônio se modifica dinamicamente<br />
com a aprendizagem e com certas <strong>do</strong>enças mentais, o que nos leva a supor<br />
seu importante papel nas mais altas funções neurais.<br />
O axônio nasce como um prolongamento <strong>do</strong> corpo celular e forma<br />
em sua extremidade uma estrutura, denominada de cone de crescimento,<br />
descoberto segun<strong>do</strong> Lent (2001) por Santiago Ramón Y Cajal no ínicio <strong>do</strong><br />
século XX. Esta estrutura não está presente apenas nos axônios mais também<br />
em dendritos. Seu estu<strong>do</strong> ao microscópio eletrônico e seu comportamento<br />
através de uma câmara de vídeo acoplada ao microscópio óptico, em<br />
preparações de teci<strong>do</strong> embrionário, possibilitou não só o conhecimento de sua<br />
ultra-estrutura, mas a descoberta de que estes prolongamentos são capazes<br />
de movimentar-se devi<strong>do</strong> a presença de sensores químicos que reconhecem o<br />
micro ambiente neuronal. Para isto, o cone apresenta finas protrusões como<br />
de<strong>do</strong>s, os filopódios, uni<strong>do</strong>s por membranas os lamelopódios, que tateiam o<br />
ambiente para reconhecer pistas químicas.<br />
Entretanto, como os circuitos neurais se formam, ou seja, como o<br />
axônio cresce durante o desenvolvimento? Segun<strong>do</strong> Lent, o neurônio juvenil<br />
pode emitir axônio, que cresce ao longo de um trajeto preciso e consistente até<br />
as proximidades das células alvo, com as quais estabelece contatos<br />
especializa<strong>do</strong>s. Esse processo é de grande importância, pois de sua ocorrência<br />
depende a precisão <strong>do</strong>s circuitos forma<strong>do</strong>s durante a embriogênese, que irão<br />
garantir o funcionamento <strong>do</strong> <strong>sistema</strong> <strong>nervoso</strong>.<br />
O axônio é uma parte <strong>do</strong> neurônio de grande importância pelo papel<br />
que exerce de condutor <strong>do</strong> impulso <strong>nervoso</strong>. A membrana <strong>do</strong> axônio recebe o
nome particular de axolema e o citoplasma de axoplasma. O axoplasma não<br />
existe corpúsculos de Nissl, contém mitocôndrias esparsas, vesículas em<br />
trânsito e microtúbulos, neurofilamentos e microfilamentos.<br />
Os microtúbulos são essenciais à realização de importante função<br />
de comunicação entre o corpo celular e as extremidades <strong>do</strong> axônio: fluxo<br />
axoplasmático.<br />
O fluxo axoplasmático é um movimento contínuo de moléculas que<br />
utilizam os microtúbulos como “trilhos”. O fluxo pode partir <strong>do</strong> soma em direção<br />
às extremidades <strong>do</strong> axônio, denominan<strong>do</strong>-se de fluxo anterógra<strong>do</strong>, ou então da<br />
extremidade <strong>do</strong> axônio para o soma fluxo retrógra<strong>do</strong>.<br />
Segun<strong>do</strong> Lent (2001), o fluxo anterógra<strong>do</strong> tem três componentes.<br />
<strong>Um</strong> deles é mais rápi<strong>do</strong>, transportan<strong>do</strong> vesículas em movimento saltatório à<br />
velocidade média de 400µm/dia. As vesículas se ligam aos microtúbulos por<br />
meio de uma protéina cinesina. É através <strong>do</strong> fluxo anterógra<strong>do</strong> rápi<strong>do</strong> que o<br />
soma alimenta as extremidades <strong>do</strong> axônio com as substâncias necessárias<br />
para sintetizar mais membranas. Isso é de suma importância para axônios em<br />
crescimento, seja durante o desenvolvimento ou durante processos<br />
regenerativos. Ocorre também em axônios adultos, que apresentam uma<br />
renovação contínua de suas membranas.<br />
Através <strong>do</strong> fluxo anterógra<strong>do</strong> rápi<strong>do</strong>, os neurotransmissores e outras<br />
moléculas utilizadas na comunicação intercelular chegam as extremidades <strong>do</strong>s<br />
neurônios. Os outros <strong>do</strong>is componentes <strong>do</strong> fluxo anterógra<strong>do</strong> são mais lentos e<br />
carreiam proteínas <strong>do</strong> citoesqueleto que serão utilizadas nas extremidades<br />
axonais.<br />
O fluxo axoplasmático retrógra<strong>do</strong>, por sua vez, utiliza também o<br />
<strong>sistema</strong> de microtúbulos como “trilhos”, carregan<strong>do</strong> fragmentos de membranas<br />
e outras moléculas dentro de lisossomos para degradação ou reutilização no<br />
soma neural. A molécula motora neste caso, é a dineína.<br />
Muitos axônios, tanto no <strong>sistema</strong> <strong>nervoso</strong> central como no <strong>sistema</strong><br />
<strong>nervoso</strong> periférico, são envolvi<strong>do</strong>s por uma cobertura isolante composta por<br />
lipídios e proteínas chamada bainha de mielina. No SNC é produzida pelos<br />
oligodentrócitos, e no SNP pelas Células de Schwann. Lent (2001) nos chama<br />
atenção que a diferença entre o SNC e SNP quanto a formação da mielina<br />
não se resume no gliócito que a produz, mas se estende a sua composição
molecular. Recentemente, descobriu-se que há proteínas na mielina central<br />
que bloqueiam o crescimento regenerativo de axônios lesa<strong>do</strong>s. Essas<br />
proteínas não existem na mielina periférica, e isso explica porque os axônios<br />
periféricos são capazes de regeneração, enquanto os axônios centrais não<br />
apresentam.<br />
O mecanismo de mielinização é o processo pelo qual a célula de<br />
Schwann ou oligodendrócito enrola, concentricamente, sua membrana em<br />
torno <strong>do</strong> axônio.<br />
Durante o processo de mielinização há intervalos regulares ao longo<br />
<strong>do</strong> axônio e ocorrem interrupções na bainha de mielina, chamadas nódulos de<br />
Ranvier. Os nódulos de Ranvier indicam o limite entre as bainhas de mielina de<br />
duas células de Schwann diferentes, localizadas ao longo <strong>do</strong> axônio no SNP.<br />
A porção externa das células de Schwann é envolvida por uma<br />
lâmina basal que mergulha nos nódulos de Ranvier, recobrin<strong>do</strong> as áreas<br />
sobrepostas das lamelas da bainha de mielina de células de Schwann<br />
adjecentes, assim, cada célula de Schwann, no SNP, é recoberta por uma<br />
lâmina basal, bem como o axônio no nódulo de Ranvier. No caso de lesão, o<br />
nervo em regeneração é direciona<strong>do</strong> pela lâmina basal até o seu destino.<br />
As áreas <strong>do</strong> axônio cobertas por lamelas concêntricas de mielina e<br />
pela única célula de Schwann que produz a mielina são chamadas de<br />
segmentos internodais, cuja extensão varia de 200 a 1.000ìm. A microscopia<br />
óptica revelou fendas cônicas na bainha de mielina de cada segmento<br />
internodal chamadas de Fendas (incisuras) de Schmidt-Lantermann.<br />
Observadas a microscopia eletrônica, estas fendas representam o citoplasma<br />
das células de Schwann aprisiona<strong>do</strong> no interior da bainha de mileina.<br />
Lent (2001) questiona se o processo de mielinização é final de<br />
desenvolvimento. Segun<strong>do</strong> este pesquisa<strong>do</strong>r, não se pode determinar um<br />
momento preciso em que o <strong>sistema</strong> <strong>nervoso</strong> se torna adulto, isto é, o ponto<br />
final <strong>do</strong> desenvolvimento. Mesmo porque o <strong>sistema</strong> continua a se transformar,<br />
embora menos aceleradamente na vida adulta. Entretanto, geralmente se<br />
considera que o processo de mielinização marca o estágio final de maturação<br />
ontogenética <strong>do</strong> <strong>sistema</strong> <strong>nervoso</strong>.<br />
Segun<strong>do</strong> Gartner (1999), os nervos não são mieliniza<strong>do</strong>s<br />
simultâneamente durante o desenvolvimento. O início e o final da mielinização
varia, consideravelmente, em áreas diferentes <strong>do</strong> <strong>sistema</strong> <strong>nervoso</strong>. Esta<br />
variação parece estar relacionada com a função. Por exemplo, nervos motores<br />
são quase completamente mieliniza<strong>do</strong>s ao nascimento, enquanto as raízes<br />
sensoriais não estão mielinizadas por muitos meses depois.<br />
O axônio, em sua extremidade distal, pode se ramificar<br />
profusamente, forman<strong>do</strong> uma arborização terminal denominada telodendro.<br />
Cada ramo <strong>do</strong> telodendro por sua vez, forma múltiplos botões sinápticos que se<br />
encontram apostos aos dendritos ou ao soma de outros neurônios forman<strong>do</strong><br />
sinapses.<br />
O teci<strong>do</strong> <strong>nervoso</strong> apresenta, além <strong>do</strong>s neurônios, outros<br />
componentes que são as células da neuróglia. A primeira suposição <strong>do</strong>s<br />
cientistas <strong>do</strong> século XIX, ao descobrirem a existência de uma população de<br />
células não neuronais no <strong>sistema</strong> <strong>nervoso</strong>, foi de que essas células<br />
representavam o arcabouço de sustentação mecânica <strong>do</strong>s neurônios. Embora,<br />
essa função das células da glia seja ainda aceita, atualmente se conhece<br />
inúmeras outras funções de que estas células participam ativamente.<br />
No <strong>sistema</strong> <strong>nervoso</strong> central consideram-se duas grandes classes de<br />
células gliais: a macroglia e a microglia. A macroglia é formada pelos<br />
astrócitos e oligodendrócitos. Ambos têm origem embrionária ectodérmica,<br />
como os neurônios. A microglia por outro la<strong>do</strong>, é formada por um conjunto<br />
homogêneo de células com origem mesodérmica, aparentada às células <strong>do</strong><br />
<strong>sistema</strong> imunitário em estrutura e função.<br />
Os astrócitos possuem prolongamentos muitos numerosos que<br />
emergem <strong>do</strong> soma e se ramificam profusamente, forman<strong>do</strong> uma densa<br />
arborização. Esses prolongamentos ocupam os meandros <strong>do</strong> espaço<br />
interneural, envolven<strong>do</strong> sinapses e nós de Ranvier, forman<strong>do</strong> verdadeiras<br />
capas envoltórias (pedículos, pés vasculares) <strong>do</strong>s capilares sangüíneos <strong>do</strong><br />
<strong>sistema</strong> <strong>nervoso</strong> e constituin<strong>do</strong> o revestimento interno da parede das cavidades<br />
intracerebrais e das meninges.<br />
Os astrócitos localiza<strong>do</strong>s na substância cinzenta são<br />
morfologicamente diferentes daqueles situa<strong>do</strong>s na substância branca: os<br />
primeiros são chama<strong>do</strong>s protoplasmáticos, os segun<strong>do</strong>s fibrosos. No entanto,<br />
segun<strong>do</strong> Lent (2001), não se conhece diferenças funcionais marcantes entre os<br />
<strong>do</strong>is subtipos morfológicos.
Recentemente, além de suas características morfológicas, os<br />
astrócitos são identifica<strong>do</strong>s pela expressão de uma proteína que lhe é<br />
exclusiva, chamada proteína ácida fibrilar glial (GFAP). A GFAP pode ser<br />
identificada nos astrócitos através de anticorpos monoclonais fluorescentes ou<br />
colori<strong>do</strong>s. Esta proteína faz parte de um <strong>do</strong>s filamentos intermediários <strong>do</strong><br />
citoesqueleto da célula, responsável pela sua forma típica.<br />
Os oligodendrócitos também apresentam prolongamentos que<br />
emergem <strong>do</strong> soma, mas não tão numerosos e ramifica<strong>do</strong>s como <strong>do</strong>s astrócitos.<br />
São dividi<strong>do</strong>s em <strong>do</strong>is subtipos morfológicos: os oligodendrócitos satélites,<br />
situa<strong>do</strong>s próximo aos corpos celulares <strong>do</strong>s neurônios, e os fascicula<strong>do</strong>s,<br />
posiciona<strong>do</strong>s em meio aos axônios <strong>do</strong>s neurônios, são responsáveis pela<br />
formação da bainha de mielina no SNC.<br />
Finalmente, as células da microglia têm corpo pequeno e alonga<strong>do</strong>,<br />
poucos prolongamentos se ramificam moderadamente. Atualmente, considerase<br />
que fazem parte <strong>do</strong> <strong>sistema</strong> mononuclear fagocitário como os monócitos e<br />
macrófagos e realizam fagocitose. Apresentam duas formas básicas; os<br />
microgliócitos ramifica<strong>do</strong>s, que são quiescentes, isto é, não proliferam e nem<br />
atuam em processos patológicos, e os microgliócitos amebóides (ou<br />
macrófagos cerebrais), que têm atividade fagocítica e proliferam bastante na<br />
vigência de agressões e traumatismos <strong>do</strong> SNC.<br />
Com relação aos astrócitos, Lent faz referência de que sua<br />
organização estrutural, estrategicamente posiciona<strong>do</strong>s em relação aos<br />
neurônios, às meninges aos capilares e a camada de células que reveste as<br />
cavidades internas <strong>do</strong> SNC, permite avaliar e ampliar sua atuação funcional.<br />
Pedículos das extremidades <strong>do</strong>s prolongamentos astrocíticos rodeiam as<br />
sinapses centrais. Constatou-se que esses pedículos apresentam moléculas<br />
receptoras na membrana capazes de ligar-se a certos neurotransmissores,<br />
como o áci<strong>do</strong> gama-aminobutírico (GABA) e o glutamato. Esses<br />
neurotransmissores são interioriza<strong>do</strong>s pelos astrócitos, em cujo citoplasma são<br />
transforma<strong>do</strong>s em glutamina, que é exportada de volta aos neurônios para<br />
possibilitar a ressíntese de GABA e glutamato.<br />
Outros pedículos <strong>do</strong>s astrócitos estão em contato próximo aos<br />
axônios, especialmente nos nós de Ranvier, sítios de ocorrência de potenciais<br />
de ação. Nesses pedículos, há grande densidade de canais de K+ e proteínas<br />
transporta<strong>do</strong>ras de íons como a bomba de Na+/ K+. Verificou-se que o excesso
de potássio que alcança o meio extra celular quan<strong>do</strong> o neurônio dispara (PÁS)<br />
é transporta<strong>do</strong> para o citoplasma <strong>do</strong>s astrócitos, o que permite o<br />
restabelecimento mais rápi<strong>do</strong> <strong>do</strong> gradiente eletroquímico normal <strong>do</strong>s neurônios.<br />
<strong>Um</strong> terceiro grupo de pedículos astrocítico - muito numeroso - forma<br />
um denso revestimento da parede <strong>do</strong>s capilares cerebrais. Inicialmente, supôsse<br />
que esse revestimento seria responsável pelo bloqueio quase completo da<br />
passagem de substâncias <strong>do</strong> sangue ao teci<strong>do</strong> cerebral e vice-versa, que<br />
caracteriza a barreira hemato-encefálica. Depois constatou-se que as células<br />
das paredes <strong>do</strong>s capilares cerebrais, diferentemente daquelas que formam a<br />
parede <strong>do</strong>s demais capilares <strong>do</strong> organismo, são fortemente unidas por junções<br />
oclusivas que impede essa troca de moléculas.<br />
Atualmente, sabe-se que os astrócitos induzem ou facilitam a<br />
formação dessas junções oclusivas significan<strong>do</strong> que os astrócitos<br />
indiretamente são importantes para o funcionamento da barreira hematoencefálica.<br />
Os astrócitos apresentam capacidade regenerativa quan<strong>do</strong> ocorrem<br />
lesões no teci<strong>do</strong> <strong>nervoso</strong>. Neste caso multiplicam-se e se deslocam para as<br />
proximidades da lesão, forman<strong>do</strong> uma cicatriz glial em seu re<strong>do</strong>r. O processo<br />
chama-se gliose.<br />
Segun<strong>do</strong> Lent (2001), a presença abundante de astrócitos em<br />
regiões de lesão constitui um análogo da reação inflamatória que ocorre em<br />
circunstâncias semelhantes em outros teci<strong>do</strong>s <strong>do</strong> organismo. Como os<br />
astrócitos são capazes de produzir fatores tróficos (NGF), sen<strong>do</strong> também<br />
células apresenta<strong>do</strong>ras de antígenos como macrófagos e monócitos, o<br />
resulta<strong>do</strong> é duplo: os fatores tróficos libera<strong>do</strong>s no local da lesão contribuem<br />
para a sobrevida <strong>do</strong>s neurônios atingi<strong>do</strong>s, e os antígenos exterioriza<strong>do</strong>s na<br />
membrana astrocítica provocam ação defensiva <strong>do</strong> <strong>sistema</strong> imunitário<br />
(linfócitos T).<br />
Os microgliócitos têm papel importante nessa função defensiva <strong>do</strong><br />
<strong>sistema</strong> <strong>nervoso</strong>. Em caso de necessidade ocorre a entrada de monócitos <strong>do</strong><br />
sangue no teci<strong>do</strong> <strong>nervoso</strong> e sua diferenciação em microgliócitos amebóides.<br />
Ocorre a ativação <strong>do</strong>s microgliócitos ramifica<strong>do</strong>s, que passam a se proliferar e<br />
assumem a forma amebóide. Então, esses verdadeiros macrófagos cerebrais<br />
exercem sua função fagocitária, o que permite a interiorização de partículas de
origem externa (no caso de lesão ou invasão de microrganismos) e de detritos<br />
resultantes da degeneração de neurônios e axônios.<br />
REFERÊNCIAS<br />
GARTNER, Leslie P.; Hiatt, James. Trata<strong>do</strong> de Histologia. Guanabara: Rio de<br />
Janeiro, 1999.<br />
LENT, Roberto. Cem bilhões de neurônios - Conceitos fundamentais de<br />
neurociânia. Atheneu: São Paulo, 2001.<br />
ROMRELL, Lynn; ROSS, Michael. Histologia: texto e atlas.<br />
Panamericana: São Paulo, 1993.