RACISMO EM MARIO FILHO: UMA ANÁLISE DA OBRA O NEGRO ...
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seja, como se fosse uma característica inata, natural, contida na própria raça e assim essa<br />
ideia acaba se configurando também com um viés racista, mesmo que no sentido inverso.<br />
Já os “novos narradores” – compostos basicamente pelos estudiosos Gordon<br />
Junior, Simoni Guedes, Ronaldo Helal e Hugo Lovisolo – tem abordagens e posições<br />
distintas de Soares. O NFB é tomado com significativa importância para a construção e<br />
compreensão da história do futebol brasileiro e considerada, talvez, como a mais completa<br />
fonte historiográfica levantada sobre o assunto e o acesso principal para compreender a<br />
democratização das relações entre raças no Brasil realizada através do futebol. Para<br />
contrapor a argumentação de Soares, os autores questionam o que denominam de sua<br />
“posição radical” em negar qualquer possibilidade de utilização histórica do texto do Mario<br />
Filho, pois para eles o pesquisador desqualificou totalmente a obra enquanto fonte<br />
primária. Defendem que mesmo sendo “causos” oriundos de histórias orais não<br />
necessariamente reais, o livro possibilita um acesso à história e à realidade e pensamento<br />
sociais do período e mesmo concordando que pode ser pensada como um romance épico<br />
isso não a desqualifica de nenhuma maneira e possibilita sim um tratamento histórico.<br />
Outra crítica vai tanger a questão racial, a qual para os novos narradores é negligenciada na<br />
obra de Soares assim como a dúvida em relação ao processo de relaxamento das tensões<br />
raciais no interior do universo futebolístico. Segundo eles, o autor marginaliza o fator<br />
racial enaltecendo apenas a questão referente ao amadorismo x profissionalismo, enquanto<br />
o mais aconselhável seria aliar e pensar as duas questões em conjunto. Por fim, há mais<br />
uma crítica dos “novos narradores” que tange a questão da identidade nacional. Eles<br />
concordam com Soares que toda a identidade nacional é construída e que o caso brasileiro<br />
não configura uma exceção, porém o autor defenderia que ela foi “inventada” pelo discurso<br />
nacionalista e intelectual do período e que essas especificidades no fundo não existiriam,<br />
os pesquisadores discordam amplamente, pois a identidade é construída pautada em algum<br />
fator de real e que só vai encontrar permanência se houver identificação e aceitação. Dessa<br />
forma, as culturas tendem a celebrar o que as diferencia das demais e no caso brasileiro<br />
isso aconteceria fortemente no futebol, pelo estilo próprio do Brasil de jogar bola e assim a<br />
obra de Mario Filho, no interior de sua moldura integracionista da democracia racial<br />
brasileira também estaria revelando alguma coisa do sentimento do ser e da identidade do<br />
brasileiro.<br />
É importante destacar o contexto no qual está inserido NFB possibilitando assim<br />
sua melhor compreensão. Entretanto, recorda-se que há duas edições escritas com quase<br />
vinte anos de diferença, localizadas dessa forma em realidades muito distintas. Porém, a<br />
segunda edição se conecta diretamente à conjuntura e ideologia da primeira, fator que será<br />
discutido novamente mais adiante.<br />
Sendo assim, nos prenderemos ao período da versão primeira que se configura<br />
entre as décadas de 20 a 40. Essa é uma época singular na história brasileira, marcada por<br />
diversas mudanças nos cenários social, político e cultural. No âmbito político ocorreram<br />
diversos eventos marcados por permanências e rupturas com a antiga política vigente.<br />
Mesmo com o advento do Estado Novo com um governo forte e centralizador acontece a<br />
manutenção e a continuidade da cultura política do patriarcalismo tão característico da<br />
Primeira República. Graças a isso a modernização política do Brasil se dá de forma única<br />
marcada por antigos ideais oriundos de uma sociedade hierárquica, escravocrata e de tom<br />
clientelista. O Estado Novo possuía uma política ideológica própria voltada para a nova<br />
construção da nacionalidade e visando a integração nacional. A nova identidade nacional<br />
do Brasil seria marcada pela harmonia entre todos e a singularidade do brasileiro. A missão