Leituras Inglesas no Brasil oitocentista
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Crop, 8, 2002<br />
autores. É o mesmo Pigoreau quem <strong>no</strong>s dá a pista para compreender que<br />
parâmetros podem ter <strong>no</strong>rteado as traduções desses romances para o francês.<br />
Afinal, satisfazer a demanda do público tinha precedência sobre a fidelidade<br />
e respeito ao original, já que um conceito como o de autoria só se<br />
incorporaria ao vocabulário crítico mais tarde:<br />
“Le Français vif et léger ne lit un roman que pour se distraire<br />
quelques instans; il veut qu’on le conduise au but pour voi la<br />
plus courte. L’Anglais, flegmatique, aime à s’appesantir sur les<br />
détails, et ne veut arriver au dé<strong>no</strong>uement qu’aprés s’être<br />
promené dans les longs circuits d’un labyrinthe”. 11<br />
Foi, portanto, na conta do temperamento do leitor que Pigoreau colocou<br />
as principais diferenças entre os romances ingleses e franceses, definindo<br />
dessa maneira as <strong>no</strong>rmas que deviam reger o trabalho de adaptação<br />
por parte do tradutor. Pigoreau devia saber do que estava falando, uma vez<br />
que foi um dos principais livreiros de Paris e grande fornecedor dos gabinetes<br />
de leitura. Sempre de olho <strong>no</strong> mercado consumidor, os livreiros já haviam<br />
percebido o grande potencial de lucro proporcionado pela venda e<br />
aluguel de romances, que, tratados como uma mercadoria qualquer, tinham<br />
que agradar o público e conquistar <strong>no</strong>vos mercados. Não vinha a calhar,<br />
portanto, a recente abertura dos portos brasileiros ao comércio com as nações<br />
estrangeiras?<br />
Durante todo o período colonial, o <strong>Brasil</strong> havia padecido de uma<br />
impossibilidade estrutural quanto à circulação de livros; sem imprensa, submetido<br />
à censura prévia, 12 com um peque<strong>no</strong> número de livreiros aqui<br />
sediados, o país, mesmo depois da abertura dos portos, dependia basicamente<br />
do comércio ilegal, mantido pelos ingleses, franceses e holandeses, e<br />
da indústria editorial em língua portuguesa que, de Londres e Paris, abastecia<br />
seu peque<strong>no</strong> mercado consumidor. Com a fundação da Impressão Régia<br />
em 1808, a suspensão da censura em 1821 e o crescente estabelecimento de<br />
livreiros franceses <strong>no</strong> Rio de Janeiro, esse quadro começou a mudar e,<br />
base d’un cabinet de lecture. Paris, Pigoreau Librarie, 1821-1828 (incluindo suplementos).<br />
11<br />
Pigoreau. 5º Suplemento, fevereiro de 1823, p. 18.<br />
12<br />
Rubens Borba de Moraes informa que Viagens de Gulliver, de Swift, e Viagem<br />
Sentimental, de Sterne só podiam ser lidos mediante licença, pois constavam<br />
da lista de livros proibidos pela Real Mesa Censória. Ver Livros e Bibliotecas <strong>no</strong><br />
<strong>Brasil</strong> Colonial. Rio de Janeiro, LTC, 1979.<br />
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