O fundamento da democracia em Benedictus de Spinoza - Uece
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Apêndice que <strong>Spinoza</strong> anuncia a transformação do preconceito <strong>em</strong> superstição 39 .<br />
Diz ele: “esse preconceito transformou-se, assim, <strong>em</strong> superstição e criou<br />
profun<strong>da</strong>s raízes <strong>em</strong> sua mente, fazendo com que ca<strong>da</strong> um <strong>de</strong>dicasse o máximo<br />
<strong>de</strong> esforço para compreen<strong>de</strong>r e explicar as causas finais <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as coisas”.(EI,<br />
Ap). Assim, o preconceito único torna-se superstição, fincando suas raízes nas<br />
mentes dos homens.<br />
Para <strong>Spinoza</strong>, ao tentar d<strong>em</strong>onstrar que a natureza na<strong>da</strong> faz <strong>em</strong> vão os<br />
homens parec<strong>em</strong> ter d<strong>em</strong>onstrado apenas que, tal como eles próprios, a natureza<br />
e os <strong>de</strong>uses também <strong>de</strong>liram. Ora, não é difícil perceber que os males ating<strong>em</strong> a<br />
todos (cf. EI, Ap). Mas mesmo diante <strong>de</strong>ste fato vivenciado por todos, os homens<br />
não abandonam a superstição: “Foi-lhes mais fácil, com efeito, colocar essas<br />
ocorrências na conta <strong>da</strong>s coisas que <strong>de</strong>sconheciam e cuja utili<strong>da</strong><strong>de</strong> ignorava [...]<br />
do que <strong>de</strong>struir to<strong>da</strong> essa fabricação e pensar algo novo” (EI, Ap)<br />
Diante <strong>da</strong> cruel reali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> não po<strong>de</strong>r<strong>em</strong> conhecer a causa final <strong>de</strong> tudo,<br />
<strong>de</strong> não po<strong>de</strong>r<strong>em</strong> conhecer a “vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> Deus”, os homens viv<strong>em</strong> uma vi<strong>da</strong> <strong>de</strong><br />
incertezas, uma vi<strong>da</strong> repleta <strong>de</strong> medos. Este vinculo entre medo e superstição,<br />
também está expresso no TTP, on<strong>de</strong> <strong>Spinoza</strong> afirma que “o medo é a causa que<br />
origina, conserva e alimenta a superstição”. Diante <strong>da</strong> precarie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> vi<strong>da</strong><br />
humana o hom<strong>em</strong> se vê assolado pelo medo. Para Santiago, <strong>de</strong> todos os medos, a<br />
morte é o que mais o assombra. A superstição então aproveita <strong>de</strong>sse sentimento<br />
<strong>de</strong>ver <strong>de</strong> culto que se levantou, ca<strong>da</strong> um, conforme seu engenho, inventará seus modos <strong>de</strong><br />
cultuar, seus artifícios para <strong>de</strong>stacar-se, a fim <strong>de</strong> agra<strong>da</strong>r ao dirigente <strong>de</strong> plantão e angariar,<br />
quanto for possível, os benefícios correspon<strong>de</strong>ntes e seus esforços, mesmo que para isso<br />
mundos e fundos, ‘a natureza inteira’ tenha que ser movi<strong>da</strong>”.<br />
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Para Homero (id<strong>em</strong>, 183), [...] a superstição não é só a crença <strong>em</strong> fins, <strong>em</strong> livre-arbítrio, <strong>em</strong><br />
prêmios e castigos; a sua originali<strong>da</strong><strong>de</strong> é a sist<strong>em</strong>atização <strong>de</strong>sses el<strong>em</strong>entos todos, e <strong>de</strong> tudo o<br />
mais que <strong>da</strong>í se possa <strong>de</strong>rivar, numa estrutura (fabrica) do real. [...] A superstição or<strong>de</strong>na o<br />
real, segundo os cânones finalistas, <strong>em</strong> meios e fins; ela é portadora <strong>de</strong> uma inteligibili<strong>da</strong><strong>de</strong> do<br />
real, já que explica por que as coisas são como são, por que o hom<strong>em</strong> é como é; ela promove a<br />
justiça estipulando aos homens um <strong>de</strong>ver e, portanto, uma paga e um <strong>de</strong>stino, conforme cultue<br />
ou negligencie as vonta<strong>de</strong>s divinas.” Assim, com a superstição, os próprios <strong>de</strong>sejos humanos<br />
são sacrificados <strong>em</strong> prol dos <strong>de</strong>sejos divinos. O <strong>de</strong>ver passa a ser cultuar e agra<strong>da</strong>r a Deus, a<br />
vi<strong>da</strong> presente se torna insignificante diante dos ganhos <strong>em</strong> um futuro possível. A inversão é<br />
feita <strong>de</strong> uma forma perversa, pois o resultado <strong>da</strong>quele <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> liber<strong>da</strong><strong>de</strong> foi a <strong>de</strong>scoberta <strong>de</strong><br />
um dirigente do mundo. Assim, o preço <strong>da</strong> ilusão do livre-arbítrio será s<strong>em</strong>pre a servidão.<br />
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