01.06.2014 Views

universidade federal fluminense faculdade de ... - Proppi - UFF

universidade federal fluminense faculdade de ... - Proppi - UFF

universidade federal fluminense faculdade de ... - Proppi - UFF

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE<br />

FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO, CIÊNCIAS CONTÁBEIS E TURISMO<br />

CURSO DE TURISMO<br />

PRISCILLA DE SOUSA NUNES<br />

A PERCEPÇÃO DOS BACKPACKERS SOBRE A EXPLORAÇÃO FINANCEIRA<br />

EM SUAS VIAGENS<br />

NITERÓI<br />

2012


PRISCILLA DE SOUSA NUNES<br />

A PERCEPÇÃO DOS BACKPACKERS SOBRE A EXPLORAÇÃO FINANCEIRA<br />

EM SUAS VIAGENS<br />

Trabalho <strong>de</strong> Conclusão <strong>de</strong> Curso apresentado<br />

ao curso <strong>de</strong> Graduação em Turismo da<br />

Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral Fluminense como<br />

requisito parcial <strong>de</strong> avaliação para obtenção do<br />

grau <strong>de</strong> Bacharel em Turismo.<br />

Orientador: Prof. Msc. Bernardo Lazary Cheibub<br />

Niterói<br />

2012


N972 Nunes, Priscilla <strong>de</strong> Sousa<br />

A percepção dos backpackers sobre a exploração financeira em suas viagens / Priscilla <strong>de</strong><br />

Sousa<br />

Nunes -- Niterói: <strong>UFF</strong>, 2012.<br />

81p.<br />

Monografia ( Graduaçao em Turismo )<br />

Orientador: Bernardo Lazary Cheibub, M.Sc.<br />

1.Viagem 2. Viajantes 3. Backpackers 4. Relações entre<br />

Visitantes e Visitados 4. Exploração Financeira<br />

CDD. 338.4791


A PERCEPÇÃO DOS BACKPACKERS SOBRE A EXPLORAÇÃO FINANCEIRA<br />

EM SUAS VIAGENS<br />

Por<br />

PRISCILLA DE SOUSA NUNES<br />

Trabalho <strong>de</strong> Conclusão <strong>de</strong> Curso apresentado<br />

ao curso <strong>de</strong> Graduação em Turismo da<br />

Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral Fluminense como<br />

requisito parcial <strong>de</strong> avaliação para obtenção do<br />

grau <strong>de</strong> Bacharel em Turismo.<br />

BANCA EXAMINADORA<br />

___________________________________________________<br />

MSC. BERNARDO LAZARY CHEIBUB - ORIENTADOR<br />

Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral Fluminense<br />

___________________________________________________<br />

MSC. CARLOS ALBERTO LIDIZIA SOARES - CONVIDADO<br />

Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral Fluminense<br />

___________________________________________________<br />

MSC. EDUARDO ANTÔNIO PACHECO VILELA - DEPARTAMENTO DE TURISMO<br />

Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral Fluminense<br />

Niterói, 05 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 2012.


AGRADECIMENTOS<br />

Primeiramente a Deus, que com seu infinito amor, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o ventre da minha<br />

mãe, sonhou comigo. À minha mãe Rosângela Nunes, figura imprescindível na<br />

minha vida; meu referencial <strong>de</strong> guerreira e vencedora. Ao meu pai Emilson <strong>de</strong><br />

Sousa, por ter me ajudado a conquistar meu espaço no mundo através da educação<br />

e, por me apresentar <strong>de</strong> forma surpreen<strong>de</strong>nte o universo mochileiro em um <strong>de</strong>stino<br />

tão surpreen<strong>de</strong>nte como a China (experiências únicas que motivaram esse trabalho<br />

<strong>de</strong> conclusão <strong>de</strong> curso).<br />

À minha família e parentes, na figura <strong>de</strong> tantas pessoas que, me fizeram<br />

continuar, mesmo quando tudo parecia contrário: Olga Laus (mãe do coração que<br />

sonhou <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início comigo), Maercio La<strong>de</strong>ira (pai do coração que, com suas<br />

palavras sábias, sempre iluminaram meu caminho), José Nunes (meu avô que,<br />

sempre me ajudou quando mais precisei), Iolina Nunes (minha avó que, com suas<br />

orações, sempre trouxe a proteção divina para o meu caminho, Vicente Moreira<br />

(meu tio, por sempre acreditar em mim e me ajudar em todos os momentos que<br />

precisei). Aos meus tios, tias, primos, primas e irmã: obrigada pela torcida constante<br />

e confiança <strong>de</strong>positada em mim!<br />

Agra<strong>de</strong>ço também aos gran<strong>de</strong>s educadores que cruzaram meu caminho<br />

durante essa longa caminhada na Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral Fluminense; educadores<br />

que são muito mais que professores e profissionais... Educadores que são exemplo<br />

e inspiração e gran<strong>de</strong>s amigos: Carlos Alberto Lidizia Soares, Eduardo Vilela, Valéria<br />

Guimarães, Aguinaldo Cesar Fratucci, Erly Maria, Osíris Marques, Marcello Tomé,<br />

Telma Lasmar, Verônica Mayer, Carolina Lescura, Claudia Moraes, Isabella<br />

Sacramento, Ana Paula Spolon, Renato Me<strong>de</strong>iros e Manoela Valduga.<br />

Ao meu orientador, Bernardo Cheibub, por ter aceitado a tarefa árdua <strong>de</strong><br />

orientar uma aluna tão sonhadora como eu! Obrigada por todo o carinho e<br />

<strong>de</strong>dicação! Ao Marcos Rosauro, pela entrevista que me conce<strong>de</strong>u e a todos os<br />

mochileiros que me conce<strong>de</strong>ram as entrevistas: sem vocês o trabalho não existiria!<br />

Aos meus amigos e amigas que o <strong>de</strong>stino me enviou... Vocês são presentes<br />

<strong>de</strong> Deus em minha vida! Obrigada pela força, i<strong>de</strong>ias e todo carinho que me<br />

<strong>de</strong>dicaram durante todo esse tempo! Meu mundo não seria o mesmo sem vocês:<br />

Bárbara Figueiredo, Breno Bersot, Flávia Marques, Letícia Campos, Liara Fonseca,


Noelle Camello, Marcelly Lisboa e Paulo Anastacio... Amo vocês!<br />

Um agra<strong>de</strong>cimento todo especial para os meus mais novos amigos <strong>de</strong><br />

Petrópolis! Pelos momentos <strong>de</strong> <strong>de</strong>scontração e força entre uma página e outra e as<br />

famílias do coração Guerreiro e Fonseca!<br />

Por fim, e não menos importante, o meu agra<strong>de</strong>cimento ao meu companheiro<br />

e amigo João Guerreiro. Obrigada por me acalentar, fazer várias pesquisas e altas<br />

traduções, ficar comigo até altas horas, aturar meus <strong>de</strong>scompassos e por sempre<br />

me dizer que tudo ficaria bem... É não é que ficou mesmo? Obrigada universo!


Dedico a você que faz meu mundo girar e minha estrela brilhar...


“O viajante, essa figura sempre notável cuja<br />

primeira virtu<strong>de</strong> é a pequena voz e o gran<strong>de</strong><br />

olhar. O viajante, essa figura cuja segunda<br />

virtu<strong>de</strong> é a discreta elegância com que traz o<br />

interesse e leva as memórias. O viajante, essa<br />

figura cujas virtu<strong>de</strong>s ocasionalmente culminam<br />

no <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> compartilhar...”<br />

Mario Beni


RESUMO<br />

Este trabalho teve como principal objetivo compreen<strong>de</strong>r a percepção dos viajantes<br />

backpackers sobre as relações comerciais estabelecidas em suas experiências <strong>de</strong><br />

viagens e os possíveis fatores e situações que os levam a serem explorados<br />

financeiramente nestas relações. Para tal compreensão foram realizadas pesquisas<br />

bibliográficas e entrevistas em profundida<strong>de</strong> com mochileiros brasileiros e um agente<br />

<strong>de</strong> mercado especializado no segmento backpacker no estado do Rio <strong>de</strong> Janeiro. As<br />

entrevistas qualitativas semi-estruturadas foram norteadas por três categorias <strong>de</strong><br />

análise: pré-viagem, viagem e pós-viagem. A pesquisa explicitou os principais<br />

agentes da exploração e os principais motivos para a ocorrência <strong>de</strong> experiências<br />

<strong>de</strong> exploração financeira. A pesquisa também <strong>de</strong>monstrou que experiências como<br />

estas são frequentes e que, inevitavelmente, alteram a percepção final dos viajantes<br />

sobre sua experiência no <strong>de</strong>stino. Através da percepção dos principais atores<br />

envolvidos nas relações comerciais estabelecidas no <strong>de</strong>stino, o viajante e o<br />

mercado, procurou-se encontrar métodos e meios que pu<strong>de</strong>ssem minimizar as<br />

experiências <strong>de</strong> exploração financeira.<br />

Palavras-chave: Viagem. Viajantes. Backpackers. Relações entre Visitantes e<br />

Visitados. Exploração Financeira.


ABSTRACT<br />

The main goal of this paper is to comprehend the perception of the backpacker<br />

travelers about the comercial relations established in their travel experiences and the<br />

possible factors and situations that leads them to be financially exploited in these<br />

relations. To comprehend this, bibliographical researches and extensive<br />

interviews were ma<strong>de</strong> with Brazilian backpackers, and one market<br />

agent specialized in the backpacker segment in the Rio <strong>de</strong> Janeiro state. The semistructured<br />

qualitative interviews were gui<strong>de</strong>d by three analysis categories: pretravel,<br />

travel, and post-travel. The reseach explained the main agents of the<br />

exploitation and the main reasons for the occurrence of financial exploitation<br />

experiences. The research also <strong>de</strong>monstrated that experiences such as this are<br />

frequent and that, inevitably, they alter the final perception of the travelers about its<br />

own experiences in the <strong>de</strong>stination. Through the perception of the main actors<br />

involved in the comercial relations established on the <strong>de</strong>stination, the traveler and the<br />

market, methods and means were tried with the objective of minimizing experiences<br />

of financial exploitations.<br />

Keywords: Travel, Travelers, Backpackers, Relations between visitors and visited.<br />

Financial Exploitation.


LISTA DE FIGURAS<br />

Figura 1 Valores dos Backpackers .......................................................... 25<br />

Figura 2 Sistema Psicográfico <strong>de</strong> Plog ................................................... 31<br />

Figura 3 Posições Psicográficas <strong>de</strong> Destino ........................................... 34<br />

Figura 4 Grupo <strong>de</strong> Análise I - Pré Viagem ............................................... 45<br />

Figura 5 Grupo <strong>de</strong> Análise II - Viagem .................................................... 46<br />

Figura 6 Grupo <strong>de</strong> Análise III - Pós-Viagem ............................................ 47<br />

Figura 7 Encontro entre Backpackers - Pequim - China ......................... 50<br />

Figura 8<br />

“Kit <strong>de</strong> Sobrevivência” do Backpacker - Guias Turísticos<br />

especializados ...........................................................................<br />

53<br />

Figura 9 Medina - Marrakesh - Marrocos ................................................ 55<br />

Figura 10 Churrasquinho com Chá - Deserto do Saara ............................ 57<br />

Figura 11 Banheiro em acampamento selvagem em Botswana ............... 58<br />

Figura 12 Turistas/Viajantes e Mercado Informal nas principais<br />

Pirâmi<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Gizé - Egito .........................................................<br />

59<br />

Figura 13 Mercados/Feiras organizadas - Tibet - China ........................... 60<br />

Figura 14<br />

Parada para compra <strong>de</strong> suprimentos na subida do Monte<br />

Sinai - Israel ..............................................................................<br />

61<br />

Figura 15 As mulheres da Muralha da China - Pequim - China ................ 66<br />

Figura 16<br />

Panorama geral das relações <strong>de</strong> exploração financeira em<br />

viagens ......................................................................................<br />

74


SUMÁRIO<br />

1 INTRODUÇÃO................................................................................. 12<br />

2 A BUSCA DA AUTENTICIDADE NAS EXPERIÊNCIAS<br />

TURÍSTICAS: DIFERENÇAS PERCEBIDAS ENTRE<br />

VIAJANTES E TURISTAS............................................................... 16<br />

3 O CONCEITO MOCHILEIRO: SUA HISTÓRIA,<br />

CONCEITUAÇÃO, MERCADO E PERFIL ..................................... 22<br />

3.1 ORIGENS DAS VIAGENS DE JOVENS PELO MUNDO E A<br />

“IDENTIDADE BACKPACKER”........................................................ 22<br />

3.2 O SEGMENTO MOCHILEIRO E SUAS CLASSIFICAÇÕES<br />

MERCADOLÓGICAS ...................................................................... 30<br />

4 INDISPENSÁVEIS, DESEJÁVEIS E TENSAS: AS POSSÍVEIS<br />

RELAÇÕES ESTABELECIDAS ENTRE VISITANTES E<br />

VISITADOS...................................................................................... 34<br />

4.1 O CONTATO COM A COMUNIDADE LOCAL: INTERFERÊNCIAS<br />

MÚTUAS ......................................................................................... 34<br />

4.2 O CONTATO COM OS COMERCIANTES: AS RELAÇÕES<br />

COMERCIAIS ESTABELECIDAS ENTRE VISITANTES E<br />

VISITADOS ...................................................................................... 37<br />

5 RELAÇÕES COMERCIAIS PERCEBIDAS: A EXPLORAÇÃO<br />

FINANCEIRA SOB O OLHAR DO VIAJANTE BACKPACKER E<br />

DO MERCADO ................................................................................ 42<br />

5.1 PRÉ-VIAGEM .................................................................................. 48<br />

5.2 VIAGEM ........................................................................................... 54<br />

5.3 PÓS-VIAGEM .................................................................................. 67<br />

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................ 72<br />

REFERÊNCIAS .......................................................................................... 76


12<br />

1 INTRODUÇÃO<br />

Situações <strong>de</strong>sagradáveis como esta [<strong>de</strong> exploração financeira] já “estão<br />

virando” normais, tanto que a gente já espera passar por elas. Ninguém faz<br />

nada pra reverter isso, as autorida<strong>de</strong>s competentes, os viajantes (...). Nem<br />

adianta tentar se sentir parte do lugar... Assim que seu dinheiro for <strong>de</strong>sejado<br />

além do que ele realmente <strong>de</strong>veria ser você vai lembrar que não é “dali” e<br />

que quem na verda<strong>de</strong> é bem-vindo não é você, é o seu dinheiro 1 .<br />

Para Margarita Barreto, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as origens do turismo <strong>de</strong> massas na década <strong>de</strong><br />

1950 as expectativas em torno do turismo, do ponto <strong>de</strong> vista cultural, têm estado<br />

centradas na potencialida<strong>de</strong> do mesmo para promover o intercâmbio cultural entre<br />

visitantes e visitados, o conhecimento do outro, a consciência da alterida<strong>de</strong> e como<br />

consequência, a paz mundial. (2004)<br />

No entanto, as pesquisas realizadas até o momento não indicam que estes<br />

objetivos <strong>de</strong> entendimento e aproximação entre as pessoas tenham sido atingidos,<br />

pelo contrário, parecem ocasionalmente indicar que se repetem na prática do<br />

turismo alguns dos antigos problemas que acompanham a história da humanida<strong>de</strong><br />

tais como o colonialismo cultural e a xenofobia, e indicam também que,<br />

inevitavelmente as relações interpessoais acabam sendo comercializadas como<br />

bens <strong>de</strong> consumo (BARRETO, 2004).<br />

Para a autora supracitada é <strong>de</strong> suma importância evitar lugares comuns, já<br />

que gran<strong>de</strong> parte da literatura existente que estuda os impactos 2 ocasionados pelo<br />

turismo “ten<strong>de</strong> a colocar as comunida<strong>de</strong>s locais como vítimas <strong>de</strong> hordas invasoras”.<br />

Para Barreto (2004), o caminho inverso também ocorre já que, por “muitas vezes os<br />

visitantes são vítimas da população local, que os enxergam apenas como sujeitos<br />

passíveis <strong>de</strong> exploração.”<br />

Não há pesquisas direcionadas para a percepção do viajante sobre a prática<br />

<strong>de</strong> exploração financeira e as suas consequências para a experiência final nas suas<br />

viagens. Exatamente por esta ausência <strong>de</strong> pesquisas sistematizadas que se po<strong>de</strong><br />

atribuir como relevante a escolha <strong>de</strong>ste tema.<br />

As pesquisas existentes sobre as relações estabelecidas entre visitantes e<br />

1 Trecho da entrevista realizada neste trabalho <strong>de</strong> conclusão <strong>de</strong> curso.<br />

2 Para alguns autores, como Barreto (2004), “interferências”.


13<br />

visitados levaram a autores como Van <strong>de</strong>n Berghe (apud Crick, 1992) a dizer que os<br />

nexos estabelecidos entre turistas e locais representam “uma paródia da relação<br />

humana” e a Buodhiba (apud Crick, 1992), a afirmar que “a hospitalida<strong>de</strong> não passa<br />

<strong>de</strong> uma técnica <strong>de</strong> vendas”:<br />

É uma frau<strong>de</strong> <strong>de</strong>screver os anfitriões como seres<br />

universalmente amistosos quando na verda<strong>de</strong><br />

existem abundantes correntes <strong>de</strong> ressentimento que<br />

afloram a todo o momento [...] É uma autêntica<br />

imoralida<strong>de</strong> difundir a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que, por ser turista,<br />

alguém po<strong>de</strong> apagar séculos <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconfiança e<br />

isolamento. TURNER; ASH, (apud BARRETO, 2004)<br />

Percebendo então que as relações entre visitantes e visitados não só geram<br />

interferências para a comunida<strong>de</strong> local, mas também para os visitantes,<br />

principalmente em questões que envolvam relações comerciais, este trabalho <strong>de</strong><br />

conclusão <strong>de</strong> curso visou respon<strong>de</strong>r a seguinte pergunta: qual a percepção dos<br />

viajantes em relação a exploração financeira em suas experiências <strong>de</strong> viagem?<br />

Além disto, buscou-se através <strong>de</strong>ste estudo, encontrar possíveis motivos para<br />

a ocorrência <strong>de</strong> situações <strong>de</strong> exploração. Para encontrar tais motivos inúmeros<br />

pressupostos foram mapeados previamente para auxiliar e nortear a pesquisa. Para<br />

justificar a escolha do grupo focal po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>stacar, por exemplo, a hipótese <strong>de</strong><br />

que quanto mais o viajante se propusesse a ter uma experiência pautada em<br />

conhecer a localida<strong>de</strong> e obter um maior envolvimento com a comunida<strong>de</strong> local,<br />

maiores seriam as chances <strong>de</strong>le ser explorado financeiramente. Este pressuposto<br />

justificou então a escolha <strong>de</strong> um tipo específico <strong>de</strong> viajante, que, diferentemente dos<br />

turistas possuem uma diferenciada forma <strong>de</strong> estabelecer relações com a localida<strong>de</strong><br />

e com os anfitriões para ser o objeto <strong>de</strong> estudo do presente trabalho: o viajante<br />

backpacker 3 .<br />

Para Erik Cohen diferentes tipos <strong>de</strong> turistas/viajantes estabelecem relações<br />

distintas com a comunida<strong>de</strong> (1972). Este pesquisador constituiu-se no primeiro<br />

estudioso da área a <strong>de</strong>monstrar que não existe um “viajante genérico”, que é preciso<br />

diferenciar os turistas quanto aos seus comportamentos e motivações em função<br />

das características socioeconômicas e psicossociais (BARRETO, 2004). De acordo<br />

3 Ou mochileiro. Neste trabalho serão utilizadas ambas nomenclaturas.


14<br />

com a literatura vigente, amplamente abordada nos capítulos seguintes, os<br />

mochileiros costumam organizar suas viagens <strong>de</strong> forma in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, são flexíveis<br />

e buscam opções econômicas, evitando assim o turismo <strong>de</strong> massa e <strong>de</strong> luxo.<br />

Hospedam-se em acomodações baratas, costumam barganhar preços quando<br />

possível e utilizam a infraestrutura <strong>de</strong> serviços local.<br />

Para se compreen<strong>de</strong>r os possíveis fatores e situações que levam os viajantes<br />

a serem explorados financeiramente em suas viagens, foram realizadas pesquisas<br />

bibliográficas sobre os diferentes tipos <strong>de</strong> viajantes, questões pertinentes ao perfil do<br />

backpacker e sobre as possíveis formas <strong>de</strong> relações estabelecidas entre os<br />

viajantes e a comunida<strong>de</strong> local.<br />

Para uma maior familiarida<strong>de</strong> com o objeto <strong>de</strong> estudo do presente trabalho,<br />

foram realizadas entrevistas semi-estruturadas em profundida<strong>de</strong> com pessoas que já<br />

viajaram como backpackers e que vivenciaram alguma experiência <strong>de</strong> exploração<br />

financeira nesta viagem. A pesquisa foi realizada com jovens brasileiros,<br />

primeiramente escolhidos a partir do conhecimento da própria autora sobre viajantes<br />

com o perfil para a entrevista e, os <strong>de</strong>mais foram indicados pelos primeiros<br />

entrevistados. Preten<strong>de</strong>u-se também através da percepção dos mesmos sobre as<br />

relações estabelecidas entre o viajante, o local e o mercado, encontrar métodos que<br />

minimizassem as possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> exploração.<br />

O trabalho estrutura-se em seis capítulos. O primeiro tem caráter introdutório,<br />

on<strong>de</strong> é apresentado o objeto <strong>de</strong> estudo, os seus objetivos, a sua contextualização, a<br />

metodologia e a questão problema e justificativa. O segundo capítulo refere-se às<br />

principais diferenças entre turistas e viajantes e, entre turismo e viagens. Esse<br />

capítulo também trata do alargamento do campo da antropologia para assuntos<br />

pertinentes ao estudo do turismo e sobre a questão da autenticida<strong>de</strong> nas<br />

experiências turísticas.<br />

O terceiro capítulo consiste em uma abordagem <strong>de</strong>talhada do segmento<br />

backpacker. Definições, história, perfis e características foram alguns dos aspectos<br />

retratados. Este capítulo teve o objetivo <strong>de</strong> fornecer a base teórica necessária para<br />

conhecer com profundida<strong>de</strong> os entrevistados da pesquisa exploratória. O capítulo<br />

quatro <strong>de</strong>screve as possíveis relações estabelecidas entre os visitantes, os visitados<br />

e o mercado. E por fim, o capítulo cinco trata dos procedimentos que orientaram a<br />

elaboração do presente estudo e analisa as entrevistas realizadas. A partir da


15<br />

revisão bibliográfica e da análise dados obtidos na pesquisa, no final do trabalho,<br />

são apresentadas algumas consi<strong>de</strong>rações.


16<br />

2 A BUSCA DA AUTENTICIDADE NAS EXPERIÊNCIAS TURÍSTICAS:<br />

DIFERENÇAS PERCEBIDAS ENTRE VIAJANTES E TURISTAS<br />

Á medida que viaja, o viajante se <strong>de</strong>senraíza, solta, liberta. Po<strong>de</strong> lançar-se<br />

pelos caminhos e pela imaginação, atravessar fronteiras e dissolver<br />

barreiras, inventar diferenças e imaginar similarida<strong>de</strong>s. (Octávio Ianni 4 )<br />

Para Araújo (2005) o estudo do turismo sob o viés antropológico é<br />

relativamente novo. “A atenção direcionada ao estudo do turismo foi pouca e muito<br />

reticente”, já que sempre houve uma restrição a qualquer aproximação entre o<br />

antropólogo e o turista. A autora cita como exemplo <strong>de</strong>ste distanciamento a primeira<br />

frase do livro <strong>de</strong> Lévi-Straus 5 , Tristes Trópicos: “o<strong>de</strong>io as viagens e os exploradores e<br />

eis que me <strong>de</strong>paro para contar as minhas expedições.” LÉVI-STRAUS (apud<br />

ARAÚJO, 2005)<br />

Para Araújo (2005), “esta avaliação negativa foi confirmada pelo preconceito<br />

<strong>de</strong> muitos antropólogos que insistiam em consi<strong>de</strong>rar o turismo como uma ocupação<br />

frívola, estabelecendo um olhar sob os turistas como intrusos.” No entanto, em<br />

<strong>de</strong>corrência do alargamento do campo da antropologia nos anos 1970, uma<br />

mudança significativa ocorreu com este pensamento pré-concebido, como po<strong>de</strong>mos<br />

perceber em um trecho da obra <strong>de</strong> Michel Picard, Anthropology of Tourism:<br />

(...) <strong>de</strong> um lado, na consi<strong>de</strong>ração das influências externas, sejam estatais ou<br />

internacionais, sobre o meio social estudado e, <strong>de</strong> outro, nos próprios<br />

antropólogos, que começaram a se preocupar não mais exclusivamente<br />

com culturas exóticas, mas igualmente com o que se passava em sua<br />

própria socieda<strong>de</strong>. Picard (apud Araújo, 2005:50)<br />

Realçando ainda mais essa lógica, Araújo (2005) coloca que por um longo<br />

período <strong>de</strong> tempo a disciplina antropológica pautou-se em oposição à experiência<br />

vivenciada pelo antropólogo e a do turista; oposição esta embebida pela máxima <strong>de</strong><br />

que o turista “não viajava à sério” ao passo que o antropólogo seria uma espécie <strong>de</strong><br />

4 Octavio Ianni), sociólogo brasileiro, foi um pensador <strong>de</strong>votado à compreensão das diferenças<br />

sociais, das injustiças a elas associadas e dos meios <strong>de</strong> superá-las.<br />

5 Clau<strong>de</strong> Lévi-Strauss (Bruxelas, 28 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1908 – Paris, 30 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 2009),<br />

antropólogo, professor e filósofo francês, é consi<strong>de</strong>rado fundador da antropologia estruturalista, em<br />

meados da década <strong>de</strong> 1950, e um dos gran<strong>de</strong>s intelectuais do século XX.


17<br />

“viajante genuíno”. A vivência (ou não) <strong>de</strong> experiências “genuínas” sempre foi<br />

controversa e discutível, tema este <strong>de</strong> muitos ensaios e nomenclaturas, como as<br />

categorias diferenciadas do turista e do viajante.<br />

Po<strong>de</strong>mos encontrar um exemplo <strong>de</strong>sta discussão no filme <strong>de</strong> Bernardo<br />

Bertolucci O Céu que nos protege 6 que, baseado no livro autobiográfico <strong>de</strong> Paul<br />

Bowles 7 (1949), apresenta a história <strong>de</strong> um casal <strong>de</strong> escritores americanos Port<br />

(John Malkovich) e Kit (Debra Winger), acompanhados <strong>de</strong> um amigo, Turner<br />

(Campbel Scott), que viajam pela África do Norte, por volta <strong>de</strong> 1948, logo após a<br />

Segunda Guerra Mundial, período este marcado pelo processo gradativo <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>scolonização das colônias européias situadas na Ásia e na África (PEREIRA apud<br />

SOUSA, 2004).<br />

O longa-metragem começa com sua primeira cena lançando um diálogo curto<br />

que, explica muito o posicionamento <strong>de</strong> cada um dos personagens ao longo do<br />

filme. O diálogo referência <strong>de</strong>sta discussão sobre a diferença entre um turista e um<br />

viajante po<strong>de</strong> ser conferido no trecho abaixo citado:<br />

Turner: Somos os primeiros turistas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a guerra.<br />

Kit: Somos viajantes, não turistas.<br />

Turner: Qual a diferença?<br />

Port: O turista pensa em voltar para casa assim que chega.<br />

Kit: E o viajante po<strong>de</strong> nem voltar. (O céu que nos protege, Bertolucci, 1990)<br />

Ao introduzir uma dicotomia entre o viajante e o turista, o filme coloca em<br />

pauta uma discussão que é muito abordada por autores contemporâneos, a exemplo<br />

<strong>de</strong> Ferrara (apud Sousa, 2004), que trata <strong>de</strong>ssa questão <strong>de</strong> modo que viagem e<br />

turismo apresentam abordagens bem distintas. Primeiro o termo viagem é <strong>de</strong>finido<br />

como um “o olhar que se <strong>de</strong>sloca”, o qual para Sousa (2004) seria um olhar que<br />

busca algo que vai além do visível. Por sua vez o turismo é entendido como “o olhar<br />

que se concentra”, ou seja, é o olhar (treinado) que já sabe o que <strong>de</strong>seja<br />

ver/conhecer, on<strong>de</strong> para a autora, o que diferencia essas duas instâncias são as<br />

motivações que as impulsionam. FERRARA (apud SOUSA, 2004).<br />

Desse modo, o termo viagem é compreendido, sumariamente, como uma<br />

6 Do original, The Sheltering Sky, 1990.<br />

7 Paul Fre<strong>de</strong>ric Bowles (Nova Iorque, 30 <strong>de</strong> Dezembro <strong>de</strong> 1910 - Tânger, 18 <strong>de</strong> Novembro <strong>de</strong> 1999)<br />

foi um escritor, compositor e viajante norte-americano.


18<br />

busca do <strong>de</strong>sconhecido que envolve principalmente o prazer da <strong>de</strong>scoberta do<br />

espaço em todas as suas instâncias, sejam elas sociais, culturais e/ou históricas.<br />

Esse espaço (geográfico/cultural = lugar) é <strong>de</strong>nominado por Carlos (apud Sousa,<br />

2004) “como o produto das relações humanas, entre homem e natureza, tecido por<br />

relações sociais que se realizam no plano vivenciado, o que garante uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

significados e sentidos que são tecidos pela história e cultura civilizadora produzindo<br />

a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>, que o diferencia dos <strong>de</strong>mais.”<br />

Em linhas gerais, o viajante é movido primeiramente por um sentimento <strong>de</strong><br />

liberda<strong>de</strong>, <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>, do <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> ir em busca do <strong>de</strong>ssemelhante, on<strong>de</strong> a<br />

“experiência da viagem permite fremir o ‘eu’ excitado pelos novos panoramas e<br />

[pelos] novos contatos”. (FERRARA apud SOUSA, 2004).<br />

Em contrapartida, temos a figura do turista. Compreen<strong>de</strong>ndo o turismo<br />

enquanto uma ativida<strong>de</strong> organizada e institucionalizada, on<strong>de</strong> o caráter<br />

burocrático/comercial do turismo representa um elemento fundamental para<br />

distingui-lo <strong>de</strong> viagens sem roteiros pré-estabelecidos, o turista ten<strong>de</strong> a cumprir uma<br />

programação previamente elaborada pelos agenciadores, on<strong>de</strong> o roteiro é<br />

previamente selecionado <strong>de</strong> acordo com o <strong>de</strong>sejo e as possibilida<strong>de</strong>s aquisitivas do<br />

interessado. Para Ferrara (apud Sousa, 2004), este perfil se adapta perfeitamente<br />

no papel do turista que busca passivamente apenas o exótico, que “viaja por<br />

curiosida<strong>de</strong> e ociosida<strong>de</strong>”, on<strong>de</strong> a ativida<strong>de</strong> turística visa o preenchimento do tempo<br />

e do espaço como uma alternativa <strong>de</strong> lazer. Assim, o espaço visitado, sob o signo da<br />

socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo, torna-se tão somente um objeto mercantilizado. (FERRARA,<br />

apud SOUSA, 2004).<br />

Ao falar sobre as diferenças entre viajantes e turistas, outra questão<br />

levantada é o nível <strong>de</strong> “autenticida<strong>de</strong>” nas experiências turísticas <strong>de</strong> ambos. Para a<br />

discussão sobre isto, utilizaremos como base o artigo <strong>de</strong> Silvana Araújo “Artifício e<br />

Autenticida<strong>de</strong>: o turismo como experiência antropológica”.<br />

Araújo (2005) propõe como base para a discussão do tema, dois autores:<br />

Daniel Boorstin 8 e Dean MacCannell 9 . Para a autora existe uma diferença na<br />

8 Autor do livro “The Image: a gui<strong>de</strong> to pseudo-events in America”.<br />

9 Para fins <strong>de</strong>ste trabalho <strong>de</strong> conclusão <strong>de</strong> curso, nos ateremos somente nas consi<strong>de</strong>rações trazidas<br />

por Boorstin (1992).


19<br />

argumentação entre os autores supracitados. Boorstin vê a viagem como “<strong>de</strong>vedora<br />

da tradição do Grand Tour, elaborando a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> “pseudo-eventos”, noção central<br />

da sua argumentação. Deste modo, “a ênfase estaria na viagem como um<br />

procedimento ativo - como a experiência do estar lá - que foi, contudo, substituído<br />

pelo turismo caracterizado como procedimento passivo, sintetizado no ver e ouvir.”<br />

BOORSTIN (apud ARAUJO, 2005).<br />

A autora, sob a luz da obra <strong>de</strong> Boorstin, ainda avalia que <strong>de</strong>vido ao gran<strong>de</strong><br />

po<strong>de</strong>r e a tecnologia americana (foco da sua obra), a socieda<strong>de</strong> teria “criado um<br />

ticket <strong>de</strong> entrada para a irrealida<strong>de</strong>”, intermediando assim a relação entre as<br />

pessoas e os fatos da vida, o que, representaria na verda<strong>de</strong> uma ilusão que tornaria<br />

ainda mais nebulosa a “verda<strong>de</strong>ira experiência”:<br />

(...) a multiplicação, a melhoria e o barateamento das oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

viagem têm permitido a muitos viajarem a lugares distantes, mas, a<br />

experiência <strong>de</strong> “ir lá” (going there), a experiência <strong>de</strong> “estar lá” (being there)<br />

e o que resulta disso é totalmente diferente. A experiência se tornou<br />

diluída, posto que engendrada artificialmente (...) é pré-fabricada. Boorstin<br />

(apud Araujo, 2001).<br />

Com um significado já embutido na expressão “estar lá”, ser ativo em alguma<br />

ativida<strong>de</strong> requer esforço e <strong>de</strong>dicação. A propósito <strong>de</strong>ste esforço <strong>de</strong>sprendido para<br />

realizar uma “viagem autêntica”, Boorstin (apud Araújo, 2005) avaliou<br />

etimologicamente a palavra travel (do inglês, viagem). Ela po<strong>de</strong> ser associada à<br />

palavra francesa travail, à qual estão associadas os significados trouble (em<br />

português, problema), work (em português, trabalho), torment (em português,<br />

tormenta). Além disso, Boorstin relembra que a origem latina da palavra é trepalium,<br />

um antigo instrumento <strong>de</strong> tortura.<br />

Ao realizar esta busca etimológica, Boorstin resgatou significados importantes<br />

associados à verda<strong>de</strong>ira i<strong>de</strong>ia do que seria realizar uma viagem, que, ao contrário<br />

das práticas associadas ao lazer, on<strong>de</strong> o prazer se estabelece como ponto principal<br />

da prática, confere ao ato <strong>de</strong> realizar uma viagem uma ação laboriosa, trabalhosa e,<br />

por vezes, também incômoda, como aponta Boorstin (apud Araújo, 2005) no trecho<br />

abaixo:


20<br />

(...) na viagem, portanto, o agente envolvido é um sujeito, uma<br />

individualida<strong>de</strong> experimentando uma <strong>de</strong>terminada trajetória própria, e,<br />

nesses termos é absolutamente ativo, movendo-se por seus esforços e<br />

por sua vonta<strong>de</strong>, embora sem <strong>de</strong>stacar a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se <strong>de</strong>frontar<br />

com algo encantatório...<br />

A partir do século XIX, contudo, começa a se <strong>de</strong>senhar uma outra figura, a do<br />

turista como sendo aquele que se estabelece como um “pleasure seeker” (do<br />

português, “aquele que procura prazer”) e que vai produzir, no seu extremo, a figura<br />

do mero expectador. Especificamente sobre as aspirações <strong>de</strong>ste “novo” tipo <strong>de</strong><br />

viajante, o turista, que foi se <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ando um processo <strong>de</strong> transformação das<br />

viagens em turismo; um exemplo <strong>de</strong>ste processo foi a criação dos pacotes <strong>de</strong><br />

viagem. Os elementos que anteriormente faziam parte da experiência da viagem<br />

(providências para sua elaboração) foram “embaladas” 10 e oferecidas como um<br />

serviço. Esta passagem da viagem para o turismo promoveu, sob a ótica do<br />

sistema <strong>de</strong> interpretação elaborado por Boorstin, o <strong>de</strong>clínio da experiência da<br />

viagem “ativa” em favor apenas <strong>de</strong> um usufruto <strong>de</strong> ações turísticas. (ARAÚJO,<br />

2005).<br />

Especificamente sobre a transformação do sujeito em “espectador da<br />

viagem”, Araújo (2005) afirma que o sentido do elemento “trabalho” embutido na<br />

palavra viagem foi transferido para terceiros, que passam então a se ocupar <strong>de</strong> todo<br />

o “planejamento”, tomando para si um conjunto <strong>de</strong> providências para que uma<br />

viagem ocorra. Outros fatores também interferirão no significado original da viagem,<br />

como a facilitação dos transportes e outros serviços criados para facilitar a prática<br />

turística. Estes novos recursos contribuem para aumentar o grau <strong>de</strong> prazer da<br />

viagem e, ao mesmo tempo, contribuem para reduzir os ricos e <strong>de</strong>sconfortos<br />

característicos <strong>de</strong> uma viagem; recursos estes que tornam os substantivos que a<br />

palavra viagem trazia em sua origem etimológica (problema, tormenta e trabalho)<br />

per<strong>de</strong>rem seu po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> significação em todo o processo.<br />

O viajante dito como turista é poupado a todo instante <strong>de</strong> ter contato com os<br />

locais, já que os intermediários estão sempre tentando, conforme aponta Boorstin<br />

(apud ARAÚJO, 2005), “inseri-los na experiência perfeita que se po<strong>de</strong> ter naquele<br />

pacote adquirido”. O turista po<strong>de</strong>rá, sem sair <strong>de</strong> casa, ter negociado e <strong>de</strong>finido por<br />

10 Metáfora utilizada por Araújo (2005) para pacote <strong>de</strong> viagens.


21<br />

terceiros a hospedagem, as refeições, o transporte e, sobretudo, o entretenimento.<br />

Para os autores supracitados, ao se praticar o turismo se almeja eliminar, se<br />

possível totalmente, o índice <strong>de</strong> perigo e riscos. Já quando se fala em viagem os<br />

problemas associados à escolha fazem parte do preço que se paga para se ter o<br />

título <strong>de</strong> “cidadão do mundo”. Em linhas gerais, para Boorstin (apud ARAÚJO, 2005);<br />

quando são terceiros que trabalham para aten<strong>de</strong>r o viajante-turista, caminha-se no<br />

sentido da dissolução dos riscos. E é justamente esse aspecto que Boorstin<br />

i<strong>de</strong>ntifica como responsável pela transformação da viagem em turismo.<br />

Outros autores também dialogam sobre diferentes <strong>de</strong>nominações <strong>de</strong> viagens.<br />

Oliveira (apud Sousa, 2004), por exemplo, afirma que “é importante diferenciar os<br />

termos <strong>de</strong>slocar-se, viajar e fazer turismo”. Para o autor são três instâncias que se<br />

diferenciam tanto pelas motivações como pelas condições da viagem. Analisando e<br />

mesclando com a visão trazida no filme <strong>de</strong> Bertolucci, para o autor, fazer turismo é “o<br />

ato <strong>de</strong> <strong>de</strong>slocar-se temporariamente <strong>de</strong> um lugar para outro, sempre com a intenção<br />

<strong>de</strong> retornar”.<br />

No atual contexto <strong>de</strong> globalização e mundialização cultural 11 torna-se um<br />

gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>safio buscar novas alternativas <strong>de</strong> viagens que possibilitem o encontro<br />

com o novo, o <strong>de</strong>ssemelhante. Como tão bem recomenda Otávio Ianni (2000: 30),<br />

algo que possibilite <strong>de</strong>svendar alterida<strong>de</strong>s, no sentido <strong>de</strong> autoafirmar-se, <strong>de</strong> fazer<br />

parte <strong>de</strong> uma “travessia, a <strong>de</strong>speito <strong>de</strong> <strong>de</strong>spojar-se, libertar-se e abrir-se, [on<strong>de</strong> o<br />

viajante procura] reafirma seu modo <strong>de</strong> ser, observar, sentir, agir, pensar ou<br />

imaginar. No limite, são muitos os viajantes que buscam e rebuscam o seu eu, ou a<br />

sua sombra. Mesmo quando parecem fugir, estão se procurando no diferente, no<br />

<strong>de</strong>sconhecido, no outro”. Essas características parecem ir ao encontro <strong>de</strong> um tipo <strong>de</strong><br />

viajante bem peculiar: o backpacker (mochileiro). É sobre suas origens,<br />

conceituação, perfil e mercado que abordaremos no próximo capítulo.<br />

11 Para Ortiz (1998: 30), a mundialização cultural é “um fenômeno social total que permeia o conjunto<br />

das manifestações culturais”


22<br />

3 O CONCEITO MOCHILEIRO: SUA HISTÓRIA, CONCEITUAÇÃO, MERCADO E<br />

PERFIL<br />

A necessida<strong>de</strong> do inusitado, do <strong>de</strong>sconhecido, nos acompanha através dos<br />

tempos. Des<strong>de</strong> os povos nôma<strong>de</strong>s, até a conquista do espaço e mesmo<br />

séculos antes da introdução do conceito <strong>de</strong> turismo na cultura oci<strong>de</strong>ntal, já<br />

buscávamos o novo através <strong>de</strong> nossas viagens. E foi exatamente esse<br />

<strong>de</strong>sejo que herdou o que chamamos <strong>de</strong> cultura backpacker. Conhecer<br />

outras culturas, o meio em que vivemos, nossas raízes, enfim estabelecer o<br />

óbvio <strong>de</strong> ser um cidadão do mundo. Só ou acompanhado, cheio <strong>de</strong><br />

apetrechos ou apenas com a mochila <strong>de</strong> companhia, <strong>de</strong> trem, <strong>de</strong> carro,<br />

bicicleta ou avião e/ou utilizando inúmeros serviços já disponíveis no mundo<br />

não são as incógnitas da questão, o “x” nesse caso é a liberda<strong>de</strong>. (Blog<br />

Mochila Brasil 12 )<br />

De acordo com Carvalho (2009), o turismo jovem vem experimentando um<br />

crescimento acelerado, e vem sendo reconhecido como importante segmento do<br />

mercado global <strong>de</strong> viagens. Este tipo <strong>de</strong> turismo po<strong>de</strong> ser caracterizado como o<br />

turismo praticado por um grupo homogêneo <strong>de</strong> jovens, com as características<br />

marcadas por período etário, estilo <strong>de</strong> vida e estado <strong>de</strong> espírito que <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ia<br />

uma série <strong>de</strong> vários outros subsegmentos.<br />

Para muitos autores que serão abordados nas subseções a seguir, o<br />

segmento backpacker compõe um dos sub-segmentos do turismo jovem. Em linhas<br />

bem gerais, <strong>de</strong> acordo com estudos recentes, este grupo é formado principalmente<br />

por jovens que costumam organizar suas viagens <strong>de</strong> forma in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, flexível e<br />

econômica. Evitam as estruturas advindas do turismo <strong>de</strong> massa e <strong>de</strong> luxo,<br />

hospedam-se em acomodações baratas, costumam barganhar preços, quando<br />

possível e utilizam a infra-estrutura <strong>de</strong> serviços locais. É sobre sua origem,<br />

conceituação, mercado e perfil que trataremos neste capítulo.<br />

3.1 ORIGENS DAS VIAGENS DE JOVENS PELO MUNDO E A “IDENTIDADE<br />

BACKPACKER”<br />

12 Disponível em: http://www2.uol.com.br/mochilabrasil/mochileiro.shtml (acessado em 18 <strong>de</strong> fevereiro<br />

<strong>de</strong> 2012).


23<br />

De acordo com Aoqui (2005), a história <strong>de</strong> jovens do mundo viajando em<br />

jornadas <strong>de</strong> auto<strong>de</strong>scoberta po<strong>de</strong> ser remontada às famosas viagens <strong>de</strong> Ulisses. A<br />

história <strong>de</strong> jovens viajando em jornadas <strong>de</strong> auto <strong>de</strong>scoberta pelo mundo po<strong>de</strong> ser<br />

traçada <strong>de</strong>s<strong>de</strong> um passado antigo, como se po<strong>de</strong> ver pelo estatuto do parlamento<br />

inglês no século XIV:<br />

“Quaisquer estudantes andarilhos sem autorização <strong>de</strong> seus tutores ou<br />

outros andarilhos encontrados sem passes <strong>de</strong> sua paróquia certificando a<br />

legitimida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua viagem <strong>de</strong>vem ser presos, chicoteados publicamente e<br />

mandados <strong>de</strong> volta para casa”.<br />

Segundo o autor, uma adaptação da viagem educacional foi o <strong>de</strong>slocamento<br />

associado ao Grand Tour das classes mais abastadas da Inglaterra entre os séculos<br />

XVII e XVIII, on<strong>de</strong> o nobre jovem inglês frequentemente saía por um ano ou mais<br />

para viajar pelas estradas e pelo circuito social da Europa, a fim <strong>de</strong> completar sua<br />

educação. Outra manifestação <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> viagem aconteceu durante o século<br />

XIX, com o aumento do número <strong>de</strong> comerciantes qualificados que começaram a<br />

viajar por seu país como uma forma <strong>de</strong> aprendizado. As associações <strong>de</strong> artesãos <strong>de</strong><br />

outras cida<strong>de</strong>s frequentemente recebiam abertamente esses comerciantes<br />

andarilhos com todo o calor da hospitalida<strong>de</strong> local. Isso era conhecido como o<br />

sistema itinerante inglês (English Tramping System) e era uma prática tão comum<br />

que ocorria em toda a Europa.<br />

Cohen (1973) i<strong>de</strong>ntifica o período logo após a Segunda Guerra Mundial como<br />

o ponto <strong>de</strong> partida do turismo “sem <strong>de</strong>stino”, quando os estudantes e outros jovens<br />

da classe média começaram a “pedir carona em sua viagem pelo continente”. À<br />

medida que houve o crescimento das viagens aéreas entre as décadas <strong>de</strong> 1960 e<br />

1970, com o advento das turbinas a jato, um crescimento similar ocorreu nas<br />

viagens ditas “sem roteiro”, o qual se esten<strong>de</strong>u da “tradicional” Europa para a Ásia e<br />

a América. (AOQUI, 2005)<br />

Para Mateu (1998), o movimento original dos mochileiros <strong>de</strong>senvolveu-se nos<br />

anos 50, com os beatniks (pacifistas) e então tornou-se mais global com as trilhas<br />

hippies dos anos 70, especialmente para locais como o Nepal. Para o autor,<br />

inicialmente os mochileiros eram os <strong>de</strong>siludidos com a socieda<strong>de</strong> ou marginalizados


24<br />

por ela. Outros autores, como Riley (1988), sustentam que a origem do mochilão 13<br />

remonta ao Grand Tour do século XVIII, ou mais precisamente a viagens<br />

equivalentes, só que realizadas pelas classes trabalhadoras da Europa.<br />

O segmento backpacker certamente apresenta uma série <strong>de</strong> características<br />

que permitem diferenciá-lo dos <strong>de</strong>mais. Cohen (1973) foi um dos primeiros a<br />

caracterizar o mercado <strong>de</strong> viajantes in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes e jovens, na época conhecidos<br />

como drifters (andarilhos), dividindo-os em viajantes permanentes ou temporários.<br />

Os viajantes permanentes, segundo o autor, seguem um estilo <strong>de</strong> vida totalmente<br />

voltado a viagens, em geral, permanecendo “na estrada” por muitos anos, enquanto<br />

os temporários apenas viajam por um curto período <strong>de</strong> tempo e então retornam a<br />

sua vida cotidiana. Essa última <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> viajantes parece mais próxima do<br />

mochileiro atual.<br />

Jarvis (1994), em seu estudo sobre o mercado backpacker na Austrália,<br />

i<strong>de</strong>ntifica uma série <strong>de</strong> valores comuns às pessoas que praticam mochilão em<br />

relação ao que consi<strong>de</strong>ram importante na vida. Entre os principais valores<br />

<strong>de</strong>stacam-se a importância dada a boas amiza<strong>de</strong>s e à alegria <strong>de</strong> viver. O espírito <strong>de</strong><br />

in<strong>de</strong>pendência e o auto-respeito vieram logo a seguir entre os que tiveram maior<br />

pontuação – num máximo <strong>de</strong> <strong>de</strong>z (figura 1):<br />

13 Nome utilizado pelos mochileiros, em seus no círculo <strong>de</strong> relacionamento, para <strong>de</strong>signar as viagens<br />

que realizam.


25<br />

Figura 1 - Valores dos Backpackers<br />

Fonte: Elaboração própria a partir <strong>de</strong> JARVIS (1994)<br />

Moshin e Ryan (2003) atestam que o segmento po<strong>de</strong> ser caracterizado por<br />

sua heterogeneida<strong>de</strong>. Segundo Thoms (1999), há diferenças <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> (7% dos<br />

mochileiros internacionais na Austrália têm mais <strong>de</strong> 45 anos, enquanto esse<br />

percentual chega a 17% entre os mochileiros locais). Uma explicação para isso está<br />

relacionada às facilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> viajar <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> seu próprio país – como as viagens no<br />

estilo in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte em geral ten<strong>de</strong>m a exigir maior planejamento logístico, além <strong>de</strong><br />

um certo grau <strong>de</strong> resistência física, é natural que com o avançar da ida<strong>de</strong>, mais<br />

viajantes escolham roteiros internos ou próximos à região em que vivem.<br />

Loker (1993) também sugere que o mercado não é homogêneo, i<strong>de</strong>ntificando<br />

quatro clusters os quais foram <strong>de</strong>nominados “achievers”, “self-<strong>de</strong>velopers”,<br />

“social/excitment seekers” e “escapers/relaxers” (respectivamente: “executores”, “em<br />

busca <strong>de</strong> auto<strong>de</strong>senvolvimento”, “sociáveis/aventureiros” e “fugitivos/em busca <strong>de</strong><br />

relaxamento”). Entre os principais resultados <strong>de</strong> seu estudo, realizado em 1995,<br />

estão a listagem <strong>de</strong> características comuns a esses viajantes, tais como a


26<br />

preferência por acomodações econômicas (mas com alto uso <strong>de</strong> alternativas aos<br />

alojamentos para backpackers); a forte motivação para encontrar outras pessoas,<br />

para manter flexibilida<strong>de</strong> dos preparativos <strong>de</strong> viagem e para conhecer as atrações<br />

naturais que são ícones da região visitada.<br />

Segundo a autora, as razões que levam os turistas a escolherem realizar um<br />

mochilão seriam:<br />

• O aspecto econômico;<br />

• A oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conhecer outras pessoas;<br />

• Conhecer melhor a realida<strong>de</strong> do país;<br />

• O prolongamento do tempo <strong>de</strong> viagem;<br />

• A in<strong>de</strong>pendência;<br />

• A flexibilida<strong>de</strong>;<br />

• A conveniência/facilida<strong>de</strong>;<br />

• A experiência prévia como mochileiro e;<br />

• A recomendação <strong>de</strong> outras pessoas.<br />

Swarbrooker & Horner (2002) citam como características <strong>de</strong> viagem dos<br />

mochileiros a in<strong>de</strong>pendência em seus <strong>de</strong>slocamentos ao invés da aquisição <strong>de</strong><br />

pacotes <strong>de</strong> viagem; o <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> manter os gastos ao menor nível possível; a<br />

tendência <strong>de</strong> tentar escapar dos locais turísticos “tradicionais” e a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

esten<strong>de</strong>r a duração da viagem além do período comum <strong>de</strong> duas semanas <strong>de</strong> férias.<br />

Mencionam que esta última característica se <strong>de</strong>ve ao fato <strong>de</strong> a maioria dos<br />

backpackers serem jovens estudantes, que têm períodos <strong>de</strong> férias mais longos, ou<br />

por ser uma prática comum em pessoas que tiram um ano <strong>de</strong> férias para viajar,<br />

geralmente antes ou <strong>de</strong>pois do curso universitário. Portanto, é um estilo <strong>de</strong> viagem<br />

baseado na idéia <strong>de</strong> permanecer um longo tempo <strong>de</strong> férias viajando. De acordo com<br />

esses autores, <strong>de</strong>stinos intercontinentais como o su<strong>de</strong>ste da Ásia e a América do Sul<br />

são populares para esses viajantes.<br />

Já o estudo <strong>de</strong> Jarvis (2004), também na Austrália, coinci<strong>de</strong> com as<br />

observações <strong>de</strong> Hampton (1998) <strong>de</strong> que a categoria <strong>de</strong> backpackers não po<strong>de</strong>,<br />

como comumente acontece, ser <strong>de</strong>finida como composta apenas <strong>de</strong> estudantes,<br />

uma vez que apresenta uma proporção crescente <strong>de</strong> profissionais e autônomos.


27<br />

Segundo Murphy (apud Aoqui, 2005) os mochileiros se diferenciam dos<br />

turistas por não serem a<strong>de</strong>ptos dos pacotes turísticos comerciais, viajarem com um<br />

orçamento restrito e, principalmente por irem além dos atrativos turísticos comuns<br />

para experimentar e conhecer outros aspectos do país visitado, principalmente as<br />

pessoas.<br />

Embora os mochileiros tenham sido <strong>de</strong>scritos <strong>de</strong> muitas formas, Hampton<br />

(1998) registra que esses turistas são geralmente vistos como turistas<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes porque sobrevivem com menos <strong>de</strong> US$ 15 por dia, usam transporte<br />

local, carregam todos os seus pertences nas costas, barganham por bens e serviços<br />

enquanto protegem-se <strong>de</strong> preços excessivos, evitam multidões e <strong>de</strong>scobrem novos<br />

lugares.<br />

Em suas pesquisas, Pearce; Loker (apud Aoqui, 2005) encontraram as<br />

seguintes características para esse distinto grupo <strong>de</strong> viajantes:<br />

• Gasta pelo menos uma noite <strong>de</strong> sua viagem em albergues para<br />

mochileiros ou em albergues da juventu<strong>de</strong>;<br />

• Enquanto viajam, expressam uma preferência por estada em<br />

acomodações econômicas;<br />

• Enquanto viajam, seguem uma agenda <strong>de</strong> viagem flexível e organizada<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente;<br />

• Enfatizam a importância do encontro com outros viajantes;<br />

• Preferem longas em vez <strong>de</strong> curtas férias;<br />

• Enfatizam ativida<strong>de</strong>s participativas e informais.<br />

Ravon (apud Aoqui, 2005), em sua pesquisa sobre viagem na juventu<strong>de</strong>,<br />

elabora um panorama mais “fechado” para quem seriam os backpackers da<br />

atualida<strong>de</strong>:<br />

“... [são] jovens entre 18 e 30 anos, que preferem viajar individualmente e<br />

não em grupos. Na maioria dos casos, não organizam a viagem<br />

previamente, apenas procuram um modo <strong>de</strong> ir <strong>de</strong> país para país... <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>saparecer nas partes remotas do país e <strong>de</strong> não se misturar com as<br />

hordas <strong>de</strong> turistas <strong>de</strong> pacotes”.


28<br />

Apesar <strong>de</strong> o turista backpacker ter sido <strong>de</strong>finido <strong>de</strong> várias formas por<br />

acadêmicos, <strong>de</strong> acordo com suas características principais, cabe aqui ressaltar que<br />

uma <strong>de</strong>finição mais exata do termo <strong>de</strong>ve, necessariamente, ter um conteúdo menos<br />

generalista. Isso porque, embora alguns traços sejam comuns à maioria <strong>de</strong>sses<br />

viajantes, outros representam apenas características <strong>de</strong> parte dos viajantes.<br />

Utilizando como base o conceito da reflexivida<strong>de</strong> da vida social mo<strong>de</strong>rna 14<br />

proposto por Gid<strong>de</strong>ns (1991), em entrevista com um agente <strong>de</strong> viagens e guia<br />

especializado no mercado backpacker, também afirmou que todas as <strong>de</strong>finições<br />

para o segmento <strong>de</strong>vem ser questionáveis e variáveis, pois “não tem como rotular<br />

uma pessoa como backpacker e muito menos suas ações e atitu<strong>de</strong>s”:<br />

(...) estamos falando <strong>de</strong> uma segmentação <strong>de</strong> mercado, não <strong>de</strong> pessoas.<br />

Não tem como apontar o <strong>de</strong>do e dizer “você é backpacker, você não”, nem,<br />

muito menos, dizer que toda hora alguém é backpacker, para mim, ser<br />

backpacker é um estado <strong>de</strong> momento: “estou backpacker”(...)<br />

A heterogeneida<strong>de</strong> do segmento é o que o marca – e, portanto, na tentativa<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>finição, esse quesito <strong>de</strong>ve ser levado em consi<strong>de</strong>ração. Com isso, parece<br />

ina<strong>de</strong>quado <strong>de</strong>finir um valor médio gasto diariamente, como o fez Hampton (1998),<br />

uma vez que essa variável <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> do país, da moeda, do custo <strong>de</strong> vida e,<br />

sobretudo, do que o próprio viajante consi<strong>de</strong>ra <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> seu orçamento. É possível<br />

encontrar <strong>de</strong>s<strong>de</strong> mochileiros que sobrevivem com alguns dólares (menos <strong>de</strong> US$ 5),<br />

viajantes a<strong>de</strong>ptos <strong>de</strong> caronas, noites ao relento e trabalhos temporários, até os que,<br />

embora se preocupem com os gastos financeiros, dão-se ao luxo, ao menos<br />

esporadicamente, <strong>de</strong> dormir em um hotel <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> superior à média para o<br />

segmento ou <strong>de</strong> fazer uma refeição em um restaurante mais caro, além <strong>de</strong> gastar<br />

com compras <strong>de</strong> artesanatos e com ativida<strong>de</strong>s esportivas.<br />

14 De acordo com Gid<strong>de</strong>ns (1991, p.45) a reflexivida<strong>de</strong> da vida social mo<strong>de</strong>rna “consistiria no fato <strong>de</strong><br />

que as práticas sociais são constantemente examinadas e reformadas à luz <strong>de</strong> informação renovada<br />

sobre estas próprias práticas, alterando assim constitutivamente seu caráter”. Este fenômeno explica<br />

a diversida<strong>de</strong> das reações dos viajantes e populações receptoras e os feedbacks diferentes em cada<br />

experiência turística.


29<br />

Também não se po<strong>de</strong> afirmar que os mochileiros fazem, por natureza,<br />

viagens longas e superiores a um mês <strong>de</strong> duração. Pesquisas indicam que uma<br />

parte representativa <strong>de</strong>sses viajantes está em férias do trabalho, e não por isso<br />

<strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> se enquadrar no segmento (OLIVEIRA apud JARVIS, 2004).<br />

Isso também <strong>de</strong>rruba a tese <strong>de</strong> que o mochileiro sempre viaja em uma fase<br />

<strong>de</strong> transição na vida, antes <strong>de</strong> concluir os estudos e iniciar a vida profissional, por<br />

exemplo, ou após <strong>de</strong>ixar um emprego. É importante perceber que o fator<br />

<strong>de</strong>terminante para <strong>de</strong>finir o segmento não é uma propulsão única <strong>de</strong> viagem, sua<br />

duração ou a quantia gasta, mas sim traços que indiquem um estilo <strong>de</strong> viagem<br />

comum a todos os mochileiros. Caso contrário, é provável que se incorra em<br />

<strong>de</strong>finições romantizadas e estereotipadas do segmento.<br />

Também não se po<strong>de</strong> generalizar que o mochileiro foge completamente das<br />

rotas turísticas “tradicionais”. Aos olhos do guia especializado no segmento no<br />

estado do Rio <strong>de</strong> Janeiro, “ser um viajante” não quer dizer que o backpacker não<br />

fará o que geralmente “turistas” fazem:<br />

(...) o comportamento do backpacker não é exclu<strong>de</strong>nte, é <strong>de</strong> inclusão. Ele<br />

faz tudo o que o turista faz, mas, a diferença primordial é a busca<br />

diferenciada nessas experiências. (...) Como vir ao Rio e não conhecer o<br />

Cristo, o Pão <strong>de</strong> Açúcar? Impossível! A diferença é que, entre as ativida<strong>de</strong>s<br />

meramente turísticas, ele vai mesclar com experiências diferenciadas que<br />

permitem um maior contato com a localida<strong>de</strong> e o local (...)<br />

Dessa forma, sob a luz do que já foi dito e, analisando as principais<br />

características apontadas pelos autores e, tentando atribuir características menos<br />

generalistas ao segmento, os backpackers seriam:<br />

Grupos <strong>de</strong> pessoas <strong>de</strong> todas as ida<strong>de</strong>s (com capacida<strong>de</strong> física para suportar<br />

alguns <strong>de</strong>sconfortos da viagem), que realizam, fundamentalmente, viagens<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes e econômicas – evitam o turismo <strong>de</strong> luxo, hospedam-se em<br />

acomodações baratas, costumam barganhar preços quando possível e<br />

utilizam a infra-estrutura <strong>de</strong> serviços (restaurantes, comunicação,<br />

transportes e facilida<strong>de</strong>s) local, o que lhes permite, muitas vezes, um<br />

contato mais próximo com a população visitada e o estilo <strong>de</strong> vida da região.<br />

Tratam-se <strong>de</strong> pessoas que costumam viajar sozinhas ou em pequenos<br />

grupos, mas com freqüência superior à média da população, normalmente<br />

com uma agenda mais flexível (muitas vezes em itinerários multi-<strong>de</strong>stino),<br />

organizada <strong>de</strong> forma personalizada e aberta a novas experiências (como<br />

<strong>de</strong>sbravar regiões menos turísticas), porém sem <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> conhecer e<br />

experimentar os aspectos e lugares consi<strong>de</strong>rados tradicionais em uma<br />

cultura.


30<br />

3.2 O SEGMENTO MOCHILEIRO E SUAS CLASSIFICAÇÕES<br />

MERCADOLÓGICAS<br />

Para Loker (1993) os mochileiros são freqüentemente abertos a vivenciar o<br />

estilo <strong>de</strong> vida local, sendo o encontro com as pessoas, uma motivação-chave<br />

(RILEY, 1998). Complementando, Aoqui (2005) relata em seus estudos que o<br />

mercado direcionado para o turista mochileiro é caracterizado por um estilo <strong>de</strong><br />

turismo flexível e econômico, com a maioria dos participantes a<strong>de</strong>ptos a viagens<br />

solitárias ou em pequenos grupos.<br />

De acordo com as pesquisas realizadas na Austrália pelos autores Loker-<br />

Murphy; Pearce (1995), <strong>de</strong> um modo geral, as ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> recreação dos<br />

mochileiros focam principalmente na natureza (por exemplo, trekking), cultura<br />

(estadas em vilarejos) ou aventura (incluindo rafting em rios e passeios <strong>de</strong> camelo).<br />

Essas características estão associadas ao fato <strong>de</strong> os mochileiros viajarem mais que<br />

outros tipos <strong>de</strong> turistas e principalmente ao fato que, geralmente, ocorre uma<br />

assídua busca <strong>de</strong> atrações incomuns ou experiências inusitadas pelos mesmos.<br />

(HAIGH, 1995).<br />

De acordo com Riley (1998) outra característica pertinente aos mochileiros, é<br />

a busca pela a rota menos viajada e a busca pelos caminhos mais difíceis. Em sua<br />

pesquisa, o autor <strong>de</strong>scobriu que a <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> escolher o caminho mais complicado,<br />

para os mochileiros é regada <strong>de</strong> misticismo e a constante busca <strong>de</strong> conferir status<br />

em seus “<strong>de</strong>sbravamentos”. Já em relação aos gastos, o orçamento apertado a que<br />

muitos mochileiros se impõem está em boa parte relacionado à longa duração <strong>de</strong><br />

suas viagens (GIBBONS e SELVARAJAH apud AOQUI, 2005).<br />

Para Lohmann e Netto (2008), a segmentação <strong>de</strong> mercado <strong>de</strong>senvolvida pelo<br />

marketing po<strong>de</strong> incluir características sócio-<strong>de</strong>mográficas, comportamentais,<br />

motivacionais, psicográficas ou até mesmo uma combinação <strong>de</strong>ssas. Segundo<br />

Kotler (2000), uma das formas mais utilizadas para classificar os turistas está<br />

baseada no aspecto organizacional da viagem, po<strong>de</strong>ndo ser em grupo ou<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte. Como os turistas mochileiros não participam <strong>de</strong> excursões ou pacotes<br />

<strong>de</strong> viagens e tomam <strong>de</strong>cisões sobre a viagem por conta própria, os mesmos são<br />

classificados como turistas in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes.<br />

A partir <strong>de</strong> um estudo realizado em 1974, Plog i<strong>de</strong>ntificou cinco tipos


31<br />

psicográficos <strong>de</strong> turistas: alocêntricos, quase-alocêntricos, meio-cêntricos, quasepsicocêntricos<br />

e psicocêntricos.<br />

Figura 2 - Sistema Psicográfico <strong>de</strong> Plog<br />

Fonte: Elaboração própria a partir <strong>de</strong> Plog (1974)<br />

Para Lohmann e Netto (2008), os turistas alocêntricos são aqueles que<br />

querem <strong>de</strong>scobrir novos <strong>de</strong>stinos, explorando culturas estrangeiras e com espírito <strong>de</strong><br />

aventura. Ruschman (1997) comentou que a palavra “alocêntrico” <strong>de</strong>riva <strong>de</strong> allo, que<br />

significa “formas variadas”, explicando assim que são turistas cujos interesses estão<br />

centrados em várias ativida<strong>de</strong>s. Os alocêntricos têm uma personalida<strong>de</strong> extrovertida<br />

e são autoconfiantes. Muitos têm preconceito <strong>de</strong> serem chamados <strong>de</strong> turistas, uma<br />

vez que, <strong>de</strong> certa forma, procuram se integrar com a cultura e povos locais.<br />

(LOHNMANN; NETTO, 2008)<br />

Conforme pesquisas feitas por Solá (1975) sobre os turistas alocêntricos,<br />

po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>stacar as principais características encontradas neste perfil <strong>de</strong> turista:<br />

• Preferem viajar para regiões ainda não <strong>de</strong>senvolvidas turisticamente;<br />

• Buscam novas experiências e <strong>de</strong>scobertas;<br />

• A maioria das vezes procura <strong>de</strong>stinos diferentes;<br />

• Buscam <strong>de</strong>senvolver ativida<strong>de</strong>s originais durante sua estada;<br />

• Buscam alojamentos simples e;<br />

• Procuram o máximo <strong>de</strong> flexibilida<strong>de</strong> na organização da viagem.<br />

De acordo com Stanley (apud Aoqui, 2005), há uma contraposição entre os


32<br />

turistas alocêntricos e os turistas psicocêntricos. O turista psicocêntrico ten<strong>de</strong> a ser<br />

inibido e pouco aventureiro. Por meio <strong>de</strong>ssa classificação, é possível realizar uma<br />

distribuição das posições psicográficas <strong>de</strong> <strong>de</strong>stinações, <strong>de</strong>finidos em uma curva<br />

normal em que, do lado psicocêntrico, ficariam <strong>de</strong>stinos como Miami e parques<br />

temáticos; os meio-cêntricos iriam <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as ilhas do Caribe a <strong>de</strong>stinos como<br />

Austrália, Nova Zelândia e Rússia; já os alocêntricos viajariam para áreas não<strong>de</strong>senvolvidas,<br />

Nepal, Tibete e África, por exemplo (vi<strong>de</strong> figura 2).<br />

Figura 3 - Posições Psicográficas <strong>de</strong> Destino<br />

Fonte: GOELDNER, RITCHIE e MCINTOSH, 2002, p. 413.<br />

O comportamento do consumidor também apresenta outra forma <strong>de</strong><br />

segmentar o mercado turístico. Les Lumdson (apud Aoqui, 2005), propõe uma<br />

subdivisão dos consumidores em cinco categorias distintas: em inovadores,<br />

primeiros adotantes, maioria adiantada, maioria tardia e conservadores. Nesse caso,<br />

em termos <strong>de</strong> consumo do produto “<strong>de</strong>stino <strong>de</strong> viagem”, po<strong>de</strong>-se inserir os<br />

mochileiros na primeira categoria, a <strong>de</strong> inovadores, já que procuram <strong>de</strong>sbravar áreas<br />

pouco estruturadas para o turismo, em busca <strong>de</strong> novida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong> aventuras.


33<br />

Outra forma <strong>de</strong> classificar o mercado é pelo grau <strong>de</strong> institucionalização e suas<br />

interferências nos <strong>de</strong>stinos turísticos, proposta por Cohen (1973), os mochileiros<br />

pertenceriam aos <strong>de</strong>nominados turistas exploradores, e até mesmo em alguns<br />

casos, como turistas errantes, ou seja, pessoas que viajam sem propósito e por<br />

impulso e que ten<strong>de</strong>m a passar como pertencentes à comunida<strong>de</strong> local. Nessa<br />

segmentação, os turistas exploradores seriam os viajantes que geralmente se<br />

hospedam em albergues da juventu<strong>de</strong> ou em campings na companhia dos amigos,<br />

que ten<strong>de</strong>m a se relacionar com as pessoas nativas <strong>de</strong> classes socioeconômicas<br />

menos favorecidas, que utilizam meio <strong>de</strong> transportes coletivos ferroviários e<br />

rodoviários, e que, em sua maioria, são jovens. (AOQUI, 2005)


34<br />

4 INDISPENSÁVEIS, DESEJÁVEIS E TENSAS: AS POSSÍVEIS RELAÇÕES<br />

ESTABELECIDAS ENTRE VISITANTES E VISITADOS<br />

Somos apaixonados por lugares novos, pessoas novas, culturas diferentes.<br />

Queremos ver <strong>de</strong> perto, sentir na pele, provar o sabor do mundo. [...] Nos<br />

interessaram os mais diversos <strong>de</strong>stinos. Cada pedaço <strong>de</strong> chão em que já<br />

estivemos serviu para aguçar a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r melhor, conhecer mais<br />

profundamente, ampliar cada experiência. Não temos certeza do que iremos<br />

encontrar, mas sabemos o que estamos buscando; que as viagens<br />

permaneçam conosco por toda a nossa vida. (Blog “Mochilando pelo<br />

Mundo” 15 )<br />

Molina (1994) ressalta a importância da comunicação entre os homens que<br />

viajam ou, até mesmo, o contato direto com a natureza e a cultura do lugar visitado.<br />

Essa experiência permite ao homem contemporâneo uma alternativa <strong>de</strong> se<br />

contemplar/ter outra realida<strong>de</strong>. No entanto, para Krippendorf (2001), o <strong>de</strong>slocamento<br />

<strong>de</strong> indivíduos com a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> fugir do seu cotidiano em busca do “novo” traz<br />

implicações para a comunida<strong>de</strong> local, especialmente no que se refere às<br />

interferências negativas geradas pelo turismo como as ambientais, culturais,<br />

psicológicas e sociais. Mas, quais seriam as interferências negativas para o<br />

visitante? O objetivo principal <strong>de</strong>ste capítulo baseia-se em não cair no estereótipo –<br />

muito difundido em alguns âmbitos acadêmicos – da visão das populações visitadas<br />

como vítimas e dos turistas, como algozes. (BARRETO, 2004)<br />

4.1 O CONTATO COM A COMUNIDADE LOCAL: INTERFERÊNCIAS MÚTUAS<br />

De acordo com Kadt (apud Barreto, 2004), para fins <strong>de</strong> análise, os encontros<br />

entre visitantes e população local po<strong>de</strong>m ser categorizados em três situações:<br />

quando os visitantes compram bens ou serviços, quando visitantes e resi<strong>de</strong>ntes<br />

compartem espaços ou quando os visitantes se dirigem expressamente aos<br />

resi<strong>de</strong>ntes a procura <strong>de</strong> informações.<br />

De acordo com Oliveira (2007), muitos mochileiros ao chegarem ao <strong>de</strong>stino,<br />

preferem conhecer os lugares andando pelas ruas, utilizando os meios <strong>de</strong> transporte<br />

15 Disponível em http://mochilandopelomundo.wordpress.com (acessado em: fevereiro <strong>de</strong> 2012)


35<br />

públicos, entrando nos comércios locais, restaurantes e supermercados comuns aos<br />

cidadãos locais, sempre com o intuito <strong>de</strong> vivenciar realmente os costumes da<br />

comunida<strong>de</strong> local e, quando possível , interagir com as pessoas nativas. Atitu<strong>de</strong>s<br />

como esta, são inversas ao turismo elitizado, ou aqueles adquiridos <strong>de</strong> forma<br />

fechada através <strong>de</strong> pacotes turísticos. Geralmente, nestes casos, o turista pouco sai<br />

do seu hotel ou resort, pois há uma varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s para serem<br />

<strong>de</strong>senvolvidas no próprio local. Quando saem do hotel, conhecem a cida<strong>de</strong> através<br />

do ônibus que faz o city tour. Essa é apenas uma forma <strong>de</strong> ilustrar que na maioria<br />

das vezes esses turistas não buscam manter contato com as pessoas locais e<br />

interagem com elas da forma mais superficial possível. (CARVALHO, 2009)<br />

Para Gursoy; Jurowski; Uysal (apud Barreto, 2004) na atualida<strong>de</strong> parece não<br />

haver discussão quanto ao fato <strong>de</strong> que a relação entre visitantes e visitados<br />

apresenta graus <strong>de</strong> conflito bem variados. Por vezes, interferências para o visitado,<br />

e em outras, para o visitante. Dentre as mais frequentes, po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>stacar:<br />

• A visão distorcida que a população local po<strong>de</strong> ter dos estrangeiros em<br />

<strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> experiências anteriores não-positivas com forasteiros nãoturistas;<br />

• Preconceitos;<br />

• A rapi<strong>de</strong>z com que acontece o fenômeno <strong>de</strong> turistificação 16 nos <strong>de</strong>stinos;<br />

• A percepção que a população tem dos benefícios econômicos e sociais<br />

advindos do turismo e, por este motivo, por vezes, tiram vantagem dos<br />

visitantes;<br />

• Os custos sociais;<br />

• Os custos ambientais;<br />

• Competição por recursos naturais na localida<strong>de</strong>;<br />

• Uso <strong>de</strong> instalações e infraestrutura local;<br />

• Grau da distância social e econômica entre visitantes e visitados.<br />

16 O processo <strong>de</strong> turistificação ocorre quando um espaço é apropriado pelo turismo, fazendo com que<br />

haja um direcionamento das ativida<strong>de</strong>s para o atendimento dos que vem <strong>de</strong> fora, alterando a<br />

configuração em função <strong>de</strong> interesses mercadológicos. (ISSA; DENCKER, 2006)


36<br />

Outra variação <strong>de</strong> conflito entre visitantes e visitados ocorre quando os<br />

visitados estão em diferentes estágios <strong>de</strong> acesso à tecnologia e a outros padrões da<br />

civilização oci<strong>de</strong>ntal (BARRETO, 2004). Os viajantes esperam encontrar “o<br />

primitivo”, o “bom selvagem” não “contaminado” pela civilização urbana.<br />

Paradoxalmente os visitados, quanto mais pobres, mais <strong>de</strong>positam no turismo suas<br />

expectativas <strong>de</strong> progresso, <strong>de</strong> integração ao processo civilizatório e a economia <strong>de</strong><br />

mercado.<br />

Existe também a incidência <strong>de</strong> interferências quando os visitantes não se<br />

preocupam com os costumes locais, como aponta Noronha (1999). O autor sugere<br />

que alguns viajantes, até mesmo mochileiros, simplesmente não se preocupam com<br />

costumes locais e que possuem um comportamento inaceitável, mostrando <strong>de</strong>scaso<br />

com as normas sociais. Ao se consi<strong>de</strong>rarem livres dos comprometimentos e das<br />

restrições sociais, po<strong>de</strong>m apresentar um comportamento culturalmente e<br />

socialmente <strong>de</strong>sapropriado.<br />

Para Carvalho (2009) isso parece ser um problema particularmente em<br />

guetos ou enclaves <strong>de</strong> mochileiros, ou seja, lugares on<strong>de</strong> se congregam vários<br />

viajantes para usufruir <strong>de</strong> confortos domésticos e a companhia <strong>de</strong> turistas com<br />

pensamentos parecidos. Tais lugares po<strong>de</strong>m ser encontrados em Kathmandu 17 ,<br />

Bancóc 18 e Pushkar 19 , pontos maiores <strong>de</strong> referência na gran<strong>de</strong> rota pela Ásia.<br />

Sorensen (apud Carvalho, 2009) cita o exemplo <strong>de</strong> Bancoc, na Tailândia, on<strong>de</strong> o<br />

famoso enclave <strong>de</strong> mochileiros, a Khaosan Road, como é conhecido, tornou-se um<br />

mundo à parte, uma região <strong>de</strong>svinculada das características da cida<strong>de</strong> e da<br />

população local. Lá, esses viajantes “reinam absolutos”. Serviços como<br />

hospedagem, restaurantes e salões <strong>de</strong> beleza, e comércios, como farmácias, lojas<br />

<strong>de</strong> CDs e <strong>de</strong> roupas, são exclusivamente voltados aos turistas e com pequena<br />

participação dos tailan<strong>de</strong>ses.<br />

17 O Kathmandu fica localizado no Nepal. O vale <strong>de</strong> Kathmandu foi <strong>de</strong>clarado Patrimônio Mundial da<br />

Humanida<strong>de</strong> pela Unesco em 1979 é o principal ponto turístico do Nepal.<br />

18 Bancóc é a capital, bem como a maior e mais importante cida<strong>de</strong> da Tailândia.<br />

19 Pushkar é uma cida<strong>de</strong> no distrito <strong>de</strong> Ajmer, no estado indiano <strong>de</strong> Rajasthan. Ele é um dos cinco<br />

dhams sagrados (local <strong>de</strong> peregrinação) para os hindus <strong>de</strong>votos. É um cida<strong>de</strong> que tem sido <strong>de</strong>stino<br />

popular para turistas estrangeiros.


37<br />

Por outro lado, percebe-se que a gran<strong>de</strong> maioria dos mochileiros, são<br />

possuidores <strong>de</strong> um espírito aventureiro e busca novos <strong>de</strong>safios. Na maioria das<br />

vezes ele é um viajante i<strong>de</strong>alista, político e socialmente correto, porque busca<br />

conhecer <strong>de</strong> fato o lugar, a cultura, respeita o meio ambiente e consome coisas do<br />

lugar, aceita a hospedagem rústica sem mudar os hábitos do morador e incentiva as<br />

manifestações culturais locais (GIARETTA, 2003).<br />

No entanto, há <strong>de</strong> se lembrar que os visitantes também geram fatores<br />

positivos para a comunida<strong>de</strong> receptora. Wilson (1997) e Hampton (1998) enumeram<br />

estas vantagens <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> turismo econômico, incluindo maiores oportunida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> emprego, distribuição dos benefícios econômicos para a comunida<strong>de</strong> local,<br />

manutenção dos proprietários locais e dos equipamentos turísticos.<br />

Cohen (apud Barreto, 2004) caracteriza os encontros entre visitantes e<br />

visitados como “essencialmente transitórios, assimétricos e sem repetição, [on<strong>de</strong>] os<br />

participantes procuram gratificação imediata em lugar <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong>”. Acrescenta<br />

que essa efemerida<strong>de</strong> das relações é a que propicia a exploração, o engano, a<br />

hostilida<strong>de</strong> e a <strong>de</strong>sonestida<strong>de</strong>; fatores estes presentes na relação entre turistas e<br />

população local justamente porque nenhuma das partes envolvidas se sente<br />

comprometida com as conseqüências das suas ações.<br />

Muito se fala das interferências dos turistas para a comunida<strong>de</strong> local, no<br />

entanto, ainda não se estudou o caminho inverso. Até que ponto as relações entre a<br />

comunida<strong>de</strong> local para com o visitante se estabelece <strong>de</strong> forma positiva?<br />

4.2 O CONTATO COM OS COMERCIANTES: AS RELAÇÕES COMERCIAIS<br />

ESTABELECIDAS ENTRE VISITANTES E VISITADOS<br />

O segmento dos mochileiros está cada vez mais atuante no cenário mundial e<br />

é um forte aliado para trocas sem prece<strong>de</strong>ntes entre visitantes e visitados, uma vez<br />

que o perfil do viajante permite este intercâmbio. No entanto, para Barreto (2004), o<br />

turismo em sentido amplo representa um fenômeno social; em sentido restrito<br />

representa somente uma fonte <strong>de</strong> significação para os núcleos receptores, é um<br />

negócio e por isso é conduzido pela lógica da socieda<strong>de</strong> capitalista: a produtivida<strong>de</strong><br />

e a lucrativida<strong>de</strong>. Mas até que ponto os habitantes que se beneficiam


38<br />

economicamente com a presença dos visitantes estão somente interessados em<br />

recebê-los e não necessariamente interessados no seu dinheiro? (BARRETO, 2004)<br />

Retomando Kadt (apud Barreto, 2004) e, focando na primeira forma <strong>de</strong><br />

encontro entre visitantes e população local - compra <strong>de</strong> bens ou serviços - é preciso<br />

antes <strong>de</strong> qualquer coisa, levar em consi<strong>de</strong>ração que o turismo é um ato praticado<br />

por pessoas que realizam uma ativida<strong>de</strong> específica <strong>de</strong> lazer, fora das suas<br />

respectivas cida<strong>de</strong>s e se utilizam, para atingir seus objetivos, <strong>de</strong> equipamentos e<br />

serviços, cuja prestação constitui um negócio.<br />

Essa comunida<strong>de</strong> empresarial que negocia serviços turísticos estabelece com<br />

os turistas, relações <strong>de</strong> mercado <strong>de</strong>ntro da lógica capitalista. O turista é um<br />

consumidor e os membros da comunida<strong>de</strong> empresarial são ven<strong>de</strong>dores <strong>de</strong> serviços<br />

e/ou produtos. A relação entre estes (turistas e partes interessadas em ven<strong>de</strong>r<br />

serviços aos turistas) foi chamada por Nash (apud Barreto, 2004) <strong>de</strong> “transação<br />

complexa”, o que <strong>de</strong>fine muito bem estes encontros.<br />

Apesar <strong>de</strong> o mochileiro ser qualificado como um turista econômico, buscando<br />

em suas escolhas minimizar os seus gastos, em suas pesquisas na Austrália com<br />

mochileiros, Jarvis (1994) aponta que, embora a média <strong>de</strong> gastos por noite dos<br />

mochileiros seja <strong>de</strong> apenas US$ 10 a US$ 15 em acomodação, muitos não<br />

pensariam duas vezes para esbanjar US$ 120 por um vôo sobre os Bungle<br />

Bungles 20 ou US$ 200 em um safári pelo Kakadu 21 ou ainda US$ 400 em um curso<br />

<strong>de</strong> mergulho em Cairns 22 .<br />

Apesar <strong>de</strong> o viajante mochileiro possuir como um dos seus i<strong>de</strong>ais <strong>de</strong> viagem a<br />

20 Os Bungle Bungles ficam no nor<strong>de</strong>ste da Austrália Oci<strong>de</strong>ntal. São faixas <strong>de</strong> pedra arredondadas e<br />

coloridas alternadamente em laranja e preto. Esta faixa <strong>de</strong> pedras é localizada no Parque Nacional <strong>de</strong><br />

Purnululu e, em 2003, foram <strong>de</strong>claradas Patrimônio Mundial da Humanida<strong>de</strong>. Os vôos na área são<br />

muito comuns e procurados pelos visitantes.<br />

21 O Parque Nacional Kakadu é um parque nacional australiano localizado no Território do Norte. Foi<br />

estabelecido em 1981 e cobre uma área <strong>de</strong> 19.804 km². A sua gestão é conjuntamente feita pelo<br />

governo australiano e pelos aborígenes da área. O parque é reconhecido pela UNESCO como um<br />

patrimônio mundial, <strong>de</strong>vido às gravuras rupestres aborígenes e ao ecossistema com rica<br />

biodiversida<strong>de</strong>.<br />

22 Cairns é uma cida<strong>de</strong> australiana que se localiza no estado <strong>de</strong> Queensland. Esta cida<strong>de</strong> é o ponto<br />

<strong>de</strong> entrada para a Gran<strong>de</strong> Barreira <strong>de</strong> Corais. Cairns e a Gran<strong>de</strong> Barreira <strong>de</strong> Corais representam<br />

alguns dos melhores e mais exóticos mergulhos do mundo. As profundida<strong>de</strong>s variam entre os 6 e os<br />

1000 metros <strong>de</strong> profundida<strong>de</strong>, abrangendo mergulhadores <strong>de</strong> vários níveis <strong>de</strong> mergulho.


39<br />

não-intermediação como já abordado anteriormente, em algumas situações, mesmo<br />

planejando seu roteiro, este tipo <strong>de</strong> viajante recorrerá às estruturas advindas do<br />

turismo <strong>de</strong> massa. Nestas relações, principalmente as comerciais, inci<strong>de</strong>ntes críticos<br />

como exploração financeira dos visitados po<strong>de</strong> ocorrer.<br />

Uma dificulda<strong>de</strong> encontrada neste trabalho foi encontrar fontes que<br />

abordassem o caminho inverso: as interferências causadas aos visitantes pelos<br />

anfitriões e, principalmente, estudos e questões específicas (como sua<br />

conceituação, os possíveis “agentes da exploração”, possíveis razões para a<br />

incidência e possíveis formas <strong>de</strong> prevenção) sobre situações <strong>de</strong> exploração<br />

financeira direcionadas aos viajantes. No entanto, com algumas experiências in loco<br />

e principalmente relatos <strong>de</strong> outros viajantes, a autora do presente trabalho po<strong>de</strong><br />

constatar previamente alguns possíveis agentes da exploração e um <strong>de</strong>les seria o<br />

mercado informal.<br />

De acordo com Urry (2001), turismo é uma ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> lazer que pressupõe<br />

o seu oposto, isto é, um trabalho regulamentado e organizado. No entanto, nem<br />

sempre isto ocorre. Segundo Gid<strong>de</strong>ns (1996), a categoria informal se torna uma<br />

nova característica da socieda<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna, já não <strong>de</strong>vendo ser consi<strong>de</strong>rada como<br />

"sobra" da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>: o setor informal constituiu (na década <strong>de</strong> 90) entre 60% e<br />

80% do emprego urbano nos países periféricos, transformando-se, assim, na regra e<br />

não na exceção.<br />

De acordo com Oliveira e Oliveira (2005), “sem dúvida, parcelas<br />

consi<strong>de</strong>ráveis <strong>de</strong> setores médios da socieda<strong>de</strong> também têm incorporado a estratégia<br />

da informalida<strong>de</strong> como meio <strong>de</strong> trabalho, mas também é inquestionável a<br />

associação entre pobreza e informalida<strong>de</strong> nos países periféricos.”<br />

Segundo Oliveira (2000), muitos mochileiros ao chegarem ao <strong>de</strong>stino<br />

preferem conhecer os lugares andando pelas ruas, utilizando os meios <strong>de</strong> transporte<br />

públicos, entrando em lojas comerciais, restaurantes e supermercados comuns aos<br />

cidadãos locais, ou seja, nas rotinas <strong>de</strong> um backpacker, é muito fácil encontrar os<br />

vestígios do trabalho informal, que sempre <strong>de</strong>sempenhou um importante papel na<br />

economia e na sobrevivência da sua população mais pobre.<br />

Memórias <strong>de</strong> backpackers em sites <strong>de</strong> relacionamento, blogs, mostram<br />

claramente a profusão <strong>de</strong> mercadores e comerciantes que oferecem os mais<br />

variados tipos <strong>de</strong> serviços: cantorias e entoações, shows e encenações, passeios <strong>de</strong>


40<br />

camelo e tuc-tuc 23 , souvenirs, relógios e bolsas falsificadas, ca<strong>de</strong>iras e sombreiros,<br />

tatuagens <strong>de</strong> henna, tererê 24 , massagens, <strong>de</strong>ntre outros típicos produtos e serviços<br />

da região visitada, que são verda<strong>de</strong>iros chamarizes para o consumo. Mas, o que<br />

po<strong>de</strong>ria ser consi<strong>de</strong>rado relações <strong>de</strong> mercado “saudáveis”? Para tal, se faz<br />

necessário conceituar o que o presente trabalho enten<strong>de</strong> por exploração financeira.<br />

De acordo com o Dicionário da Língua Portuguesa, Michaelis 25 , a palavra<br />

exploração vem do latim exploratione e possui os seguintes significados:<br />

1 Ato ou efeito <strong>de</strong> explorar. (...). 5 Tentativa ou ato <strong>de</strong> tirar utilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

alguma coisa; aproveitamento, utilização (...) 7 Abuso da boa-fé, da<br />

ignorância ou da especial situação <strong>de</strong> alguém, para auferir interesse ilícito [...]<br />

(Dicionário online Michaelis, 2012)<br />

Se conceituarmos a palavra finanças, teremos significados como “o estado<br />

financeiro <strong>de</strong> um particular” ou “o dinheiro <strong>de</strong> que se dispõe. (Dicionário online<br />

Michaelis, 2012). Utilizando estas <strong>de</strong>finições, po<strong>de</strong>mos então dizer que, para os fins<br />

dos objetivos <strong>de</strong> análise <strong>de</strong>ste trabalho que exploração financeira seria o abuso da<br />

boa-fé, da ignorância ou da especial situação <strong>de</strong> alguém, para auferir interesse<br />

ilícito em relação ao dinheiro (recursos financeiros) que o alguém em questão,<br />

dispõe. 26<br />

O perfil do viajante pertencente ao grupo <strong>de</strong> foco <strong>de</strong>ste trabalho, o mochileiro,<br />

anseia por experiências únicas, novas culturas, pessoas. Para Carvalho (2009), os<br />

backpackers valorizam a troca <strong>de</strong> experiências com a comunida<strong>de</strong> local, o que gera<br />

uma maior conscientização e respeito com hábitos e culturas diferentes. Esse é um<br />

interesse advindo do próprio “ser mochileiro”. O pressuposto <strong>de</strong>ste trabalho <strong>de</strong><br />

conclusão <strong>de</strong> curso é que, situações <strong>de</strong> exploração geram experiências negativas<br />

não só para o viajante, mas também uma imagem negativa para o <strong>de</strong>stino. O relato<br />

obtido pelos mochileiros no blog “Mochilando pelo mundo” esclarece o que uma<br />

experiência <strong>de</strong> exploração po<strong>de</strong> gerar em um viajante:<br />

23 Taxi motorizado que representa uma espécie <strong>de</strong> moto coberta que carrega duas ou mais pessoas.<br />

24 A<strong>de</strong>reços são fixados temporariamente em uma mecha <strong>de</strong> cabelo.<br />

25 Disponível em http://michaelis.uol.com.br/mo<strong>de</strong>rno/portugues<br />

26 Conceito criado pela autora.


41<br />

“A Medina é o lar <strong>de</strong> muita gente e compreen<strong>de</strong> vários bairros. On<strong>de</strong> há<br />

maior concentração <strong>de</strong> turistas, torna-se uma gigantesca feira com pequenas<br />

lojas ocupando cada espaço disponível. Isso seria ótimo, não fosse a legião<br />

<strong>de</strong> ven<strong>de</strong>dores, pseudo-guias e toda sorte <strong>de</strong> aproveitadores molestando<br />

insistentemente a todos que passam. Cobram por informações que você não<br />

pediu ou por produtos que não queria comprar, pressionando e coagindo pra<br />

conseguir algum dinheiro. É exageradamente hostil e <strong>de</strong>sconfortável. Por<br />

sinal, uma das cenas mais comuns e que se tornaram mais irritantes é o que<br />

apelidamos <strong>de</strong> “bingo dos países”. Não é possível dar 5 passos sem que<br />

alguém tente adivinhar <strong>de</strong> on<strong>de</strong> você veio: “Espanha?”, “Itália?”, “Inglaterra?”,<br />

“Where are you from?”. Partindo da premissa, cujo embasamento lógico é<br />

in<strong>de</strong>cifrável, <strong>de</strong> que caso consigam acertar on<strong>de</strong> você nasceu, você terá que<br />

parar pra ver o que querem oferecer, mesmo que isso seja apenas apontar<br />

na direção que você já ia e lhe cobrar por isso. Po<strong>de</strong> parecer intolerância<br />

nossa, mas é absurda a freqüência e animosida<strong>de</strong> com que isso po<strong>de</strong> ser<br />

feito”. (Blog Mochilando pelo Mundo 27 )<br />

O que faz um viajante gostar ou não <strong>de</strong> uma experiência <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da sua<br />

percepção sobre aquele lugar. Viajar é uma jornada <strong>de</strong> característica única e<br />

diferente pra cada pessoa. Difícil dizer o que leva uma pessoa a gostar ou não <strong>de</strong><br />

algum lugar, pois isso <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> das experiências vividas, impressões e<br />

acontecimentos específicos que se misturam na memória do viajante, construindo<br />

uma imagem. E é exatamente este o objetivo <strong>de</strong>ste trabalho <strong>de</strong> conclusão <strong>de</strong> curso:<br />

compreen<strong>de</strong>r as percepções do turista mochileiro em relação à exploração financeira<br />

em suas experiências <strong>de</strong> viagem.<br />

27 Acessível em http://mochilandopelomundo.wordpress.com/2011/03/21/pra-la-<strong>de</strong>-marrakech/<br />

(acessado em 19 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 2012)


42<br />

5 RELAÇÕES COMERCIAIS PERCEBIDAS: A EXPLORAÇÃO FINANCEIRA SOB<br />

O OLHAR DO VIAJANTE BACKPACKER E DO MERCADO<br />

“Existem coisas que adoramos fazer a cada novo <strong>de</strong>stino. Por exemplo,<br />

apren<strong>de</strong>r um pouco da língua, nem que seja “olá”, “obrigado” e “tchau”.<br />

Nessa brinca<strong>de</strong>ira, foram 19 formas diferentes <strong>de</strong> falar essas 3 palavrinhas.<br />

Também gostamos <strong>de</strong> <strong>de</strong>vorar o Lonely Planet da próxima parada, além <strong>de</strong><br />

pesquisar na Internet e contar com as dicas <strong>de</strong> outros mochileiros que<br />

cruzam nosso caminho (...) Por outro lado, têm aquelas coisas chatas que<br />

não gostamos, como o assédio <strong>de</strong> ven<strong>de</strong>dores, guias, pilotos <strong>de</strong> táxi, barco,<br />

tuc-tuc, camelo ou seja lá o que for. Na realida<strong>de</strong>, recebe a nossa<br />

<strong>de</strong>sconfiança qualquer um que se aproxime <strong>de</strong> uma forma excessivamente<br />

simpática oferecendo ajuda sem que a gente sequer pareça ter algum<br />

problema. Que nos perdoem os poucos que fazem isso <strong>de</strong> forma bem<br />

intencionada, é que se apren<strong>de</strong> rápido que em qualquer lugar do mundo<br />

existem picaretas tentando separar os estrangeiros <strong>de</strong> seu dinheiro...” (Blog<br />

“Mochilando pelo Mundo”) 28<br />

Este capítulo tem o objetivo <strong>de</strong> <strong>de</strong>screver os procedimentos que orientaram a<br />

elaboração do presente estudo assim como relatar as informações obtidas nas<br />

entrevistas realizadas com jovens que já tiveram oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> viajar como<br />

backpackers e que vivenciaram alguma experiência <strong>de</strong> exploração financeira em<br />

suas viagens. Devido à complexida<strong>de</strong> e a importância do assunto e, sobretudo, a<br />

ausência <strong>de</strong> estudos prévios relacionados ao tema, este trabalho foi subdividido em<br />

duas partes complementares entre si.<br />

A primeira parte consistiu em uma pesquisa bibliográfica on<strong>de</strong> se buscou<br />

“conhecer e analisar as contribuições culturais ou científicas do passado sobre<br />

<strong>de</strong>terminado assunto, tema ou problema” (CERVO; BERVIAN, 1983, p.55) e a<br />

segunda parte consistiu em uma pesquisa exploratória, <strong>de</strong> caráter qualitativo, com o<br />

objetivo <strong>de</strong> proporcionar maior familiarida<strong>de</strong> com o fenômeno investigado, tornandoo<br />

mais explícito (DENCKER, 2001).<br />

Por meio <strong>de</strong> levantamento bibliográfico, foi realizado um resgate da literatura<br />

existente sobre o assunto, incluindo livros, teses e dissertações, artigos, matérias<br />

em imprensa escrita, filmes, conteúdos <strong>de</strong> websites e periódicos <strong>de</strong> instituições<br />

ligadas ao turismo. A maioria das referências bibliográficas, tendo em vista a falta <strong>de</strong><br />

estudos sobre o tema proposto no Brasil, veio <strong>de</strong> pesquisas realizadas em outros<br />

28 Fonte: http://mochilandopelomundo.wordpress.com/2011/12/13/300-dias-na-estrada/<br />

(Acessado em 8 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 2012)


43<br />

países, sobretudo na Austrália.<br />

A pesquisa bibliográfica tornou possível o conhecimento aprofundado sobre a<br />

antropologia do turismo, conceitos pertinentes aos diferentes tipos <strong>de</strong> viajantes e<br />

segmentos do turismo, sobretudo sobre o tema backpacker. Além disso, são<br />

abordados aspectos que possibilitam <strong>de</strong>terminar o perfil <strong>de</strong>sse segmento <strong>de</strong><br />

viajantes, sob a luz da antropologia e estudos dirigidos sobre o mesmo. No entanto,<br />

no quesito exploração financeira a busca foi incessante e sem resultados. Fez-se<br />

então necessário o uso <strong>de</strong> diversos caminhos para obtenção <strong>de</strong> conteúdo relevante<br />

sobre o mesmo.<br />

Por se tratar <strong>de</strong> um estudo <strong>de</strong> natureza exploratória, foi escolhido o método<br />

<strong>de</strong> entrevistas em profundida<strong>de</strong> que permite o aprofundamento das questões e<br />

percepções do entrevistado sobre <strong>de</strong>terminado assunto ou problema. Segundo<br />

Mattar (apud DENCKER, 2001), “amostra é qualquer parte <strong>de</strong> uma população e<br />

amostragem é o processo <strong>de</strong> colher amostras <strong>de</strong> uma população”. A amostragem foi<br />

<strong>de</strong>finida como não probabilística por conveniência, já que a seleção dos elementos<br />

da população que compuseram a amostra foi realizada a critério do pesquisador.<br />

A amostra da pesquisa foi constituída por 14 viajantes com ida<strong>de</strong>s entre 18 e<br />

32 anos que já tiveram a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> viajar como backpackers para um <strong>de</strong>stino<br />

ou mais nos últimos cinco anos e, principalmente, que tenha vivenciado algum tipo<br />

<strong>de</strong> exploração financeira neste <strong>de</strong>stino. Os entrevistados <strong>de</strong> ambos os sexos foram<br />

selecionados através da re<strong>de</strong> <strong>de</strong> relacionamento da autora e, por indicação <strong>de</strong><br />

outros viajantes através dos primeiros selecionados. Todos os entrevistados eram<br />

brasileiros e resi<strong>de</strong>ntes no Brasil.<br />

As entrevistas foram realizadas no período <strong>de</strong> 03 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 2012 a 16 <strong>de</strong><br />

abril <strong>de</strong> 2012, doze <strong>de</strong>las pessoalmente e duas por skype 29 e duraram em média 50<br />

minutos. Estas foram gravadas e transcritas para possibilitar futuras consultas. De<br />

acordo com o grau <strong>de</strong> estruturação, as entrevistas se classificavam como semiestruturadas<br />

para que permitisse uma maior liberda<strong>de</strong> ao pesquisador. Foi<br />

informado aos entrevistados que o objetivo da pesquisa era compreen<strong>de</strong>r os<br />

29 Software <strong>de</strong> troca <strong>de</strong> mensagens instantâneas pela internet, tendo como carro chefe seu sistema<br />

voip (voz sobre ip), ou seja, sistema que possibilita utilizar a voz para conversar pela internet.


44<br />

possíveis fatores e situações que levam um viajante a ser explorado em suas<br />

experiências <strong>de</strong> viagem.<br />

Depois <strong>de</strong> perguntas genéricas sobre a viagem, ao final da entrevista foi<br />

pedido aos entrevistados que narrassem um inci<strong>de</strong>nte crítico vivido durante a<br />

viagem, no caso <strong>de</strong>sta pesquisa, sobre a experiência <strong>de</strong> exploração financeira<br />

vivenciada. Este procedimento trata-se essencialmente <strong>de</strong> um meio que permite<br />

obter fatos importantes relacionados ao comportamento do indivíduo. (FLANAGAN,<br />

1973).<br />

Segundo Dencker (2001): “A entrevista é uma comunicação verbal entre duas<br />

ou mais pessoas, com grau <strong>de</strong> estruturação previamente <strong>de</strong>finido, cuja finalida<strong>de</strong> é a<br />

obtenção <strong>de</strong> informações <strong>de</strong> pesquisa.” Para direcionar as entrevistas, foi formulado<br />

um roteiro (vi<strong>de</strong> anexo A).<br />

Inicialmente, foram previstas somente as entrevistas com os mochileiros, no<br />

entanto, durante estas entrevistas, constatou-se a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ouvir o que os<br />

agentes <strong>de</strong> mercado tinham a dizer sobre práticas <strong>de</strong> exploração narradas pelos<br />

backpackers. A justificativa para tal inclusão se dá pela importância <strong>de</strong> tentar<br />

<strong>de</strong>scobrir meios que po<strong>de</strong>riam dificultar a ação dos exploradores financeiros e,<br />

principalmente, para buscar possíveis justificativas para algumas práticas<br />

mencionadas pelos entrevistados. Para nortear tal entrevista, outro roteiro <strong>de</strong><br />

entrevista foi elaborado (vi<strong>de</strong> anexo B).<br />

O roteiro da entrevista foi <strong>de</strong>senvolvido a partir <strong>de</strong> grupos <strong>de</strong> análises préestabelecidos,<br />

<strong>de</strong> acordo com os pressupostos da pesquisa. Para a criação <strong>de</strong>stes<br />

grupos <strong>de</strong> análises, a autora do presente trabalho foi a campo em setembro <strong>de</strong> 2011<br />

e, ao ter vivenciado uma experiência <strong>de</strong> exploração e por ter estado em contato com<br />

outros viajantes que também tinham passado pela mesma experiência, começou<br />

então a <strong>de</strong>signar algumas variáveis básicas para análise do conteúdo adquirido com<br />

as entrevistas. Em linhas gerais, além da obtenção <strong>de</strong> dados básicos como sexo,<br />

ida<strong>de</strong>, escolarida<strong>de</strong> e renda, foram criados três grupos <strong>de</strong> análise: Pré-viagem,<br />

Viagem e Pós-viagem.<br />

No grupo <strong>de</strong> análise um, PRÉ-VIAGEM, vi<strong>de</strong> figura 4, a variável motivações<br />

busca compreen<strong>de</strong>r os fatores que levaram o viajante a escolher aquele<br />

<strong>de</strong>terminado <strong>de</strong>stino para conhecer. A variável organização da viagem foi criada<br />

para saber se houve intermediação (organizada por agências <strong>de</strong> turismo) ou se toda


45<br />

a viagem foi organizada pelo próprio viajante, esta variável também procurava<br />

enten<strong>de</strong>r quais eram os fatores relevantes e <strong>de</strong>cisivos para a escolha do viajante.<br />

A variável acompanhantes na viagem foi utilizada para saber com quantas<br />

pessoas o entrevistado viajou ou se, durante a viagem e em experiências <strong>de</strong><br />

exploração financeira estavam acompanhados, já a variável informações préembarque<br />

buscou sondar quais os meios mais utilizados pelos mochileiros e quais<br />

eram os tipos <strong>de</strong> informações mais procuradas pelos backpackers antes <strong>de</strong> viajar.<br />

Neste mesmo grupo <strong>de</strong> análise, através da variável expectativas antes do<br />

embarque, buscou-se fazer um retrospecto <strong>de</strong> quais eram as maiores expectativas<br />

dos viajantes antes <strong>de</strong> embarcar rumo ao <strong>de</strong>stino.<br />

Figura 4 - Grupo <strong>de</strong> Análise I - Pré Viagem<br />

Fonte: Elaboração própria (2012)<br />

Já no grupo <strong>de</strong> análise dois, VIAGEM, como <strong>de</strong>monstrado na figura 5, na<br />

variável infraestrutura do <strong>de</strong>stino buscou-se compreen<strong>de</strong>r as características do<br />

<strong>de</strong>stino, bem como sua preparação para receber o visitante. A variável nível <strong>de</strong><br />

informação buscou mapear se as informações obtidas anteriormente auxiliaram na<br />

viagem, bem como se na localida<strong>de</strong> tinha meios <strong>de</strong> se obter informações fi<strong>de</strong>dignas.<br />

A variável relações com a comunida<strong>de</strong> local buscou compreen<strong>de</strong>r como o<br />

viajante achava que a comunida<strong>de</strong> local o via, bem como, as relações que o viajante<br />

conseguiu estabelecer e sua percepção sobre estas relações. A quarta variável, as<br />

relações comerciais percebidas e estabelecidas, correspon<strong>de</strong> à questão central<br />

<strong>de</strong>ste trabalho. Analisando-a preten<strong>de</strong>-se compreen<strong>de</strong>r a percepção sobre a


46<br />

experiência <strong>de</strong> exploração financeira vivenciada pelo viajante.<br />

Figura 5 - Grupo <strong>de</strong> Análise II - Viagem<br />

Fonte: Elaboração própria (2012)<br />

Já o grupo <strong>de</strong> análise três, PÓS-VIAGEM, (vi<strong>de</strong> figura 6), visa compreen<strong>de</strong>r o<br />

que a experiência <strong>de</strong> exploração financeira impactou na experiência geral da<br />

viagem, através da variável alteração nas expectativas iniciais. Através da<br />

variável opinião sobre a intermediação, foi mapeado se, para os entrevistados,<br />

haveria alguma diferença em suas experiências <strong>de</strong> exploração financeira se eles<br />

estivessem viajando com a ajuda <strong>de</strong> agências <strong>de</strong> turismo. Questões como retorno e<br />

recomendação, também foram colocados em pauta. Como, um dos objetivos<br />

específicos <strong>de</strong>ste trabalho era também encontrar meios que diminuíssem a<br />

ocorrência <strong>de</strong> eventos como este, também foi perguntado o que po<strong>de</strong>ria ser feito<br />

para minimizar situações <strong>de</strong> exploração financeira, através da variável proposições<br />

<strong>de</strong> mudança.


47<br />

Figura 6 - Grupo <strong>de</strong> Análise III - Pós-Viagem<br />

Fonte: Elaboração própria (2012)<br />

A autora confiou nesta forma <strong>de</strong> divisão, pois, seria um meio <strong>de</strong> ativar no<br />

entrevistado mecanismos que o fizessem recuperar maiores <strong>de</strong>talhes da sua viagem<br />

e, principalmente, da experiência <strong>de</strong> exploração financeira vivenciada. Além <strong>de</strong><br />

conseguir maiores <strong>de</strong>talhes da experiência, foi a forma encontrada <strong>de</strong> analisar cada<br />

um dos componentes por estudos já realizados e bibliografia já existente por cada<br />

variável percebida.<br />

Assim, tornou-se a motivação principal do presente trabalho <strong>de</strong> conclusão <strong>de</strong><br />

curso investigar a percepção do viajante backpacker sobre as experiências <strong>de</strong><br />

exploração financeira em suas viagens, realizando inicialmente um profundo<br />

levantamento <strong>de</strong> referências bibliográficas nacionais e internacionais, <strong>de</strong> modo a<br />

formatar uma base teórica para o estudo, para então, por meio <strong>de</strong> pesquisas <strong>de</strong><br />

natureza qualitativa, compreen<strong>de</strong>r a percepção do mochileiro em situações <strong>de</strong><br />

exploração financeira e encontrar possíveis formas <strong>de</strong> minimizar experiências como<br />

estas.<br />

Segue abaixo os principais trechos dos entrevistados, contextualizado e<br />

divididos pela variáveis supracitadas.


48<br />

5.1 PRÉ-VIAGEM<br />

A entrevista iniciou com perguntas básicas sobre o viajante: ida<strong>de</strong>, renda,<br />

escolarida<strong>de</strong>. Todos tinham no mínimo o ensino superior completo e renda familiar<br />

superior mínima <strong>de</strong> seis salários mínimos. Todos, exceto um dos entrevistados,<br />

falaram sobre suas experiências em <strong>de</strong>stinos situados em países em<br />

<strong>de</strong>senvolvimento 30 como: Laos, Tailândia, China, Camboja, Bostwana, Índia, Nepal,<br />

Namíbia, Argentina, Brasil, Israel, Malásia, Jordânia, Marrocos, Egito e Peru 31 .<br />

A maioria dos entrevistados organizou sua própria viagem, com exceção <strong>de</strong><br />

um <strong>de</strong>les, que em dois dos seus <strong>de</strong>stinos em um mochilão que realizou em 2012,<br />

resolveu optar pela utilização dos serviços <strong>de</strong> uma agência <strong>de</strong> receptivo:<br />

Eu sempre organizo minhas viagens, mas, como já tinha ouvido falar que as<br />

coisas não estavam muito boas no meu próximo <strong>de</strong>stino, [Israel],<br />

principalmente pelos problemas na Faixa <strong>de</strong> Gaza, resolvi contar com os<br />

serviços <strong>de</strong> uma agência <strong>de</strong> receptivo local (...). Chegando lá, resolvi fechar<br />

Egito também, porque já tinha ouvido outros backpackers falando que a<br />

exploração “rolava solto” lá (...). Resolvi abrir mão da minha liberda<strong>de</strong> em<br />

nome da minha segurança.<br />

Os entrevistados que escolheram organizar sua própria viagem apontaram<br />

como principal motivação para escolha <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> organização a flexibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

horários, liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> percurso e a tentativa <strong>de</strong> ter os custos reduzidos:<br />

Escolhi planejar minha viagem principalmente porque tínhamos um<br />

orçamento reduzido. Apesar <strong>de</strong> ser mais trabalhoso, temos o “po<strong>de</strong>r” em<br />

nossas mãos. Decidimos on<strong>de</strong> realmente queremos ir e não precisamos<br />

acordar na hora que o guia me diz pra acordar... Meu horário sou eu que<br />

faço e não há nada melhor do que isso!<br />

30 Kofi Annan, antigo Secretário-Geral das Nações Unidas, <strong>de</strong>finiu que "um país <strong>de</strong>senvolvido é<br />

aquele que permite que todos os cidadãos <strong>de</strong>sfrutem <strong>de</strong> uma vida livre e saudável em um ambiente<br />

seguro." No entanto, <strong>de</strong> acordo com a Divisão Estatística das Nações Unidas, não há nenhuma<br />

convenção estabelecida para a <strong>de</strong>signação <strong>de</strong> países ou áreas "<strong>de</strong>senvolvidas" e/ou "em<br />

<strong>de</strong>senvolvimento" no sistema das Nações Unidas. Disponível em<br />

http://unstats.un.org/unsd/methods/m49/m49regin.htm#ftnc. (acesso em 26 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 2012).<br />

31 É importante frisar que, nove dos entrevistados fizeram viagens multi-<strong>de</strong>stinos e dois <strong>de</strong>les, fizeram<br />

uma viagem <strong>de</strong> “volta ao mundo”.


49<br />

É interessante ressaltar que para muitos dos backpackers que falam em<br />

“orçamento reduzido” não quer dizer, necessariamente, que planejam uma “viagem<br />

econômica”. Quando questionados sobre o orçamento da viagem, os mochileiros<br />

entrevistados afirmaram que a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> economizar existia durante o<br />

planejamento para po<strong>de</strong>rem ampliar o tempo e o itinerário das suas viagens.<br />

Todos os entrevistados concordaram que organizar uma viagem por conta<br />

própria, sem itinerário <strong>de</strong>finido antes <strong>de</strong> sair do país <strong>de</strong> origem, era uma opção mais<br />

cara e por isso que suas escolhas durante as viagens eram pautadas na economia.<br />

No entanto, quando sobravam recursos, os mesmo não hesitavam em escolher<br />

opções mais confortáveis e/ou mais caras:<br />

É meio que uma regra <strong>de</strong> todos os mochileiros economizar até o último<br />

centavo durante a viagem para quando chegar no final ainda ter uma grana<br />

reserva para fazer coisas mais caras, mas que são oportunida<strong>de</strong>s únicas.<br />

Foi assim que fiz meu bungee jump na África do Sul, que é consi<strong>de</strong>rado o<br />

maior do mundo (...) Valeu cada centavo que economizei durante toda a<br />

viagem e cada ran<strong>de</strong> 32 que gastei por lá (...).<br />

Depois <strong>de</strong> todo o stress no Marrocos resolvi tirar dois dias <strong>de</strong> folga em<br />

Roma. A gente tinha uma escala por lá e resolvemos esten<strong>de</strong>r as 12 horas<br />

por lá para dois dias para comer bastante pizza e gellato (...). Não estava<br />

nos nossos planos, mas, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> tanta coisa ruim, nos <strong>de</strong>mos ao luxo <strong>de</strong><br />

voltar a Europa (...)...<br />

Para Aoqui (2005), os backpackers geralmente costumam viajar sozinhos ou<br />

em pequenos grupos. Quando optam em ir acompanhados, geralmente <strong>de</strong>ci<strong>de</strong>m<br />

viajar com pessoas que possuem afinida<strong>de</strong> ou, quando embarcam sozinhos,<br />

encontram com outros viajantes com as mesmas aspirações. Este apontamento<br />

apareceu claramente nas entrevistas. Doze dos entrevistados viajaram com amigos<br />

ou familiares e outros dois viajaram sozinhos, estabelecendo este tipo <strong>de</strong> interação,<br />

o encontro com outros mochileiros:<br />

(...) é quase que uma rotina na nossa vida: sair sozinho, só com a mochila<br />

nas costas e tombar com outros iguais a gente [vi<strong>de</strong> figura 7] (...). É uma<br />

oportunida<strong>de</strong> única, sabe? Apren<strong>de</strong>mos muito mais quando nos permitimos<br />

sair da “zona <strong>de</strong> conforto da nossa língua”, <strong>de</strong> pessoas que conhecem<br />

nossas manias (...). Quando vamos pra estrada sozinhos apren<strong>de</strong>mos mais.<br />

32 Moeda da África do Sul.


50<br />

Figura 7 - Encontro entre Backpackers - Pequim - China<br />

Fonte: Arquivo pessoal do entrevistado (2011)<br />

Para Barreto (2004), “não havendo verda<strong>de</strong>iros contatos, não há intercâmbio<br />

cultural, mas reforço <strong>de</strong> preconceitos”, e, contatos verda<strong>de</strong>iros com “o outro” parece<br />

não ser um problema para um viajante backpacker. Quando os entrevistados foram<br />

questionados sobre a principal motivação para a escolha <strong>de</strong> seus <strong>de</strong>stinos, todos,<br />

sem exceção, citaram pelo menos uma vez estas duas palavras-chave: conhecer<br />

pessoas e ampliar os horizontes:<br />

O que mais me fascina quando <strong>de</strong>cido fazer uma nova viagem são as<br />

experiências incomuns que eu po<strong>de</strong>ria viver naquele <strong>de</strong>stino (...). O que me<br />

fez escolher a China foi exatamente isso: “bater <strong>de</strong> frente” com o novo,<br />

encontrar pessoas, mudar meus conceitos (...), construir meus caminhos.<br />

Moshin e Ryan (2003) exploram as principais motivações do backpacker <strong>de</strong><br />

duas formas: são analisadas em relação aos “fatores <strong>de</strong> pressão” (push factors), ou<br />

seja, em referência as necessida<strong>de</strong>s pessoais <strong>de</strong> viajar, e em relação aos “fatores<br />

que atraem” (pull factors), os quais representam as atrações locais. Em se tratando<br />

das motivações pessoais, para os autores, verificou-se o seguinte ranking <strong>de</strong>


51<br />

importância:<br />

• Aumentar os conhecimentos sobre o mundo;<br />

• Fazer novos amigos;<br />

• Preferência pelo estilo <strong>de</strong> vida <strong>de</strong> viajante;<br />

• Autoteste;<br />

• Conselho <strong>de</strong> amigos e parentes;<br />

• Um longo <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> visitar especificamente o território;<br />

• Confusão sobre planos futuros;<br />

• Finalizar os comprometimentos com os estudos;<br />

• Finalizar os comprometimentos com o trabalho;<br />

• Adiar compromissos presentes;<br />

• Busca por emprego;<br />

• Busca pelo parceiro i<strong>de</strong>al.<br />

Ainda <strong>de</strong> acordo com Moshin e Ryan (2003), a motivação para viajar varia<br />

conforme a situação que gerou a <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> viagem. Para os autores, distinguem-se<br />

entre si os backpackers proativos, ou seja, aqueles que criam a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

viagem (por exemplo, ao <strong>de</strong>ixar seu emprego, estudos) dos reativos, quando a<br />

oportunida<strong>de</strong> para viajar acontece sem sua intervenção (como ao terminar os<br />

estudos ou tirar férias do trabalho). Em ambos os casos, o <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> viajar é latente,<br />

mas é natural que, no primeiro caso, o <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> viajar seja mais forte do que no<br />

segundo exemplo. Isso faz com que haja dois tipos <strong>de</strong> mochileiros: os que viajam<br />

como um “rito <strong>de</strong> passagem” entre estágios diferentes da vida e os que tiram férias<br />

do emprego e que simplesmente utilizam as acomodações econômicas e os<br />

mesmos padrões <strong>de</strong> transporte dos anteriores.<br />

Tais possíveis motivações também estiveram presentes no discurso dos<br />

viajantes durante as entrevistas. Para alguns <strong>de</strong>les, “mochilar 33 ” foi uma forma<br />

encontrada <strong>de</strong> amadurecer; uma espécie <strong>de</strong> “rito <strong>de</strong> passagem”, on<strong>de</strong> a or<strong>de</strong>m é<br />

lidar com os <strong>de</strong>safios e contar com a “sorte”:<br />

33 Neologismo criado com um intuito <strong>de</strong> se referir ao ato <strong>de</strong> praticar/fazer um mochilão.


52<br />

Foi muito “louco” quando <strong>de</strong>cidi fazer uma volta ao mundo (...) Tinha<br />

emprego garantido, tava cursando minha pós, tinha meu carro, “apê”(...)<br />

Mas sentia que não era bem aquilo, que “tava” faltando alguma coisa” (...)<br />

Resolvi ven<strong>de</strong>r meu carro e ir. Queria “tombar” com as pessoas <strong>de</strong> lá,<br />

apren<strong>de</strong>r outros idiomas, queria ver o mundo, “cara”! (...) Voltar não era<br />

minha preocupação. Eu só queria ir! Só sabia que ia chegar por Lisboa, e o<br />

<strong>de</strong>pois viria... E sabe? Veio da melhor forma possível (...). Aprendi muito<br />

com as diferenças, a comida (...) Vi a beleza no caos todos os dias (...)<br />

Voltei uma outra pessoa! Posso dizer que existe um “eu-antes” e um “eu<strong>de</strong>pois”<br />

<strong>de</strong>sta viagem.<br />

Assim como Moshin e Ryan (2003) também elucidam em suas pesquisas, nas<br />

entrevistas o fator motivador “busca pelo parceiro i<strong>de</strong>al” também surgiu como<br />

consequência <strong>de</strong> viagens como estas:<br />

(...) quando começamos, éramos quatro casais, dois amigos que vieram<br />

juntos, um homem que viajava sozinho, oito mulheres por conta própria e os<br />

três homens da equipe. Com tantas noites em torno da fogueira e uma ou<br />

outra em algum bar dos campings em que passamos, a essa altura já havia<br />

três novos casais... Cupido andava solto naqueles dias!<br />

Quando foram questionados sobre a obtenção ou não <strong>de</strong> informações no préembarque,<br />

foi consensual que, quando o <strong>de</strong>stino era <strong>de</strong>sconhecido, a busca <strong>de</strong><br />

informações prévias sobre o <strong>de</strong>stino aconteceu. Em relação aos tipos <strong>de</strong> fontes <strong>de</strong><br />

informação utilizadas por viajantes, Gitelson e Crompton (1983) <strong>de</strong>senvolveram<br />

cinco categorias para cobrir todas as fontes consultadas pelos diferentes tipos <strong>de</strong><br />

viajantes: amigos e parentes, literatura específica sobre o <strong>de</strong>stino, consultores <strong>de</strong><br />

viagem, mídia impressa e <strong>de</strong> imagem.<br />

Os principais meios citados pelos entrevistados foram amigos e parentes,<br />

guias turísticos especializados como Lonely Planet 34 e a Internet, especialmente<br />

blogs <strong>de</strong> viajantes como o “Trip Advisor” 35 e “mochileiros.com 36 ”. Muitos citaram que<br />

a busca por saber mais sobre a cultura local e procurar por experiências <strong>de</strong> outros<br />

viajantes seriam procedimentos indispensáveis para um viajante que se propõe<br />

conhecer em profundida<strong>de</strong> um <strong>de</strong>stino:<br />

34 A Lonely Planet é uma das maiores editoras <strong>de</strong> guias <strong>de</strong> viagem do mundo. Foi esta editora que<br />

publicou o Let's Go Travel Gui<strong>de</strong>s, que foi a primeira série <strong>de</strong> livros <strong>de</strong> viagem <strong>de</strong>stinados a<br />

mochileiros e outros viajantes procurando gastar pouco.<br />

35 Disponível em: http://www.tripadvisor.com.br (acesso em 27 <strong>de</strong> abril, 2012)<br />

36 Disponível em: http://mochileiros.com (acesso em 27 <strong>de</strong> abril, 2012)


53<br />

(...) buscar informação é um <strong>de</strong>ver da gente e isso é uma característica bem<br />

forte do viajante in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte. Ajuda muito enten<strong>de</strong>r a região que queremos<br />

visitar (...). Ouvir quem já foi também é legal. Vários conhecidos me<br />

ajudaram com dicas (...). Também usei muito a internet (...). O guia Lonely<br />

Planet [vi<strong>de</strong> figura 8] me salvou muitas vezes (...). Muita informação que<br />

soube foi uma “mão na roda” em muitas situações na minha viagem.<br />

Figura 8 - “Kit <strong>de</strong> Sobrevivência” do Backpacker - Guias Turísticos especializados<br />

Fonte: Arquivo pessoal do entrevistado (2008)<br />

Em relação ao quesito expectativa dos viajantes com os seus <strong>de</strong>stinos, todos<br />

apresentaram expectativas muito altas. Zeithaml, Berry e Parasuraman (1993:92),<br />

verificam que as expectativas têm várias formas: “há expectativas como<br />

prognósticos, expectativas como i<strong>de</strong>ais, expectativas baseadas em experiências,<br />

expectativas com tolerâncias mínimas, expectativas <strong>de</strong> merecimento, expectativas<br />

comparativas”, <strong>de</strong>ntre outras.<br />

Baseado nesses tipos <strong>de</strong> expectativas, esses autores concluíram que os<br />

consumidores avaliam o <strong>de</strong>sempenho <strong>de</strong> serviços utilizando dois padrões: o nível <strong>de</strong><br />

serviço <strong>de</strong>sejado por eles, que po<strong>de</strong>ria ser chamado <strong>de</strong> serviço máximo aceitável e o<br />

nível <strong>de</strong> serviço a<strong>de</strong>quado, que po<strong>de</strong>ria ser chamado <strong>de</strong> serviço mínimo aceitável.<br />

Entre esses dois níveis, verifica-se a presença <strong>de</strong> uma “zona <strong>de</strong> tolerância”,<br />

que não é perfeita, mas aceitável em <strong>de</strong>terminadas circunstâncias. Essa zona <strong>de</strong><br />

tolerância é variável entre consumidores e flutuante <strong>de</strong> acordo com as compras dos


54<br />

consumidores. Como, geralmente, este tipo <strong>de</strong> viajante tem inúmeras experiências,<br />

e, também dotados <strong>de</strong> expectativas muito altas, <strong>de</strong>sgostos e comparações parecem<br />

inevitáveis:<br />

Quando escolhi conhecer o Marrocos esperava encontrar um lugar com<br />

gran<strong>de</strong> diferença cultural e belas paisagens (...). Tinha isso tudo, tinha, mas<br />

a experiência foi completamente diferente que imaginava. Era um ambiente<br />

hostil, sujo, não havia beleza naquele caos (...). Também tive uma<br />

experiência como esta no Nepal, que mesmo não sendo boa também, nem<br />

se compara ao Marrocos (...). com poucos turistas e muita gente que vive<br />

do turismo por lá, dá-lhe molestação dos “caça-clientes nas ruas”. Mas,<br />

diferente do Marrocos, dá pra levar o assédio numa boa.<br />

Ficou bem claro nas entrevistas que, quando o viajante entrevistado era mais<br />

experiente em viajar, as expectativas eram bem menores ou, simplesmente, não<br />

existiam:<br />

Essa é uma pergunta que sempre me fazem quando eu <strong>de</strong>cido fazer mais<br />

uma viagem “maluca”, aos olhos dos outros (...). Tenho trinta e dois anos,<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> os quinze aprendi a viajar e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então, não parei mais. Aprendi<br />

uma coisa muito importante durante esses anos <strong>de</strong> estrada: quem cria<br />

expectativa não se surpreen<strong>de</strong>, por isso nem penso nelas, por mais que<br />

minha mente planeje, e maquine tudo o tempo, eu tento cortar ao máximo<br />

cada uma <strong>de</strong>las (...) elas não po<strong>de</strong>m prevalecer sobre meu resultado final.<br />

5.2 VIAGEM<br />

Para Aoqui (2005), o segmento backpacker organiza seus roteiros <strong>de</strong> forma<br />

mais flexível (muitas vezes em itinerários com <strong>de</strong>stinos múltiplos) e são abertos a<br />

novas experiências, como <strong>de</strong>sbravar regiões menos turísticas. Confirmando a<br />

<strong>de</strong>finição do autor supracitado, a maioria das experiências abordadas pelos<br />

entrevistados aconteceram em rotas “menos turísticas” e em países em<br />

<strong>de</strong>senvolvimento. Geralmente, países como estes não possuem nem ao menos<br />

estrutura básica satisfatória para seus moradores, como água, luz, saneamento<br />

básico e internet, quanto mais uma estrutura turística bem planejada.<br />

Como um dos pressupostos apontava que um dos fatores prepon<strong>de</strong>rantes<br />

para uma maior incidência <strong>de</strong> experiências <strong>de</strong> exploração era a ausência <strong>de</strong> uma<br />

estrutura turística bem organizada, - que <strong>de</strong> certa forma ocasionariam ausência <strong>de</strong>


55<br />

uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> informações - quesitos como a existência <strong>de</strong> sinalização turística,<br />

centro <strong>de</strong> informações ao visitante, agências <strong>de</strong> receptivo e fornecimento <strong>de</strong> mapas<br />

e guias turísticos foram avaliados pelos entrevistados.<br />

Sem nenhuma exceção, todos os entrevistados indicaram que não havia<br />

sinalização turística, centro <strong>de</strong> informações turísticas na localida<strong>de</strong> e muito menos o<br />

fornecimento <strong>de</strong> mapas e guias com informações e que, exatamente por isso “as<br />

pessoas que trabalham com o turismo tentavam se aproveitar <strong>de</strong>les 37 ”:<br />

(...) a Medina é enorme [vi<strong>de</strong> figura 9]. Se você imagina que com um bom<br />

mapa e um GPS não irá se per<strong>de</strong>r é porque ainda não esteve lá (risos).<br />

Imagine infinitas ruelas e becos escuros e milhares atrações escondidas e<br />

sem praticamente nenhuma sinalização que possa te ajudar Quem não<br />

recorre aos inúmeros “guias” fantasiados <strong>de</strong> “amigos” você não consegue<br />

voltar pro albergue.<br />

Figura 9 - Medina - Marrakesh - Marrocos<br />

Fonte: Arquivo pessoal do entrevistado (2011)<br />

As entrevistas também apontaram que gran<strong>de</strong> parte dos viajantes utilizava<br />

guias turísticos adquiridos antes <strong>de</strong> chegar ao <strong>de</strong>stino e a ajuda <strong>de</strong> outros<br />

mochileiros para chegar aos pontos <strong>de</strong> interesse turístico. Também elucidaram a<br />

37 Trecho da entrevista.


56<br />

existência <strong>de</strong> agências <strong>de</strong> receptivo por toda a parte, até mesmo <strong>de</strong>ntro dos<br />

albergues que se hospedavam, e a presença massiva <strong>de</strong> “falsos guias” nas ruas<br />

oferecendo serviços <strong>de</strong> guiamento:<br />

(...) foi muito complicado achar placas com informações dos pontos<br />

turísticos. “Sobrevivemos” por lá porque tínhamos comprado um guia antes<br />

<strong>de</strong> sair do Brasil, e vou te dizer que, mesmo com ele foi difícil <strong>de</strong>mais<br />

chegar nos lugares que queríamos. Quando precisávamos <strong>de</strong> ajuda,<br />

geralmente, recorríamos ao pessoal do hostel que a gente “tava” ou até<br />

mesmo, com outros mochileiros.<br />

Apesar <strong>de</strong> estarmos muito bem localizados, era difícil <strong>de</strong>mais achar alguns<br />

pontos que queríamos conhecer (...). tivemos que contratar o serviço <strong>de</strong><br />

uma agência <strong>de</strong> receptivo lá do albergue que estávamos. Não que fosse<br />

difícil encontrar outras opções. Era só cruzar a rua que vinha 20 ao seu<br />

redor com fol<strong>de</strong>rs em inglês, francês, espanhol, alemão tentando te levar<br />

até o céu se você pagasse.<br />

Quando foram questionados se as informações obtidas previamente ajudaram<br />

em alguma situação na viagem, alguns <strong>de</strong>les notificaram, principalmente, situações<br />

pertinentes a questões culturais e idiomáticas.<br />

Saber falar um “não”, “sim”, “obrigada”, “quanto custa” foi essencial em<br />

muitos momentos (...). Saber sobre os costumes da Índia me ajudou muito<br />

(...). Não me assustei com o trânsito caótico por conta das inúmeras vacas<br />

que cismavam em <strong>de</strong>itar no meio da rua (...). Outra boa também foi saber<br />

que por lá a mão esquerda é consi<strong>de</strong>rada impura porque é utilizada para a<br />

higiene pessoal, essa foi a mais difícil, sou canhoto, poxa! (risos).<br />

No entanto, mesmo sem ter perguntado se as informações obtidas<br />

anteriormente ajudaram em alguma situação que envolvia a ação dos exploradores<br />

financeiros, as mesmas surgiram com naturalida<strong>de</strong>:<br />

(...) “Tava procurando informação sobre a China na internet e lá no<br />

“tripadvisor” vi um <strong>de</strong>poimento <strong>de</strong> um mochileiro que tinha sido passado pra<br />

trás em um golpe muito comum em Pequim: “tipo”, você tá andando e, do<br />

nada, chegam jovens bem apessoados e perguntam <strong>de</strong> on<strong>de</strong> você é, falam<br />

que querem treinar o inglês, e aí, te convidam para um “ritual bem<br />

tradicional <strong>de</strong>les” [fazendo aspas com as mãos], a tal da cerimônia do chá.<br />

Você, todo ingênuo, vai e, acaba “bancando” tudo, porque eles foram ao<br />

banheiro, ou foram aten<strong>de</strong>r uma ligação e, nunca mais voltaram! Quando<br />

uma situação parecida aconteceu comigo por lá, automaticamente me<br />

lembrei do <strong>de</strong>poimento e não cai na <strong>de</strong>les (...). somos presas muito fáceis,<br />

já que queremos a todo instante conhecer pessoas novas.


57<br />

Smith (apud Barreto, 2004) aborda em seus estudos que, o tipo <strong>de</strong> contato<br />

com a comunida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> do tipo <strong>de</strong> turistas que estabelecem essas relações.<br />

Aqueles chamados pela autora <strong>de</strong> “turistas <strong>de</strong> elite” ou “alternativos” (neste caso,<br />

po<strong>de</strong>mos incluir os backpackers), gostam <strong>de</strong> abrir seus próprios caminhos para<br />

conhecerem melhor a comunida<strong>de</strong> que se propuseram a visitar, já os “turistas <strong>de</strong><br />

massa” que viajam <strong>de</strong>ntro da sua “bolha turística” 38 não têm oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

apren<strong>de</strong>r muito sobre a vida e hábitos da localida<strong>de</strong> visitada.<br />

Todos os entrevistados apontaram como principal motivação da viagem a<br />

interação com pessoas e costumes diferentes. Para Carvalho (2009) os backpackers<br />

valorizam a troca <strong>de</strong> experiências com a comunida<strong>de</strong> local e com outros viajantes, e<br />

isso gera um maior entendimento, conscientização e respeito aos hábitos e culturas:<br />

Em nossas andanças pelo Egito, fizemos amiza<strong>de</strong> com Mohamed (...).<br />

Sempre sorri<strong>de</strong>nte, nos levou pra um passeio <strong>de</strong> tuc-tuc pelas terras da sua<br />

família. Lá rolava um churrasquinho com chá [vi<strong>de</strong> figura 10], bebida muito<br />

tradicional entre eles, seria como a cerveja pro brasileiro(...) Era sexta-feira,<br />

dia <strong>de</strong> folga, é, não! Não é no mundo inteiro que os finais <strong>de</strong> semana são<br />

aos sábados e domingos! (...) O visual é bonito, mas sendo bem sincero,<br />

não chega a ser especialmente marcante. O que surpreen<strong>de</strong> é que aquilo<br />

exista no meio do Saara, as pessoas e todo aquele ritual (...).<br />

Figura 10 - Churrasquinho com Chá - Deserto do Saara<br />

Fonte: Arquivo pessoal do entrevistado (2011)<br />

38 Metáfora usada pela autora (Smith apud Barreto, 2004) para <strong>de</strong>finir o pacote turístico com tudo<br />

estruturado.


58<br />

Para os entrevistados, a escolha <strong>de</strong> ter contato com a comunida<strong>de</strong> local - em<br />

muitos aspectos - é uma experiência única, mas não é sinônimo <strong>de</strong> conforto e<br />

segurança, fato este já elucidado por Boorstin (apud Araújo, 2005), que uma “viagem<br />

autêntica” traz consigo o real significado da palavra travel (problema, trabalho e<br />

tormenta).<br />

Várias experiências ditas como “únicas” e “inesquecíveis” foram experiências<br />

que envolveram riscos <strong>de</strong> vida, como a presença <strong>de</strong> animais peçonhentos em<br />

acampamentos <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma tribo africana ou ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> aventura extrema<br />

(bungee jump, vôo livre, queda livre), banheiros ao céu aberto [vi<strong>de</strong> figura 11] e<br />

comida escassa. Para os entrevistados, “é um preço que se paga”:<br />

Como era um acampamento selvagem, não havia cerca que nos separasse<br />

dos animais. Ouvíamos os hipopótamos, que po<strong>de</strong>m ser mais perigosos do<br />

que qualquer outro animal África quando ameaçados e durante a noite<br />

vimos os rastros das black mambas, cobras super venenosas <strong>de</strong> lá<br />

[Bostswana] (...). Um pouco assustador ir ao “banheiro” [vi<strong>de</strong> figura 11]<br />

sozinho pela noite (...).<br />

Figura 11 - Banheiro em acampamento selvagem em Botswana<br />

Fonte: Arquivo pessoal do entrevistado (2011)


59<br />

Depois das narrações obtidas sobre as experiências dos viajantes com a<br />

comunida<strong>de</strong> local, a entrevista direcionou-se para as relações percebidas entre os<br />

viajantes e o mercado. O pressuposto <strong>de</strong> que as experiências <strong>de</strong> exploração seriam<br />

mais frequentes quando houvesse a presença do mercado informal foi confirmada<br />

durante as entrevistas. Os entrevistados alegaram que as ações dos ambulantes<br />

eram “invasivas” e que, a presença <strong>de</strong>les gerava muito incômodo nas experiências<br />

com a localida<strong>de</strong>:<br />

Nas pirâmi<strong>de</strong>s [vi<strong>de</strong> figura 12], em qualquer lugar que parávamos, vinham<br />

50 milhões <strong>de</strong> camelôs querendo nos ven<strong>de</strong>r bugigangas, sempre tudo por<br />

"one dollar". Se a gente quisesse tirar foto com eles, vestidos tipicamente,<br />

era "one dollar", pra ir ao banheiro que não tinha papel higiênico, sem<br />

<strong>de</strong>scarga e tudo sujo foi cobrado “one dollar” Se você pensasse em olhar <strong>de</strong><br />

longe o que eles tinham pra ven<strong>de</strong>r, já era! Eles tentavam negociar a<br />

qualquer preço. Juntavam cinco a sua volta, com cordão, marcador <strong>de</strong><br />

páginas, canetas (...). Chega ao cúmulo <strong>de</strong>les apren<strong>de</strong>rem algumas<br />

palavras-chave para conversar com a gente e po<strong>de</strong>r negociar o preço ou até<br />

mesmo dizendo que é um “regalo” só para você pegar.<br />

Figura 12 - Turistas/Viajantes e Mercado Informal nas principais Pirâmi<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Gizé - Egito<br />

Fonte: Arquivo pessoal do entrevistado (2012)<br />

Os entrevistados também apontaram a presença dos mercados abertos como


60<br />

uma opção mais organizada e segura para as compras, já que eles se aproximavam<br />

quando queriam e, principalmente, porque tinha preço nas mercadorias:<br />

A presença do mercado informal no Tibet era em todo o canto, cheios <strong>de</strong><br />

“lábia” pra cima da gente. A presença <strong>de</strong>les <strong>de</strong>ixava o local sujo, bagunçado<br />

(...). Tinha também aqueles mercadões [vi<strong>de</strong> figura 13] que até eram<br />

“organizados na sua <strong>de</strong>sorganização”. Me sentia mais segura em comprar lá<br />

porque tinha preços nas coisas (...).<br />

Figura 13 - Mercados/Feiras organizadas - Tibet - China<br />

Fonte: Arquivo pessoal do entrevistado (2011)<br />

Quando os entrevistados foram indagados sobre o que eles sentiram no<br />

momento em que foram explorados financeiramente, os mesmos utilizaram adjetivos<br />

como “raiva”, “medo”, “insatisfação”, “frustração”, “<strong>de</strong>sconforto”, “aborrecimento”,<br />

“revolta” e “indignação” para expressar o ocorrido. Ao serem indagados sobre a<br />

experiência <strong>de</strong> exploração e o que ela causou, simplesmente falavam adjetivos<br />

soltos e nada mais; não conseguiam articular o pensamento já que causava muito<br />

<strong>de</strong>sconforto para os entrevistados relembrar situações <strong>de</strong> stress como estas. No<br />

entanto, foi possível perceber que, quando os mesmo já tinham ouvido falar que<br />

situações como estas po<strong>de</strong>riam ocorrer, os “sentimentos” foram amenizados e não


61<br />

foi atribuída muita importância ao ocorrido:<br />

Como eu já tinha uma expectativa <strong>de</strong> que isso po<strong>de</strong>ria acontecer, o<br />

sentimento não foi tão forte, foi algo esperado. Como não tinha opção,<br />

simplesmente aceitei, afinal, quem não precisa <strong>de</strong> água? E on<strong>de</strong> eu<br />

conseguiria outro lugar [vi<strong>de</strong> figura 14] para matar minha se<strong>de</strong> subindo o<br />

Monte Sinai, umas três horas da manhã? Tive que pagar o equivalente a<br />

<strong>de</strong>z dólares pela garrafa. Não po<strong>de</strong>ria passar se<strong>de</strong>!<br />

Figura 14 - Parada para compra <strong>de</strong> suprimentos na subida do Monte Sinai - Israel<br />

Fonte: Arquivo pessoal do entrevistado (2011)<br />

Além <strong>de</strong> falarem mais sobre o ocorrido, teceram algumas conclusões sobre as<br />

conseqüências para o <strong>de</strong>stino:<br />

Tinham me alertado exatamente sobre isso, que os comerciantes se<br />

aproveitam das nossas necessida<strong>de</strong>s básicas (...). O que eles não<br />

percebem é que isso gera uma imagem negativa do lugar. Sempre que me<br />

lembrar <strong>de</strong> lá, me virá na mente o que aconteceu não só comigo, mas com<br />

todo o grupo que estava por lá.<br />

O mercado informal como um dos principais meios dos viajantes serem<br />

explorados em suas experiências <strong>de</strong> viagens surgiu com muita freqüência nas<br />

entrevistas, no entanto, muitas foram as situações narradas pelos entrevistados


62<br />

envolvendo o mercado formal como fontes <strong>de</strong> exploração. Oito dos entrevistados<br />

apontaram como meio <strong>de</strong> exploração os guias <strong>de</strong> turismo, informais e formais. Os<br />

mesmos citaram que, muitas vezes recorriam ao serviço <strong>de</strong>les porque “era difícil<br />

encontrar alguns lugares por conta própria”. Eles citaram como um meio <strong>de</strong><br />

exploração a técnica muito comum no tra<strong>de</strong> <strong>de</strong> “parada para compras”, que induz ao<br />

consumo e nem sempre representam o melhor lugar, principalmente no quesito<br />

“preço”.<br />

Práticas como “gorjetas obrigatórias” também surgiram em três entrevistas.<br />

Quatro <strong>de</strong>les também teceram comentários a respeito do comissionamento dos<br />

guias por <strong>de</strong>terminadas lojas:<br />

Mas o que mais me assustou, é que fomos muito explorados em Buenos<br />

Aires pelos guias (...). eles davam a enten<strong>de</strong>r que ajudariam mais se a gente<br />

<strong>de</strong>sse gorjeta pra eles (...). Eles diziam que iam nos levar nos lugares mais<br />

baratos <strong>de</strong> lá pra gente fazer compras, mas, sei lá, sentia que tinha alguma<br />

coisa <strong>de</strong> errado porque o preço tava muito parecido com o do Brasil e nossa<br />

moeda é muito mais forte que a <strong>de</strong>les(...). Percebemos também que,<br />

sempre que a gente saía <strong>de</strong> alguma loja, eles <strong>de</strong>moravam muito pra entrar<br />

na van <strong>de</strong> novo e, aí, começamos a ficar <strong>de</strong> olho neles (...). Percebemos<br />

que nas últimas lojas que eles passavam no caixa antes <strong>de</strong> ir, ou, sempre<br />

ganhavam presentes quando a gente comprava alguma coisa (...)<br />

Após situações como estas narradas pelos backpackers¸ um agente <strong>de</strong><br />

viagens e guia <strong>de</strong> turismo especializado no segmento backpacker no estado do Rio<br />

<strong>de</strong> Janeiro também foi entrevistado. Ao ser indagado sobre uma prática bastante<br />

citada nas entrevistas, “o comissionamento dos guias”, o entrevistado apresentou a<br />

seguinte resposta:<br />

Isso realmente existe, são as relações <strong>de</strong> mercado, como em diversos<br />

outros segmentos no turismo, existe essa relação forte <strong>de</strong> comissionamento<br />

no nosso ramo. Quando você ven<strong>de</strong> um produto existe uma coisa que a<br />

gente até brinca: “quem é o dono do gringo?” Ah, é o Copacabana Palace?<br />

Então “o Copa” vai assumir o risco <strong>de</strong> oferecer aquele turista para fazer um<br />

passeio com você, mas, se ele não gostar do passeio, ele vai reclamar lá no<br />

hotel, porque é lá que ele tá comprando. Então, se ele compra no hotel e o<br />

hotel assume riscos, faz todo o sentido ele ganhar comissionamento, porque<br />

ele tá tendo o trabalho <strong>de</strong> fazer essa ligação (...). Se o turista compra<br />

comigo direto, o turista tá assumindo esse risco (...). Da mesma forma<br />

acontece se eu levar ele numa loja <strong>de</strong> sorvetes e tem uma do lado da outra,<br />

porque eu levaria naquela que o dono nem me dá um sorvete <strong>de</strong> graça? (...)<br />

Não sei se isto <strong>de</strong>ve ser visto como uma prática certa ou errada, bonita ou<br />

feia, foi somente uma forma que a outra loja encontrou <strong>de</strong> atrair mais<br />

turistas pra sua loja (...).


63<br />

Ainda complementa:<br />

O que acontece também, seguindo a lógica do mercado, é que, o outro que<br />

nem pensava em me dar um sorvete <strong>de</strong> graça, vendo que o do lado me<br />

dava, resolveu então me dar uma caixa <strong>de</strong> sorvete. (...). Aí que <strong>de</strong>ve entrar<br />

a ética do profissional. De on<strong>de</strong> vai sair o dinheiro da minha caixa <strong>de</strong><br />

sorvete? Do bolso do turista? Isso é um ciclo vicioso (...). O profissional<br />

<strong>de</strong>ve buscar oferecer a melhor opção para seu cliente, tentando não encher<br />

os olhos com as possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ganhos que ele terá nas transações.<br />

Doze dos quatorze entrevistados apontaram os taxistas como fonte <strong>de</strong><br />

exploração financeira, seja por práticas <strong>de</strong> não utilização do taxímetro, cobrança <strong>de</strong><br />

taxas extras abusivas para bagagens, preços fixos e, principalmente, pela<br />

<strong>de</strong>sonestida<strong>de</strong> <strong>de</strong> combinar um preço na origem e cobrar mais no <strong>de</strong>stino final:<br />

Mas o mais chato da viagem foram os taxistas, que exploraram “legal” a<br />

gente. Sem a gente perceber, um taxista fez uma corrida sem taxímetro e só<br />

<strong>de</strong>u o preço pra gente quando chegamos ao nosso <strong>de</strong>stino final (...) Ele se<br />

aproveitou que estava <strong>de</strong> madrugada e que não tínhamos outra forma <strong>de</strong><br />

chegar com segurança no albergue em Cuzco (...). Pagamos o equivalente<br />

a cinco vezes mais.<br />

Ainda à respeito as praticas apontadas pelos entrevistados em relação aos<br />

taxistas, foi notificado por dois entrevistados a cobrança <strong>de</strong> taxas e valores<br />

diferentes <strong>de</strong> acordo com a nacionalida<strong>de</strong> do passageiro:<br />

Nossa última parada do mochilão pela América do Sul foi no Rio (...) Me<br />

lembro que minha amiga européia fez sinal pro taxista e, com o péssimo<br />

português <strong>de</strong>la, perguntou uma média <strong>de</strong> preço <strong>de</strong> uma corrida <strong>de</strong> Ipanema<br />

até Copacabana. O “malandro” do taxista queria cobrar oitenta reais. Não<br />

acreditei! Parei <strong>de</strong> tirar foto, me aproximei e, imitando o sotaque do Rio<br />

perguntei ''e para quem é morador, meu irmão?". Senti que ele gelou, logologo<br />

diminuiu o preço e se <strong>de</strong>sculpou dizendo: “poxa cara, pensei que vocês<br />

eram ‘gringo’, <strong>de</strong>sculpa aí, ‘vintinho’ resolve?”.<br />

Foi apontado em duas entrevistas situações <strong>de</strong> exploração em restaurantes<br />

tradicionais nos <strong>de</strong>stinos visitados:


64<br />

Quando a gente tava em Gramado, fomos num daqueles cafés coloniais que<br />

tem buffet e bebida liberadas, ficamos comendo e tomando vinho a noite<br />

inteira (...) Quando pedimos conta, ao invés da gente pagar trinta reais, que<br />

era o valor do buffet que pensávamos que era completo, o garçom estava<br />

nos cobrando o vinho à parte (...). Vendo a confusão, um casal que estava<br />

sentado do nosso lado me chamou e disse que tudo era incluso sim,<br />

inclusive o vinho, e que ele estava tentando nos “passar a perna” porque<br />

éramos turistas (...).<br />

Em uma visita ao Chile, pedi ao garçom que ele me servisse o vinho e a<br />

comida que ele comia no dia-a-dia <strong>de</strong>le. O resultado? O prato e o vinho mais<br />

caro da carta.<br />

aeroportos:<br />

Foi apontado também em uma entrevista, situações <strong>de</strong> coação 39 <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong><br />

Chegando no nosso primeiro <strong>de</strong>stino [Egito], minha amiga foi ao banheiro,<br />

<strong>de</strong>ntro do aeroporto, por sinal maravilhoso, tinha uma funcionária do<br />

aeroporto, super solícita lá <strong>de</strong>ntro, que abriu a porta, a torneira, secou a mão<br />

<strong>de</strong>la (...) e na hora <strong>de</strong>la sair, ela simplesmente ficou na frente da porta,<br />

esticou a mão e disse: "one dollar" (...).Ela teve que pagar pra sair.<br />

A precificação diferenciada para o visitante/turista em relação aos preços<br />

<strong>de</strong>stinados para a comunida<strong>de</strong> local foi uma prática citada por todos durante as<br />

entrevistas. No entanto, isso não era o que mais incomodava a estes viajantes;<br />

muito pelo contrário, aos olhos <strong>de</strong>les era justo que os preços fossem menores para<br />

os moradores, afinal, ele “não está ali à passeio e merecem sim, pagar menos”. O<br />

agente <strong>de</strong> turismo e guia entrevistado também comentou sobre experiências como<br />

estas:<br />

(...) quando eu chego na lojinha pra comprar bebida a água é um real, mas,<br />

se chegaram os “gringos”, a água vira três reais. É claro que tem isso.<br />

Alguns não percebem, outros percebem e não ligam. Eu por exemplo não<br />

ligo <strong>de</strong> pagar mais. Acho que é uma forma <strong>de</strong> contribuir ainda mais com a<br />

comunida<strong>de</strong> (...).Se a gente for analisar bem, se não for um real pro<br />

morador, ele não compra. O preço tem que ser <strong>de</strong> acordo com a realida<strong>de</strong><br />

local. Se formos analisar pelo outro lado, o turista seria então explorador,<br />

porque, ele está indo naquele lugar comprar por um enquanto, na sua zona<br />

<strong>de</strong> permanência, custa três (...). Depen<strong>de</strong>ndo do enfoque que se dá aos<br />

fatos e <strong>de</strong> como você se sente é que po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado exploração ou<br />

não.<br />

39 Constrangimento eficiente exercido sobre uma pessoa <strong>de</strong> maneira direta ou indireta, com o escopo<br />

<strong>de</strong> lhe impedir a livre manifestação da vonta<strong>de</strong>. A coação po<strong>de</strong> ser física ou moral. Disponível em<br />

http://michaelis.uol.com.br/mo<strong>de</strong>rno/portugues


65<br />

No entanto, o que mais incomodava aos viajantes era “quando [os agentes <strong>de</strong><br />

mercado] agiam <strong>de</strong> má fé” com eles, não estabelecendo preços fixos para os<br />

produtos e serviços, dando a enten<strong>de</strong>r que o “o preço era dado <strong>de</strong> acordo com cada<br />

viajante” e, principalmente, quando os valores acordados anteriormente ao serviço<br />

não eram cumpridos e a criação abusiva <strong>de</strong> taxas extras:<br />

A todo o momento os preços para os turistas eram muito mais altos (3, 4<br />

vezes o valor para locais). Além disso, os preços acordados na negociação<br />

não eram os mesmos <strong>de</strong>pois do serviço consumido. Sem contar as taxas<br />

que eles inventavam a todo o momento (...). pra mim, era só outra forma <strong>de</strong><br />

ganhar em cima da gente. Isso acontecia <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a compra <strong>de</strong> água até uma<br />

propina pra a mochila no porta malas do ônibus “chegasse bem” ao <strong>de</strong>stino.<br />

(...) chegando no principal monastério do Tibet, o Potala Palace, eles<br />

falaram que, para entrar na segunda parte do prédio, tínhamos que pagar<br />

uma taxa extra. E o pior: se não pagássemos, não conseguiríamos sair,<br />

porque a saída era por lá. Nos sentimos muito enganados. Porque não nos<br />

avisaram antes?<br />

No discurso dos entrevistados foi percebido que durante muitas situações os<br />

mesmos confundiram situações típicas <strong>de</strong> exploração com questões pertinentes a<br />

diferenças culturais. Para muitas culturas barganhar é parte do processo <strong>de</strong> compra<br />

e venda e, se um dos objetivos do viajante é se inserir na cultura local, aceitar<br />

práticas como estas faz parte do processo <strong>de</strong> conhecimento “do outro”:<br />

(...) Acho que eles pensam que somos bobos (...). On<strong>de</strong> já se viu um colar<br />

custar 800 dirham 40 no início da negociação e no final, ficar por 60 dirhan?<br />

Só porque somos turistas eles aumentam o preço <strong>de</strong>scaradamente. Isso<br />

não é só no Marrocos não, aconteceu em muitos lugares, principalmente na<br />

Ásia e América do Sul (...).<br />

Foi notório durante a realização das entrevistas que os viajantes ten<strong>de</strong>ram a<br />

generalizar suas experiências negativas com os agentes <strong>de</strong> mercado, com a<br />

comunida<strong>de</strong> local:<br />

40 Moeda do Marroquina.


66<br />

Quando as pessoas me abordavam na rua da forma mais gentil do mundo,<br />

eu não estranhava, mas... Eu <strong>de</strong>sconfiava sim! Sempre achava que tinha<br />

alguma segunda intenção em jogo. Eu sobrevivi por lá seguindo duas regras<br />

básicas: sendo firme e, sempre, mantendo o bom humor. Um “shukran”<br />

(obrigado) com um sorriso sempre era mais eficaz do que a minha<br />

impaciência. Eu também tive que <strong>de</strong>ixar minha ingenuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> lado. Eles<br />

não querem “apenas” praticar o inglês com a gente. Eles querem é ganhar<br />

em cima da gente (...)<br />

Os entrevistados apontaram que uma prática muito comum para tirar<br />

vantagem dos viajantes é a da “exploração da nossa consciência”:<br />

Quando chegamos na Muralha da China, tinha “ locais” para nos<br />

recepcionar [vi<strong>de</strong> figura 15] (...) As que nos recepcionou era muito simpática,<br />

falava quase todos os idiomas, nos contou historias sobre o local, sobre sua<br />

vida, rotina (... ). Era tudo que queríamos: contato, cultura (...). Ela era tão<br />

solicita! Ela nos ajudava a subir, a encarar as partes difíceis do percurso.<br />

Teve uma hora que não consegui mais subir e, ela até me arrumou um<br />

espaço para sentar.(...). Quando dissemos que queríamos voltar a base, ela<br />

começou a tirar um monte <strong>de</strong> coisas da mochila, dizendo que elas<br />

sobreviviam daquilo, que tinham filhos para criar, e que a gente tinha que<br />

comprar para ajudar ela. (...). Nisso, ela nos ofereceu só coisas caras: uma<br />

blusa <strong>de</strong> sessenta dólares um livro com fotos <strong>de</strong> cem dólares (...). Falei que,<br />

infelizmente, não podíamos comprar, mas que, para ajudá-la, podíamos<br />

levar a blusa, mas, que só tínhamos quarenta dólares! Ela começou a falar<br />

que não queríamos ajudar e, que por isso, tínhamos que nos virar para<br />

voltar para a base sozinhos, que ela tinha mais o que fazer (...).<br />

Figura 15 - As mulheres da Muralha da China - Pequim - China<br />

Fonte: Arquivo pessoal do entrevistado (2011)


67<br />

Nas entrevistas também percebemos que, o brasileiro também é explorado<br />

em seu próprio país. Um dos entrevistados chegou a dizer que “o turistômetro 41 dos<br />

ven<strong>de</strong>dores é o sotaque diferente e as inúmeras fotos nos lugares que parecem<br />

comuns aos olhos <strong>de</strong>les”:<br />

Fomos ao Pelourinho e em seguida ao Elevador Lacerda e tinha muita<br />

presença do comércio informal, oferecendo souvenires e lembrancinhas<br />

durante todo o tempo e com certa insistência, pois perceberam que éramos<br />

turistas. Tentamos barganhar e conseguimos comprar dois cordões, ditos <strong>de</strong><br />

prata peruana, por R$30,00. Achamos que tínhamos feito bom negócio,<br />

afinal cada cordão nos foi oferecido a R$20,00, porém nos surpreen<strong>de</strong>mos<br />

ao <strong>de</strong>scer e ver os mesmos cordões sendo vendidos no Mercado Mo<strong>de</strong>lo a<br />

três unida<strong>de</strong>s por R$10,00 (...).<br />

Logo após a narração da situação (ou situações) <strong>de</strong> exploração que<br />

vivenciaram, foi perguntado aos backpackers como eles achavam que o mercado os<br />

via. Pronunciamentos como "notas <strong>de</strong> dinheiro andando pelo <strong>de</strong>stino”, “uma forma<br />

<strong>de</strong>les ganharem mais dinheiro”, “máquinas caça-níqueis”, “fonte <strong>de</strong> dinheiro fácil” e<br />

“tolos” foram obtidos na entrevista.<br />

Assim como aborda Barreto (2004), os habitantes dos lugares turísticos se<br />

beneficiam economicamente com a presença dos turistas, não estão precisamente<br />

interessados em receber os turistas como hóspe<strong>de</strong>s e a realizar com eles trocas<br />

culturais, mas sim, em receber o dinheiro trazido pelos turistas:<br />

O mercado, as pessoas, todos nos vêem como uma oportunida<strong>de</strong> bem<br />

lucrativa. A nossa presença gera neles uma excitação incrível! Uma<br />

oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> enriquecer (...). Às vezes, é tão perceptível que, a<br />

sensação <strong>de</strong> ser usado é quase que constante. Chegou um momento que<br />

não conseguia nem mais acreditar que eu po<strong>de</strong>ria conseguir uma relação<br />

diferente da comercial. Não foi só uma sensação pessoal. Quando<br />

conversávamos sobre isso nos albergues, parecia ser <strong>de</strong> consenso geral<br />

essa atmosfera <strong>de</strong> interesse não pela nossa cultura, mas pelo nosso po<strong>de</strong>r<br />

<strong>de</strong> compra, nosso dinheiro (...).<br />

5.3 PÓS-VIAGEM<br />

Retomando o pensamento <strong>de</strong> que os serviços <strong>de</strong> agências <strong>de</strong> viagens visam<br />

41 Neologismo criado com o objetivo <strong>de</strong> representar um “medidor <strong>de</strong> turistas”.


68<br />

eliminar quase que completamente os riscos <strong>de</strong> uma viagem, os entrevistados foram<br />

perguntados se a intermediação po<strong>de</strong>ria minimizar as chances <strong>de</strong> exploração<br />

financeira. As respostas foram bem divididas. Parte dos entrevistados não sabia se<br />

organizar suas viagens com ajuda <strong>de</strong> agência <strong>de</strong> turismo diminuiria os riscos. A<br />

meta<strong>de</strong> dos entrevistados afirmou que os riscos po<strong>de</strong>riam diminuir, mas que ao optar<br />

pela intermediação haveria consequências para a experiência final:<br />

Já viajei muito por agência... A diferença <strong>de</strong> ir por conta própria é que, pela<br />

agência, você se sente mais seguro, sem dúvidas! Parece que você fica<br />

<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um pacote, protegido, sabe? Por outro lado, esse pacote te<br />

impe<strong>de</strong> <strong>de</strong> conhecer a realida<strong>de</strong> daquele lugar... Ou seja, diminui muito o<br />

risco sim... Mas, não impe<strong>de</strong>.<br />

A outra parte dos entrevistados, no entanto, disse que não acreditava que a<br />

intermediação po<strong>de</strong>ria ajudar a diminuir a incidência <strong>de</strong> experiências <strong>de</strong> exploração<br />

financeira aos visitantes, pelo contrário, para eles “a intermediação é outra forma <strong>de</strong><br />

ser explorado, só que <strong>de</strong> uma forma mais formal”:<br />

Não mesmo! Pensei que, acompanhada do guia as chances <strong>de</strong> ser<br />

explorada reduziriam, mas, além <strong>de</strong> ser explorada pelos ambulantes, o guia<br />

só me levava em locais para almoço e compras quando eles recebiam<br />

comissão (...). Não me importaria se, esses lugares fossem realmente a<br />

melhor opção pra mim, mas eram extremamente caros e sem qualida<strong>de</strong><br />

nenhuma. Então, não acho que intermediação iniba a ação dos<br />

exploradores, <strong>de</strong> uma forma ou <strong>de</strong> outra, o turista sempre será explorado,<br />

exceto se o turista conhecer alguém <strong>de</strong> confiança que more no local.<br />

Sinceramente não. Já viajei com agências e nunca fui informada <strong>de</strong>sse tipo<br />

<strong>de</strong> ocorrências. Acho que, na verda<strong>de</strong>, a forma <strong>de</strong> exploração muda. Quem<br />

viaja <strong>de</strong> forma in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte tem mais chance <strong>de</strong> ser explorado porque<br />

interage mais com a população local. Ir por meio <strong>de</strong> uma agência você paga<br />

a agência, é direcionado para lugares que eles querem que você vá, é<br />

explorado por lá e ainda é explorado nas suas compras pessoais (...). Não<br />

tem jeito.<br />

Sem exceção, quando os entrevistados foram perguntados se as expectativas<br />

iniciais tinham sido atingidas, todos (exceto os que não as tinham), disseram que<br />

suas expectativas iniciais sobre o <strong>de</strong>stino e a experiência não foram atendidas:


69<br />

Acho que, quando planejamos uma viagem ninguém espera vivenciar uma<br />

experiência ruim, que te cause medo, que te faz sentir incapaz ou até<br />

mesmo um injusto por ter o que outros não têm (...). Sempre que a gente<br />

era explorado financeiramente durante os treze meses <strong>de</strong> estrada, a gente<br />

lembrava que não pertencia àquele lugar, que, querendo ou não, éramos<br />

intrusos (...). A gente era turista, ninguém ia mudar isso, nem mesmo a<br />

nossa vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> se sentir parte daquilo tudo.<br />

Vogt (1976) argumenta que os mochileiros alteram suas percepções <strong>de</strong><br />

dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> negativas para positivas na forma <strong>de</strong> <strong>de</strong>safios. O que para a maioria<br />

dos turistas aparenta ser um problema, nada mais é do que um método <strong>de</strong><br />

“autoteste” para o viajante backpacker. Situações como ficar perdido, ser assediado<br />

por ven<strong>de</strong>dores, ser furtado, não saber como voltar para casa ou ter que lidar a todo<br />

o momento com situações <strong>de</strong>sconfortáveis e diferentes <strong>de</strong> sua realida<strong>de</strong> cultural,<br />

apesar <strong>de</strong> incômodas, foram vistas pela gran<strong>de</strong> maioria dos entrevistados como<br />

proveitosas na medida em que contribuem para o amadurecimento e crescimento<br />

pessoal:<br />

Antes <strong>de</strong> chegarmos na Índia, já tinham nos falado muito sobre como era<br />

visitar o País. Honestamente, na maioria das vezes, tocaram o terror! Sem<br />

querer criar ilusões, <strong>de</strong> fato não é fácil. Existe muito assédio, risco <strong>de</strong> furtos,<br />

pouca higiene (...). Mas, também não é nada <strong>de</strong> outro mundo. Tomando<br />

cuidado, usando purificadores nas águas que bebemos, prestando atenção<br />

às situações mais arriscadas e sabendo ignorar quem estava lá apenas pra<br />

nos importunar, saímos ilesos e felizes. Nenhum contratempo sério <strong>de</strong><br />

or<strong>de</strong>m estomacal ou policial e muitas belezas e experiência que só são<br />

possíveis <strong>de</strong> se viver por lá. No final, foi bem mais simples do que nos<br />

tinham feito pensar que seria. E garantimos a qualquer alma “não pequena”,<br />

que é uma visita muito gratificante!<br />

Quando os entrevistados foram questionados sobre se retornariam ao <strong>de</strong>stino<br />

e se recomendariam, a maioria dos entrevistados disse que não retornaria e, que só<br />

recomendaria <strong>de</strong>ixando bem claro tudo o que vivenciou no <strong>de</strong>stino:<br />

Recomendaria, porém frisaria o fato do comércio informal tentar se<br />

aproveitar dos turistas e indicaria lugares mais seguros para se consumir.<br />

Não tenho vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> retornar a Salvador.<br />

Os pesquisadores Gitelson e Crompton (1983) i<strong>de</strong>ntificaram em suas<br />

pesquisas sobre fontes <strong>de</strong> informação que 72% <strong>de</strong> todos os respon<strong>de</strong>ntes utilizaram<br />

amigos como fonte principal <strong>de</strong> informação. Já Perry e Hamm (apud Murray, 1991)


70<br />

mostram que, quanto maior o risco percebido, maior a importância da influência<br />

pessoal. A questão principal é: até que ponto narrar experiências negativas (como as<br />

exploração financeira) a um viajante potencial po<strong>de</strong> atrapalhar em seu processo <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>cisão?<br />

Existem muitos tipos <strong>de</strong> viajantes e cada um caminha para um processo<br />

diferente. Vários estudos no campo do marketing vêm mostrando que o marketing<br />

boca a boca é a fonte <strong>de</strong> informação mais importante para reduzir o risco no<br />

processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão e tem maior impacto nos consumidores do que comunicações<br />

<strong>de</strong> massa, <strong>de</strong>vido ao fato que as oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> feedback existem nas interações<br />

existentes entre quem já vivenciou e quem quer vivenciar:<br />

Quando relembro das situações negativas, até mesmo, para me proteger,<br />

diria que não retornaria! Mas, a China guarda tanta beleza e diversida<strong>de</strong>,<br />

que, mesmo com tantas experiências que me trouxeram sensações ruins,<br />

eu voltaria sim! Em relação as minhas expectativas, meu conceito sobre a<br />

China mudou muito, sei também que, a magia do meu discurso sobre ela<br />

também mudou. Acho que, quando eu recomendasse a China, eu falaria<br />

muito mais sobre os pontos negativos do que dos positivos... Foi assim com<br />

as pessoas que me falaram da China; elas exaltavam mais o que po<strong>de</strong>ria<br />

dar errado do que o que <strong>de</strong>u certo... Quem não tiver muito certo <strong>de</strong> querer<br />

visitar a China, acho que seria “infectado” pelas minhas experiências<br />

negativas.<br />

Outra questão levantada pelos viajantes foi em relação a imagem do local e<br />

da população local por conta das experiências <strong>de</strong> exploração financeira:<br />

Seria fácil dizer que o Marrocos <strong>de</strong>ixa sentimentos confusos. Mas, não é<br />

bem assim. Nossos sentimentos são claros. O País tem paisagens<br />

absolutamente extraordinárias, Medinas incríveis e uma gran<strong>de</strong> riqueza<br />

cultural. Contudo, recebem muito mal os estrangeiros e <strong>de</strong>ixam que um<br />

bando <strong>de</strong> pessoas <strong>de</strong>sonestas comprometa a imagem <strong>de</strong> todo um povo. O<br />

turista é visto como alguém <strong>de</strong> quem se <strong>de</strong>ve tirar alguma coisa. Portanto,<br />

recomendamos o <strong>de</strong>stino para pessoas dispostas a pagar esse preço por<br />

suas belezas. Ou, talvez, para quem pense em usar algum tipo <strong>de</strong> excursão<br />

já com tudo organizado. É provável que assim funcione bem. Para viajantes<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes, o País <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> fato boas recordações, porém é também um<br />

alívio embarcar pra ir embora.<br />

Quando foram perguntados sobre quais po<strong>de</strong>riam ser os meios para coibir a<br />

ação dos exploradores informais, a presença da polícia foi citada como uma possível<br />

solução:


71<br />

Passamos duas noites no Marrocos. Em Marrakesh têm turistas por todos<br />

os lados e muita gente tentando se aproveitar <strong>de</strong>les. Já em Se Fès, a<br />

“encheção <strong>de</strong> saco” é menos irritante. São menos insistentes e certos<br />

golpes como os falsos guias são coibidos pela polícia.<br />

Os viajantes também apontaram como uma solução para coibir a exploração<br />

financeira por agentes formais, pesquisa prévias <strong>de</strong> experiências <strong>de</strong> outros viajantes<br />

com aquela empresa.<br />

Passamos nosso último dia no Marrocos a caminho <strong>de</strong> Casablanca.<br />

(...).Sabe-se lá por qual razão, fomos ingênuos o bastante para acreditar no<br />

ven<strong>de</strong>dor que nos garantiu que seria um ônibus novo. Não era. Nem ia<br />

direto. Pelo contrário, parava em praticamente qualquer esquina pra pegar<br />

ou <strong>de</strong>ixar passageiros. Só não parava pra que a gente pu<strong>de</strong>sse ir ao<br />

banheiro. A única oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> comer era a multidão <strong>de</strong> ven<strong>de</strong>dores <strong>de</strong><br />

biscoitos a bananas que invadia o ônibus a cada parada (...). Foram oito<br />

horas em uma viagem que po<strong>de</strong>ria ter durado a meta<strong>de</strong> disso.<br />

No entanto, a solução mais citada por todos foi o aumento da fiscalização<br />

pelos órgãos competentes do turismo tanto para o mercado informal quanto para o<br />

mercado formal.


72<br />

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />

Seems like everybody's got a price/I won<strong>de</strong>r how they sleep at night/When<br />

the sale comes first/And the truth comes second/Just stop for a minute and<br />

smile... (Música: Price Tag - Jessie J) 42<br />

Ao longo da discussão dos resultados no capítulo cinco, algumas<br />

consi<strong>de</strong>rações sobre a percepção dos viajantes backpackers em relação às<br />

experiências <strong>de</strong> exploração financeira em suas viagens, os possíveis “agentes da<br />

exploração” e os fatores/situações que levam estes viajantes a serem explorados<br />

financeiramente já foram apresentadas.<br />

No entanto, estas consi<strong>de</strong>rações finais não se configuram como um “resumo”<br />

ou uma “repetição” dos principais assuntos do presente trabalho, e sim como uma<br />

oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> “retomar” pontos especiais do trabalho, apontando caminhos e<br />

sugestões referentes às percepções compreendidas durante as entrevistas<br />

analisadas sob a luz da literatura vigente. As propostas não preten<strong>de</strong>m incorporar o<br />

sentido restrito <strong>de</strong> uma “cartilha”, muito pelo contrário, elas objetivam assinalar i<strong>de</strong>ias<br />

e diferentes maneiras <strong>de</strong> se pensar as relações entre visitantes, visitados e os<br />

agentes <strong>de</strong> mercado – que certamente po<strong>de</strong>m gerar reflexões para próximos<br />

estudos sobre o tema.<br />

O turismo é uma ativida<strong>de</strong> realizada pelos homens em socieda<strong>de</strong>. Como tal,<br />

tem um importante grau <strong>de</strong> imprevisibilida<strong>de</strong>, portanto não po<strong>de</strong>mos generalizar as<br />

relações entre visitantes e visitados nem predizer como elas serão em <strong>de</strong>terminado<br />

momento e lugar. No entanto, durante as entrevistas, muitas situações se repetiram,<br />

em lugares e períodos diferentes, com a mesma dinâmica, ocorrência esta que gera<br />

um alerta para os <strong>de</strong>stinos e comunida<strong>de</strong> acadêmica. Como foi apontado pelos<br />

entrevistados, situações <strong>de</strong> exploração financeira acontecem com frequência e são<br />

esperadas pelos viajantes, como se fizessem “parte da experiência total.”<br />

Barreto (2004) aponta que visitantes e população local tem diversos graus <strong>de</strong><br />

empatia, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um leque que vai da simpatia até a hostilida<strong>de</strong>, passando pela<br />

“cordialida<strong>de</strong> profissionalmente trabalhada”. A tendência parece ser que os<br />

42 Tradução: Parece que todo mundo tem um preço/Eu me pergunto como eles dormem durante a<br />

noite/Quando a venda vem em primeiro lugar/E a verda<strong>de</strong> vem em segundo lugar/Apenas pare por<br />

um minuto e /Sorria...


73<br />

relacionamentos entre visitantes e visitados sejam cada vez mais profissionais na<br />

medida em que os serviços turísticos e os próprios moradores se profissionalizam.<br />

Durante as entrevistas realizadas, os viajantes apontaram durante muitos momentos<br />

exatamente isso: que os moradores dos núcleos receptores não se comportam<br />

como anfitriões, “que sua receptivida<strong>de</strong> é profissional” e que “raros são os<br />

momentos que se sentem convidados”. Desta forma, prevalece o fato <strong>de</strong> que,<br />

“mesmo buscando uma proximida<strong>de</strong> com a localida<strong>de</strong> e seus moradores, do ponto<br />

<strong>de</strong> vista social e cultural, os visitantes sempre serão forasteiros e seu<br />

relacionamento com as populações receptoras sempre será a partir <strong>de</strong>sta condição”.<br />

(BARRETO, 2004)<br />

A literatura existente aponta que o turismo, em sentido amplo, é um fenômeno<br />

social. Mas, em sentido restrito, na perspectiva dos núcleos receptores, é um<br />

negócio. Um negócio que ven<strong>de</strong> algo diferente - prazer, lazer, experiências - mas<br />

que está conduzido pela lógica da socieda<strong>de</strong> capitalista: a produtivida<strong>de</strong> e a<br />

lucrativida<strong>de</strong>. O gran<strong>de</strong> paradoxo do turismo é que esta ativida<strong>de</strong> coloca em contato<br />

pessoas que não enxergam a si mesmas como pessoas, mas como portadores <strong>de</strong><br />

uma função precisa e <strong>de</strong>terminada: uns trazem dinheiro com o qual compram os<br />

serviços do outro. Essa lógica <strong>de</strong> funcionalida<strong>de</strong> foi diversas vezes elucidada pelos<br />

entrevistados.<br />

A compreensão da percepção dos viajantes sobre as situações <strong>de</strong> exploração<br />

financeira vivenciadas permitiu a construção <strong>de</strong> um panorama geral das relações<br />

comerciais que envolvem experiências <strong>de</strong> exploração (vi<strong>de</strong> figura 16):


74<br />

PRINCIPAIS<br />

"AGENTES DE<br />

EXPLORAÇÃO<br />

FINANCEIRA" DOS<br />

VIAJANTES<br />

•Mercado informal (ven<strong>de</strong>dores<br />

ambulantes)<br />

•Agências <strong>de</strong> Turismo <strong>de</strong> Receptivo<br />

•Guias <strong>de</strong> Turismo<br />

• Restaurantes<br />

•Taxistas<br />

•Pedintes/Moradores <strong>de</strong> Rua<br />

PRINCIPAIS<br />

MOTIVOS PARA A<br />

OCORRÊNCIA DE<br />

EXPLORAÇÃO<br />

• Diferenças econômicas exarcebadas<br />

• Ausência <strong>de</strong> informações antes do<br />

embarque<br />

• Má fé dos comerciantes<br />

• Interpretações equivocadas sobre<br />

diferenças culturais que geram a sensação<br />

<strong>de</strong> exploração financeira (ex.: barganhas)<br />

PRINCIPAIS<br />

FORMAS DE EVITAR<br />

PRÁTICAS DE<br />

EXPLORAÇÃO<br />

FINANCEIRA<br />

•Obter informações antes do embarque<br />

•Trocar informações com outros viajantes<br />

•Acessar blogs e sites para saber<br />

previamente experiências <strong>de</strong> outros<br />

viajantes que estiveram no <strong>de</strong>stino que<br />

<strong>de</strong>seja conhecer<br />

•Fiscalização<br />

Figura 16 - Panorama geral das relações <strong>de</strong> exploração financeira em viagens<br />

Fonte: Elaboração própria (2012)<br />

As entrevistas apontaram que os principais agentes da exploração<br />

financeira pertenciam não somente ao mercado informal - como os ven<strong>de</strong>dores<br />

ambulantes - mas principalmente ao mercado formal <strong>de</strong> turismo: guias cre<strong>de</strong>nciados,<br />

agentes <strong>de</strong> viagens, taxistas e restaurantes. Além dos casos <strong>de</strong> exploração<br />

financeira realizadas pelos principais atores com quem realizam somente trocas<br />

comerciais, os entrevistados também <strong>de</strong>stacaram a prática, nomeadas por eles <strong>de</strong><br />

“exploração da consciência”, realizada pela comunida<strong>de</strong> local, utilizando como


75<br />

artifício para a mesma a pobreza e as diferenças sociais.<br />

As entrevistas também apontaram que os principais motivos para a ocorrência<br />

<strong>de</strong> práticas <strong>de</strong> exploração financeira são as diferenças econômicas exarcebadas, a<br />

ausência <strong>de</strong> informações antes do embarque (já que muitos atribuíram à pesquisa<br />

prévia uma forma <strong>de</strong> “sair ileso” <strong>de</strong> algumas situações que já ocorreram com outros<br />

viajantes) e a “má fé” dos agentes <strong>de</strong> mercado e resi<strong>de</strong>ntes, embebidos pela<br />

máxima <strong>de</strong> que “turistas/visitantes têm muito dinheiro”.<br />

As entrevistas também apontaram algumas medidas para evitar as práticas<br />

<strong>de</strong> exploração financeira, como obter informações antes do embarque (evitaria, por<br />

exemplo, o equívoco <strong>de</strong> alguns viajantes acharem que práticas culturais como a<br />

“barganha” é uma forma <strong>de</strong> exploração financeira) e a troca <strong>de</strong> informações com<br />

outros viajantes. Os entrevistados também indicaram a internet como um meio <strong>de</strong><br />

informação muito eficaz para se ter acesso a experiências <strong>de</strong> viajantes através <strong>de</strong><br />

relatos em blogs e sites. Estas são ações e posturas que os viajantes po<strong>de</strong>m tomar,<br />

no entanto, outra solução apontada foi o aumento da fiscalização pelos órgãos<br />

competentes.<br />

No entanto, as práticas elucidadas pelos entrevistados para evitar a<br />

exploração financeira representam a meu ver apenas medidas paliativas que<br />

parecem resolver o problema apenas <strong>de</strong> uma forma imediatista e não em sua origem<br />

<strong>de</strong> fato. Sugeriria como uma solução eficaz uma política <strong>de</strong> estruturação e incentivo<br />

ao turismo receptivo, baseada na educação turística. Medidas como estas seriam<br />

capazes <strong>de</strong> envolver e educar a comunida<strong>de</strong> local e assim minimizar as práticas <strong>de</strong><br />

exploração financeira aos visitantes. A pergunta que este trabalho <strong>de</strong>ixa para<br />

pesquisas futuras é: até quando os <strong>de</strong>stinos negligenciarão práticas como estas?<br />

Apesar das poucas pesquisas sistematizadas a respeito, seria enriquecedor<br />

para a discussão do tema, estudos direcionados para o impacto <strong>de</strong>stas práticas<br />

sobre os <strong>de</strong>stinos visto que, a imagem <strong>de</strong> cada localida<strong>de</strong> se faz pelo olhar e<br />

percepção do visitante.


76<br />

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS<br />

AOQUI, C. Desenvolvimento do Segmento Backpacker no Brasil sob a Ótica do<br />

Marketing <strong>de</strong> Turismo (Trabalho <strong>de</strong> Conclusão <strong>de</strong> Curso <strong>de</strong> Graduação em<br />

Administração) São Paulo: USP, 2005.<br />

ARAÚJO, S. M. Artifício e autenticida<strong>de</strong>: O turismo como experiência<br />

antropológica. In: BANDUCCI, A. e BARRETO, M. (Org.) Turismo e I<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

Local: Uma visão antropológica. São Paulo: Papirus, 2005.<br />

BARRETO, M. Relações entre visitantes e visitados: nem anfitriões nem<br />

convidados. Revista Turismo em Análise, Vol 15, n. 2, nov. 2004, p.133-149.<br />

BLOG MOCHILA BRASIL: http://www2.uol.com.br/mochilabrasil/mochileiro.shtml<br />

(acesso em 18 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 2012)<br />

BLOG MOCHILANDO PELO MUNDO: http://mochilandopelomundo.wordpress.com/<br />

(acesso em 15 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 2012)<br />

CARVALHO, D. T. B. Turismo Backpacker: Um estudo exploratório sobre perfil,<br />

características e motivações. (Trabalho <strong>de</strong> Conclusão <strong>de</strong> Curso <strong>de</strong> Graduação em<br />

Turismo) Rio <strong>de</strong> Janeiro: <strong>UFF</strong>, 2009.<br />

CERVO, P.A; BERVIAN,L.A . Metodologias científicas. São Paulo: Makron Books,<br />

1983<br />

COHEN, E. Towards a sociology of internacional tourism. Social Research 39.<br />

1972. P.164-182 apud KOTLER, P., BOWEN, J. e MAKENS, J. Op. cit., p. 662.<br />

COHEN, E. Nomads from Affluence: Notes on the Phenomenon of Drifter<br />

Tourism. International Journal of Comparative Sociology, 1973.<br />

CRICK, M. Representaciones <strong>de</strong>l turismo internacional en las ciencias sociales:<br />

Sol, sexo, paisaje, ahorros y servilismos. Madrid: Endymion, 1992.<br />

DENCKER, A. Métodos e técnicas <strong>de</strong> pesquisa em turismo. São Paulo: Futura,<br />

2001.<br />

FLANAGAN, J. C. A técnica do inci<strong>de</strong>nte crítico. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Arq. Bras. Psic.<br />

Apl., 1973.<br />

GIARETTA, M. J. Turismo da Juventu<strong>de</strong>. São Paulo: Manole, 2002<br />

GIDDENS, A. Para além da esquerda e da direita. São Paulo: Unesp, 1996.<br />

GITELSON, R. e CROMPTON, J. The planning horizons and sources of<br />

information used by pleasure vacationers. Journal of Marketing Research, 1983.


77<br />

GOELDNER, C. R.; RITCHIE, J. R.; MCINTOSH, R. W. Turismo: princípios,<br />

práticas e filosofias. Porto Alegre: Bookman, 2002.<br />

HAIGH, R. Backpackers in Australia. Occasional Paper n. 20. Bureau of Tourism<br />

Research, 1995.<br />

HAMPTON, M. P. Backpacker tourism and economic <strong>de</strong>velopment. Annals of<br />

Tourism Research, 1998. V. 25.<br />

IANNI, O. Enigmas da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>-mundo. Rio <strong>de</strong> Janeiro : Civilização Brasileira,<br />

2000, 319 p.<br />

JARVIS, J. The million dollar backpackers. Australia: Monash University, 1994.<br />

JARVIS, J. Yellow bible tourism: Backpackers in South East Asia. Australia:<br />

Monash University, 2004.<br />

KRIPPENDORF, J. Sociologia do Turismo: Para uma nova compreensão do<br />

lazer e das viagens. Aleph. São Paulo. 2001.<br />

KOTLER, P. Administração <strong>de</strong> marketing. São Paulo: Prentice Hall, 2000.<br />

LOKER, L. The Backpacker phenomenon II: more answers to further questions.<br />

North Queensland: James Cook University, 1993.<br />

LOKER-MURPHY, L.; PEARCE, P. L. Young budget travelers: Backpackers in<br />

Australia. [S.D.]: Annals of Tourism Research, 1995. V. 22, p. 819-843.<br />

MATEAU, J. Y. Children of the Backpackers: analysis of the backpacker since<br />

the 1950s. Paris: Espaces, 1998.<br />

MICHAELES. Dicionário Online. Disponível em <br />

(Acessado em 13 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 2012.)<br />

MOLINA, S: Mo<strong>de</strong>rnización <strong>de</strong> empresas turísticas. Um enfoque para el logro <strong>de</strong><br />

la calidad total. México, Editorial Diana. (1994).<br />

MOSHIN, A.; RYAN, C. Backpackers in the Northern Territory of Australia –<br />

motives, behaviours and satisfactions. Northern Territory: International Journal of<br />

Tourism Research, 2003. V. 5, p. 113-131.<br />

MURRAY, K. A test of services marketing theory: consumer information<br />

acquisition activities. Journal of Marketing, V. 55, Jan. 1991.<br />

NORONHA, F. Culture shocks: In Focus (spring): p. 4-5, 1999.<br />

OLIVEIRA, R. J. Backpackers no Brasil. Dissertação (Mestrado em Turismo).<br />

Escola <strong>de</strong> Comunicação e Artes, Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, 2000.


78<br />

OLIVEIRA, R. J. Estudo do segmento <strong>de</strong> turistas internacionais mochileiros no<br />

Brasil. IV Seminário da Associação Brasileira <strong>de</strong> Pesquisa e Pós-Graduação em<br />

Turismo UAM. 2007.<br />

OLIVEIRA, M. F. S, O. J. R.; OLIVEIRA: Carnaval, turismo e trabalho informal na<br />

Bahia: tanto negócio e tanto negociante. Ca<strong>de</strong>rno Virtual <strong>de</strong> Turismo. Vol. 5, N° 4<br />

(2005).<br />

ORTIZ, R. Mundialização e Cultura. São Paulo: Editora Brasiliense S.A., 1994.<br />

RILEY, P. J. Road Culture of International Long-Term Budget Travelers. Annals of<br />

Tourism Research. Vol. 15, 1998.<br />

SOLÁ, J. J. Economia <strong>de</strong>l tiempo libre. Barcelona: Revista do Instituto <strong>de</strong> Ciencias<br />

Sociales, 1975. N. 25.<br />

SORENSEN, A. Backpacker Ethnography. Annals of Tourism Research, 30 (4):<br />

847-867, 2003.<br />

SOUSA, M. G. Viajante/Turista – Categorias em discussão com base no filme O<br />

céu que nos protege, <strong>de</strong> Bernardo Bertolucci. Revista Espaço Acadêmico, n. 34.<br />

2004.<br />

SWARBROOKE, J. e HORNER, S. O comportamento do consumidor no turismo.<br />

São Paulo: Aleph, 2002.<br />

THOMS, C. Backpackers in Australia. Canberra: Bureau of Tourism Research,<br />

1999.<br />

URRY, J. O Olha do Turista: Lazer e Viagens na Socieda<strong>de</strong> Contemporânea. São<br />

Paulo: Editora Studio Nobel/SESC, 2001.<br />

VISSER, G. The <strong>de</strong>velopmental impacts of backpacker tourism in South Africa:<br />

GeoJournal, v. 60, p. 283-299. University of the Free State, 2004.<br />

VOASSE, R. Tourism: The Human Perspective. Hod<strong>de</strong>r and Stoughton, London,<br />

1995.<br />

VOGT, J. Wan<strong>de</strong>ring: youth and travel behaviour. Annals of Tourism Research, V.<br />

4, N. 1, set./out. 1976, p. 28.<br />

WILSON, D. Paradoxes of tourism in Goa. Annals of Tourism Research, 1997. Vol.<br />

24, p. 52-75.<br />

ZEITHAML, Valarie A,; BERRY, Leonard L.; PARASURAMAN, A. Consumer<br />

Perceptions of Price, Quality and Value: a means-end mo<strong>de</strong>l and synthesis of<br />

evi<strong>de</strong>nce. Journal of Marketing. V. 52, p. 2-22, July 1993.


79<br />

APÊNDICES<br />

Apêndice A - Formulário <strong>de</strong> Direcionamento <strong>de</strong> Entrevista - Mochileiro<br />

• Nome, ida<strong>de</strong>, escolarida<strong>de</strong> e <strong>de</strong>stino.<br />

• Porque escolheu fazer um mochilão para este <strong>de</strong>stino?<br />

• Você viajou com alguém? Quem?<br />

• Você buscou informações antes <strong>de</strong> viajar? Qual(is) meio(s) você utilizou?<br />

• Quando escolheu este <strong>de</strong>stino, o que você esperava <strong>de</strong>le?<br />

• Existia sinalização turística clara dos pontos <strong>de</strong> interesse turístico?<br />

• Havia algum lugar que cedia informações turísticas?<br />

• Você encontrava com facilida<strong>de</strong> mapas ou guias turísticos?<br />

• Existia serviço <strong>de</strong> agenciamento (agências <strong>de</strong> turismo) oferecendo passeios e<br />

pacotes no albergue que estava hospedado?<br />

• Você percebeu a presença do mercado informal (ven<strong>de</strong>dores ambulantes,<br />

camelôs, profissionais <strong>de</strong> turismo amadores, <strong>de</strong>ntre outros)?<br />

• Antes <strong>de</strong> viajar alguém lhe alertou, ou você leu em algum lugar, sobre a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> eventos como este (exploração dos turistas) acontecerem?<br />

Saber <strong>de</strong>sta possibilida<strong>de</strong> te ajudou? Se sim, cite algum exemplo.<br />

• Você sofreu algum tipo <strong>de</strong> exploração financeira em sua viagem? Se sim,<br />

conte-me como foi. Se não, estava com alguém que sofreu? Como foi sua<br />

reação e atitu<strong>de</strong>?<br />

• Qual foi a sua percepção do momento em que ocorreu a exploração<br />

financeira? (Como você se sentiu?)<br />

• Após uma experiência como esta como você acha que os agentes <strong>de</strong><br />

mercado vêem os visitantes?<br />

• Você acredita que, o modo <strong>de</strong> como você organiza a viagem influencia na<br />

ocorrência (ou não) <strong>de</strong> eventos <strong>de</strong> exploração financeira dos turistas? Em<br />

linhas gerais, você acredita que ser intermediado por uma agência <strong>de</strong> turismo<br />

aumenta ou diminue o risco <strong>de</strong> ser explorado financeiramente? Justifique.<br />

• Relembrando suas expectativas iniciais em relação a sua viagem, o que uma<br />

experiência como esta (<strong>de</strong> exploração financeira) trouxe para sua experiência<br />

final? Você recomendaria o local? Você retornaria? Justifique.


80<br />

• O que você acha que po<strong>de</strong>ria ser feito para que situações como estas não<br />

ocorram?


81<br />

Apêndice B - Formulário <strong>de</strong> Direcionamento <strong>de</strong> Entrevista - Agente <strong>de</strong> mercado<br />

especializado no segmento backpacker<br />

• Nome, ida<strong>de</strong> e escolarida<strong>de</strong>;<br />

• Há quanto tempo trabalha com turismo?<br />

• O que te motivou a trabalhar com o segmento backpacker?<br />

• Po<strong>de</strong>ria me dizer as principais características do seu público-alvo?<br />

• Quais serviços a sua empresa oferece a estes viajantes?<br />

• Descreva as suas ativida<strong>de</strong>s com estes grupos.<br />

• Geralmente, o estilo backpacker <strong>de</strong> viajar tente a “fugir” da intermediação.<br />

Como você po<strong>de</strong>ria explicar esta procura?<br />

• Como você <strong>de</strong>screveria, em linhas gerais, a interação entre os visitantes e<br />

a comunida<strong>de</strong> local?<br />

• Como você acha que a comunida<strong>de</strong> local vê os viajantes?<br />

• Você já presenciou alguma situação <strong>de</strong> exploração financeira ao visitante?<br />

Como foi? Você interferiu?<br />

• Como você acha que a intermediação po<strong>de</strong> ajudar na prevenção <strong>de</strong><br />

experiências como estas?<br />

• Em entrevistas anteriores com backpackers, os mesmos apontaram como<br />

um dos “exploradores” os guias <strong>de</strong> turismo, que, através do sistema <strong>de</strong><br />

comissionamento em <strong>de</strong>terminados pontos <strong>de</strong> interesse turístico,<br />

direcionam os viajantes nem sempre para o melhor local <strong>de</strong> compras.<br />

Teria como nos explicar estas transações comerciais? Como você acha<br />

que po<strong>de</strong>ríamos encontrar um equilíbrio que não <strong>de</strong>sfavorecesse nem ao<br />

mercado e nem ao viajante?

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!