O fundamento da democracia em Benedictus de Spinoza - Uece
O fundamento da democracia em Benedictus de Spinoza - Uece
O fundamento da democracia em Benedictus de Spinoza - Uece
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
evela <strong>em</strong> situação, com tendência interna a buscar o que possa nos<br />
convir ou ser útil enquanto corpos ou mente, nas mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong>s do que<br />
<strong>de</strong>signamos “vonta<strong>de</strong>”, “apetite” e “<strong>de</strong>sejo”. 22<br />
Conforme essa compreensão, esta é a condição peculiar <strong>de</strong> todo hom<strong>em</strong>: nasce<br />
ignorante <strong>da</strong>s causas e é por natureza um ser <strong>de</strong> apetite. Se tivermos consciência<br />
<strong>de</strong> nosso apetite, t<strong>em</strong>os o <strong>de</strong>sejo; mas n<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre sab<strong>em</strong>os o que nos leva a<br />
<strong>de</strong>sejar o que <strong>de</strong>sejamos. Esta é a condição fun<strong>da</strong>mental <strong>de</strong> todo hom<strong>em</strong>:<br />
ignorância e apetite (ou <strong>de</strong>sejo), o que constitui um solo fértil para o preconceito<br />
e a superstição. Nunca é d<strong>em</strong>ais l<strong>em</strong>brar que, ao apresentar o hom<strong>em</strong> como um<br />
ser que <strong>de</strong>seja, <strong>Spinoza</strong> elimina as possibili<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> um po<strong>de</strong>r absoluto <strong>da</strong> razão<br />
sobre as paixões. E isto t<strong>em</strong> uma importância crucial para sua abor<strong>da</strong>g<strong>em</strong><br />
política. Segundo ele, é impossível suprimir as paixões nos homens, pois os<br />
mesmos são passionais <strong>em</strong> virtu<strong>de</strong> <strong>da</strong> constituição <strong>de</strong> sua própria natureza. No<br />
primeiro capitulo do TP 23 , <strong>Spinoza</strong> se posiciona contra ao que acredita ser uma<br />
perspectiva moral <strong>da</strong> teoria política, ou seja, ver nas paixões uma imperfeição <strong>da</strong><br />
natureza dos homens. Diz ele: “[...]os filósofos conceb<strong>em</strong> as <strong>em</strong>oções que se<br />
combat<strong>em</strong> entre si, <strong>em</strong> nós, como vícios <strong>em</strong> que os homens ca<strong>em</strong> por erro<br />
próprio[...] julgam <strong>de</strong> louvores a uma natureza humana que <strong>em</strong> parte alguma<br />
existe, e atacando através dos seus discursos a que realmente existe.” (TP, Cap.1,<br />
§ 1). Esta passag<strong>em</strong> é comumente interpreta<strong>da</strong> como uma rejeição, por parte <strong>de</strong><br />
<strong>Spinoza</strong>, <strong>de</strong> uma perspectiva moral <strong>da</strong> política, vista como teoria dos <strong>de</strong>veres. A<br />
tese é <strong>de</strong> que <strong>em</strong> <strong>Spinoza</strong>, a perspectiva moral, é substituí<strong>da</strong> pela ética como<br />
teoria <strong>da</strong> potência. Ora, segundo Victor Brochard, não há <strong>de</strong>ver-ser na filosofia<br />
clássica. Para Brochard “[...] a idéia <strong>de</strong> obrigação, <strong>de</strong> <strong>de</strong>ver [...] se olharmos b<strong>em</strong><br />
e prestarmos atenção, está totalmente ausente <strong>da</strong> moral antiga [...] os antigos<br />
jamais conceberam o i<strong>de</strong>al moral sob a forma <strong>de</strong> uma lei ou <strong>de</strong> um<br />
man<strong>da</strong>mento.” 24 Segundo Brochard, foram os mo<strong>de</strong>rnos que, sob influência do<br />
22<br />
Oneto, P. D. <strong>Spinoza</strong> e a passag<strong>em</strong> ao político. Conatus – filosofia <strong>de</strong> <strong>Spinoza</strong>, nº 1, v. I<br />
(2007), p. 75.<br />
23<br />
A morte veio a impedir <strong>Spinoza</strong> <strong>de</strong> terminar o seu tratado político, tendo ficado completos os<br />
<strong>de</strong>z primeiros capítulos, que se refer<strong>em</strong> ao Estado <strong>em</strong> geral, ao soberano, à monarquia e à<br />
aristocracia. O décimo primeiro ficou por acabar, entretanto a partir <strong>da</strong> leitura do TTP, do TP<br />
e <strong>da</strong> Ética, pod<strong>em</strong>os intuir o que <strong>Spinoza</strong> enten<strong>de</strong> por <strong>d<strong>em</strong>ocracia</strong>. É este o esforço do<br />
presente trabalho, constituindo t<strong>em</strong>a específico do segundo capítulo.<br />
24<br />
Brochard, Victor. A moral antiga e a moral mo<strong>de</strong>rna, p.135.<br />
22