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285 G – Não. O papel que sai da Associação alguém tem que assinar pela Associação! Esse dia teve uma pessoa, eu não sei quem me pediu também, eu não pude nem dar o nome porque é assim, quando é pra um benefício pra comunidade, se eu assinar um documento em nome da cooperativa sem ser presidente, entendeu? Quem pode dar isso é a Jorgina! Eu posso também... Eu podia ver... Mas também não vai dar pra mim ver, só sábado que eu vou estar com eles. Pela União! Eu também não tenho nem o telefone da Jorgina! Sabe quem é a Jorgina? A do Conselho Tutelar! Porque lá deve ter carimbo... H – (Ao telefone) Pô cara tem que ver o negócio aqui cara! Eu to aqui, em vim aqui... Olha só, vem pra cá (...) Vou pegar a porra do ofício de lá mesmo, a gente não pode parar não! A gente tem que fazer isso pra ontem! Aí vai babá tudo, vai babá tudo! Você não pode vir aqui pra gente tentar ver, tentar resolver? Tem que arranjar um papel timbrado com a porra do carimbo da Associação que eu assino, cara! G – Thau! Se eu pudesse ajudar eu ajudava, tá! P – O que eles estão querendo? G – Liberação pro carnaval aqui na rua. Aí pra você pedir aqueles banheiros químicos, policiamento, você tem que ter papel da associação, só que aqui não é uma associação! P – É, aqui é cooperativa. E aí, tá sem presidente? G – (Fala baixo) Ele é da milícia. Entendeu? Eu me comprometo com uns cara desse? Vai onde tem uma associação, procura uma associação! Eu não sou associação! P – Mas aqui tem presidente ou não? G – Não, aqui tá sem presidente! E nem pode! De jeito nenhum! A cooperativa ela não responde pelo conjunto habitacional de Shangrilá! Ela responde pela cooperativa! Do portão pra fora é Associação de Moradores! Você entendeu? Sabe o que está acontecendo? Eles ainda não conseguiram cooptar aqui porque aqui é uma cooperativa, se fosse uma associação já tinha cooptado!
286 Durante esta entrevista e todo o trabalho de campo ficou claro que a questão do poder paralelo, seja ele originado do tráfico ou da milícia, é um problema cada vez mais urgente colocado para as agências que desenvolvem trabalho de intervenção social junto à população mais pobre e trabalhadora. Sobre este processo de cooptação das associações de moradores no Rio de Janeiro, César, outro coordenador nacional da União por Moradia no Estado, chama a atenção para o envolvimento do presidente da FAMERJ (Federação das Associações de Moradores do Estado do Rio de Janeiro) em diversas contravenções destacando a grande disputa por poder nesta instituição. Falou que teve, inclusive, oportunidade de ocupar a presidência, mas rejeitou devido ao envolvimento de várias associações de moradores com tráfico e com milícia. A coordenadora Gilda cita, por exemplo, o caso de uma cooperativa na Ilha do Governador que não deu certo por causa do tráfico no local e responsabiliza o trabalho social desenvolvido por técnicos FBR. A Cooperativa de Ipiíba ainda está relativamente distante deste contexto, mas a segurança quanto a esse aspecto, tendo em vista problemas com alguns moradores, é uma preocupação recente dos cooperados. A entrevista foi bastante interessante, seguiu sob discursos improvisados e resgatados pela memória da entrevistada que desmentia seu término a cada novo impulso de fala. Como ela mesma ponderou: Eu falo muito, né! Tem horas ás vezes que eu tenho que pedir arrego! Eu peço arrego de mim mesma! Entretanto, meu retorno pra casa foi tenso. Saí da cooperativa e cumprimentei o mesmo comerciante que encontrei quando cheguei, mas este desta vez nem mesmo me respondeu, só me olhou, quer dizer, “me encarou”! Saindo da ruela, caminhando pela rua Japomirim em direção à estrada Rio Grande um motorista de um carro preto me seguiu lentamente, jogava beijos me intimidando. Fiquei assustada, mas procurei ignorar e cheguei até o ponto de ônibus. Não imaginava tal situação porque antes de procurar pessoalmente por Gilda nesta cooperativa falei com os cooperados de Ipiíba que freqüentavam o lugar por meio de reuniões da UMP-RJ e eles me certificaram de que não haveria problema visitar Shangrilá desacompanhada. Mas imagino que opinaram com relação a si mesmos que já eram conhecidos. Eu, obviamente, não sou um deles.
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