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Leituras Inglesas no Brasil oitocentista

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VASCONCELOS, Sandra Guardini T. <strong>Leituras</strong> <strong>Inglesas</strong> <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> <strong>oitocentista</strong>.<br />

Prática useira e vezeira entre esses <strong>no</strong>ssos romancistas mais conhecidos,<br />

ela também marcou presença nas <strong>no</strong>velinhas dos precursores, ainda<br />

com mais razão. A chancela de autenticidade e a garantia de finalidade<br />

didática e apelo moral eram fundamentais para vencer a resistência do leitor<br />

e emprestar à leitura de ficção um ar de atividade mais séria.<br />

“A Perjura”, <strong>no</strong>vela publicada em 1838 em O Gabinete de Leitura, tem<br />

como epígrafe “All is true” (assim mesmo, em inglês) e também usa como<br />

estratégia a carta que um certo Eugênio mandara ao narrador, contendo a<br />

história que ele agora relata. Henriqueta, a personagem de que trata a narrativa,<br />

por faltar a um juramento e deixar-se seduzir, é punida exemplarmente<br />

com a loucura e a morte.<br />

Por sua vez, em “A Ressurreição de Amor (crônica rio-grandense)”,<br />

publicada em 4 partes <strong>no</strong> Jornal do Comércio entre os dias 23 e 27 de<br />

fevereiro de 1839, o que predomina é o clima de mistério e terror, certamente<br />

emprestado ao romance “negro”, tão popular neste como <strong>no</strong> outro<br />

lado do Atlântico. Por excesso de amor, Francisco, seu protagonista, viola o<br />

túmulo da amada apenas para descobri-la viva, <strong>no</strong> melhor estilo do gótico<br />

inglês. Tendo como cenário a cidade de Porto Alegre, a narrativa exibe uma<br />

fratura formal, na medida em que não há qualquer relação de causalidade,<br />

nem unidade orgânica, entre enredo e espaço.<br />

Os exemplos acima demonstram que, enquanto se valem de artifícios<br />

e argumentos para convencer seu leitor, <strong>no</strong>ssos primeiros ficcionistas usam<br />

e abusam do repertório de situações, regras de comportamento e personagens<br />

tomados de empréstimo às <strong>no</strong>ssas matrizes romanescas. A missão<br />

moralizadora e a correção dos costumes, se bem que nem sempre explicitamente<br />

declaradas, se revelam na escolha de entrechos e desfechos, com a<br />

punição ao vício e a recompensa da virtude, ao mesmo tempo que enredos<br />

mirabolantes, amores contrariados, mistério e terror, vingança, sedução,<br />

constituem o acepipe servido fatiado a leitores e leitoras.<br />

Sobra, portanto, em artifícios aquilo que falta em ajuste formal, denunciado<br />

pela ausência de organicidade entre os elementos que compõem<br />

a narrativa. Em que pese a tentativa de incorporar ao cenário dessas <strong>no</strong>velas<br />

a famosa “cor local”, fica sempre evidente o descolamento entre forma e<br />

conteúdo, consubstanciado na descrição de uma paisagem brasileira em<br />

desalinho com o enredo de talhe europeu.<br />

Nos primeiras manifestações da ficção na Bahia, David Salles vê a<br />

coexistência de dois modelos: o primeiro, decalcado de modelos europeus<br />

já ultrapassados, com ênfase <strong>no</strong>s bons princípios morais vigentes <strong>no</strong> setor<br />

mais conservador da sociedade e o segundo, caracterizado pelo uso do<br />

diálogo, pela descrição realista da cena, pelo relativismo do comportamen-<br />

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16/11/2010, 16:21

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