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a imagem de d. fernando na crônica de fernão lopes - Universidade ...

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Como já dissemos a sua associação à nobreza o tornou refém, em certa medida, dos<br />

<strong>de</strong>sejos <strong>de</strong>ssa nobreza, que possuía ambições no reino <strong>de</strong> Castela. E o rei ao se <strong>de</strong>parar com<br />

essa realida<strong>de</strong> mostra-se arrependido <strong>de</strong> ter-se casado e queixa-se aos seus privados, como<br />

escreve o cronista. D. Fer<strong>na</strong>ndo:<br />

Disse huum dia a huum <strong>de</strong> seu conselho, como se repremdia <strong>de</strong> teer casado com<br />

ella; o outro respom<strong>de</strong>o disse: .. [...] [D. Afonso IV foi ameaçado <strong>de</strong> <strong>de</strong>stituição pelos<br />

seus privados, pois não dava a <strong>de</strong>vida atenção aos assuntos do reino, preferindo a caça ao<br />

conselho] E eu assi quisera que vos outros do meu comsselho fezerees a mim: pois que<br />

viees que nom era minha homrra tal casamento, nom me comssemtisses que o fezesse. 15<br />

Desse modo, pois, evi<strong>de</strong>ncia-se aquilo que nós cremos talvez possa ser entendido<br />

como uma possível síntese da criação <strong>de</strong> Fernão Lopes a respeito da figura do rei D.<br />

Fer<strong>na</strong>ndo <strong>de</strong> Portugal.<br />

A socieda<strong>de</strong> política medieval, em seus mais altos círculos, era formada pelo rei e<br />

um grupo restrito <strong>de</strong> pessoas que formavam os privados do rei e o Conselho régio. Os<br />

privados eram pessoas próximas do rei e atuavam como conselheiros pessoais <strong>de</strong>ste. O<br />

Conselho régio, que aqui mais nos interessa, era formado por vassalos diretos do rei e era<br />

convocado periodicamente para auxiliar o rei <strong>na</strong>s <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m política e para traçar<br />

os rumos da ação gover<strong>na</strong>tiva no reino. Sobre o Conselho escreve Marc Bloch:<br />

Em tempo <strong>de</strong> paz, ele [o senhor] reunia a sua “corte”, que, em datas mais ou<br />

menos regulares coinci<strong>de</strong>ntes, em geral, com as principais festas litúrgicas, convocava<br />

com gran<strong>de</strong> aparato: sucessivamente, tribu<strong>na</strong>l, conselho cuja moral política da época<br />

impunha ao senhor a opinião em todas as circunstâncias graves, e também serviço <strong>de</strong><br />

honra. 16<br />

Fernão Lopes aponta para o fato <strong>de</strong> o consilium ser uma das maneiras pelas qual o<br />

rei po<strong>de</strong> atingir a justiça. Em diversos capítulos transparece essa idéia como nos capítulos<br />

45, 53, 64, 72, 80, 101, entre outros. Lembremo-nos pois que a justiça é para o cronista a<br />

virtu<strong>de</strong> que caracteriza o rei i<strong>de</strong>al, conforme o prólogo da Crônica <strong>de</strong> D. Pedro I. D.<br />

Fer<strong>na</strong>ndo figura então, <strong>na</strong> criação <strong>de</strong> Fernão Lopes, como um mau rei por fugir ao mo<strong>de</strong>lo<br />

<strong>de</strong> justiça também ao ignorar o Conselho régio.<br />

Po<strong>de</strong>mos, <strong>de</strong>ssa maneira, concluir que há um fio que conduz todo o conjunto das<br />

Crônicas <strong>de</strong> Fernão Lopes, e que serve como legitimador da di<strong>na</strong>stia <strong>de</strong> Avis. Este<br />

elemento é, segundo nossa interpretação, a justiça. Elemento que aparece primeiramente <strong>na</strong><br />

construção do perfil <strong>de</strong> D. Pedro I, que além <strong>de</strong> justo é tido como justiceiro, como um<br />

pequeno <strong>de</strong>svio da qualida<strong>de</strong> da justiça; que escapa a D. Fer<strong>na</strong>ndo, <strong>de</strong> acordo com a<br />

criação lopea<strong>na</strong>, quando este prefere a nobreza em <strong>de</strong>trimento do povo, gerando<br />

<strong>de</strong>sequilíbrio e crise; e que se manifesta <strong>de</strong> maneira ple<strong>na</strong> e equilibrada, <strong>na</strong> pe<strong>na</strong> <strong>de</strong> Fernão<br />

Lopes, em D. João I, que é justo, mas não justiceiro, e que rei<strong>na</strong> em busca do bem do reino,<br />

e não somente <strong>de</strong> um grupo restrito.<br />

15 LOPES, Fernão. Crónica do senhor rei Dom Fer<strong>na</strong>ndo... pp. 169-170.<br />

16 BLOCH, Marc. A socieda<strong>de</strong> feudal. Lisboa: Edições 70, 1982. p. 250.

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