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Revista HUGV 2008 - Hospital Universitário Getúlio Vargas - Ufam

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evistahugv<br />

<strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

The Journal of Getulio <strong>Vargas</strong> University <strong>Hospital</strong><br />

v.7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS<br />

HOSPITAL UNIVERSITÁRIO GETÚLIO VARGAS<br />

Rua Apurinã nº 04 – Praça 14 de Janeiro, Cep: 69020-170 Manaus - AM<br />

Fones: (092) 3621-6582/6519 E-mail: revistahugv@ufam.edu.br<br />

UFAM<br />

FUNDADORES<br />

Ricardo Torres Santana<br />

Jorge Alberto Mendonça<br />

LISTA DO CONSELHO EDITORIAL DA REVISTA <strong>HUGV</strong><br />

EDITOR-CHEFE<br />

Fernando Luiz Westphal Maria Augusta Bessa Rebelo Rosane Dias da Rosa<br />

Kathya Augusta Thomé Lopes<br />

Maria Lizete Guimarães Dabela<br />

LISTA DO CONSELHO CONSULTIVO DA REVISTA <strong>HUGV</strong><br />

Aluísio Miranda Leão<br />

Àngela Delfina B. Garrido<br />

Antonio Carlos Duarte Cardoso<br />

Célia Regina Simoneti Barbalho<br />

Cláudio Chaves<br />

Clemencio Cezar Campos Cortez<br />

Dagmar Keisslich<br />

David Lopes Neto<br />

Domingos Sávio Nunes de Lima<br />

Edson Sarkis Gonçalves<br />

Ermerson Silva<br />

Eucides Batista da Silva<br />

Eurico Manoel Azevedo<br />

Cristina da Melo Rocha<br />

Fernando César Façanha Fonseca<br />

Fernando Luiz Westphal<br />

Gerson Suguyama Nakajima<br />

Ione Rodrigues Brum<br />

Ivan da Costa Tramujás<br />

Jacob Cohen<br />

João Bosco L. Botelho<br />

Julio Mario de Melo e Lima<br />

Kathya Augusta Thomé de Souza<br />

Lourivaldo Rodrigues de Souza<br />

Luís Carlos de Lima<br />

Luiz Carlos de Lima Ferreira<br />

Luiz Fernando Passos<br />

José Correa Lima Netto<br />

Maria Augusta Bessa Rebelo<br />

Maria do Socorro L. Cardoso<br />

Maria Fulgência Costa L. Bandeira<br />

Maria Lizete Guimarães Dabela<br />

Mariano Brasil Terrazas<br />

Neila Falcone Bonfim<br />

Nelson Abrahim Fraiji<br />

Nikeila Chacon de O. Conde<br />

Osvaldo Antônio Palhares<br />

Ricardo Torres Santana<br />

Rosana Cristina Pereira Parente<br />

Rosane Dias da Rosa<br />

Wilson Bulbol<br />

Zânia Regina Ferreira Pereira


evistahugv<br />

<strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

The Journal of Getulio <strong>Vargas</strong> University <strong>Hospital</strong><br />

v.7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA<br />

UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS<br />

HOSPITAL UNIVERSITÁRIO GETÚLIO VARGAS<br />

Copyright© <strong>2008</strong> Universidade Federal do Amazonas/<strong>HUGV</strong><br />

REITOR DA UFAM<br />

Dr. Hidembergue Ordozgoith da Frota<br />

DIRETOR DO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO GETÚLIO VARGAS<br />

Dr. Raymison Monteiro de Souza<br />

PRODUÇÃO GRÁFICA-EDITORIAL: EDUA<br />

DIRETOR DA EDUA<br />

Dr. Renan Freitas Pinto<br />

DIRETORA DA REVISTA<br />

Profª Dayse Enne Botelho<br />

REVISÃO (LÍNGUA PORTUGUESA)<br />

Sergio Luiz Pereira<br />

CAPA<br />

TIRAGEM 300 EXEMPLARES<br />

FICHA CATALOGRÁFICA<br />

Ycaro Verçosa dos Santos – CRB-11 287<br />

R454 <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong>.<br />

<strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Getúlio <strong>Vargas</strong>. V. 6, n. 1-2 (2007) / Manaus: Editora da Universidade<br />

Federal do Amazonas, 2007.<br />

82p.<br />

Semestral<br />

Título da revista em português inglês<br />

ISSN – 1677-9169<br />

1. Medicina-Periódico I. <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong> II. Universidade Federal do<br />

Amazonas.<br />

CDU 61(051)


SUMÁRIO<br />

Editorial .......................................................................................................................................<br />

Fernando Luiz Westphal<br />

9<br />

ARTIGOS ORIGINAIS<br />

1. A medicina na Grécia .....................................................................................................................<br />

2. Medicina no século 19: as bases para uma nova medicina ...............................................................<br />

3. História da medicina na Mesopotâmia ..............................................................................................<br />

4. Manejo prático da ascite ....................................................................................................................<br />

5. Prevalência dos sintomas nasais em pacientes com hanseníase acompanhados na Fundação<br />

Alfredo da Matta ...................................................................................................................................<br />

6. Achados histopatológicos em glândulas tireoideas de necrópsias de adultos jovens habitantes<br />

da região amazônica .........................................................................................................................<br />

7. Alterações gasométricas durante lavado broncoalveolar em um serviço especializado de<br />

broncoscopia de manaus ......................................................................................................................<br />

8. Estudo experimental dos efeitos do óleo-resina de copaíba e do talco (silicato de magnésio<br />

hidratado) na pleura e parênquima pulmonar de ratos .......................................................................<br />

9. Refluxo laringofaríngeo: estudo prospectivo correlacionando achados à videolaringoscopia<br />

e endoscopia digestiva alta ..............................................................................................................<br />

10. Prevenção de fatores causais de doenças osteomusculares em trabalhadores que exercem<br />

atividades na posição sentada .....................................................................................................<br />

11. Avaliação dos protocolos de higiene bucal nas unidades de terapia intensiva de hospitais<br />

públicos e privados ................................................................................................................................<br />

12. Refluxo laringofaríngeo: uma manifestação atípica da doença do refluxo gastroesofágico<br />

clássica ....................................................................................................................................................<br />

13. Rinossinusite crônica em pacientes com lúpus - eritematoso sistêmico .........................................<br />

11<br />

19<br />

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27<br />

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37<br />

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63<br />

69<br />

81<br />

85<br />

REVISÃO DE LITERATURA<br />

14. Ética em pesquisa clínica com seres humanos - Artigo de revisão .................................................<br />

91<br />

RELATO DE CASO<br />

15. Angiomiolipoma renal com trombo tumoral em veia cava inferior: Relato de caso ...................<br />

16. Nódulo testicular maligno submetido à cirurgia preservadora de órgão – Relato de caso e<br />

Revisão de literatura ..............................................................................................................................<br />

17. Lesão de traqueia mediastinal por arma de fogo: Relato de caso ...................................................<br />

18. Complicação tardia da cirurgia de Bentall-Debono: Relato de caso ..............................................<br />

97<br />

101<br />

107<br />

113


6<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


CONTENTS<br />

Editorial.................................................................................................................................................<br />

9<br />

ORIGINAL ARTICLES<br />

1. The medicine in greece.................................................................................................................<br />

2. Medicine in century xix: The bases for a new medicine.............................................................<br />

3. History of medicine in mesopotamia...........................................................................................<br />

4. Management of practical ascites.................................................................................................<br />

5. Prevalence of nasal symptoms in leprosy patients in follow-up at alfredo da matta<br />

foundation........................................................................................................................................<br />

6. Histopatological findigns in thyroid glands from autopsy of young adults from Amazonia<br />

7. Gasometries alterations during bronchoalveolar lavage in especialized service of Manaus..<br />

8. Evaluation of the pleuropulmonary alterations after injection of copaiba oil and talc in the<br />

pleural space of mice – an experimental study...............................................................................<br />

9. laringopharingeal reflux: Prospective study that compares videolayngoscopy and upper<br />

endoscopy finds...............................................................................................................................<br />

10. Prevention of causal factors of musculoskeletal diseases in workers engaged in activities in<br />

the sitting position............................................................................................................................<br />

11. Evaluation of the protocols of oral hygiene in the intensive care units of public and private<br />

hospitals............................................................................................................................................<br />

12. Laryngopharyngeal reflux: An atypical manifestation of classic gastroesophageal reflux<br />

disease................................................................................................................................................<br />

13. Chronic rhinosinusitis in systemic lupus – erythematosus patients.........................................<br />

11<br />

19<br />

23<br />

27<br />

33<br />

37<br />

43<br />

49<br />

57<br />

63<br />

69<br />

81<br />

85<br />

LITERATURE REVIEW<br />

14. ethics in clinical research with human beigns – revision article..............................................<br />

91<br />

CASE REPORT<br />

15. Renal angiomyolipoma with inferior vena cava tumour thrombus: Case report...................<br />

16. Malign testicular nodule underwent to organ´s preservative surgery: case report and<br />

literature review...............................................................................................................................<br />

17. Mediastinal trachea injury by firearm: Case report..................................................................<br />

18. Later complication after bentall-de bono procedure: Case report..........................................<br />

97<br />

101<br />

107<br />

113<br />

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v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


EDITORIAL<br />

A <strong>Revista</strong><strong>HUGV</strong> encontra-se em seu sétimo ano de existência e a partir do ano de 2007 nós<br />

conseguimos disponibilizá-la na Internet, no sítio da Universidade Federal do Amazonas, localizado<br />

no setor de Hospitais. Este importante passo fez com que todos os artigos publicados nesta <strong>Revista</strong><br />

pudessem ser acessados na Internet, aumentando a visibilidade deste periódico.<br />

Sem dúvida, o estágio atual da <strong>Revista</strong> <strong>HUGV</strong> é considerado baixo em relação a periódicos<br />

que estão indexados na base de dados do Scielo e Medline, mas estamos indexados no ISSN. Devemos<br />

por obrigação estar permanentemente atentos, pois o conquistado pode ser facilmente perdido na<br />

ausência de trabalho focado e por desatenção. Devemos lembrar as causas para o desaparecimento<br />

das <strong>Revista</strong>s científicas, que muito provavelmente, envolve a interrupção da publicação,<br />

irregularidades na peridiocidade, má qualidade da produção publicada e ausência de artigos para<br />

serem publicados.<br />

A Coordenação de Ensino e Pesquisa editou através da Coordenação de Residência Médica a<br />

portaria que estimula o residente a publicar um artigo na <strong>Revista</strong><strong>HUGV</strong> como autor principal ou<br />

dois artigos como co-autores e, com isto ficar isento de apresentar a Monografia de conclusão do<br />

curso. Esta ação propiciou a apresentação de mais artigos ao Conselho Editorial ajudando a<br />

manutenção da <strong>Revista</strong>. Outra ação desenvolvida por esta Coordenação foi o Residente Publica, no<br />

qual um dos coordenadores realiza reuniões com os residentes ensinando-os os passos de confecção<br />

de um artigo científico, desde a pergunta ao qual se pretende responder, até a contextualização<br />

efetiva do trabalho.<br />

Um dos fatores importantes de inclusão e manutenção da <strong>Revista</strong><strong>HUGV</strong> na base de dados<br />

Qualis é a publicação de trabalhos científicos de produções realizadas em Programas de Pós-<br />

Graduações . Neste momento, faço um veemente apelo aos coordenadores dos programas de pósgraduação<br />

da Universidade Federal do Amazonas para que enviem seus trabalhos para a nossa<br />

<strong>Revista</strong>, pois sabemos da existência de diversos trabalhos de conclusão de Mestrado que ficam nas<br />

prateleiras das bibliotecas sem publicações, determinando uma diminuição na avaliação do Curso de<br />

Pós-Graduação pela CAPES.<br />

As metas a serem cumpridas por nossa <strong>Revista</strong><strong>HUGV</strong> são:<br />

1. Manter a qualidade do conteúdo: o mérito científico de um jornal é a qualidade primária<br />

considerada na seleção para indexação. Aspectos como a originalidade dos artigos, sua importância<br />

e validade dentro do campo de conhecimento, são elementos chave para a aceitação de uma revista.<br />

2. Qualidade do trabalho editorial: a revista deve mostrar características que contribuam para<br />

a objetividade, credibilidade e qualidade de seu conteúdo.<br />

3. Qualidade da produção: aspectos como a qualidade da impressão,<br />

4. Tipos de conteúdo: Diferentes tipos de jornais são avaliados para indexação no MEDLINE,<br />

tais como os que publicam pesquisas originais, observações clínicas, revisões, descrições de métodos,<br />

análises de aspectos éticos e filosóficos, etc.<br />

Um outro aspecto importante a ser ressaltado é o papel dos revisores, que não recebem<br />

remuneração e a confecção de um parecer toma tempo das suas obrigações de trabalho e, mais<br />

importante, dos seus momentos de lazer. Com freqüência uma revisão exige a consulta de bibliografia<br />

complementar e a busca ativa de artigos adicionais. A complexidade de questões metodológicas e<br />

testes estatísticos também pode exigir discussão do manuscrito com outros colegas especializados<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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nessas áreas. Além disso, todo esse processo deve ocorrer em tempo hábil, idealmente dentro de um<br />

mês após a primeira submissão, e de duas semanas para as demais apresentações.<br />

Ainda que alguns dos caminhos tomados ao longo dessa trajetória tenham se mostrado<br />

equivocados, o balanço final foi muito positivo. Além disso, a experiência nos ensina que devemos<br />

ser humildes para tomarmos novas rotas quando necessário.<br />

Nesta fase que se encerra, quero agradecer sinceramente a todos aqueles que vêm colaborando<br />

constantemente com a nossa publicação, atuando como revisores ou submetendo artigos para possível<br />

publicação. Não poderia ainda deixar de reconhecer o excelente trabalho exercido pelos funcionários<br />

da Coordenação de Ensino e Pesquisa e pela Editora da Universidade Federal do Amazonas. Para<br />

os próximos números espero continuar a contar com o indispensável apoio de todos vocês.<br />

Prof. Dr. Fernando Luiz Westphal<br />

Coordenador de Ensino e Pesquisa do <strong>HUGV</strong><br />

Editor Chefe da <strong>Revista</strong><strong>HUGV</strong><br />

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v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


RODOLFO FAGIONATO, MELKA FRANCO GUIMARÃES, NAIÁ DANTAS CARVALHO, RAFAEL LEÔNIDAS C. ABREU, VÂNGELIS BASÍLIO REBELO<br />

A MEDICINA NA GRÉCIA<br />

THE MEDICINE IN GREECE<br />

Rodolfo Fagionato*, Melka Franco Guimarães ** , Naiá Dantas Carvalho**,<br />

Rafael Leônidas C. Abreu**, Vângelis Basílio Rebelo **<br />

RESUMO: Sabe-se muito sobre a história e cultura gregas, nada melhor sabermos um pouco mais também sobre a<br />

Medicina na antiga Grécia. Não há dúvidas de que herdamos um grande conhecimento médico dos gregos, até<br />

porque o Pai da Medicina foi Hipócrates. Muitas teorias sobre saúde e doença surgiram durante o crescimento do<br />

conhecimento médico na Grécia, e muitos médicos e filósofos entraram em conflito sobre seus conhecimentos,<br />

como, por exemplo, o dos quatro humores. Saber da saúde e da doença sempre foi importante para as pessoas, e<br />

era por isso que médicos expunham seus conhecimentos aos leigos, tentavam não só curá-los, mas também ensinálos<br />

a se tratar e evitar doenças. Neste trabalho descreveremos os pontos mais importantes a respeito da antiga<br />

Medicina grega.<br />

ABSTRACT: We have know a lot about Greece historian and culture, nothing better know a little more also about<br />

the Medicine in ancient Greec. There is no doubt that we inherited a great medical knowledge of the Greeks, up<br />

to because the father of the Medicine was Hipocrates. Many theories about health and disease have emerged<br />

during the growth of the medical knowledge in Greece, many doctors and philosophers clashed on his knowledge,<br />

for example, the four humours. Knowledge of the health and of the disease has always been important to people,<br />

and it was therefore which doctors were exposing his knowledges to the laymen, they were not only trying to<br />

cure them, but also teach them to treat and prevent diseases. This work describes the most important points<br />

about the ancient Greek Medicine.<br />

INTRODUÇÃO<br />

Como se sabe, a Grécia deixou muitos conhecimentos<br />

culturais e históricos para a população<br />

atual; não menos importante, deixou também<br />

muitas teorias a respeito da saúde e da doença e a<br />

sua relação com a natureza. Na falta de conhecimentos<br />

mais aprofundados e de técnicas de análise<br />

para diagnósticos de doenças, ficava difícil para<br />

os gregos se aprofundarem na tentativa de achar<br />

uma cura para as doenças, e era por isso que eles<br />

utilizavam a técnica do experimento em que manipulavam<br />

vários medicamentos até que achassem<br />

um que servia para a cura.<br />

Neste trabalho serão apresentados os diversos<br />

conhecimentos da época a respeito da Medicina,<br />

como os filósofos, os médicos e como as pessoas<br />

se comportavam diante de uma doença, e<br />

também a evolução do médico como uma especialização,<br />

como era visto pela população e se tinha<br />

reconhecimento para a época.<br />

1. GRÉCIA ANTIGA<br />

Costuma-se dividir didaticamente a história<br />

da Grécia em quatro períodos. Inicialmente, dos<br />

séculos 20 a 12 a.C., foi denominado de Préhomérico,<br />

onde ocorreu a invasão dos povos arianos<br />

através da península balcânica, dessa forma<br />

povoando aquela região. Aqueus, jônios, eólios e<br />

dórios chegaram à região grega em sucessivas vagas<br />

de ocupação fundando, dentre várias cidades,<br />

Trinto e Micenas. Logo após, entraram em<br />

contato com os habitantes de Creta, surgindo a<br />

*<br />

Mestre e professor substituto da disciplina História da Medicina da Faculdade de Medicina da <strong>Ufam</strong>.<br />

** Acadêmicos do curso de Medicina da <strong>Ufam</strong>.<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

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A MEDICINA NA GRÉCIA<br />

civilização creto-micênica. Por volta de 1700 a.C.,<br />

contudo, ocorreu um enorme crescimento<br />

populacional, iniciando uma expansão marítima<br />

e entrando em choque com a talassocracia<br />

cretense, da qual Creta saiu, com sua maior cidade,<br />

Cnossos, destruída.<br />

A expansão micênica continuou pelo mar<br />

Egeu, como conta a obra Ilíada, de Homero, até a<br />

chegada dos dórios os quais arrasam Micenas provocando<br />

a primeira diáspora grega em direção à<br />

Ásia Menor. As populações que passaram a viver<br />

ainda na Grécia, mesmo isoladamente, formaram<br />

grupos familiares chamados de genos, finalizando<br />

esse período.<br />

A partir daquele momento, dos séculos 12<br />

a 8 a.C., chamado de período Homérico, ocorreu<br />

uma continuidade dos genos, uma primitiva unidade<br />

econômica, social, política e religiosa dos gregos,<br />

onde toda família vivia sob autoridade do<br />

pater-familias, patriarca; os bens de produção e o<br />

trabalho eram coletivos.<br />

Nos fins desse período, famílias cresciam,<br />

mas a produção agrícola não acompanhava o mesmo<br />

ritmo, em função da falta de terras férteis e de<br />

técnicas de produção mais avançadas. Iniciou-se<br />

uma desintegração das comunidades gentílicas,<br />

onde os patres favoreciam territorialmente seus<br />

parentes mais próximos, eupátridas.<br />

Os eupátridas monopolizavam o poder político,<br />

organizando-se em grupos chamados de<br />

fratrias que futuramente originariam cidades-Estados<br />

chamadas de poleis.<br />

Já no período Arcaico, entre os séculos 8 a 6<br />

a.C., teve início uma expansão, segunda diáspora<br />

grega, que culminou com a ocupação e colonização<br />

de várias regiões da bacia do Mediterrâneo,<br />

por causa da desintegração dos genos, o crescimento<br />

da população, a busca de oportunidades e o desenvolvimento<br />

da navegação. Nesse período, Atenas<br />

e Esparta ganharam bastante importância graças<br />

às suas influências regionais.<br />

Esparta surgiu na planície da Lacônia, na<br />

península do Peloponeso. Esta cidade-Estado não<br />

diferia muito das outras gregas, ou seja,<br />

oligárquica, militarista e escravocrata. O afluxo de<br />

uma grande quantidade de escravos, propriedade<br />

estatal, foi motivado pelas conquistas da vizinhança,<br />

gerando um problema vital em Esparta: conservar<br />

a proporção entre o número de espartiatas<br />

e o de hilotas, escravos. Por isso, sua educação era<br />

baseada no laconismo e na xenofobia, a fim de evitar<br />

ideias inovadoras, consideradas subversivas<br />

para o sistema espartano.<br />

Atenas surgiu na Ática, uma península grega<br />

que se estende pelo mar Egeu. Fundada por arianos,<br />

possuía um excelente porto natural, mas não<br />

muitas terras aráveis. Dessa forma, Atenas se voltou<br />

mais para o comércio, a qual se tornou um grande<br />

centro no Mediterrâneo. Comerciantes e industriais,<br />

não-eupátridas, começaram a emancipar-se,<br />

iniciando uma oposição ao regime oligárquico,<br />

acarretando uma crise em Atenas.<br />

A fim de solucionar essa crise, foi estabelecido<br />

padrão monetário fixo, promovido um sistema<br />

de participação política com base na riqueza<br />

do indivíduo, estimulado o comércio e a indústria<br />

e abolido a escravidão por dívidas.<br />

Mesmo assim, não se conseguiu contentar<br />

todas as reivindicações populares nem atender a<br />

conservadora aristocracia; por fim, se implantou a<br />

democracia efetiva para os cidadãos, o que incluía<br />

direitos políticos a eles, ou seja, participação política<br />

direta no governo. Isso significou o início da<br />

consolidação de Atenas dentro da Hélade.<br />

Baseado nessa consolidação ateniense na<br />

Hélade e no domínio espartano no Peloponeso, inicio-se,<br />

entre os séculos 5 e 4 a.C., o período Clássico,<br />

caracterizado pela disputa da supremacia das<br />

polis sobre toda a Grécia. Essa fase foi marcada<br />

pelas hegemonias e imperialismos no mundo grego,<br />

que acabaram em uma guerra fratricida entre<br />

os próprios gregos, culminado em sua decadência.<br />

Esse imperialismo foi iniciado por Atenas,<br />

depois de ter alcançado prestígio com a vitória nas<br />

guerras médicas sobre a Pérsia, obrigaram os Estados<br />

membros da Confederação de Delos a pagarem<br />

impostos, mesmo com o fim dos conflitos, pois<br />

Atenas passava por uma crise econômica e social<br />

gerada pela guerra. Era o início da hegemonia<br />

ateniense e esplendor sobre a Hélade.<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


RODOLFO FAGIONATO, MELKA FRANCO GUIMARÃES, NAIÁ DANTAS CARVALHO, RAFAEL LEÔNIDAS C. ABREU, VÂNGELIS BASÍLIO REBELO<br />

Atenas, contudo, desrespeitava o princípio<br />

da soberania das cidades e passou a criar uma série<br />

de inimigos. Essas cidades marginalizadas ligaram-se<br />

a Esparta e fundaram a Liga do<br />

Peloponeso, hostil à Confederação de Delos. Em<br />

431 a.C. Atenas tentou se apropriar de uma colônia<br />

de Esparta, isso culminou com a Guerra do<br />

Peloponeso que durariam 27 anos, deixando exaurida<br />

a Grécia.<br />

Apesar da decadência grega, sua cultura se<br />

perpetuou influenciando outros impérios antigos<br />

e civilizações contemporâneas. A filosofia, por<br />

exemplo, foi um dos pontos mais importantes do<br />

qual se perpetuou na Grécia, pois influenciou<br />

muitos ramos profissionais, até os dias atuais, inclusive<br />

na Medicina, já que muitos filósofos, por<br />

empirismo, acreditavam que algumas das enfermidades<br />

eram meramente psicológicas.<br />

2. A FILOSOFIA GREGA NA MEDICINA<br />

Os filósofos gregos foram os fundadores da<br />

ciência ocidental. Esse fato está diretamente relacionado<br />

à Medicina grega e à própria Medicina<br />

ocidental como sua herdeira.<br />

A ciência nasce da tentativa de explicar as<br />

coisas da natureza nela própria, sem o intermédio<br />

do mito. O pensamento racional se inicia, então,<br />

tendo a physis, ou seja, aquilo que surge de si mesmo,<br />

como modelo para explicar a “origem, ordem<br />

e transformações da Natureza”.<br />

Para entender melhor a influência do pensamento<br />

grego no surgimento da Medicina é preciso,<br />

antes, abordar o surgimento de alguns conceitos<br />

sobre os quais a Medicina hipocrática se sustenta.<br />

A Medicina se separa da filosofia como ciência<br />

no século 4 a.C. Enquanto isso, as discussões<br />

filosóficas dos períodos pré-socrático e socrático,<br />

períodos que abrangem o intervalo de tempo entre<br />

o amadurecimento do pensamento racional e o<br />

desmembramento da Medicina, são fundamentais<br />

para os conceitos médicos gregos.<br />

O período pré-socrático, também denominado<br />

cosmológico, ocorre entre o final do século 7<br />

e o final do século 5 a.C. Os filósofos desse período<br />

encontram diferentes physis e dão diferentes<br />

razões para que estas sejam o elemento primordial,<br />

eterno e imutável que está na origem das coisas.<br />

Os debates pré-socráticos são também fundamentais<br />

para o surgimento do pensamento crítico<br />

por meio da discussão de diversos pontos e opiniões<br />

sobre os assuntos.<br />

O elemento formador da natureza se encontra<br />

na própria natureza; dessa forma, para Tales<br />

de Mileto (640 a.C.), a physis era a água. Para<br />

Anaximandro (555 a.C.), esta se encontrava no ilimitado,<br />

e para Anaxímenes (535 a.C.), no ar. Já no<br />

século 5, Heráclito diz que esta era o fogo e<br />

Empédocles a água, o ar, a terra e o fogo. Dessas<br />

diferentes physis surge a divisão dos elementos terra<br />

e sólido, água e líquido, ar e gás, fogo e energia<br />

que fará parte de teorias médicas.<br />

O período socrático ou antropológico ocorre<br />

do final do século 5 até o final do século 4 a.C., e<br />

nesse período os filósofos se ocupam com as questões<br />

humanas, com a ética, a política e as técnicas,<br />

como a Medicina. Para Sócrates, a filosofia tem um<br />

fim prático e moral sendo a ciência que resolve o<br />

problema da vida. E nesse período a filosofia parte<br />

do conhecimento empírico para alcançar o intelectual,<br />

que é imutável.<br />

Durante a racionalização do pensamento, a<br />

doença passa a ser vista como resultado do<br />

desequilíbrio da natureza e separada dos fenômenos<br />

sobrenaturais. A physis entra na Medicina estabelecendo<br />

a dinâmica da existência e da essência<br />

(entre se algo é ou não é e o que é), que ocorre<br />

entre a doença e o corpo. Nisso, a saúde surge como<br />

um equilíbrio entre as forças opostas (úmido e seco,<br />

por exemplo) e a doença do domínio de uma força<br />

sobre a outra. O corpo humano, e tudo à sua volta,<br />

era, dessa forma, compreendido entre esses elementos<br />

(as diversas physis).<br />

A Medicina, já na época dos gregos, estava<br />

definida como especialização social, e no final do<br />

século 5, era conhecida e íntima do pensamento<br />

helênico. 1<br />

Os gregos, que sempre foram politeístas e<br />

extremamente religiosos, começaram a diminuir<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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A MEDICINA NA GRÉCIA<br />

a influência dos deuses em seus diagnósticos e curas,<br />

não pondo mais a responsabilidade de um erro<br />

ou acerto em vontades divinas. 1<br />

Já se começavam a produzir textos a fim de<br />

suprir leitores leigos e os não-leigos, sendo estes<br />

os médicos da sociedade. Os médicos, para reforçar<br />

seu valor diante da população, começaram a<br />

expor suas ideias em relação à saúde e à doença<br />

em forma de conferência e discurso preparado. 1<br />

Havia uma escola para médicos na Grécia,<br />

a Escola de Cós, onde médicos e filósofos se encontravam<br />

e discutiam sobre a Medicina; às vezes<br />

os filósofos concordavam com os médicos, mas às<br />

vezes havia séria discordância, como no caso em<br />

que a saúde e a doença são o resultado do equilíbrio<br />

ou desequilíbrio dos quatro humores dos quais<br />

éramos feitos: sangue, fleuma, bílis amarela e bílis<br />

preta. Hipócrates, que era reconhecido como grande<br />

médico, discordava desse pensamento; para ele,<br />

o nosso corpo é feito de muito mais substâncias do<br />

que apenas quatro. Segundo Hipócrates, a saúde e<br />

a doença são resultados de todas as forças que atuam<br />

sobre os organismos, e havendo um<br />

desequilíbrio oposto de uma dessas forças resultaria<br />

em doença. 1<br />

Se pararmos para analisar essas afirmações,<br />

veremos que os gregos têm crédito por terem pensado<br />

isso há muito tempo, quando não havia recursos<br />

tecnológicos para pesquisas, tirando suas<br />

conclusões e teorias apenas da observação da natureza.<br />

Hoje, sabemos que realmente a nossa saúde<br />

depende de um equilíbrio complexo entre os<br />

líquidos e substâncias corporais, por exemplo: para<br />

se fazer um diagnóstico de uma infecção, analisase<br />

o sangue e verifica-se se os diferentes constituintes<br />

estão de acordo com o considerado normal<br />

para o organismo; se não estiver, significa que há<br />

um desequilíbrio entre essas substâncias e que<br />

estamos doentes, afirmando assim, de um modo<br />

generalizado, a teoria de Hipócrates sobre o equilíbrio<br />

de forças. 1<br />

A tendência do pensamento grego em agrupar<br />

em classificações gerais o conjunto e ordenar<br />

em grupos ficou exemplificado no livro Das Doenças<br />

Sagradas, de autor desconhecido. O livro estudava<br />

as manifestações patológicas das doenças que<br />

causavam alterações no comportamento, quase<br />

como quadros clínicos e sintomas das patologias. 1<br />

A Medicina grega já tinha o conhecimento<br />

do problema da multiplicidade das doenças e a<br />

possibilidade de teorizar e numerar para estabelecer<br />

o número exato dos tipos patológicos. Foram<br />

elaboradas normas para a conservação da saúde<br />

do homem. As práticas do esporte, da música e do<br />

lazer foram vinculadas como formas de tratamento.<br />

1<br />

No livro Das Epidemias, produzido pela Escola<br />

de Cós, a arte do médico consiste em eliminar<br />

o que causa dor e em sarar o homem, afastando o<br />

que o faz sofrer. Quando a natureza falha nessa<br />

missão, o médico é aquele que irá intermediar na<br />

cura. A ação médica é associada com as recomendações<br />

da qualidade e quantidade da dieta, da prática<br />

de esportes e de atividades culturais. Segundo<br />

os conceitos platônicos, o médico e o filósofo teriam<br />

a mesma função no tratamento da alma do homem,<br />

sempre na busca da harmonia plena do homem.<br />

1 Com o aparecimento da literatura médica,<br />

normas que devem ser obedecidas para a conservação<br />

da saúde foram estabelecidas. A manutenção<br />

da saúde ocorreria pela dieta adequada, pelo<br />

exercício físico contínuo e pela higiene do corpo.<br />

Os médicos passaram a atuar também no homem<br />

com objetivo educativo e profilático. 1<br />

Os hospitais construídos nesse período,<br />

como o de Epidauro, eram grandes e tinham múltiplas<br />

divisões destinadas a diferentes atividades<br />

dos médicos. Havia salas de exame, alojamentos<br />

individuais para os doentes, salas de banho coletivo,<br />

praça de esportes e anfiteatro para apresentações<br />

de teatro e música. 1<br />

Houve críticas a essas tentativas de intervenção<br />

no modo de vida das pessoas. Platão e<br />

Aristóteles diziam que havia muita gente que, embora<br />

gozasse de saúde, não poderia se considerar<br />

feliz, pois mantinham a força porque se privavam<br />

das coisas agradáveis. 1<br />

A Medicina e a filosofia gregas, entre os<br />

séculos 5 e 3, estabeleceram um sistema ordenado<br />

14<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


RODOLFO FAGIONATO, MELKA FRANCO GUIMARÃES, NAIÁ DANTAS CARVALHO, RAFAEL LEÔNIDAS C. ABREU, VÂNGELIS BASÍLIO REBELO<br />

com o objetivo de melhorar a saúde coletiva, pelo<br />

menos entre os homens livres e desenvolveram a<br />

compreensão do papel social do médico como<br />

agente na busca da saúde. 1<br />

3. A MEDICINA E A MITOLOGIA GREGA<br />

A mitologia grega influenciou a prática<br />

médica no Ocidente durante mais de vinte séculos<br />

depois da sua elaboração. A compreensão da Medicina,<br />

como sendo de natureza sagrada, não foi<br />

diferente da babilônica e da grega. As relações<br />

médicas com as ideias e crenças religiosas se perderam<br />

no tempo. 1<br />

De acordo com a mitologia grega, a Medicina<br />

começou com Apolo, filho da união de Zeus<br />

com Leto. Nos primeiros tempos, ele era considerado<br />

como o deus protetor dos guerreiros. Posteriormente,<br />

foi identificado como Aplous, aquele que<br />

fala a verdade. Apolo atuava purificando a alma<br />

por meio das lavagens e aspersões do corpo com<br />

remédios curativos. 1 Apolo era conhecido como o<br />

deus da cura e das doenças. Pai de Asclépio ou<br />

Esculápio, era venerado junto com este em grandes<br />

templos-hospitais, onde se curavam várias<br />

doenças. 6<br />

Asclépio, filho de Apolo e da ninfa Coronis,<br />

teria sido educado pelo centauro Quirão para ser<br />

médico. 1 Zangado porque Coronis era infiel a ele,<br />

Apolo matou-a e arrancou o nascituro Asclépio de<br />

seu ventre. 8 O fato de Apolo ter tirado o filho do<br />

ventre da mãe no momento em que esta se encontrava<br />

na pira funerária, confere-lhe o simbolismo<br />

de deus da Medicina logo à nascença: a vitória da<br />

vida sobre a morte. 7 A escolha de Quirão para dirigir<br />

a educação de Asclépio foi feita porque o<br />

centauro dominava o completo conhecimento da<br />

música, magia, adivinhações, astronomia e da<br />

Medicina. Além dessas habilidades, possuía incomparável<br />

destreza e manejava com a mesma<br />

habilidade o bisturi e a lira. Foi o primeiro que plantou,<br />

na Tessália, plantas medicinais e a primeira<br />

delas foi a denominada Gentiana centaurium. 1<br />

Asclépio conquistou fama inimaginável, tinha<br />

delicadeza do tocador de harpa e a habilidade<br />

agressiva do cirurgião. Todos os doentes, que não<br />

obtinham cura em outros lugares, procuravam os<br />

serviços de Asclépio. Mais cirurgião que médico,<br />

ele criou as tiras, as ligaduras e as tentas para drenar<br />

as feridas. Chegou a ressuscitar mortos e, por<br />

essa razão, Zeus o matou com o auxílio do raio<br />

mortal dos Ciclopes. 1 Zeus temia que Asclépio pudesse<br />

ser uma ameaça à ordem natural das coisas. 8<br />

O deus da Medicina era celebrado em grandes<br />

festas públicas, em torno do dia 18 de outubro.<br />

1 E o culto que lhe era prestado não só tinha<br />

um fim religioso, mas também terapêutico. Os santuários,<br />

dos quais o mais célebre foi Epidauro, eram<br />

instalados fora das cidades, em zonas escolhidas<br />

pela sua salubridade. Os sacerdotes transmitiam<br />

os segredos da cura de pai para filho. Um dos mais<br />

ilustres teria sido Hipócrates, que se dizia ser aparentado<br />

com o deus. Os doentes, que afluíam de<br />

todas as partes do mundo antigo e que pertenciam<br />

a todos os grupos sociais, eram alojados nas dependências<br />

do templo e, durante o seu sonho, reviam<br />

o deus, que lhes revelava o remédio para os<br />

seus males. 10 Seus segredos na arte da Medicina<br />

eram preservados nas ilhas gregas de Kós e Kithnos<br />

por sacerdotes. 9 Em várias esculturas procedentes<br />

de templos de Asclépio greco-romanos, o deus da<br />

Medicina é sempre representado segurando um<br />

bastão com uma serpente em volta, o qual se tornou<br />

o símbolo da Medicina. 11<br />

A certa altura da sua vida casou com a filha<br />

do rei de Cós, Epíone, que lhe deu dois filhos e<br />

cinco filhas. Os rapazes, Macáon e Podalírio, herdaram<br />

do seu pai o poder de curar. Fizeram-no,<br />

por exemplo, no decorrer da guerra de Troia, da<br />

qual participaram como médicos das tropas gregas.<br />

Macáon cuidou de Télefo e de Menelau e operou<br />

Filoctetes. As filhas de Asclépio também o ajudaram<br />

na sua função, particularmente Hígia, deusa<br />

da Medicina, e Panaceia, que personifica a cura<br />

de todos os males por meio das plantas. 10<br />

Muitos achados arqueológicos de agradecimentos<br />

a dádivas atribuídas pelos próprios doentes,<br />

que se consideravam curados pelo poder<br />

de Asclépio, foram encontrados. Várias escrituras<br />

contendo nomes dos doentes, as descrições das<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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A MEDICINA NA GRÉCIA<br />

doenças e curas obtidas. 1 A maior parte das escrituras,<br />

porém, refere-se a curas milagrosas e fantásticas,<br />

sem dúvida para impressionar outros<br />

pacientes e motivá-los em busca de cura, e tendo<br />

assim escasso valor do ponto de vista médico.<br />

Grande número de pacientes, contudo, experimentava<br />

melhoras e muitos se consideravam curados.<br />

2 Em qualquer caso, e apesar do valor que<br />

possam ter atingido os conhecimentos médicos dos<br />

sacerdotes de Asclépio e a eficiência terapêutica<br />

de sua atuação, o certo é que a iniciação da Medicina<br />

científica teve suas bases na escola filosófica e<br />

médica da antiga Grécia. 2<br />

CONCLUSÃO<br />

É interessante pensar que mesmo numa<br />

época antiga, onde não existia tecnologia disponível<br />

como hoje, os gregos fizeram grandes progressos<br />

não só em relação à ciência como também na<br />

Medicina. Sabe-se, por exemplo, que a teoria dos<br />

quatro humores na época já não era bem-aceita,<br />

mas que sua essência de que o equilíbrio ou<br />

desequilíbrio dos humores corporais em relação à<br />

saúde ou doença é bem-vista, já que o diagnóstico<br />

de uma doença feita atualmente é realizado tirando-se<br />

como base um equilíbrio entre os metabólitos<br />

do organismo.<br />

1973, para o curso de Introdução à História da<br />

Ciência, do Mestrado em Ensino, História e Filosofia<br />

das Ciências, UFBA/UEFS, 2000.<br />

5. <strong>Revista</strong> eletrônica Graecia Antiqua ISSN 1679-<br />

5709 – Breve introdução à Grécia Antiga – Wilson<br />

A. Ribeiro Jr. Disponível em: <br />

6. <br />

7. <br />

8. <br />

9. <br />

10. <br />

11. <br />

ANEXOS<br />

Ilustração 1 – Mapa da Grécia antiga<br />

REFERÊNCIAS<br />

1. BOTELHO, J. B. História da Medicina – da<br />

abstração à materialidade. Manaus: Valer, 2004.<br />

2. SOUSA, A. T. de. Curso de História da Medicina:<br />

das origens aos fins do século XVI. 2. a ed.<br />

Lisboa: Gulbenkian, 1996.<br />

3. CHAUI, M. S. Convite à filosofia. São Paulo:<br />

Ática, 1999.<br />

4. Resumão feito por Osvaldo Pessoa Jr. dos livros<br />

de G. E. R. Lloyd, Early Greek Science:<br />

Thales to Aristotle (EGS) e Greek Science after<br />

Aristotle (GSA). Norton, Nova Iorque, 1970 e<br />

Fonte: http// www.greeka.com/greece-maps/ancient-greece-map.htm<br />

16<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

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RODOLFO FAGIONATO, MELKA FRANCO GUIMARÃES, NAIÁ DANTAS CARVALHO, RAFAEL LEÔNIDAS C. ABREU, VÂNGELIS BASÍLIO REBELO<br />

Ilustração 2 – Apolo<br />

Ilustração 3 – Os quatro humores<br />

Fonte: http://www.accionchilena.cl/images/Apolo.gif<br />

Fonte: http://usuarios.cultura.com.br/jmrezende/temperamento.gif<br />

Ilustração 4 – Asclépio<br />

Ilustração 5 – Hígia<br />

Fonte: http://es.geocities.com/el_verbo_crea/dioses/esculapio.jpg<br />

Fonte: pt.wikipedia.org/wiki/higia<br />

revistahugv<br />

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v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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A MEDICINA NA GRÉCIA<br />

Ilustração 6 – Prática da sangria<br />

Ilustração 7 – Devoto de Asclépio.<br />

Fonte: www.tiosam.com/enciclopedia/?q=medicina<br />

Fonte: http://www.scielo.br/img/fbpe/hcsm/v6n2/v6n2a9f6.jpg<br />

Ilustração 8 – Asclépio cuidando de um paciente.<br />

Correspondência dos autores:<br />

Contato: E-mail: melkafranco@hotmail.com ou<br />

vangelisrebelo@msn.com. Telefones: 9962-6939<br />

ou 8131-9999. Instituição: <strong>Ufam</strong> – Manaus.<br />

Fonte: http://mural.uv.es/dosagar/griega8.jpg<br />

18<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


RODOFO FAGIONATO, ANA PAULA SOUSA DA SILVA, FERNANDO HENRIQUE DA SILVA, LYGIA DE OLIVEIRA PEREIRA, RENATO MORAIS DA SILVA<br />

MEDICINA NO SÉCULO XIX: AS BASES PARA UMA<br />

NOVA MEDICINA<br />

MEDICINE IN CENTURY XIX: THE BASES FOR A NEW MEDICINE<br />

Rodolfo Fagionato*, Ana Paula Sousa da Silva**, Fernando Henrique da Silva**,<br />

Lygia de Oliveira Pereira**, Renato Morais da Silva**<br />

RESUMO: O avanço no tratamento das doenças e a melhoria das técnicas cirúrgicas caracterizaram a Medicina do<br />

século XIX. O fato principal responsável por tudo isso foi a descoberta de quais microrganismos patogênicos eram<br />

causadores das enfermidades. Essa descoberta também propiciou a criação de vacinas, além de métodos para<br />

melhoria da saúde pública. Este artigo tem por objetivo mostrar como a Medicina era aplicada durante o século 19<br />

e o que possibilitou sua evolução.<br />

ABSTRACT: The diseases treatment advance and the surgical techniques improvement characterized the medicine<br />

of the 19 th century. The main fact responsible for all that was the discovery of pathogenic microorganisms that<br />

caused the diseases. This discovery also propitiated creation of vaccines and methods for public health<br />

improvement. This article aims to show how the medicine was applied during the 19 th century and what allowed<br />

its evolution.<br />

O século XIX foi marcado pelo desvendar das<br />

doenças infecciosas, possibilitando a modernização<br />

da Medicina<br />

No início do século XIX suspeitava-se de<br />

que doenças infecciosas eram causadas por microrganismos<br />

específicos. Essa visão das causas<br />

das doenças contagiosas, como febre tifoide, varíola<br />

e escarlatina, antes mesmo de qualquer caracterização<br />

dos microrganismos situaram Jacob<br />

Henle (1809-1885) no papel de criador da bacteriologia.<br />

Uma geração mais tarde, seu discípulo<br />

Robert Koch (1843-1910) introduziu os métodos<br />

de fixação e coloração, permitindo visualizar e<br />

analisar o bacilo do carbúnculo, caracterizando<br />

fenômeno da esporulação. Em 1882, ele descobriu<br />

o bacilo da tuberculose e em 1884 descobriu o modo<br />

de transmissão do vibrião colérico, promovendo<br />

o tratamento da água por meio da filtração. Dessa<br />

forma, “logo que foi encontrado o método adequado,<br />

as descobertas surgiram naturalmente, tal<br />

como as maçãs maduras caem da árvore” [Robert<br />

Koch (1843-1910)].<br />

Outro grande nome para o século XIX foi<br />

Louis Pauster (1822-1895), que provou a atividade<br />

fermentadora de microrganismos em bebidas e alimentos,<br />

melhorando a preservação destes. Além<br />

disso, a descoberta da fermentação derrubou a teoria<br />

da geração espontânea. Pasteur também lançou<br />

as bases da imunoterapia preventiva e curativa,<br />

e antecipou o advento dos antibióticos. A prática<br />

da vacinação aplicada à prevenção de epidemias<br />

em humanos e animais fez de Louis Pasteur<br />

um dos cientistas que, individualmente, mais contribuiu<br />

para o bem-estar do homem e o desenvolvimento<br />

da ciência médica.<br />

*<br />

Mestre e professor substituto da disciplina História da Medicina da Faculdade de Medicina da <strong>Ufam</strong>.<br />

** Acadêmicos do curso de Medicina da <strong>Ufam</strong>.<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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MEDICINA NO SÉCULO XIX: AS BASES PARA UMA NOVA MEDICINA<br />

Com conhecimento sobre a existência desses<br />

microrganismos patogênicos fez-se necessário<br />

precaver a contaminação por esses microrganismos.<br />

E foi o escocês Joseph Lister (1827-1912), professor<br />

de Medicina em Edinburgo, que introduziu<br />

a antissepsia na prática cirúrgica. Quando Joseph<br />

foi a Londres ensinar a importância dessa prática<br />

no <strong>Hospital</strong> St. John, foi ridicularizado e insultado<br />

por médicos, residentes e enfermeiras. Mas seu<br />

artigo “On the antiseptic principle in the pratice of<br />

surgery”, publicado em 1867 na revista Lancet,<br />

marcou o início de uma verdadeira revolução na<br />

prática cirúrgica, ao descrever como se impedia que<br />

microrganismos causassem as infecções tão frequentemente<br />

responsáveis pelo insucesso das intervenções.<br />

“A era da antissepsia foi seguida pela da<br />

assepsia. Os cirurgiões, em vez de procurar limpar<br />

os focos infectados das cirurgias, buscaram eliminar<br />

os agentes nocivos (bactérias) da sala de cirurgia<br />

(campo cirúrgico), realizando a esterilização<br />

pelo calor e substâncias químicas” (http://<br />

www.hebron.com.br/revista/n25/materia3.htm).<br />

Os cirurgiões, em pouco tempo, passaram<br />

a ter as seguintes práticas:<br />

– uso de máscaras cirúrgicas;<br />

– uso de luvas de borrachas esterilizadas<br />

após cada cirurgia, proposta por Halsted, em 1889;<br />

– esterilização dos instrumentos cirúrgicos,<br />

com uso do ácido fênico – método introduzido por<br />

Joseph Lister (1827-1912), em 1867;<br />

– isolamento das salas cirúrgicas e circulação<br />

apenas de pessoal autorizado;<br />

– lavagem permanente das áreas expostas<br />

pela cirurgia com compressas embebidas com ácido<br />

fênico por Stéphane Tarnier (1828-1897) e Just<br />

Lucas Chapionniére (1843-1913);<br />

– lavagem das mãos do pessoal médico com<br />

solução de cloreto de cálcio. O médico Ignace<br />

Semmelweis (1818-1865) adotou essa medida no<br />

manuseio genital no pós-parto numa maternidade<br />

em Viena, conseguindo reduzir a mortalidade<br />

de 27 para 0,23%.<br />

A admiração universal causada pelas novas<br />

descobertas científicas foi consequência direta<br />

no fervor das investigações científicas. Logo, governos<br />

e filantropos de vários países passaram a<br />

financiar a criação de institutos de pesquisa dedicados<br />

à aplicação da ciência em benefício da saúde<br />

pública. Alguns dos institutos criados foram: o<br />

Instituto Pasteur em Paris, o Instituto Rockefeller<br />

nos Estados Unidos ou o Instituto Butantã (São<br />

Paulo) e o Instituto Manguinhos (Rio de Janeiro).<br />

No Brasil, por exemplo, o imperador Pedro II manifestou<br />

sua admiração pelo trabalho de Pasteur,<br />

doando uma grande soma ao Instituto Pasteur. Em<br />

retribuição ao gesto, colocou-se um busto do imperador<br />

brasileiro junto à biblioteca do Instituto<br />

Pasteur, em Paris.<br />

As técnicas anestésicas e a introdução da antissepsia e<br />

assepsia foram cruciais no desenvolvimento das<br />

técnicas e avanços nas intervenções cirúrgicas.<br />

“Ao final do século XIX, os centros médicos<br />

mais importantes da Europa eram os da França,<br />

Alemanha e Inglaterra. Paris destacava-se como<br />

o centro de maior projeção internacional, para onde<br />

se dirigiam médicos do mundo inteiro em busca<br />

de novos conhecimentos e aprimoramento profissional”<br />

(http://usuarios.cultura.com.br/<br />

jmrezende/cirurgia.htm).<br />

Os cirurgiões da época tinham três preocupações<br />

principais: infecção, hemorragia e dor.<br />

Os processos infecciosos foram evitados em<br />

função dos cuidados tomados na antissepsia e<br />

assepsia, que preveniam a entrada de um microrganismo<br />

no organismo durante e após o ato cirúrgico.<br />

No século XIX muitas amputações eram realizadas,<br />

principalmente nos campos de batalha.<br />

Com a inovação de instrumentos, entretanto, que<br />

possibilitavam ampliação da ação manual, as cirurgias<br />

tornaram-se menos arriscadas, por serem<br />

menos invasivas e mais rápidas, prevenindo a contaminação<br />

por algum microrganismo. Nesse contexto,<br />

todas as hemorragias eram evitadas e os riscos<br />

pós-operatórios diminuídos.<br />

20<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


RODOFO FAGIONATO, ANA PAULA SOUSA DA SILVA, FERNANDO HENRIQUE DA SILVA, LYGIA DE OLIVEIRA PEREIRA, RENATO MORAIS DA SILVA<br />

Alguns dos instrumentos utilizados na época<br />

são:<br />

– dreno cirúrgico lançando secreção e/ou<br />

sangue em recipientes fechados de vidro;<br />

– pinça hemostática prendendo o vaso<br />

sangrante, evitando e controlando hemorragia;<br />

– pinça com a ponta em dente de rato, imobilizando<br />

estrutura anatômica de pequeno porte;<br />

– pinça hemostática com a ponta em dente<br />

de rato possibilitando hemostasia em tecidos pouco<br />

aderentes, como a gordura;<br />

– agulhas curvas de tamanhos e espessuras<br />

variados para suturação;<br />

– afastador separando tecidos e estruturas<br />

anatômicas.<br />

Já a dor, que era um indicativo de anormalidade,<br />

era o elo entre o paciente e o médico. A<br />

ajuda médica só era procurada quando se sentia<br />

dor no intuito de diminuir o incômodo. E era no<br />

intuito de diminuir ou até cessar a dor que anestésicos<br />

passaram a ser usados.<br />

“Nenhuma outra substância específica para<br />

combater ou evitar a dor foi utilizada até 1540,<br />

quando o éter mostrou-se forte agente anestésico”<br />

(JOÃO BOSCO BOTELHO, 2004, p. 332). Seu uso<br />

pode levar, entretanto, a sérias complicações, fato<br />

que contribuiu para que o uso do éter não fosse<br />

disseminado. O éter foi primeiramente usado num<br />

paciente em 1846, no <strong>Hospital</strong> de Massachussetts,<br />

em Boston, pelo médico John Collins Warren (1773-<br />

1856).<br />

A ação anestésica do protóxido de nitrogênio<br />

ou gás hilariante é registrada desde 1799, e em<br />

1844 essa ação foi demonstrada num auditório em<br />

Boston pelo dentista Horace Wells (1815-1848). O<br />

clorofórmio foi descoberto em 1931 e usado durante<br />

o parto da rainha Victoria.<br />

Na primeira metade do século 19, no início<br />

da Revolução Industrial, com o desenvolvimento<br />

da produção fabril ocorreu uma degradação no padrão<br />

de vida da sociedade em função das condições<br />

de trabalho insalubres e desgastantes presentes<br />

nas fábricas das cidades europeias.<br />

A consequente urbanização levou os trabalhadores<br />

a morarem em aglomerados, alojamentos<br />

miseráveis e subúrbios nessas grandes cidades.<br />

Isso tudo levou à população a se tornar vítima de<br />

doenças infecciosas, como a tuberculose, contribuindo<br />

assim para o agravamento dos índices de mortalidade.<br />

Diante desse quadro, observadores,<br />

reformadores sociais e higienistas começaram a se<br />

preocupar em controlar as doenças infecto-contagiosas,<br />

e também com as frequentes epidemias de<br />

tifo, varíola e cólera que acometiam toda a população.<br />

Em 1832, foram criados os primeiros conselhos<br />

de higiene nos principais países europeus<br />

como França e Inglaterra. O arquiteto do<br />

sanitarismo foi Chadwick que, nesse mesmo ano,<br />

foi nomeado para a Royal Comission on the Poor Law.<br />

O poder público, então, por volta de 1866,<br />

implementou medidas elementares como construção<br />

de redes de esgotos, abastecimento de água<br />

potável, utilização de desinfetantes e recolhimento<br />

do lixo nas grandes aglomerações urbanas.<br />

Quanto ao problema das indústrias insalubres,<br />

foi criado em 1886, na Alemanha, o primeiro<br />

seguro de saúde denominado Krankenkassen. Esse<br />

foi responsável em instituir regras que asseguravam<br />

assistência médica aos trabalhadores e suas<br />

famílias. Em 1848, foi promulgado o primeiro Ato<br />

Público de Saúde, o Public Health Act, e em 1872<br />

este cria o verdadeiro “national public health<br />

service” e, com isso, continua a desenvolver as embrionárias<br />

estruturas de saúde pública.<br />

Em função da melhoria de fatores<br />

ambientais, como as condições de moradia, houve<br />

uma redução na mortalidade por doenças infecciosas<br />

e, com isso, percebeu-se que era mais eficiente<br />

prevenir várias doenças adotando medidas de<br />

saúde pública.<br />

CONCLUSÃO<br />

Vê-se que a Medicina sofreu diversas mudanças<br />

tanto no âmbito científico quanto no âmbito<br />

político-social. Nessa época, com a descoberta<br />

de novos métodos científicos para a pesquisa, e<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

21


MEDICINA NO SÉCULO XIX: AS BASES PARA UMA NOVA MEDICINA<br />

com a busca das razões em níveis cada vez mais<br />

moleculares, começou se a extinguir o<br />

espiritualismo e adotar o materialismo. Levando,<br />

então, a uma menor influência da Igreja no âmbito<br />

social. Logo, a saúde tornou-se um dever do Estado,<br />

pois caso houvesse uma endemia na periferia<br />

da cidade, acabaria atingindo as classes mais privilegiadas<br />

das urbes. Houve diversos avanços na<br />

bacteriologia com Louis Paster. Já no exame clínico,<br />

novas ferramentas auxiliaram na ausculta pulmonar.<br />

Houve também avanço nas doenças infecciosas<br />

e uma melhora no uso de anestésicos.<br />

REFERÊNCIAS<br />

[1] “Medicina no século XIX”, por Viviane Santos.<br />

<strong>Revista</strong> Hebron atualidades. Disponível na<br />

Internet: (http://www.hebron.com.br/revista/<br />

n25/materia3.htm).<br />

[2] Trabalho apresentado ao VI Congresso Brasileiro<br />

de História da Medicina, realizado em<br />

Barbacena, MG, de 14 a 17 de junho de 2001. Atualizado<br />

em 28/3/2005. Disponível na Internet:<br />

(http://usuarios.cultura.com.br/jmrezende/<br />

cirurgia.htm).<br />

[3] BOTELHO, João Bosco. História da Medicina<br />

– da abstração à materialidade. Manaus: Valer,<br />

2004.<br />

[4] As contradições da política de saúde no Brasil.<br />

O Instituto Butantã. Disponível na Internet:<br />

( h t t p : / / w w w . s c i e l o . b r /<br />

scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-<br />

88392002000400011).<br />

[5] GRAÇA, L. (2000). O Progresso das Ciências e<br />

Técnicas Biomédicas na II Metade do Século<br />

XIX.º [The XIX Century Scientific Revolution in<br />

Medicine]. (http://www.ensp.unl.pt/lgraca/<br />

textos104.html).<br />

[6] “Da medicina do trabalho à saúde do trabalhador”.<br />

<strong>Revista</strong> Saúde Pública, v. 25, n. 5. São Paulo:<br />

October, 1991.<br />

Correspondência dos autores:<br />

moraisrenato@hotmail.com<br />

22<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


RODOLFO FAGINATO, DEIVIS BRITO, FLÁVIA BRAGA, MICHELLE MARTINS<br />

HISTÓRIA DA MEDICINA NA MESOPOTÂMIA<br />

HISTORY OF MEDICINE IN MESOPOTAMIA<br />

Rodolfo Fagionato*, Deivis Brito**, Flávia Braga**, Michelle Martins**<br />

RESUMO: Poucas vezes é lembrado que a Medicina, suas técnicas, suas doutrinas e sua ética começaram a ser<br />

criadas há muitos e muitos anos, na Grécia Clássica de Hipócrates de Cós e seus discípulos, ou mesmo antes, na<br />

Mesopotâmia dos assírios. Há registros, na sociedade mesopotâmica, do Tratado de Diagnósticos e Prognósticos<br />

Médicos, incluindo estudos com descrições de inúmeras doenças específicas. Por diversas vezes, porém, não são<br />

feitas traduções fidedignas com a escrita cuneiforme original, o que prejudica a utilização de tais conhecimentos.<br />

Observa-se a análise mesopotâmica a respeito dos conceitos de doença e cura, sendo esses baseados em crenças<br />

espirituais, como a existência de deuses do bem e do mal e a consequente caracterização do médico como elo<br />

entre o bem e o mal, sob a denominação de ashipu ou asu, com atribuições diferentes às suas atividades práticas.<br />

Com base nos seus conhecimentos, a sociedade mesopotâmica foi capaz de postular registros acerca da cirurgia,<br />

medicamentos e doenças em geral, com ampla contribuição e importância relevante para a Medicina atual.<br />

ABSTRACT: Rarely is remembered that the Medicine, its techniques, its doctrines and ethics began to be created<br />

for many, many years, in Classical Greece of Hippocrates of Kos and his disciples, or even before, the Assyrians<br />

of Mesopotamia. There are records in Mesopotamian society, the Treaty of medical diagnosis and prognosis,<br />

including studies with descriptions of many specific diseases. Several times, but not reliable translations are<br />

made with original cuneiform writing, which preclude the use of such knowledge. There is the analysis<br />

Mesopotamia about the concepts of disease and cure, and those based on spiritual beliefs as the existence of gods<br />

of good and evil and the consequent characterization of the doctor as the link between good and evil, under the<br />

name of ashipu or asu with different tasks to its activities. Based on your knowledge, the company was able to<br />

postulate Mesopotamian records of the surgery, drugs and diseases in general, with broad and important<br />

contribution relevant to the present Medicine.<br />

INTRODUÇÃO<br />

A maior parte das informações disponíveis<br />

para estudos modernos vem de tábuas escritas<br />

com o sistema cuneiforme. Não existem representações<br />

de figuras que tenham sobrevivido na arte<br />

da antiga Mesopotâmia, nem um número significativo<br />

de esqueletos ainda a serem analisados. Infelizmente,<br />

enquanto que uma infinidade de tábuas<br />

cuneiformes chegou até nós desde aqueles<br />

tempos, muito poucas se ocupam de temas médicos.<br />

Muitas das tábuas que mencionam práticas<br />

médicas vêm da Biblioteca de Assurbanipal, o último<br />

grande rei da Assíria. A Biblioteca de<br />

Assurbanipal estava alojada no palácio do rei em<br />

Nínive e, quando o palácio foi incendiado por invasores,<br />

cerca de 20.000 tábuas de argila foram<br />

queimadas (e portanto preservadas) pelo grande<br />

incêndio. No início da década de 1920, 660 tábuas<br />

envolvendo assuntos médicos da livraria de<br />

Assurbanipal foram publicadas por Cambell<br />

Thompson. Outros textos médicos têm sido publicados<br />

mais recentemente (ver bibliografia abaixo).<br />

A grande maioria dessas tábuas são receitas,<br />

mas há uma série delas que contém entradas<br />

*<br />

Mestre e professor substituto da disciplina História da Medicina da Faculdade de Medicina da <strong>Ufam</strong>.<br />

** Acadêmicos do curso de Medicina da <strong>Ufam</strong>.<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

23


HISTÓRIA DA MEDICINA NA MESOPOTÂMIA<br />

que eram diretamente relacionadas umas às outras,<br />

e estas são chamadas de Tratados. O maior<br />

desses tratados médicos é conhecido como o Tratado<br />

de Diagnósticos e Prognósticos Médicos. O<br />

texto constitui 40 tábuas coletadas e estudadas por<br />

R. Labat. A cópia mais antiga deste tratado data<br />

de 1600 antes da nossa Era, mas o texto em si é<br />

uma compilação de vários séculos de conhecimento<br />

médico na Mesopotâmia. O Tratado de Diagnóstico<br />

está organizado na ordem que vai da cabeça<br />

ao pé, com subseções cobrindo doenças<br />

convulsivas, ginecologia e pediatria. É uma pena<br />

que traduções antiquadas e feitas por leigos nas<br />

ciências médicas fazem com que os textos pareçam<br />

extratos de um livro de aprendiz de feiticeiro. De<br />

fato, como pesquisas recentes têm mostrado, as<br />

descrições das doenças listadas mostram uma<br />

aguçada capacidade de observação. Virtualmente,<br />

todas as doenças esperadas podem ser encontradas<br />

na parte do diagnóstico, e há seções que estão<br />

completamente preservadas, como as de neurologia,<br />

febres, doenças venéreas e lesões de pele. Os<br />

textos médicos também são facilmente<br />

identificáveis, como no caso de tratamento de<br />

sangramentos, onde todas as plantas mencionadas<br />

são conhecidas, e as mesmas usadas em muitos tratamentos<br />

para os mesmos casos.<br />

Conceito Mesopotâmico para Doença e Cura<br />

As doenças eram causadas por espíritos:<br />

deuses, fantasmas, etc. Cada espírito, entretanto,<br />

era considerado responsável por apenas uma doença<br />

em qualquer parte do corpo. Em geral, portanto,<br />

“a Mão do(a) deus(a) X” do estômago<br />

correspondia ao que chamamos de doença estomacal.<br />

Uma série de doenças era simplesmente<br />

identificada por um nome, como Bennu, por exemplo.<br />

Os deuses podiam ser culpados num nível<br />

mais alto por causar uma doença ou o mau funcionamento<br />

de um órgão, mas em alguns casos essa<br />

era uma forma de dizer que um determinado sintoma<br />

não era independente, mas causado nesse<br />

caso por uma doença Y. Plantas eram usadas para<br />

tratar os sintomas das doenças, sendo que plantas<br />

diferentes eram usadas em rituais mágicos para<br />

aplacar o mesmo espírito. Pode-se inferir que<br />

oferendas específicas eram feitas a um deus ou espírito<br />

determinado quando se considerava que ele<br />

era a causa da doença, mas essas oferendas não<br />

estão indicadas em textos médicos, devendo ser<br />

encontradas em outros textos.<br />

Profissionais da Medicina na Mesopotâmia<br />

Por meio do exame de tábuas médicas da<br />

Mesopotâmia fica claro que havia dois tipos distintos<br />

de profissionais da Medicina no Oriente Próximo.<br />

O primeiro tipo de profissional em geral era<br />

chamado ashipu, ou ‘mago’. Um dos mais importantes<br />

papéis do ashipu era o diagnóstico da doença<br />

e determinar que deus ou demônio a estava<br />

causando. O ashipu também tentava determinar<br />

se a doença era resultado de algum erro ou pecado<br />

por parte do paciente. A frase “a Mão de...” era<br />

usada para indicar a divindade responsável pela<br />

aflição em questão, sendo que então essa divindade<br />

podia ser aplacada com oferendas e preces pelo<br />

paciente. O ashipu podia também tentar curar o<br />

paciente por simpatias e encantamentos que eram<br />

feitos para levar embora o espírito causador do mal.<br />

Ele também podia referir o paciente a um outro<br />

tipo de profissional da área médica chamado asu.<br />

O asu era um especialista em remédios à base de<br />

ervas e em Medicina tradicional mesopotâmica,<br />

sendo chamado em geral de “médico”, pois ele lidava<br />

com o que em geral pode ser descrito como<br />

aplicações empíricas de medicação. Exemplo: no<br />

tratamento de feridas, ele usava três técnicas fundamentais,<br />

como lavar a ferida, uso de compressas<br />

e bandagens. Todas estas técnicas do asu parecem<br />

ser as formas mais antigas de prática da Medicina<br />

e os registros mais antigos de uma literatura<br />

médica, a cerca de 2100 anos antes da nossa Era.<br />

O conhecimento do asu em termos de fazer<br />

compressas é bastante interessante. Muitas das<br />

compressas antigas (misturas de ingredientes medicinais<br />

aplicadas a uma ferida e mantidas no lugar<br />

por uma bandagem) parecem ser uma forma<br />

eficiente de tratamento. Por exemplo: algumas das<br />

24<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


RODOLFO FAGINATO, DEIVIS BRITO, FLÁVIA BRAGA, MICHELLE MARTINS<br />

mais complicadas compressas exigiam o aquecimento<br />

de uma resina de planta ou gordura animal<br />

com algo alcalino. Esta mistura, quando aquecida,<br />

libera sabão, que ajudaria a proteger contra infecções<br />

bacterianas. Enquanto que a relação entre o<br />

ashipu e o asu não está totalmente esclarecida, os<br />

dois tipos de profissionais parecem ter trabalhado<br />

juntos para efetivar curas. Os mais ricos pacientes<br />

provavelmente buscavam os cuidados médicos<br />

tanto do ashipu quanto do asu para curar uma<br />

doença. Parece que os dois profissionais trabalhavam<br />

em geral um cooperando com o outro no tratamento<br />

de doenças.<br />

Além de compartilhar pacientes, parece que<br />

os papéis de ambos algumas vezes se mesclavam:<br />

um asu podia ocasionalmente fazer um encanto, e<br />

um ashipu prescrever uma droga. Evidência para<br />

tanto foi encontrada na biblioteca de um ashipu<br />

que continha receitas farmacêuticas. Outra fonte<br />

de evidência com relação às habilidades dos médicos<br />

na Mesopotâmia está no Código de<br />

Hamurábi. Esta coleção não foi escrita numa tábua,<br />

mas descoberta num grande bloco negro de<br />

diorita. O Código de Hamurábi não era um código<br />

de leis como entendemos hoje, mas provavelmente<br />

uma coleção de decisões legais feitas por<br />

Hamurábi (cerca de 1700 antes da nossa Era) ao<br />

longo de sua atuação como juiz, e publicada para<br />

fazer propaganda de sua justiça.<br />

O Código de Hamurábi é uma notável, mas<br />

não única, aplicação da justiça na Mesopotâmica,<br />

e é baseado no princípio de “olho por olho, dente<br />

por dente”. Havia várias leis no Código de<br />

Hamurábi com relação aos cirurgiões. Estas leis<br />

dizem que o médico era responsável por erros e<br />

fracassos da cirurgia. É também digno de nota que,<br />

de acordo com tais leis, o pagamento do cirurgião<br />

bem-sucedido e do malsucedido era determinado<br />

pelo status do paciente. Se o cirurgião salvava a<br />

vida de um escravo, ele recebia apenas dois<br />

shekels. Se uma pessoa, entretanto, de status morresse<br />

como resultado de uma cirurgia, o cirurgião<br />

arriscava-se a ter sua mão cortada. Se um escravo<br />

morresse quando da cirurgia, o cirurgião apenas<br />

tinha de pagar para a substituição do escravo.<br />

Quanto às cirurgias, independente dos riscos,<br />

temos quatro tábuas associadas com a execução<br />

de um procedimento cirúrgico. Uma das tábuas<br />

está muito danificada, infelizmente, mas das três<br />

remanescentes, uma parece descrever um procedimento:<br />

são feitos cortes no peito de um paciente, a<br />

fim de remover pus da pleura. Os dois outros textos<br />

pertencem a uma coleção chamada Receitas para<br />

Doenças da Cabeça. Um destes textos menciona a faca<br />

do asu cortando levemente a cabeça do paciente. A<br />

tábua cirúrgica final menciona os cuidados pós-operatórios<br />

de um ferimento cirúrgico, onde é recomendada<br />

uma atadura de óleo de gergelim, que funciona<br />

como agente antibactericida.<br />

Outro ponto importante é a identificação de<br />

várias drogas mencionadas nas tábuas. Infelizmente,<br />

muitas destas drogas são difíceis ou impossíveis<br />

de serem identificadas com um alto grau de<br />

certeza. Em geral, os nomes empregados são metafóricos,<br />

como gordura de leão, lírio do tigre, etc.<br />

Das drogas que foram identificadas, a maioria era<br />

feita de extratos de plantas, resinas ou feitas com<br />

base em temperos. Muitas das plantas usadas pelo<br />

asu têm propriedades antibióticas, enquanto que<br />

resinas e temperos tinham algum valor antisséptico.<br />

Além desses benefícios, deve-se ter em mente<br />

que tanto os remédios como as ações dos médicos<br />

antigos devem ter tido um forte efeito placebo. Os<br />

pacientes sem dúvida acreditavam que os médicos<br />

eram capazes de curá-los. No mínimo, portanto,<br />

visitar o médico reforçava as noções de bemestar<br />

e saúde.<br />

Outras fontes de tratamentos de saúde podiam<br />

ser obtidas no templo de Gula. Gula, em geral<br />

visto como um cão, era um dos mais poderosos<br />

deuses da cura.<br />

Enquanto que escavações dos templos dedicados<br />

a Gula não têm revelado sinais de que os<br />

pacientes eram acomodados no templo enquanto<br />

recebiam tratamento (como no caso dos templos<br />

de Esculápio, na Grécia), estes templos podem ter<br />

sido locais para o diagnóstico de doenças.<br />

Parece claro que os templos de Gula também<br />

tinham bibliotecas dedicadas a temas de saúde.<br />

O principal centro de saúde era o lar, sendo<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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HISTÓRIA DA MEDICINA NA MESOPOTÂMIA<br />

que os cuidados aos pacientes eram fornecidos na<br />

própria casa do paciente, com a família prestando<br />

os cuidados. Fora da casa, outros importantes centros<br />

de cura situavam-se próximo aos rios. Os<br />

mesopotâmicos acreditavam que os rios podiam<br />

levar para longe substâncias e forças causadores<br />

de doenças. Algumas vezes, uma pequena cabana<br />

para a pessoa doente era erguida próxima à casa<br />

ou rio para ajudar no tratamento do paciente que<br />

estava em casa.<br />

CONCLUSÕES<br />

Se a Medicina praticada na antiga<br />

Mesopotâmia deixou um legado que, em última<br />

análise, influenciou médicos de outras civilizações,<br />

constitui uma questão que jamais será completamente<br />

respondida. Enquanto que muitos dos princípios<br />

básicos da Medicina, como o uso de ataduras<br />

e a coleta de textos sobre Medicina começou<br />

na Mesopotâmia, outras culturas também desenvolveram<br />

essas práticas de forma independente.<br />

Mesmo na própria Mesopotâmia, muitas das técnicas<br />

desapareceram depois de haver sobrevivido<br />

por milhares de anos. Foi a Medicina egípcia, entretanto,<br />

a mais influente, e sabemos desse fato por<br />

meio dos gregos.<br />

REFERÊNCIAS<br />

BOTELHO, João Bosco. História da Medicina – da<br />

abstração à materialidade. Manaus: Valer, 2004.<br />

ISBN: 8575121561<br />

MARGOTTA, Roberto. História Ilustrada da Medicina.<br />

São Paulo: Manole, 1998. ISBN:<br />

8520408702<br />

26<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


LEONARDO SOARES DA SILVA<br />

MANEJO PRÁTIC<br />

TICO DA ASCITE<br />

MANAGEMENT OF PRACTICAL ASCITES<br />

Leonardo Soares da Silva 1<br />

RESUMO: Ascite é definida como acúmulo de líquido livre na cavidade peritoneal. Manifestação comum na<br />

hipertensão portal da cirrose hepática e seu diagnóstico ocorre por meio da paracentese, que deve ser realizada<br />

em todos os pacientes, independentemente da sua etiologia. O objetivo é padronizar o diagnóstico e o tratamento<br />

da ascite no <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong>. A metodologia utilizada foi a revisão de artigos recentes<br />

publicados com relevância no assunto abordado pelo autor. A publicação é a visão prática de uma patologia<br />

comum no cotidiano do gastroenterologista e do clínico geral.<br />

Palavras-chave: Ascite; Diagnóstico; Terapêutica.<br />

ABSTRACT: Ascites is defined as accumulation of free liquid in the peritoneal cavity. It is a common manifestation<br />

of portal hypertension in liver cirrhosis and its diagnostic occurs by paracentesis, which must be performed in all<br />

patients, regardless of its etiology. The goal is to standardize the diagnosis and treatment of ascites in University<br />

<strong>Hospital</strong> Getulio <strong>Vargas</strong>. The methodology used was the review of recent articles published with relevance in the<br />

matter raised by the author. The publication is a practical vision of a condition common in the daily lives of<br />

gastroenterologist and the general clinic.<br />

Keywords: Ascites; Diagnosis, Therapy.<br />

INTRODUÇÃO<br />

Ascite é definida como acúmulo de líquido<br />

livre na cavidade peritoneal. Manifestação frequente<br />

em inúmeras patologias, sendo que o seu diagnóstico<br />

diferencial constitui um desafio intelectual<br />

para os gastroenterologistas e para os clínicos. 1,2<br />

1): 3,4<br />

ETIOLOGIA<br />

As principais etiologias da ascite (Tabela<br />

Tabela 1 – Etiologia da Ascite.<br />

Gastroenterológica<br />

Hipertensão portal: Cirrose hepática, hepatite fulminante,<br />

doença veno-oclusiva (trombose de veia porta e supra-hepáticas)<br />

Pancreática: Pancreatite aguda, pseudocisto Biliar.<br />

Cardíaca<br />

Insuficiência cardíaca, pericardite constritiva, cor pulmonale.<br />

Renal<br />

Síndrome nefrótica, Insuficiência renal crônica dialítica.<br />

Infecciosa<br />

Tuberculose, esquistossomose, fúngica, bacteriana.<br />

Neoplasia<br />

Metástase peritoneal, mesotelioma, linfoma,<br />

pseudomixoma peritoneal.<br />

Quilosa<br />

Obstrução linfática mesentérica.<br />

Ginecológica<br />

Síndrome de Meigss, endometriose, síndrome de<br />

hiperestimulação ovariana.<br />

Outras<br />

Lúpus eritematoso sistêmico, angioedema hereditário,<br />

artrite reumatoide, Doença de Whipple, mixedema,<br />

gastroenterite eosinofílica, febre familiar do Mediterrâneo,<br />

hipoalbuminemia.<br />

1<br />

Médico e especialista em Gastroenterologia. E-mail: drleonardoss@yahoo.com.br<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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MANEJO PRÁTICO DA ASCITE<br />

DIAGNÓSTICO<br />

a. Paracentese diagnóstica<br />

A paracentese com coleta de líquido ascítico<br />

para posterior estudo é uma grande arma para o<br />

diagnóstico da causa básica do derrame peritoneal.<br />

É um procedimento seguro, sem evidências que<br />

predisponham a infecção do líquido peritoneal e<br />

deve ser realizado em todos os pacientes com<br />

ascite, independentemente da suspeita clínica.<br />

Indicações:<br />

1. Pacientes internados ou ambulatoriais<br />

com ascite ao exame físico de início recente ou causa<br />

indeterminada.<br />

2. Paciente portador de doença hepática crônica,<br />

com ascite preexistente e suspeita de<br />

peritonite bacteriana espontânea (PBE). A PBE<br />

deve sempre ser suspeitada quando ocorre deterioração<br />

do quadro clínico do paciente, como: febre,<br />

dor abdominal, encefalopatia hepática, disfunção<br />

renal, leucocitose, acidose metabólica, sepse ou<br />

choque séptico. 1,5,6<br />

c. Localização: quadrante inferior esquerdo.<br />

No ponto central em uma linha imaginária<br />

entre a crista ilíaca superior e a cicatriz umbilical<br />

(afastando dos vasos epigástricos).<br />

d. Assepsia e antissepsia.<br />

e. Colocação do campo fenestrado.<br />

f. Anestesia local com lidocaína (2 a 5 ml).<br />

g. Montar o cateter intravenoso na seringa<br />

de 20 ml.<br />

h. Introdução do cateter/seringa perpendicular<br />

à pele, sempre aspirando até que a saída do<br />

líquido peritoneal.<br />

i. Retirar a agulha e coletar líquido para bioquímica,<br />

citometria, pesquisa de células<br />

neoplásicas, culturas.<br />

j. Ligar o cateter ao equipo e o coletor.<br />

l. Curativo no local da punção.<br />

3. Análise do líquido ascítico 6,7,8<br />

Os exames solicitados para análise do líquido<br />

ascítico encontram-se na Tabela 2:<br />

Tabela 2 – Exames para análise da ascite.<br />

Rotina<br />

Opcionais<br />

Não usual<br />

Raramente<br />

Procedimento:<br />

Celularidade e<br />

diferencial<br />

Glicose<br />

Citologia<br />

pH<br />

1. Material Utilizado<br />

a. Cateter intravenoso n.º 14<br />

b. Seringa n.º 20 ou 10<br />

c. Campo fenestrado estéril<br />

d. Luvas estéreis<br />

e. Pinças para pequenas cirurgias<br />

f. Frascos de vidro estéril<br />

g. Coletor de vidro ou plástico<br />

h. Equipo de soro<br />

i. Cloridrato de lidocaína a 2% sem vasoconstritor<br />

j. Substâncias para assepsia e antissepsia<br />

2. Técnica<br />

a. Realizado na beira do leito ou em local<br />

para procedimento na enfermaria, com paciente em<br />

jejum e esvaziamento prévio da bexiga.<br />

b. Em decúbito dorsal.<br />

Proteínas<br />

totais<br />

Albumina<br />

DHL<br />

Amilase<br />

Gram<br />

Cultura<br />

Triglicerídios<br />

Bilirrubinas<br />

Avaliação dos parâmetros encontrados no<br />

material coletado:<br />

a. Aparência macroscópica (Tabela 3).<br />

Tabela 3 – Macroscópica do líquido ascítico.<br />

Aparências do líquido ascítico<br />

Lactato<br />

Colesterol<br />

Fibronectina<br />

Macroscópica Etiologias<br />

Amarelo citrino (claro) Cirrose hepática sem complicações.<br />

Turvo<br />

Infecções (peritonite bacteriana<br />

espontânea ou secundária).<br />

Leitoso (quilosa) (Neoplasia ou trauma do ducto<br />

pancreático).<br />

Punção traumática.<br />

Sanguinolento<br />

Neoplasia maligna.<br />

28<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


LEONARDO SOARES DA SILVA<br />

Macroscópica<br />

Sanguinolento<br />

Marronzado<br />

b. Citologia e citometria<br />

Etiologias<br />

Ascite cirrótica sanguinolenta.<br />

Tuberculose (raro).<br />

Punção inadvertida do baço<br />

(Esplenomegalia volumosa).<br />

Síndrome ictérica.<br />

Perfuração de vesícula biliar.<br />

Ulcera duodenal.<br />

A contagem de polimorfonucleares (PMN)<br />

é importante no diagnóstico da peritonite<br />

bacteriana espontânea (PBE) no paciente cirrótico,<br />

independentemente da cultura:<br />

e. Cultura<br />

Injetar no frasco de hemocultura – 10 ml de<br />

líquido ascitíco à beira do leito. Cultura para bactérias,<br />

em casos especiais para tuberculose e fungos.<br />

f. Bioquímica<br />

Glicose, pH, proteínas totais, DHL (na primeira<br />

análise: amilase, ADA).<br />

TRATAMENTO<br />

a. Repouso relativo no leito.<br />

Contagem >250 PMN: PBE<br />

c. Gradiente albumina Soro Ascite (Gasa)<br />

A dosagem do Gasa é crucial no diagnóstico<br />

da etiologia da ascite, principalmente relacionada<br />

à hipertensão portal. O Gasa é a diferença<br />

entre a albumina do soro e da albumina da ascite<br />

(dosagens devem ser colhidas simultaneamente<br />

(Tabela 4).<br />

Tabela 4 – Diagnóstico diferencial com uso do Gasa.<br />

Gasa > 1,1<br />

Hipertensão portal<br />

HP Sinusoidal (cirrose hepática):<br />

Proteínas totais (ascite) < 3,0<br />

HP Pós-sinusoidal (Insuficiência<br />

cardíaca):<br />

Proteínas totais (ascite) > 3,0<br />

d. Citologia oncótica<br />

Gasa < 1,1<br />

Doença Peritoneal<br />

Carcinomatose<br />

Tuberculose<br />

Síndrome<br />

Nefrótica<br />

Encaminhar para anatomia patológica no<br />

mesmo dia, se não colocar em álcool a 50% para<br />

melhor conservação do material. A citologia<br />

oncótica contribui para o diagnóstico diferencial<br />

das neoplasias malignas peritoneais, principalmente<br />

metastáticas (carcinomatose peritoneal).<br />

b. Restrição de sódio<br />

A dieta deve conter em torno de 2 g (88<br />

mEq) de sódio por dia.<br />

c. Restrição de líquido<br />

Restrição da ingesta de líquido apenas<br />

quando o sódio sérico for menor que 120 g/ml.<br />

d. Diuréticos<br />

A associação de dois diuréticos de ações<br />

diferentes é melhor opção no tratamento oral da<br />

ascite no paciente cirrótico. As drogas provocam<br />

efeito sinérgico, além de diminuir os efeitos deletérios,<br />

quando usados isoladamente. Inicia com<br />

furosemida 40 mg/dia e espironolactona 100 mg/<br />

dia. Aumenta progressivamente, se a resposta clínica<br />

for insuficiente após 3 a 4 dias com a terapia.<br />

A furosemida pode ser aumentada até 160 mg e a<br />

espironolactona até 400 mg. Importante: Evitar o<br />

uso de diuréticos endovenosos.<br />

O objetivo da terapia diurética é a perda de<br />

peso no máximo 1 kg/dia em pacientes com<br />

edemas de membros inferiores ou 0,5 kg/dia em<br />

pacientes sem edema de membros. Essa medida<br />

tem a intenção de diminuir a deterioração da função<br />

renal nestes pacientes.<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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MANEJO PRÁTICO DA ASCITE<br />

e. Paracentese terapêutica<br />

Antibioticoterapia (Tabela 5).<br />

Tabela 5 – Antibióticos usados no tratamento do PBE.<br />

A paracentese está indicada no tratamento<br />

da ascite de difícil controle como:<br />

Cefatoxima 2 g EV 8/8h por 5 dias<br />

Ceftriaxona 2 g EV 1 x dia por 5 dias<br />

1. Ascite refratária ao tratamento oral com Amoxacilina + clavulanato EV 1,2 g 8/8h por 2 dias e<br />

625 mg VO 8/8 por 6 a 12 dias<br />

diuréticos;<br />

2. Ascite diurético-intratável, isto é, paciente<br />

com contraindicações ou efeitos colaterais com<br />

Ciprofloxacina EV 200 mg 12/12h por 5 dias<br />

diuréticos;<br />

Uso da Albumina na PBE<br />

3. Ascite tensa com desconforto respiratório;<br />

A albumina é administrada 1,5 g/kg/dia<br />

no primeiro dia (no máximo até 6h do diagnóstico)<br />

e 1 g/kg/dia no terceiro dia de tratamento. A<br />

Albumina humana<br />

albumina reduz a mortalidade intra-hospitalar e a<br />

A albumina humana é indicada quando<br />

deterioração da função renal.<br />

ocorre uma retirada maior que 4 litros durante o<br />

procedimento da paracentese terapêutica. A reposição<br />

intravenosa de albumina acarreta menos<br />

Paracentese de controle<br />

complicações (síndrome hepatorrenal, hipotensão)<br />

Realizar nova paracentese após 48 horas do<br />

e diminuindo o tempo de internação, menor número<br />

de readmissões e maior sobrevida dos paci-<br />

início do tratamento. O resultado esperado é uma<br />

queda mínima de 25% na contagem de PMN em<br />

entes A dose preconizada de 5 g de albumina por<br />

relação à análise inicial do líquido ascítico. Não<br />

litro retirado. A infusão da albumina ocorre<br />

ocorrendo essa diminuição, o esquema de<br />

concomitante ou logo após o procedimento, com<br />

antibioticoterapia deve ser substituído de acordo<br />

velocidade 1 ml/minuto. Lembrando que cada<br />

com o resultado da cultura e antibiograma.<br />

frasco de albumina humana a 20% possui 10 g. 4,9,10<br />

Profilaxia da PBE<br />

f. Outros tratamentos<br />

A profilaxia da PBE é uma prioridade em<br />

1. TIPS (Derivação porto-sistêmico intrahepático<br />

transjugular)<br />

todo paciente que apresentou a infecção do líquido<br />

ascítico, deve ser realizada por meio de esquema<br />

oral por tempo indeterminado (Tabela 6).<br />

TIPS é uma técnica que provoca um shunt<br />

portocava látero-lateral, descomprimindo o sistema<br />

porta. É opção de tratamento na ascite<br />

Tabela 6 – Profilaxia do PBE.<br />

Norfloxacina 400 mg VO 1 x dia<br />

retratária. A principal complicação é a encefalopatia<br />

hepática.<br />

Ciprofloxacina 750 mg /semana<br />

Sulfametaxazol + trimetropim 400/80 mg por dia<br />

2. Transplante hepático<br />

Outros: Ofloxacina, amoxacilina + clavunulato<br />

O transplante hepático é a opção definitiva<br />

da ascite de origem hepática.<br />

g. Tratamento da Peritonite bacteriana espontânea<br />

5,11,12<br />

30<br />

revistahugv<br />

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v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


LEONARDO SOARES DA SILVA<br />

ALGORITMO DA ASCITE<br />

ASCITE<br />

PARACENTESE<br />

DIAGNÓSTICA<br />

GASA < 1,1 GASA > 1,1<br />

Proteína >3<br />

DOENÇA<br />

PERITONEAL<br />

Proteína 250<br />

PMN < 250<br />

Peritonite bacteriana<br />

espontânea<br />

Ausência de<br />

infecção<br />

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v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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MANEJO PRÁTICO DA ASCITE<br />

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da AMRIGS, 50 (1):54-58, 2006.<br />

3. OLMOS, R. D.; SANTOS, M. S. C.; MARTINS,<br />

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9. ANGELI, P.; GATTA, A. “Medical treatment of<br />

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of ascites and hepatic hydrothorax”. Best Practice<br />

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11. CORAL, G.; MATTOS, A. A.; DAMO, D. F.;<br />

VIEGAS, A. C. “Prevalência e prognóstico da<br />

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Alegre (1991-2000)”. Arq Gastroenterol., vol. 39,<br />

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12. YU, A. S.; HU, K-Q. “Management of ascites”.<br />

Clin Liver Dis, 2001; 5:541-68.<br />

32<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


JONAS RIBAS, EDUARDO ABRAM KAUFFMAN, CLÁUDIA MARINA PUGA BARBOSA OLIVEIRA, JÚLIO CÉSAR SIMAS RIBEIRO<br />

PREVALÊN<br />

ALÊNCIA DOS SINTOMAS NAS<br />

ASAIS AIS EM PACIEN-<br />

TES COM HANSENÍASE ACOMP<br />

OMPANHADOS NA<br />

FUNDAÇÃ<br />

ÇÃOALFREDO DA MATT<br />

TTA<br />

PREVALENCE OF NASAL SYMPTOMS IN LEPROSY PATIENTS IN FOLLOW-UP AT ALFREDO DA<br />

MATTA FOUNDATION<br />

Jonas Ribas * , Eduardo Abram Kauffman ** , Cláudia Marina Puga Barbosa Oliveira *** , Júlio César Simas Ribeiro ****<br />

RESUMO: Introdução: O Mycobacterium leprae tem tropismo pelas partes mais frias do corpo e o nariz pode ser<br />

sede inicial de lesões. Objetivos: Relatar a prevalência das queixas nasais em pacientes com hanseníase. Pacientes<br />

e métodos: Estudo de prevalência, onde foram incluídos quarenta pacientes com hanseníase em acompanhamento<br />

na Fundação Alfredo da Matta entre agosto de 2006 e abril de 2007. Os pacientes eram inquiridos quanto<br />

às queixas nasais e, se apresentassem sintomas, eram encaminhados para avaliação clínica. Resultados: Cinquenta<br />

e sete por cento dos pacientes apresentavam sintomas nasais, sendo obstrução em 60,9% dos casos. A forma<br />

multibacilar lepromatosa foi predominante dentre os sintomáticos. Conclusão: Apesar das formas multibacilares<br />

se correlacionarem mais nitidamente com sintomas nasais, as formas paucibacilares também figuraram como<br />

importantes causadores dessas queixas.<br />

Palavras-chave: Hanseníase, sintoma nasal, multibacilar, paucibacilar.<br />

ABSTRACT: Introduction: Mycobacterium leprae has tropism to the coldest parts of the body and primary<br />

lesion may take place at the nose. Objectives: To relate prevalence of nasal symptoms in leprosy patients. Patients<br />

and methods: A prevalence study, in which were included forty leprosy patients in follow-up at Alfredo da<br />

Matta Foundation between august 2006 and april 2007. Patients were asked about nasal complaints and, if positive,<br />

they were lead to clinical evaluation. Results: Fifty-seven percent of the patients presented nasal symptons, and<br />

obstruction was in 60,9% of the cases. Leprosy multibacillary form was predominant among patients with<br />

symptoms. Conclusion: In spite of multibacillary forms may be related to nasal symptoms more obviously,<br />

paucibacillary forms also appear as important causes of these complaints.<br />

Keywords: Leprosy, nasal symptoms, multibacillary, paucibacillary.<br />

INTRODUÇÃO<br />

A hanseníase é uma doença de curso crônico<br />

causada pelo Mycobacterium leprae, cujo contágio<br />

se dá por meio da eliminação dos bacilos pelas<br />

secreções nasais, da orofaringe e soluções de continuidade<br />

da pele e/ou mucosas dos doentes atingindo<br />

áreas erosadas das mucosas nasal e/ou<br />

cutânea dos indivíduos sãos. 4<br />

Quanto ao espectro clínico, classifica-se<br />

em: Tuberculoide, com baciloscopia negativa, grande<br />

resposta celular, lesões limitadas e poucos<br />

bacilos; Lepromatosa ou Virchowiana (LL), com lesões<br />

de pele difusamente distribuídas na pele e<br />

exacerbada resposta humoral, e Borderline, instável,<br />

onde aparecem as formas BT (paucibacilar),<br />

BB e BL (multibacilares). É importante citar as<br />

formas Neural Pura (NP) e Indeterminada (I), onde<br />

*<br />

Mestre em Patologia Tropical e professor assistente da <strong>Ufam</strong>.<br />

**<br />

Mestre em Otorrinolaringologia, professor assistente da <strong>Ufam</strong>.<br />

***<br />

Acadêmica do 6.º ano de Medicina, <strong>Ufam</strong>.<br />

****<br />

Acadêmico do 6.º ano de Medicina, <strong>Ufam</strong>.<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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PREVALÊNCIA DOS SINTOMAS NASAIS EM PACIENTES COM HANSENÍASE ACOMPANHADOS NA FUNDAÇÃO ALFREDO DA MATTA<br />

a resposta do hospedeiro é insuficientemente diferenciada,<br />

podendo evoluir para cura espontânea<br />

ou polarizar, dependendo da resposta imune<br />

celular. 6 Em localidades onde a baciloscopia não<br />

for disponível, a OMS recomenda que os pacientes<br />

sejam classificados de acordo com o número<br />

de lesões cutâneas, considerando-se<br />

paucibacilares aqueles com até cinco lesões e<br />

multibacilares aqueles com mais de cinco lesões.<br />

O Mycobacterium leprae tem tropismo pelas<br />

partes mais frias do corpo, como a pele das extremidades,<br />

os lobos das orelhas, hélix, anti-hélix,<br />

tragus, cartilagem alar, septo nasal e testículos, onde<br />

há temperatura ideal para seu desenvolvimento.<br />

Além disso, várias publicações são unânimes em<br />

afirmar que o nariz é sede inicial de lesões, precedendo<br />

inclusive as manifestações cutâneas. 1<br />

Dentre as manifestações nasais encontradas<br />

na hanseníase encontram-se obstrução,<br />

sangramento, rinorreia, crostas, dor, prurido,<br />

ressecamento, espirro, hiposmia, cacosmia e<br />

anosmia. 7 À rinoscopia anterior e posterior, as lesões<br />

da rinite leprótica configuram como infiltração,<br />

lepromas, ulcerações e perfuração.<br />

Isso põe em destaque a avaliação otorrinolaringológica<br />

como integrante do arsenal<br />

multidisciplinar diante do diagnóstico e acompanhamento<br />

do paciente hanseniano, principalmente<br />

daquele com as formas virchowiana e borderline,<br />

onde o envolvimento das vias aéreas superiores é<br />

frequente e extenso. 8<br />

OBJETIVOS<br />

Estudar a prevalência das queixas nasais em<br />

pacientes de hanseníase com qualquer uma das<br />

formas clínicas. Identificar a frequência de cada<br />

sintoma nasal em pacientes hansenianos e relacionar<br />

os sintomas nasais com a classificação clínica<br />

de hanseníase.<br />

PACIENTES E MÉTODOS<br />

O estudo é de prevalência, realizado na<br />

Fundação Alfredo da Matta, organização de referência<br />

da OMS na América Latina no estudo da<br />

Hanseníase e responsável historicamente pelo diagnóstico<br />

de aproximadamente 50% dos casos novos<br />

de hanseníase do Estado do Amazonas. 3<br />

Por meio da análise dos prontuários, foram<br />

selecionados 40 (quarenta) pacientes entre 18 e 60<br />

anos com diagnóstico definitivo de hanseníase,<br />

com qualquer uma de suas formas clínicas e em<br />

acompanhamento na Fundação Alfredo da Matta<br />

durante o período de agosto de 2006 a abril de 2007.<br />

Foram excluídos da pesquisa grávidas, menores de<br />

18 anos e maiores de 60 anos e portadores de doenças<br />

concomitantes.<br />

Os pacientes eram inquiridos quanto às<br />

queixas nasais da hanseníase na Fundação Alfredo<br />

da Matta e eram prontamente encaminhados para<br />

avaliação otorrinolaringológica se preenchessem<br />

algum dos sintomas listados na ficha padronizada<br />

de entrevista. Durante esse atendimento, eram novamente<br />

entrevistados e examinados por intermédio<br />

de rinoscopia anterior.<br />

RESULTADOS<br />

Durante o período de realização da pesquisa,<br />

de agosto de 2006 a abril de 2007, a Fundação<br />

Alfredo da Matta registrou um total de 179 casos<br />

novos de hanseníase. Foram então selecionados<br />

para a pesquisa quarenta pacientes em acompanhamento<br />

na instituição, sendo vinte e seis homens<br />

(65%) e catorze mulheres (35%).<br />

Quanto à forma clínica, em ordem decrescente<br />

de frequência, encontramos nove pacientes<br />

com a forma LL (22,5%); oito com a forma BB (20%);<br />

sete com a forma BT (17,5%); cinco com a forma<br />

BV (12,5%); quatro com a forma TT (10%); quatro<br />

com a forma I (10%); dois com forma NP (5%) e<br />

um com ENH (2,5%). Considerando os pacientes<br />

em multibacilares ou paucibacilares, houve<br />

prevalência de 55% dos primeiros.<br />

Observou-se que 57,5% dos pacientes apresentavam<br />

queixas otorrinolaringológicas referentes<br />

ao nariz e que muitos deles não relacionavam<br />

tais sintomas à hanseníase. Em 56,5% dos casos,<br />

os pacientes detinham entre dois a seis sintomas e<br />

em 57%, tal sintomatologia era referida em anos.<br />

34<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


JONAS RIBAS, EDUARDO ABRAM KAUFFMAN, CLÁUDIA MARINA PUGA BARBOSA OLIVEIRA, JÚLIO CÉSAR SIMAS RIBEIRO<br />

A queixa nasal mais frequente foi obstrução<br />

nasal, observada em 60,9% dos pacientes sintomáticos,<br />

seguida pela hiposmia (52,2%). Encontramos<br />

ainda dor nasal e ressecamento nasal, ambos<br />

em 47,8% dos casos; dispneia e alteração da<br />

fonação em 30,4%; eliminação de crostas em 26,1%;<br />

prurido e espirros em 21,7%; sangramento nasal e<br />

rinorreia em 17,4%; cacosmia em 8,7% e nenhum<br />

caso de anosmia (Tabela 1).<br />

Faz-se mister também relacionar a presença<br />

ou ausência de sintomas com a forma clínica<br />

apresentada pelos pacientes. Dentre os pacientes<br />

com a forma Neural Pura (NP), observou-se que<br />

metade tinha sintoma nasal; nos com forma<br />

Virchowiana ou Lepromatosa (LL), 77,8% era sintomático<br />

e 22,2%, assintomático; nos pacientes com<br />

forma Borderline-Virchowiana ou Borderline-<br />

Lepromatosa (BL), 66,7% apresentou queixa nasal<br />

e 33,3% não apresentou; os com forma Borderline-<br />

Borderline (BB) foram 100% assintomáticos; os<br />

pacientes com forma Borderline-Tuberculoide (BT)<br />

eram sintomáticos em 71,4% dos casos e<br />

assintomáticos em 28,6% deles; os com forma<br />

Tuberculoide-Tuberculoide (TT) eram sintomáticos<br />

em 50% dos casos; os com forma Indeterminada<br />

de hanseníase eram 100% sintomáticos e o único<br />

paciente com Eritema Nodoso Hansênico era<br />

assintomaico.<br />

Tabela 1– Sintomas nasais em ordem decrescente de<br />

prevalência.<br />

Sintomas<br />

Obstrução nasal<br />

Hiposmia<br />

Dor nasal<br />

Ressecamento nasal<br />

Dispneia<br />

Alteração da fonação<br />

Crostas<br />

Prurido<br />

Espirro<br />

Sangramento nasal<br />

Rinorreia<br />

Cacosmia<br />

Anosmia<br />

Número de Pacientes<br />

14<br />

12<br />

11<br />

11<br />

7<br />

7<br />

6<br />

5<br />

5<br />

4<br />

4<br />

2<br />

0<br />

%<br />

60,9<br />

52,2<br />

47,8<br />

47,8<br />

30,4<br />

30,4<br />

26,1<br />

21,7<br />

21,7<br />

17,4<br />

17,4<br />

8,7<br />

0<br />

DISCUSSÃO<br />

Houve predominância de homens doentes<br />

em relação às mulheres, com proporção de quase<br />

2:1, estando em consonância com a literatura especializada<br />

que explica tal fato pelas teorias de<br />

maior exposição do sexo masculino ou de maior<br />

resistência inerente à mulher. 3,5<br />

O número de casos do grupo paucibacilar<br />

foi menor do que o do multibacilar, acompanhando<br />

o panorama nacional da moléstia. 2,7 A forma<br />

clínica mais frequente tanto nos pacientes em geral<br />

quanto nos sintomáticos foi a Virchowiana (LL),<br />

sendo tal achado concordante com alguns estudos,<br />

4,5,9 seguida em ambos os casos pela forma<br />

paucibacilar Borderline-Tuberculoide (BT).<br />

O achado relevante de 57,5% de pacientes<br />

com queixas otorrinolaringológicas referentes ao<br />

nariz é compatível com o de Martins et al. (2005),<br />

onde detectou 70% de sintomáticos em sua amostra.<br />

A referência de duração da sintomatologia em<br />

anos pela maioria dos pacientes também foi encontrado<br />

por Abreu et al. (2006) e por Santos et al.<br />

(2000), onde se registrou casos de até 50 anos de<br />

evolução.<br />

A obstrução nasal, observada em 60,9% dos<br />

casos, é um dos sinais otorrinolaringológicos mais<br />

precoces da hanseníase e é reflexo da infiltração<br />

granulomatosa da mucosa. Mesmo com aparente<br />

perviedade da cavidade nasal, os pacientes podem<br />

referir obstrução, comum na rinite atrófica da<br />

hanseníase. 4<br />

Somente 22% dos sintomáticos compareceram<br />

à avaliação clínica e estes não apresentaram<br />

alterações de mucosa ao exame. Isso não condiz<br />

com o achado de alguns trabalhos, que descrevem<br />

alterações da mucosa nasal até mesmo em<br />

assintomáticos. 4 É importante salientar que esses<br />

trabalhos possuíam um arsenal de instrumentos<br />

mais eficazes para tal detecção, como a endoscopia<br />

nasal, propiciando uma visão mais detalhada da<br />

mucosa do que a rinoscopia anterior, e de biópsia<br />

nasal para se fazer diagnóstico diferencial quando<br />

necessário. 1,4<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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PREVALÊNCIA DOS SINTOMAS NASAIS EM PACIENTES COM HANSENÍASE ACOMPANHADOS NA FUNDAÇÃO ALFREDO DA MATTA<br />

CONCLUSÃO<br />

Destaca-se a negligência do exame da<br />

mucosa nasal por meio da rinoscopia anterior na<br />

rotina de atendimento em centros de tratamento<br />

para hanseníase.<br />

A forma clínica multibacilar Virchowiana<br />

(LL) é a que mais se relaciona com sintomas nasais,<br />

mas devemos ficar atentos com os sintomas<br />

também nas formas paucibacilares, que, apesar de<br />

menos suscetíveis à sintomatologia otorrinolaringológica<br />

que as formas multibacilares, figuraram<br />

como importantes causadores de queixas nasais.<br />

A pesquisa de lesões de mucosa nasal somente<br />

pela rinoscopia anterior, pelo espéculo nasal,<br />

pode conter falhas, sendo mais adequado o uso<br />

de métodos mais sofisticados para o diagnóstico<br />

correto dessas alterações, como endoscopia e<br />

biópsia nasal.<br />

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36<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


LESEMKY CATTEBEK, JOÃO BOTELHO, ONIVALDO CERVANTES, GECILDO ANJOS, RODOLFO FREITAS, HELDER ALAGIA, VIVIANE SALDANHA<br />

ACHADOS HISTOP<br />

OPATOL<br />

OLÓGIC<br />

ÓGICOS EM GLÂNDULAS<br />

TIREOIDEAS DE NECRÓPSIAS DE ADULTOS JOVENS<br />

HABITANTES ANTES DA REGIÃO AMAZÔNICA<br />

HISTOPATOLOGICAL FINDIGNS IN THYROID GLANDS FROM AUTOPSY OF YOUNG ADULTS<br />

FROM AMAZONIA<br />

Lesemky Carlile Herculano Cattebeke * , Prof. Dr. L. D João Bosco Botelho ** , Prof. Dr. L. D. Onivaldo Cervantes *** , Gecildo<br />

Soriano dos Anjos **** , Rodolfo Fagionato de Freitas ***** , Helder Freitas Alagia ****** , Viviane Saldanha *******<br />

RESUMO: OBJETIVOS: Procurar alterações histopatológicas macroscópicas e microscópicas em glândulas<br />

tireoideas provenientes de necrósias de pacientes sem história prévia de doença tireoidiana. MÉTODO: As glândulas<br />

tireoideas foram retiradas, fotografadas, fixadas em formol a 10%, pesadas, medidas e avaliadas. Cortes<br />

seriados foram realizados a cada 2-3 mm da glândula e pelo menos 3 áreas em cada lobo e áreas suspeitas estudadas<br />

microscopicamente. RESULTADOS: Foram estudadas 15 glândulas tireoideas inteiras, com tecidos adjacentes<br />

provenientes de necropsias de indivíduos masculinos de 17 a 56 anos (média de 31,4 anos), procedentes e<br />

habitantes da região amazônica não litorânea, sem doença tireoidea prévia e mortos por causas acidentais ou<br />

violentas. O peso médio das glândulas estudadas foi 16,17 g, foram encontradas 6 (40%) tireoides normais, 9<br />

(60%) bócios difusos, sendo um (6,6%) Coloide, Cistos coloides em 3 (20%) e microcistos em 4 (26,66%) dos<br />

indivíduos. CONCLUSÃO: Estas alterações encontradas são características de indivíduos provenientes de área<br />

endêmica para bócio, no caso a região amazônica, provavelmente pela dieta alimentar local levando à deficiência<br />

de iodo.<br />

Descritores: 1. Tireoide. 2. Autópsia. 3. Bócio. 4. Histopatológico.<br />

ABSTRACT: OBJECTIVES: Search macroscopic and microscopic histopathological changes in thyroid glands<br />

that were collected at autopsy of subjects with no previous thyroid disease. METHODS: Thyroid glands were<br />

collected, photographed, fixed in formalin, weighed, measured and analyzed. All glands were serially sectioned<br />

at 2-3 mm intervals and at minimum 3 areas for lobe and suspected areas are microscopically examined. RESULTS:<br />

We studied 15 whole thyroid glands. All subjects are men, habitants of Amazon’s central region, had no known<br />

clinical history of thyroid disease and are dead for violent or trauma causes. Age varied from 17 to 56 years (31,4<br />

years of median age).The glands had 16,17 g of median weight, and we find 6 (40%) of normal thyroid glands, 9<br />

(60%) diffuse goiters (one of then Colloid), colloid cysts in 3 (20%) and micro cysts in 4 (26,66%) subjects.<br />

CONCLUSION: The morphologic changes are from individuals characteristically from an endemic goiter region,<br />

in the Amazon region, probably as a result of the local diet conducing to iodine deficiency.<br />

Keywords: 1. Thyroid. 2. Autopsy. 3. Goiter. 4. Histopathology.<br />

*<br />

Professor titular da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Departamento de Clínica Cirúrgica II da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Amazonas (<strong>Ufam</strong>),<br />

preceptor da Residência Médica em Otorrinolaringologia do <strong>Hospital</strong> Santa Júlia e <strong>Hospital</strong> Adriano Jorge, doutorando em Biotecnologia pela <strong>Ufam</strong>.<br />

**<br />

Professor doutor e livre-docente, ex-chefe da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Departamento de Clínica Cirúrgica II – Universidade Federal do Amazonas (<strong>Ufam</strong>).<br />

***<br />

Professor da Disciplina de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial da Universidade do Estado do Amazonas e do Centro Universitário Nilton Lins, preceptor da<br />

Residência Médica em Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial do <strong>Hospital</strong> Santa Júlia e <strong>Hospital</strong> Adriano Jorge.<br />

****<br />

Professor associado, doutor e livre-docente da Disciplina de Otorrinolaringologia e Distúrbios da Comunicação Humana da Unifesp – EPM<br />

*****<br />

Mestres em Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço, médico cirurgião assistencial do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong> – <strong>Ufam</strong> e preceptor da Residência<br />

Médica em Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial do <strong>Hospital</strong> Santa Júlia e Fundação <strong>Hospital</strong> Adriano Jorge, doutorandos em Biotecnologia pela <strong>Ufam</strong><br />

******<br />

Professor do Departamento de Patologia e Medicina Legal da Universidade Federal do Amazonas e médico perito legista do Instituto Médico-Legal do Amazonas<br />

*******<br />

Otorrinolaringologista, preceptora da Residência Médica em Otorrinolaringologia e Cirurgia do <strong>Hospital</strong> Santa Júlia e Fundação <strong>Hospital</strong> Adriano Jorge, doutoranda em<br />

Biotecnologia pela <strong>Ufam</strong>.<br />

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ACHADOS HISTOPATOLÓGICOS EM GLÂNDULAS TIREOIDEAS DE NECRÓPSIAS DE ADULTOS JOVENS HABITANTES DA REGIÃO AMAZÔNICA<br />

1. INTRODUÇÃO<br />

Os diagnósticos das alterações<br />

morfológicas e funcionais da tireoide são de importância<br />

singular porque são passíveis de prevenção<br />

ou tratamento clínico ou cirúrgico. Muitos<br />

trabalhos referem anormalidades tireoideas em<br />

indivíduos assintomáticos, o que, do ponto de vista<br />

anatômico, geram os “bócios”. 1<br />

O bócio é qualquer aumento de volume da<br />

glândula tireoide, não importando a etiologia ou<br />

fisiopatologia. Sob a perspectiva da histopatologia,<br />

contudo, o bócio representa uma hipertrofia difusa<br />

do tecido tireoideo em consequência da hiperplasia<br />

das células foliculares. Quanto à fisiologia, quase<br />

sempre o bócio se acompanha de hipotireoidismo,<br />

levando a graves consequências ao metabolismo<br />

do indivíduo e mesmo ao intelecto. Associado a<br />

estas doenças benignas, ocorre uma incidência aumentada<br />

também de tumores malignos, os cânceres<br />

da glândula tireoide. A Organização Mundial<br />

de Saúde (OMS) reconhece a existência de bócio<br />

endêmico quando, em determinada área geográfica,<br />

mais de 10% da população em geral ou 20%<br />

das crianças e adolescentes, de ambos os sexos, são<br />

portadoras de bócio. 1,2,3<br />

Com as modernas técnicas de imagem, principalmente<br />

a ecografia, cada vez mais se detectam<br />

alterações na anatomia tireoidea, e até nódulos não<br />

palpáveis podem ser biopsiados por uma aspiração<br />

com agulha fina (PAAF). 4,5 Mas a sensibilidade<br />

e especificidade destes exames são limitadas,<br />

pois são dependentes da experiência do examinador<br />

e somente o exame histopatológico convencional<br />

pode dar uma maior segurança ao pesquisador.<br />

Estudos da glândula tireoide em autópsias são<br />

frequentes na literatura mundial, verificando-se<br />

que a prevalência de achados morfológicos alterados<br />

relacionam-se a diversos fatores como: o aumento<br />

da faixa etária estudada, 6 a localização geográfica<br />

da população, 7 o método da pesquisa, entre<br />

outros. 8<br />

Pesquisas post morten em jovens são importantes<br />

porque a identificação destas alterações<br />

assintomáticas pode levar a medidas preventivas<br />

na população que interrompam a evolução natural<br />

da doença e melhorem a expectativa e a qualidade<br />

de vida desses pacientes numa idade mais<br />

avançada.<br />

2. MÉTODO<br />

O presente estudo apresenta como material<br />

15 glândulas tireoideas inteiras com tecidos adjacentes<br />

provenientes de autópsias de indivíduos<br />

com as seguintes características:<br />

1. Morte por causas não relacionadas a doenças<br />

tireoideas.<br />

2. Idade compreendida entre 17 e 56 anos<br />

(média = 32,46).<br />

3. Ausência de fatores relacionados ao tipo<br />

de morte ou tempo de morte que prejudicassem o<br />

correto estudo da glândula (ferimentos, queimaduras,<br />

ação da flora cadavérica, decomposição).<br />

4. Todos procedentes e domiciliados na região<br />

amazônica, em áreas não litorâneas, sem antecedentes<br />

de moradia em outras localidades.<br />

5. Ausência de história familiar de doença<br />

tireoidea conhecida.<br />

6. Consentimento por escrito da coleta, após<br />

esclarecimento, de familiar ou responsável.<br />

1. Coleta da glândula tireoidea diante dos<br />

cadáveres segundo técnica específica padronizada,<br />

obedecendo a diretrizes da legislação médicolegal<br />

vigente no Instituto Médico-Legal. Participação<br />

ativa e consentida em conjunto com os médicos<br />

legistas da instituição. Terminada a perícia médico-legal,<br />

o cadáver foi colocado em hiperextensão<br />

cervical com um coxim de madeira sob as escápulas<br />

e iniciada a coleta da glândula tireoide. A incisão<br />

mediana é ampliada até o osso hioide e<br />

aprofundada na linha média entre a cartilagem<br />

tireoidea superiormente e os primeiros anéis<br />

traqueais inferiormente, expondo a glândula<br />

tireoide. A musculatura infra-hioidea foi afastada<br />

lateralmente e, em casos de difícil dissecção, foi<br />

seccionada transversalmente de modos a facilitar<br />

a retirada completa da glândula. Após a dissecção<br />

38<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

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LESEMKY CATTEBEK, JOÃO BOTELHO, ONIVALDO CERVANTES, GECILDO ANJOS, RODOLFO FREITAS, HELDER ALAGIA, VIVIANE SALDANHA<br />

anterior e lateral da tireóide, procurando-se não<br />

lesar a cápsula, seguiu-se à secção dos pedículos<br />

arteriovenosos superiores e inferiores. Os nervos<br />

laríngeos recorrentes e superiores, paratireoides,<br />

gordura e linfonodos peri-tireoideos foram retirados<br />

em bloco com a peça principal. O exame<br />

macroscópico e microscópico, medição e pesagem<br />

da glândula, foram realizadas segundo técnicas<br />

preconizadas 9 pela Sociedade Brasileira de Patologia,<br />

no Departamento de Patologia da Faculdade<br />

de Ciências da Saúde da Fundação Universidade<br />

do Amazonas. Após a macroscopia, a glândula<br />

foi pesada com balança de precisão. Cortes longitudinais<br />

foram realizados a cada 2-3 mm e analisados<br />

sistematicamente com o objetivo de identificar<br />

lesões suspeitas (Figura 1). As alterações foram<br />

registradas e serviram para o exame<br />

histológico. Foram realizadas de 3 a 5 lâminas de<br />

cada lobo e istmo. Lâminas são preparadas e coradas<br />

com hematoxilina e eosina. Baseado nos dados<br />

coletados, foi calculado o coeficiente de correlação<br />

entre as variáveis peso das glândulas<br />

tireoideas versus idade dos pacientes. O resultado<br />

foi R = 0,3971, aparentemente sugerindo correlação<br />

positiva (o peso aumenta com a idade), porém<br />

o teste de Pearson mostrou com resultado r - value<br />

= 0,143, não mostrando significância estatística<br />

entre as variáveis em questão.<br />

restantes foram classificadas como bócios. Sendo<br />

que uma como bócio coloide. Não foram identificados<br />

focos de carcinoma ou tireoidite, embora<br />

houvesse focos de infiltrado linfocítico focal. A<br />

única alteração congênita encontrada foi a presença<br />

do lobo piramidal, ou pirâmide de Lalouette,<br />

em 2 pacientes, E e H (Tabela 1). Todas as glândulas<br />

encontravam-se na topografia usual e se constituíam<br />

de dois lobos principais e um istmo.<br />

Tabela 1– Achados Morfológicos em 15 tireoides provenientes<br />

de necropsias de pacientes sem doença conhecida<br />

prévia, provenientes da região amazônica, segundo<br />

a idade.<br />

Idade<br />

Indivíduos<br />

Tireoide Normal<br />

Peso Médio (g)<br />

Bócio Difuso<br />

Fibrose<br />

Congestão Vascular<br />

Infiltrado Linfocitário<br />

Hemorragias<br />

Hiperplasia Nodular<br />

Microcistos<br />

Cápsula íntegra<br />

Carcinomas<br />

Adenomas<br />

Cistos Coloides<br />

17 A 36<br />

ANOS<br />

9<br />

6<br />

14,17 g<br />

3<br />

4<br />

4<br />

2<br />

1<br />

1<br />

2<br />

9<br />

0<br />

0<br />

2<br />

37 A 56<br />

ANOS<br />

6<br />

0<br />

19,15 g<br />

6<br />

2<br />

5<br />

1<br />

2<br />

0<br />

2<br />

6<br />

0<br />

0<br />

1<br />

TOTAL %<br />

15 (100%)<br />

6 (40%)<br />

16,17 g<br />

9 (60%)<br />

6 (40%)<br />

9 (60%)<br />

3 (20%)<br />

3 (20%)<br />

1 (6,66%)<br />

4 (26,66%)<br />

100 %<br />

0<br />

0<br />

3 (20%)<br />

4. DISCUSSÃO<br />

Figura 1 – Cortes seriados a cada 2-3 mm da glândula tireoide.<br />

3. RESULTADOS<br />

A idade média dos 15 indivíduos do estudo<br />

foi de 31,4 anos, variando de 17 a 56 anos. Após<br />

a retirada dos tecidos adjacentes o peso médio foi<br />

16,17 g, variando de 9,3 a 30 g. Sete glândulas foram<br />

classificadas como normais. Oito glândulas<br />

A média de idade dos indivíduos deste estudo,<br />

de 31,4 anos, é uma das mais baixas da literatura;<br />

existe pouca informação publicada sobre o<br />

tipo e prevalência de doença tireoidea oculta em<br />

adultos jovens. 6,10<br />

Komorowski & Hanson 10 informam que há<br />

inúmeras razões para se procurar entender o tipo<br />

e a incidência de doenças tireoideas ocultas em<br />

adultos jovens. Primeiramente este estudo pode<br />

contribuir substancialmente para entendermos a<br />

prevalência e a história natural da doença de desordens<br />

tireoideas potencialmente graves. Outras<br />

razões são citadas, como em uso como grupo con-<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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ACHADOS HISTOPATOLÓGICOS EM GLÂNDULAS TIREOIDEAS DE NECRÓPSIAS DE ADULTOS JOVENS HABITANTES DA REGIÃO AMAZÔNICA<br />

trole, comparação entre áreas geográficas e exposição<br />

a elementos cancerígenos. Em uma série<br />

de 138 necropsias de adultos com idade entre 20<br />

e 40 anos eles encontraram somente 3% de carcinomas<br />

ocultos, o peso médio foi de 17,3 g em homens<br />

e 16,8 g em mulheres, adenomas foram encontrados<br />

em 10% e fibrose em 8% das glândulas.<br />

Estudos de patologia oculta de tireoide em<br />

adultos foram formulados quase exclusivamente<br />

em populações de idade avançada, refletindo a<br />

idade em que se fazem mais necropsias nos diversos<br />

centros médicos, 10 geralmente em Serviços de<br />

Verificação de Óbito (SVO) e não em Institutos<br />

Médico-Legais (IML).<br />

Outra característica encontrada é que os pacientes<br />

são todos do sexo masculino, isso em função<br />

da maior exposição deste sexo à causa de morte<br />

violenta ou acidental (10 dos 15 óbitos foram causados<br />

por ferimento por arma branca ou de fogo).<br />

Identificou-se uma alta incidência de bócio<br />

difuso em indivíduos jovens (60%), achado compatível<br />

com indivíduos habitantes em região<br />

endêmica para bócio, com fatores provavelmente<br />

relacionados à ingesta alimentar deficiente em<br />

iodo 3,11,12 ou fatores outros ainda não esclarecidos.<br />

Lima & Montandon 13 acharam uma incidência de<br />

35% de bócio e Bisi, Fernandes, Asato de Camargo,<br />

Koch, Abdo e Thales de Brito 7 de 36% em regiões<br />

do Sudeste brasileiro.<br />

O bócio endêmico é mais prevalente em áreas<br />

montanhosas como os Alpes, Andes e Himalaia,<br />

mas também podem ocorrer em regiões não montanhosas<br />

remotas do mar, mas com esta distribuição<br />

nem sempre a ingestão deficiente em iodo é a<br />

causa dominante da enfermidade. 2,5,14,15<br />

Dois estágios podem ser identificados na<br />

evolução do bócio não-tóxico difuso, sendo o primeiro<br />

estágio hiperplásico e o segundo da involução<br />

coloide. 11 No estágio de hiperplasia a glândula é moderadamente<br />

aumentada de tamanho, aumentada<br />

difusamente, simetricamente e torna-se acentuadamente<br />

hiperêmica. O aumento da massa de células<br />

é detido pelo eutireoidismo e a duração desta<br />

fase é extremamente variável. Os pacientes estavam<br />

na maior parte nesta fase.<br />

O acúmulo de coloide não é uniforme e alguns<br />

ficam muito distendidos, enquanto outros<br />

permanecem pequenos e podem mesmo reter pequenas<br />

invaginações de células hiperplásicas. O<br />

coloide acumulado produz acentuado aumento da<br />

consistência e uma superfície gelatinosa, brilhante.<br />

11 É o chamado bócio coloide. Convém lembrar<br />

que microcistos foram encontrados em 4 indivíduos<br />

(26,66%) e cistos coloides em 3 (20%).<br />

Então, o significado clínico das alterações<br />

encontradas (bócio difuso não tóxico) depende de<br />

sua capacidade de encontrar o estado de<br />

eutireoidismo. Raros pacientes são hipotireoideos<br />

e o TSH quase que invariavelmente está elevado.<br />

É provável que o principal significado do bócio<br />

difuso é que ele é o precursor de um bócio<br />

nodular. 11 Bisi, Fernandes, Asato de Camargo,<br />

Koch, Abdo & Thales de Brito, 7 examinando 300<br />

glândulas tireoideas inteiras, sendo 200 de mulheres,<br />

encontraram 6,6% de neoplasias benignas e<br />

malignas incidentais, sendo 2,33% de carcinomas,<br />

e 1% ocultos. Encontraram também 42,32% de<br />

tireoides normais e 36% de bócios, sendo 28,33%<br />

de bócios nodulares e 7% de bócios coloides<br />

difusos.<br />

Bisi, Fuggeri, Longatto Filho, Asato de<br />

Camargo, Fernandes & Abdo, 8 em artigo de revisão,<br />

procuraram lesões tireoideas neoplásicas, ou<br />

não, em seis décadas de autopsias de rotina<br />

(145,043 casos). Encontraram lesões neoplásicas<br />

insuspeitas em 425 casos (8,38%), sendo que destas<br />

68,24% eram malignas. Nessa casuística, as lesões<br />

não neoplásicas mais frequentes foram os<br />

bócios coloides adenomatosos com 3.135 casos<br />

(61,83% das lesões não neoplásicas).<br />

Lima & Montandon, 13 num estudo em cem<br />

necropsias, identificaram 21% de neoplasias benignas<br />

e malignas. Esse trabalho realizado no Triângulo<br />

Mineiro encontrou 14 carcinomas papilíferos<br />

sendo que 12 menores que 1 cm de diâmetro, os<br />

chamados microcarcinomas de tireoide (MCT).<br />

Bócio coloide foi encontrado em 35% dos casos,<br />

sendo 31 casos do tipo nodular e 4 do tipo coloide.<br />

Os carcinomas papilíferos encontrados apresenta-<br />

40<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


LESEMKY CATTEBEK, JOÃO BOTELHO, ONIVALDO CERVANTES, GECILDO ANJOS, RODOLFO FREITAS, HELDER ALAGIA, VIVIANE SALDANHA<br />

vam na maioria (57,14%) padrão folicular. O peso<br />

médio das glândulas foi 23,1 g. Tireoides consideradas<br />

normais foram 43%.<br />

Enfim, analisando esta série em comparando<br />

com a literatura, verifica-se a importância de<br />

uma verificação sistemática e detalhada das glândulas<br />

tireoideas em autopsias na busca de esclarecer<br />

as vias de desenvolvimento e características<br />

dessa patologia (o bócio) na região amazônica e<br />

no restante do mundo.<br />

CONCLUSÃO<br />

Os resultados encontrados nos mostram<br />

que a maioria dos indivíduos do grupo estudado<br />

possui alterações microscópicas nas suas glândulas<br />

tireoideas. Essas alterações são características<br />

de habitantes de área endêmica para bócio por provável<br />

deficiência alimentar ou na absorção do iodo.<br />

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revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

41


ACHADOS HISTOPATOLÓGICOS EM GLÂNDULAS TIREOIDEAS DE NECRÓPSIAS DE ADULTOS JOVENS HABITANTES DA REGIÃO AMAZÔNICA<br />

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1999 Jun 12; 129 (23):873-82.<br />

Local de realização do trabalho:<br />

Instituto Médico-Legal do Amazonas<br />

Faculdade de Medicina da Universidade Federal<br />

do Amazonas<br />

CONTATOS PARA CORRESPONDÊNCIA:<br />

Dr. Lesemky Cattebeke<br />

Rua Vila Amazonas, 488/404-B<br />

CEP: 69057240 – Manaus-AM<br />

Telefone: (92) 3236-3624<br />

e-mail: cattebeke@uol.com.br<br />

42<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


FERNANDO WESTPHAL, LUIZ LIMA, JOSÉ NETO, RILDO GOMES, KARINA ARNEZ, SILENO FILHO, ANA NUERZA<br />

ALTERA<br />

TERAÇÕES GASOMÉTRIC<br />

ASOMÉTRICAS DURANTE LAVADO<br />

ADO<br />

BRON<br />

ONCOAL<br />

ALVEOL<br />

VEOLAR EM UM SERVIÇO ESPECIALIZA-<br />

DO DE BRON<br />

ONCOSC<br />

OSCOPIA OPIA DE MANAUS<br />

GASOMETRIES ALTERATIONS DURING BRONCHOALVEOLAR LAVAGE IN ESPECIALIZED<br />

SERVICE OF MANAUS<br />

Fernando Luiz Westphal*, Luiz Carlos de Lima*, José Correa Lima Neto*, Rildo Guilherme de Oliveira Gomes**, Karina<br />

Rabelo Albuquerque de Arnez***, Sileno de Queiroz Fortes Filho****, Ana Carolina Quico Nuerza****<br />

RESUMO: Objetivo: Avaliar as alterações gasosas induzidas pelo lavado broncoalveolar (LBA) quanto à presença<br />

de hipoxemia ou possível hipercapnia por meio de gasometria arterial. Métodos: Estudo prospectivo, no qual<br />

pacientes maiores de 18 anos foram submetidos à broncoscopia com LBA no <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong>,<br />

no período de dezembro de 2004 a novembro de 2005. Foram colhidas amostras sanguíneas por intermédio de<br />

punção arterial radial em membro superior com arco palmar íntegro, para avaliação gasométrica, antes do LBA<br />

e em vários tempos após seu início, sendo feita suplementação de oxigênio concomitante. Resultados: Vinte e<br />

cinco pacientes participaram do estudo, sendo a maioria do sexo masculino (78%). A pressão parcial de oxigênio<br />

(PaO 2<br />

) antes do início do procedimento teve uma média de 85mmHg, aumentando para 128mmHg quando do<br />

início da suplementação de oxigênio e depois se estabilizando em 82mmHg após a realização do LBA, tendo<br />

decréscimo, portanto, de 3mmHg da média inicial. A pressão parcial de dióxido de carbono (PaCO 2<br />

) variou de 38<br />

a 45mmHg, estabilizando em 43mmHg. Conclusão: O lavado broncoalveolar diminuiu a PaO 2<br />

significativamente,<br />

mas não chegou a provocar hipoxemia, fato provavelmente explicado pela suplementação de oxigênio feita<br />

antes do início do procedimento e durante ele. A PaCO 2<br />

estabilizou em valores considerados limítrofes após seu<br />

aumento inicial, não havendo hipercapnia.<br />

Palavras-chave: Lavagem Broncoalveolar; Gasometria; Testes de Função Pulmonar; Pressão parcial; Hipóxia;<br />

Hipercapnia.<br />

ABSTRACT: Objective: To evaluate the gaseous changes induced by bronchoalveolar lavage (BAL) for the<br />

presence of hypoxemia or possible hypercapnia using arterial blood gas. Methods: Prospective study in which<br />

patients over 18 were submitted to bronchoscopy with BAL in the University <strong>Hospital</strong> Getúlio <strong>Vargas</strong>, in the<br />

period December 2004 to November 2005. Blood samples were collected through a radial artery puncture in the<br />

upper limb with palmar arch intact, to evaluate gas before the LBA and several times after its inception, and<br />

given supplemental oxygen concurrently. Results: Twenty-five patients participated in the study, the majority<br />

being male (78%). The partial pressure of oxygen (PaO2) before the procedure took an average of 85mmHg,<br />

128mmHg when rising to the top of supplemental oxygen and then stabilized at 82mmHg after the LBA, and<br />

decrease, therefore, the average 3mmHg original. The partial pressure of carbon dioxide (PaCO2) ranged from 38<br />

to 45mmHg, stabilizing at 43mmHg. Conclusion: The bronchoalveolar lavage decreased PaO2 significantly, but did<br />

not cause hypoxemia, a fact probably explained by oxygen supplementation given before the procedure and during<br />

it. The PaCO2 stabilized at values considered borderline after its initial increase, resulting no hypercapnia.<br />

*<br />

Cirurgião Torácico.<br />

**<br />

Médico especialista em Anestesiologia.<br />

***<br />

Residente em Anestesiologia do <strong>HUGV</strong>.<br />

****<br />

Acadêmico de Medicina da Universidde Estadual de Medicina.<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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ALTERAÇÕES GASOMÉTRICAS DURANTE LAVADO BRONCOALVEOLAR EM UM SERVIÇO ESPECIALIZADO DE BRONCOSCOPIA DE MANAUS<br />

INTRODUÇÃO<br />

A introdução da fibrobroncoscopia flexível<br />

para o diagnóstico e tratamento das doenças pulmonares<br />

revolucionou a abordagem dessas patologias.<br />

1 Entre as diversas técnicas que surgiram está<br />

o lavado broncoalveolar (LBA), que é um método<br />

diagnóstico minimamente invasivo, tendo por conceito<br />

básico o recolhimento de células e exsudato<br />

inflamatório presentes na superfície epitelial do<br />

alvéolo, interagindo, assim, com processos<br />

imunológicos, inflamatórios e infecciosos ali presentes.<br />

2,3 O LBA facilitou a análise microbiológica do<br />

trato respiratório inferior sem contaminação da<br />

amostra por microrganismos da orofaringe, 2 possibilitou<br />

um melhor estudo da fisiopatogênese e<br />

da avaliação da atividade das doenças que acometem<br />

o interstício pulmonar e auxiliou no diagnóstico<br />

de doenças oportunistas. 4<br />

Pacientes com HIV/aids, por exemplo,<br />

apresentam risco aumentado para infecções oportunistas<br />

respiratórias, mas por causa da ausência<br />

de especificidade nos achados clínicos e de imagem,<br />

o LBA tornou-se fundamental no diagnóstico<br />

dessas doenças, melhorando o prognóstico desses<br />

pacientes, na medida em que passou a ser feita<br />

a terapia mais adequada. 2,3,5<br />

Ao longo de décadas, a Medicina vem desenvolvendo<br />

inúmeras formas de melhor detectar<br />

e quantificar o transporte de oxigênio para avaliação<br />

da eficiência do sistema que o distribui no organismo.<br />

A gasometria arterial permite a medida<br />

da pressão parcial de oxigênio (PaO 2<br />

), da pressão<br />

parcial do dióxido de carbono (PaCO 2<br />

) e do pH, e<br />

permanece como o método mais confiável na<br />

monitorização da oxigenação e da ventilação. O<br />

controle da oxigenação durante o LBA, entretanto,<br />

é realizado mais comumente pela medida da<br />

saturação da hemoglobina pela oximetria de pulso.<br />

6,7<br />

As razões pelas quais a oximetria de pulso<br />

substituiu a gasometria arterial durante o LBA<br />

são: (1) menor risco de complicações por ser um<br />

método não-invasivo, ao contrário da gasometria,<br />

na qual há o risco de infecções, bem como a possibilidade<br />

de sangramentos; (2) monitorização das<br />

alterações do oxigênio de forma rápida e contínua,<br />

por intermédio da medida da saturação do<br />

oxigênio (SaO 2<br />

), o que implica um melhor acompanhamento<br />

durante a realização do LBA, que é<br />

considerado um método simples e rápido. 6,7<br />

A oximetria de pulso, no entanto, é consideravelmente<br />

limitada quando utilizada para estimar<br />

a PaO 2<br />

do sangue. A relação entre a PaO 2<br />

e a<br />

SaO 2<br />

(curva de dissociação da hemoglobina) sofre<br />

influências da temperatura, da PaCO 2<br />

e dos teores<br />

de 2,3 difosfoglicerato (2,3,DPG), presentes nas<br />

hemácias. Além disso, considerando a precisão da<br />

oximetria, uma SaO 2<br />

de 95% pode representar uma<br />

saturação real entre 91 e 99%. Ora, tanto a SaO 2<br />

de<br />

91% pode expressar uma PaO 2<br />

de 60mmHg como<br />

a SaO 2<br />

de 99% uma PaO 2<br />

de 160mmHg. 7<br />

Dessa forma, o presente trabalho vem mostrar<br />

as alterações das trocas gasosas durante o lavado<br />

broncoalveolar pela utilização da gasometria<br />

arterial, considerado o exame padrão-ouro para a<br />

análise correta das medidas dos gases arteriais.<br />

MÉTODOS<br />

Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de<br />

Ética em Pesquisa da Fundação de Medicina Tropical<br />

do Estado do Amazonas – FMTAM.<br />

Fizeram parte do estudo todos os pacientes<br />

maiores de 18 anos de idade com indicação de<br />

broncoscopia e LBA no Serviço de Cirurgia<br />

Torácica do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

(<strong>HUGV</strong>), no período de dezembro de 2004 a novembro<br />

de 2005. Os exames foram realizados pelos<br />

médicos responsáveis pelo setor de<br />

broncoscopia e a análise das gasometrias foi feita<br />

pelo laboratório do próprio hospital.<br />

Foram excluídos do estudo os pacientes com<br />

antecedentes de doença coronariana, doença<br />

vascular periférica, insuficiência cardíaca sistólica<br />

e/ou diastólica, fístula arterio-venosa, doença pulmonar<br />

descompensada; ausência de integridade do<br />

arco palmar em ambos os membros superiores,<br />

instabilidade clínica a ponto de interromper o exa-<br />

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revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


FERNANDO WESTPHAL, LUIZ LIMA, JOSÉ NETO, RILDO GOMES, KARINA ARNEZ, SILENO FILHO, ANA NUERZA<br />

me e aqueles que se negaram a participar do estudo.<br />

Para o preparo dos pacientes foram feitos<br />

os seguintes procedimentos: (1) venóclise no membro<br />

superior contralateral ao que seria colhida a<br />

amostra sanguínea para gasometria; (2) punção<br />

arterial em membro superior com arco palmar íntegro;<br />

(3) monitorização dos sinais vitais; (4)<br />

anestesia da via aérea, consistindo de anestesia<br />

tópica de oro e nasofaringe, além de anestesia<br />

endovenosa com midazolan 5mg e fentanil 50ìg.<br />

Com relação à técnica, o local selecionado<br />

para lavagem depende da região acometida, mas<br />

nos casos onde o comprometimento pulmonar é<br />

difuso, o lobo médio ou a língula são os preferencialmente<br />

lavados, pois o retorno de fluxo é maior<br />

pela posição pendente dos brônquios<br />

subsegmentares no paciente em posição supina. 4<br />

O broncoscópio é introduzido até atingir<br />

um brônquio compatível com seu tamanho, que<br />

geralmente é um de 3.ª à 5.ª ordens, e em seguida<br />

injetam-se quantias de 20-50ml até um total de 100-<br />

200ml (máximo de 300ml) de salina estéril, de preferência<br />

a 37ºC. 8 Após cada quantia, o líquido é<br />

aspirado manualmente ou por pressão de aspiração<br />

negativa (50-80mmHg). Desconhece-se o tempo<br />

ideal que o líquido deve ser mantido antes de<br />

ser aspirado. 2<br />

A primeira alíquota, geralmente, tem um<br />

baixo retorno de até 20%. 9 Durante o exame este<br />

valor deve subir para 40-70%, sendo o volume<br />

médio total de retorno em voluntários normais<br />

não-fumantes de 60-80% do volume injetado. Pacientes<br />

fumantes e com doenças pulmonares, principalmente<br />

DPOC, terão um retorno mais diminuído.<br />

Foram tomados os cuidados necessários na<br />

colheita das amostras sanguíneas para a gasometria<br />

arterial, as quais devem ser obtidas em condições<br />

anaeróbicas, colocadas em gelo e mantidas a 0ºC<br />

até a leitura. A presença de bolhas de ar na amostra<br />

sanguínea também influencia a leitura dos gases,<br />

com aumento da PaO 2<br />

e diminuição da PaCO 2.<br />

Os aparelhos tradicionais para medida do pH e da<br />

gasometria utilizam eletrodos especiais para a leitura<br />

do pH, do oxigênio (eletrodo de Clark) e do<br />

dióxido de carbono (eletrodo de Severinghaus), os<br />

quais necessitam de calibrações frequentes, que<br />

muitas vezes retardam a leitura das amostras. 6<br />

Foram realizadas gasometrias seriadas nos<br />

seguintes tempos:<br />

• T1 – paciente sem suplementação de oxigênio;<br />

• T2 – após 2 minutos de suplementação de<br />

oxigênio;<br />

• T3 – 1.º minuto após início da coleta do<br />

LBA;<br />

• T4 – 2.º minuto após início do LBA;<br />

• T5 – 3.º minuto após início do LBA;<br />

• T6 – 4.º minuto após início do LBA;<br />

• T7 – 5.º minuto após início do LBA.<br />

A suplementação de oxigênio foi realizada<br />

nos pacientes com máscara facial em circuito circular<br />

com absorção de CO 2<br />

, em FiO 2<br />

de 1,0. A manutenção<br />

da oxigenação foi feita com O 2<br />

nasal a<br />

4,0L/min, até o final do exame. O volume total de<br />

líquido utilizado no lavado foi de 120ml de soro<br />

fisiológico 0,9%.<br />

O método estatístico utilizado para a análise<br />

dos dados foi o descritivo, por meio da média<br />

das aferições realizadas nos tempos estudados das<br />

variáveis PaO 2<br />

e PaCO 2<br />

.<br />

RESULTADOS<br />

Participaram do estudo 25 pacientes, dos<br />

quais 72% foram do sexo masculino (n = 18) e 28%<br />

do sexo feminino (n = 7), com média de idade de<br />

51,4 anos (variação entre 28-72 anos). Somente em<br />

12 pacientes foi resgatada a principal indicação da<br />

broncoscopia com LBA, sendo cinco por infiltrado<br />

pulmonar, três por massa pulmonar, dois por<br />

bronquiectasias, um por fibrose pulmonar e outro<br />

por hemoptise.<br />

Por meio de análise descritiva foi feita, então,<br />

a distribuição das médias dos gases sanguíneos<br />

obtidos durante a gasometria arterial nos sete<br />

tempos determinados anteriormente. No caso da<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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ALTERAÇÕES GASOMÉTRICAS DURANTE LAVADO BRONCOALVEOLAR EM UM SERVIÇO ESPECIALIZADO DE BRONCOSCOPIA DE MANAUS<br />

PaO 2<br />

(Figura 1), a média antes da realização do<br />

procedimento foi de 85mmHg. Ocorreu um aumento<br />

da PaO 2<br />

no T2, em relação ao T1, de<br />

43mmHg, resultado esperado em função da<br />

suplementação de oxigênio. Desde o início da<br />

broncoscopia até o T3, já se observa o retorno da<br />

média das gasometrias até o seu valor inicial, mesmo<br />

com manutenção da oxigenação de 4 a 5L/min,<br />

fato que pode ser explicado pelo distúrbio na relação<br />

ventilação-perfusão provocado pelas alíquotas<br />

de salina do lavado ou ainda pelo obstáculo à passagem<br />

do ar ocasionado pelo aparelho nas vias<br />

aéreas do paciente e pela sedação realizada, componentes<br />

essenciais para o sucesso do exame. Após<br />

cinco minutos, no T7, as médias se estabilizaram<br />

em 82mmHg, mostrando uma variação discreta de<br />

3mmHg em relação a T3.<br />

Quanto à PaCO 2<br />

(Figura 2), a média das<br />

pressões parciais antes do procedimento foi de<br />

38mmHg. Observou-se alteração significativa desse<br />

valor em T3, no qual ocorreu elevação de<br />

9mmHg da média, não ultrapassando o limite normal<br />

de 45mmHg. Até cinco minutos após o início<br />

do lavado a média das pressões se manteve estável,<br />

chegando a um valor mínimo de 43mmHg.<br />

Gasometria (tempo)<br />

Figura 1 – Distribuição das médias da PaO 2<br />

nos sete tempos determinados.<br />

Gasometria (tempo)<br />

Figura 2 – Distribuição das médias da PaCO 2<br />

nos sete tempos determinados.<br />

DISCUSSÃO<br />

O valor normal da PaO 2<br />

é em média<br />

95mmHg, variando de 85 a 100mmHg. Quando<br />

este valor cai para níveis abaixo de 60mHg, está<br />

definido o estado de hipóxia, no qual há uma<br />

oxigenação inadequada dos tecidos que pode ser<br />

causada por fluxo sanguíneo inadequado e/ou baixa<br />

concentração de oxigênio no sangue. 10<br />

Dentre as causas de hipoxemia, temos quatro<br />

principais: (1) comprometimento da difusão,<br />

provocada pela presença de líquidos no interior<br />

dos alvéolos; 11 (2) shunts arterio-venosos, permitindo<br />

a passagem do sangue para o sistema arterial<br />

sistêmico sem a oxigenação prévia, por causa da<br />

inundação alveolar; (3) hipoventilação; (4) shunts<br />

aéreos, provocados pela desigualdade ventilaçãoperfusão.<br />

A possível baixa concentração de oxigênio<br />

causada pelo LBA pode estar associada às duas<br />

primeiras causas. 10,11<br />

Nesse estudo apenas um paciente teve PaO 2<br />

inferior a 60mmHg (4%), o que ocorreu em todos<br />

os seus tempos exceto no T2, mas nenhuma complicação<br />

foi observada. A possível diminuição da<br />

presença de hipoxemia em nosso trabalho provavelmente<br />

se dá pela utilização de oxigenação com<br />

máscara facial durante 5 minutos com FiO 2<br />

a 1,0<br />

antes do início do procedimento. Segundo Pugin e<br />

Suter (1992), as razões para a diminuição da<br />

oxigenação após broncoscopia com LBA não estão<br />

claramente definidas, mas o volume de líquido<br />

instilado e a presença de doenças pulmonares podem<br />

ser fatores de risco. 12<br />

Gibson et al. (1990) analisaram três diferentes<br />

grupos submetidos ao LBA. 13 O primeiro grupo<br />

realizou somente broncoscopia, enquanto o segundo<br />

fez LBA com respiração ambiente e o terceiro<br />

LBA com suplementação de oxigênio, feita<br />

com cateter nasal a 4L/min, sem oxigenação antes<br />

do procedimento. O valor da PaO 2<br />

caiu 12+/-<br />

3mmhg, 24+/-4mmHg e 32+/-5mmHg, respectivamente.<br />

Em 76% dos pacientes do segundo grupo<br />

e 25% do terceiro grupo à PaO 2<br />

diminuiu abaixo<br />

de 60mmHg, caracterizando um estado de<br />

hipoxemia.<br />

46<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


FERNANDO WESTPHAL, LUIZ LIMA, JOSÉ NETO, RILDO GOMES, KARINA ARNEZ, SILENO FILHO, ANA NUERZA<br />

Sharma et al. (1993) e Dubrawsky et al.<br />

(1975) também não demonstraram em seus estudos<br />

alteração significativa na PaCO 2<br />

, ou seja, valores<br />

maiores que 45mmHg, o que é justificado<br />

pela maior facilidade que o gás carbônico tem de<br />

atravessar a membrana alvéolo-capilar que o oxigênio.<br />

14,15<br />

O LBA é considerado um procedimento<br />

muito seguro, cuja taxa de complicações é de 0-<br />

3% comparado a 7% com a biópsia de pulmão<br />

transbrônquica e 13% quando se usa a biópsia pulmonar<br />

a céu aberto. A quantidade residual de salina<br />

presente no alvéolo pode gerar complicações,<br />

tais como: febre (2,5%), broncoespasmo (0,7%),<br />

sangramento leve (0,7%), infiltrados alveolares<br />

(0,4%) e hipoxemia. Estas complicações são de<br />

duração limitada, cedendo após 24 horas, mas em<br />

pacientes submetidos à instilação de 300-500ml<br />

de solução salina, a incidência pode aumentar<br />

para 20%. 2,3 Neste estudo não houve complicações<br />

nos pacientes submetidos ao LBA, com exceção<br />

do caso de hipoxemia citado anteriormente.<br />

Papazian et al. (1993) avaliaram os efeitos<br />

do lavado broncoalveolar em pacientes sob ventilação<br />

mecânica. 16 Notaram um decréscimo significativo<br />

na PaO 2<br />

, PaCO 2<br />

, bem como da SaO 2<br />

, após<br />

o procedimento, mas não houve alterações ou complicações<br />

significativas. Concluiu que é seguro realizar<br />

este tipo de procedimento mesmo em pacientes<br />

criticamente enfermos sob ventilação mecânica,<br />

estando alguns em choque cardiogênico<br />

ou choque séptico, fazendo uso de drogas<br />

vasopressoras para poder alcançar estabilidade<br />

hemodinâmica.<br />

Por sua vez, Klein et al. (1998), que também<br />

avaliaram esse tipo de alterações em pacientes<br />

sob ventilação mecânica, observaram deterioração<br />

da função e da mecânica pulmonar, associada<br />

a maior risco de hipoxemia e hipercapnia,<br />

além de diminuição da complacência. Segundo<br />

eles, são múltiplos os mecanismos que levam a essa<br />

deterioração, incluindo o não retorno do líquido<br />

instilado, indução de edema pulmonar e<br />

inativação ou interferência da ação do<br />

surfactante. 17<br />

Pacientes asmáticos estão sob maior risco<br />

de desenvolver complicações relacionadas ao<br />

LBA. Spanevello et al. (1998), ao estudarem os riscos<br />

e complicações inerentes ao LBA em pacientes<br />

asmáticos, verificaram que eles estão mais sujeitos<br />

à hipoxemia pela diminuição significativa<br />

da PaO 2<br />

e pouco retorno do líquido instilado, em<br />

comparação aos indivíduos saudáveis. A PaCO 2<br />

não apresentou grandes variações, mantendo-se<br />

estável. Sugerem que nessa classe de pacientes seja<br />

feita monitorização cuidadosa e rigorosa dos sinais<br />

vitais e dos gases sanguíneos para melhor contornar<br />

possíveis complicações. 18<br />

CONCLUSÃO<br />

O lavado broncoalveolar diminuiu a PaO 2<br />

significativamente, mas não chegou a provocar<br />

hipoxemia, fato provavelmente explicado pela<br />

suplementação de oxigênio feita antes do início<br />

do procedimento e durante ele. A PaCO 2<br />

estabilizou<br />

em valores considerados limítrofes após seu<br />

aumento inicial, não havendo hipercapnia.<br />

Não foram observadas complicações neste<br />

estudo, exceto um único paciente que evoluiu<br />

com hipoxemia durante o procedimento, recuperando-se<br />

depois, sem piora do seu estado.<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

47


ALTERAÇÕES GASOMÉTRICAS DURANTE LAVADO BRONCOALVEOLAR EM UM SERVIÇO ESPECIALIZADO DE BRONCOSCOPIA DE MANAUS<br />

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48<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


FERNANDO WESTPHAL, LUIZ LIMA, VALDIR VEIGA JÚNIOR, RISONILCE SOUZA, SAULO COUTO, TATIANA ROMERO, ALFREDO REICHL<br />

ESTUDO EXPERIMENTAL DOS EFEITOS DO ÓLEO-RE-<br />

SINA DE COP<br />

OPAÍB<br />

AÍBA A E DO TAL<br />

ALCO (SILICATO DE<br />

MAGNÉSIO HIDRATADO) ADO) NA PLEURA E PARÊNQUIMA<br />

PULMONAR DE RATOS<br />

EVALUATION OF THE PLEUROPULMONARY ALTERATIONS AFTER INJECTION OF COPAIBA OIL AND<br />

TALC IN THE PLEURAL SPACE OF MICE – AN EXPERIMENTAL STUDY<br />

Fernando Luiz Westphal * , Luiz Carlos de Lima * , Valdir Florêncio da Veiga Júnior ** , Risonilce Fernandes Silva de Souza **** ,<br />

Saulo Brasil do Couto *** , Tatiana Cortez Romero ** , Alfredo Coimbra Reichl **<br />

RESUMO: Objetivo: Identificar as alterações macroscópicas desencadeadas na pleura e parênquima pulmonar,<br />

após a injeção de óleo-resina de copaíba e talco no espaço pleural de ratos. Método: Foram utilizados 72 ratos da<br />

raça Rattus novergicus var. Wistar da mesma linhagem, machos, adultos, com peso médio de 191,6 g, randomizados<br />

em três grupos: copaíba, talco e simulação. As substâncias foram injetadas no espaço pleural direito dos animais, os<br />

quais foram mortos em 24, 48, 72 e 504h para análise macroscópica da pleura visceral e pulmão direito. Resultados:<br />

Os animais tratados com copaíba apresentaram média de reação inflamatória de grau 1,4 ± 0,27 no grupo de 24h;<br />

2,66 ± 0,68 no grupo de 48h; 3,5 ± 0,42 no grupo de 72h e 3,66 ± 0,28 no grupo de 504h. Aqueles que receberam o talco<br />

apresentaram grau 1 ± 0,44 no grupo de 24h; 0,66 ± 0,26 no grupo de 48h; 1,16 ± 0,20 no grupo de 72h e 1,83 ± 0,49 no<br />

grupo de 504h. Durante a realização do experimento, cinco animais morreram, todos tratados com copaíba e pertencentes<br />

ao tempo de 504h. No período compreendido entre a cirurgia e o sacrifício, 51,4% dos animais apresentaram<br />

perda ponderal, principalmente aqueles tratados pelo fitoterápico. Não houve relação significativa entre a perda<br />

ponderal e o óbito dos roedores. Conclusão: Constatou-se uma maior mortalidade no grupo tratado com óleoresina<br />

de copaíba, que se mostrou muito irritante para a pleura e parênquima pulmonar de ratos, e o talco, levemente<br />

irritante. Novos estudos devem ser realizados a fim de aprimorar o uso do fitoterápico como agente esclerosante.<br />

Descritores: Plantas medicinais; Fitoterapia; Pulmão; Pleura.<br />

ABSTRACT: Background: The Amazon is the largest reserve of natural products on the planet, its population<br />

uses these substance vastly, for many applications, empirically. Copaiba oil is a phitoterapic with anti-inflammatory<br />

and healing properties. There are no reports about its effects on the pleural cavity. The talc is a mineral widely<br />

used in the cosmetics industry and represents the most sclerosing agent used to promote pleural symphysis.<br />

Objective: To identify the macroscopic changes in the pleura and lung parenchyma after the injection of oil-resin<br />

of copaíba and talc in the pleural cavity of rats. Methods: 72 Rattus novergicus var. Wistar, male, with average<br />

weight of 191,6g, were used and divided in three groups: copaíba, talc and control. These substances were injected<br />

in the right pleural space of the animals, witch were sacrificed in 24, 48, 72 and 504h, them submitted to<br />

macroscopical analysis of the lung and right visceral pleura. Results: The animals treated with copaíba showed<br />

average of inflammatory reaction of 1.4 ± 0.27 degree in group of 24h; 2.66 ± 0.68 in the group of 48h; 3.5 ± 0.42 in<br />

the group of 72h; and 3, 66 ± 0,28 in the group of 504h. Those who received the talc had grade 1± 0.44 in the group<br />

24h; 0.66±0.26 in the group 48h; 1.16 ± 0.20 in the group 72h; and 1.83 ± 0.49 in the group 504h. During the<br />

experiment, five animals died, all treated with copaíba and belonging to the group of 504h. In the period between<br />

surgery and sacrifice, 51.4% of the animals showed weight loss, particularly those treated by phitoterapic. There<br />

was no significant relationship between weight loss and the death of rodents. Conclusion: There was a higher<br />

mortality in the group treated with oil-resin of copaiba, which was highly irritating to the pleura and lung<br />

*<br />

Cirurgiões torácicos do <strong>HUGV</strong>.<br />

**<br />

Acadêmicos de Medicina da <strong>Ufam</strong>.<br />

***<br />

Biotécnica do Inpa.<br />

****<br />

Acadêmico de Medicina da UEA.<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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ESTUDO EXPERIMENTAL DOS EFEITOS DO ÓLEO-RESINA DE COPAÍBA E DO TALCO (SILICATO DE MAGNÉSIO HIDRATADO) NA PLEURA E PARÊNQUIMA PULMONAR DE RATOS<br />

parenchyma of rats. Compared to copaiba, talc triggered<br />

a moderate reaction in the pleural cavity. Further studies<br />

must be conducted in order to improve the usage of<br />

copaíba oil as sclerosing agent.<br />

Keywords: Plants, Medicinal; Plant Extracts;<br />

Phytotherapy; Lung; Pleura.<br />

INTRODUÇÃO<br />

O conhecimento sobre plantas medicinais<br />

simboliza muitas vezes o único recurso terapêutico<br />

de muitas comunidades e grupos étnicos. O uso<br />

de plantas no tratamento e na cura de enfermidades<br />

é tão antigo quanto à espécie humana. Ainda<br />

hoje nas regiões mais pobres do país e até mesmo<br />

nas grandes cidades brasileiras, plantas medicinais<br />

são comercializadas em feiras livres e mercados populares.<br />

1<br />

A Copaifera multijuga, pertencente à família<br />

Leguminosae – Caesalpinoideae, conhecida como<br />

copaibeira, muito utilizada na medicina popular<br />

da região amazônica, é árvore de grande porte e<br />

de cujo tronco é extraído um óleo-resina chamado<br />

óleo de copaíba. Em sua composição química, há<br />

uma mistura de sesquiterpenos e diterpenos em<br />

concentrações variadas. 2,3<br />

Esse bálsamo é utilizado empiricamente<br />

como anti-inflamatório, analgésico, anestésico, antisséptico,<br />

cicatrizante e, ainda, no tratamento de<br />

infecções broncopulmonares. 3,4 Há poucas descrições,<br />

contudo, na literatura que comprovem seus<br />

verdadeiros efeitos terapêuticos e colaterais.<br />

A introdução de um agente químico no espaço<br />

pleural, a fim de induzir um processo inflamatório,<br />

denomina-se pleurodese e tem o objetivo<br />

de conduzir à formação de colágeno e a fusão das<br />

pleuras visceral e parietal. 5,6 Os pacientes que desenvolvem<br />

pneumotórax recorrente e derrame<br />

pleural crônico podem se beneficiar pelo procedimento,<br />

aliviando os sintomas e evitando a<br />

reacumulação de líquido. Uma variedade de agentes<br />

pode ser usada para induzir pleurodese, e diversos<br />

estudos investigaram a resposta inflamatória<br />

na pleura, em experiências com animais e em<br />

seres humanos. 7,8<br />

O talco, forma hidratada do silicato de<br />

magnésio pulverizado, é um mineral ortorrômbico<br />

amplamente utilizado na indústria de cosméticos,<br />

papel, sabões, lubrificantes; na indústria farmacêutica<br />

é usado como excipiente em drágeas e comprimidos.<br />

9 Representa o agente esclerosante mais<br />

utilizado para promoção terapêutica da sínfise<br />

pleural pelo seu baixo custo, fácil manuseio e ser<br />

acessível em hospitais de todos os portes. Pode ser<br />

administrado como um aerossol ou diluído em<br />

solução salina. Diversos estudos experimentais<br />

comprovam sua eficácia. 7<br />

A escassez de estudos atualizados sobre os<br />

efeitos medicinais das plantas amazônicas e a necessidade<br />

de um agente indutor de pleurodese eficaz<br />

e com poucos efeitos colaterais tornou essencial<br />

a realização deste trabalho científico.<br />

O objetivo do presente estudo é analisar as<br />

alterações macroscópicas desencadeadas na pleura<br />

e parênquima pulmonar de ratos pelo óleo-resina<br />

de copaíba e pelo talco.<br />

MÉTODOS<br />

Este trabalho foi desenvolvido no Biotério<br />

Central do Instituto Nacional de Pesquisas da<br />

Amazônia – Inpa. O experimento foi supervisionado<br />

por zootecnista do Biotério Central do Inpa,<br />

a fim de garantir condições sanitárias adequadas,<br />

conforto e bem-estar aos animais, segundo determinações<br />

do Colégio Brasileiro de Experimentação<br />

Animal.<br />

Antes do início do experimento propriamente<br />

dito, foi desenvolvido um plano piloto com<br />

a finalidade de avaliar sua exequibilidade.<br />

Os 72 Rattus novergicus var. Wistar, machos,<br />

com peso médio 191,6g, foram distribuídos em três<br />

grupos contendo 24 ratos em cada: Grupo 1 (óleo<br />

de resina de copaíba); Grupo 2 (talco); Grupo 3 (simulação:<br />

soro fisiológico a 0,9%). Estes grupos foram<br />

subdivididos em quatro subgrupos, conforme<br />

o tempo de sacrifício dos ratos: 24, 48, 72 e 504h,<br />

de forma aleatória.<br />

Os ratos foram pesados, tricotomizados no<br />

local da incisão e submetidos à anestesia com<br />

Hidrato de Cloral a 10% na dose de 0,4 mL para<br />

cada 100 g, por via subcutânea, seguindo de uma<br />

incisão de 5mm, precedida de assepsia local com<br />

50<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


FERNANDO WESTPHAL, LUIZ LIMA, VALDIR VEIGA JÚNIOR, RISONILCE SOUZA, SAULO COUTO, TATIANA ROMERO, ALFREDO REICHL<br />

álcool iodado, na região subxifoide e injetadas as<br />

substâncias com agulha de anestesia peridural<br />

Tuohy 18G BD ® , via transdiafragmática, na cavidade<br />

pleural direita. Para uma recuperação mais<br />

rápida e um menor índice de mortalidade no pósanestésico,<br />

cada rato foi colocado numa campânula<br />

enriquecida com oxigênio, logo após a injeção, por<br />

dez minutos.<br />

O cálculo da dose ideal das substâncias foi<br />

feito com base na proporção ponderal entre um<br />

homem adulto médio de 70 kg e o rato macho médio<br />

de 200 g, sendo o produto dessa “regra de três”<br />

multiplicado por dois, por causa da cavidade<br />

pleural dupla desse animal. Determinou-se que<br />

ratos com menos de 200 g receberiam a injeção de<br />

0,35 ml das substâncias e ratos com mais de 200 g<br />

receberiam a injeção de 0,4 ml.<br />

Com relação ao talco, num homem de 70<br />

kg corresponde à injeção de 5 g. Dessa forma, num<br />

rato de 200 g corresponde à injeção de 30 mg, sendo<br />

este valor multiplicado por 2, temos 60 mg, diluído<br />

em 1 ml de solução salina.<br />

Os animais foram mortos em grupos de 18<br />

ratos com 24, 48, 72 e 504h, após a injeção da substância<br />

selecionada, pela técnica de exposição ao<br />

éter, em câmara fechada, até a parada cardiorrespiratória.<br />

Em seguida, os animais foram novamente<br />

pesados para se verificar o ganho ou a perda de<br />

peso no decorrer do experimento.<br />

Procedeu-se, então, à incisão mediana do<br />

tórax e abdome e a observação das alterações<br />

macroscópicas, as quais foram classificadas em<br />

graus, conforme descrito por Tonietto (1999), 10 de<br />

acordo com a modificação da cavidade pleural e<br />

do parênquima pulmonar:<br />

Os resultados foram avaliados por meio da<br />

análise de dados categorizados pelo teste da razão<br />

da máxima verossimilhança, com o objetivo de avaliar<br />

a existência de associação entre as substâncias<br />

e o tipo de alteração provocada por elas, no nível<br />

de significância de 5%.<br />

RESULTADOS<br />

Conforme ilustrado no Gráfico 1, após 24<br />

horas do procedimento, a copaíba desencadeou<br />

uma reação inflamatória média de grau 1,4 ± 0,27;<br />

reação maior que a provocada pelo talco na mesma<br />

variação de tempo, sendo esta de 1 ± 0,44, não<br />

havendo significância estatística (p > 0,05).<br />

p= 0,388<br />

Gráfico 1 – Comparação do grau de reação macroscópica<br />

após 24 horas entre talco e óleo de copaíba.<br />

No grupo de 48 horas (Gráfico 2), a copaíba<br />

destacou-se como agente indutor de reação (2,66 ±<br />

0,68), enquanto no grupo que recebeu o talco houve<br />

reação leve ao produto (0,66 ± 0,26), havendo<br />

significância estatística (p < 0,05).<br />

Grau 0: nenhuma alteração macroscópica;<br />

Grau 1: presença de exsudato, sem reação<br />

de fibrina ou aderências;<br />

Grau 2: presença de exsudato, com reação<br />

de fibrina leve e aderências tênues;<br />

Grau 3: presença de exsudato, com reação<br />

de fibrina leve e aderências moderadas;<br />

Grau 4: ausência de exsudato, pulmão encarcerado<br />

pela intensa reação de fibrina e inúmeras<br />

aderências.<br />

p= 0,013<br />

Gráfico 2 – Comparação do grau de reação macroscópica<br />

após 48 horas entre talco e óleo de copaíba.<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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ESTUDO EXPERIMENTAL DOS EFEITOS DO ÓLEO-RESINA DE COPAÍBA E DO TALCO (SILICATO DE MAGNÉSIO HIDRATADO) NA PLEURA E PARÊNQUIMA PULMONAR DE RATOS<br />

Na análise macroscópica do grupo de 72<br />

horas (Gráfico 3), a copaíba permaneceu como forte<br />

indutor de pleurodese (3,5 ± 0,42). No grupo do<br />

talco, neste mesmo tempo, o grau de reação média<br />

foi de 1,16, ± 0,20, havendo significância estatística<br />

(p < 0,05).<br />

p= 0,011<br />

Gráfico 4 – Comparação do grau de reação macroscópica<br />

após 504 horas entre talco e óleo de copaíba.<br />

p= 0,0004<br />

Gráfico 3 – Comparação do grau de reação macroscópica<br />

após 72 horas entre talco e óleo de copaíba.<br />

Na avaliação de 504 horas, houve uma elevada<br />

mortalidade no grupo copaíba. Conforme<br />

descrito na metodologia, neste grupo de 504 horas,<br />

seis animais receberam a copaíba. Apenas um<br />

sobreviveu e este se enquadrava em grau 3.<br />

Os cinco animais que morreram e participavam<br />

do grupo descrito acima, em apenas dois<br />

animais foi possível realizar classificação macroscópica.<br />

Ambos se enquadravam em grau 4. Um<br />

destes animais morreu nove dias após o experimento<br />

e o outro, 17 dias após.<br />

Os outros três animais que não resistiram<br />

até a data do sacrifício e não foi possível realizar<br />

classificação: um morreu no primeiro dia, por uma<br />

importante hemorragia intratorácica. Nos dois animais<br />

restantes não foi encontrada a causa da morte.<br />

Um veio a óbito no terceiro dia e outro no décimo<br />

quarto dia após o procedimento.<br />

Realizando a média, portanto, de reação inflamatória<br />

encontrada no grupo de 504 horas (Gráfico<br />

4), a copaíba obteve grau de 3,66, ± 0,28 e o<br />

talco grau de 1,83, ± 0,49, havendo significância<br />

estatística (p < 0,05).<br />

O grupo simulação, constituído por ratos<br />

nos quais seria instalado soro fisiológico 0,9% à<br />

temperatura aproximada de 37,5ºC, apresentou<br />

uma média escore de reação pleural macroscópica<br />

de grau 0 apenas no grupo de 24 horas. O grupo<br />

simulação, cujo sacrifício ocorreu em 48 horas após<br />

o experimento, apresentou uma média dos graus<br />

de reação pleural de 0,66 ± 0,82. O grupo de 72<br />

horas apresentou uma média de reação pleural de<br />

grau 0,5 ± 0,55. O grupo de 504 horas apresentou<br />

uma média de reação pleural de grau 1,8 ± 0,4.<br />

No período compreendido entre a cirurgia<br />

e o sacrifício, trinta e sete animais (51,4%) apresentaram<br />

perda ponderal (Tabela 1), representados<br />

principalmente pelo grupo tratado com<br />

copaíba, no qual todos os ratos que receberam a<br />

substância nos tempos 48 e 72h apresentaram tal<br />

alteração. Não houve relação significativa entre a<br />

perda ponderal e o óbito dos ratos.<br />

Tabela 1– Quantidade de animais que apresentaram<br />

perda ponderal.<br />

Reação<br />

Inflamatória<br />

24 horas<br />

48 horas<br />

72 horas<br />

504 horas<br />

Total<br />

Talco<br />

0<br />

5<br />

0<br />

3<br />

8<br />

Grupo<br />

Copaíba<br />

4<br />

6<br />

6<br />

4<br />

20<br />

Simulação<br />

0<br />

4<br />

1<br />

4<br />

9<br />

Total<br />

4<br />

15<br />

7<br />

11<br />

37<br />

52<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


FERNANDO WESTPHAL, LUIZ LIMA, VALDIR VEIGA JÚNIOR, RISONILCE SOUZA, SAULO COUTO, TATIANA ROMERO, ALFREDO REICHL<br />

DISCUSSÃO<br />

O derrame pleural recidivante é uma situação<br />

clínica frequente, resultante do comprometimento<br />

anatômico ou funcional dos folhetos<br />

pleurais por processos benignos ou malignos. Na<br />

atualidade, a melhor conduta para o controle do<br />

derrame pleural recidivante maligno é a<br />

pleurodese, isto é, o colabamento dos folhetos<br />

pleurais (visceral e parietal) produzindo a sínfise<br />

do espaço pleural impossibilitando o acúmulo de<br />

líquido). Historicamente, Bethune, em 1935, introduziu<br />

o talco pela primeira vez na cavidade pleural<br />

com o objetivo de colabar o espaço residual existente<br />

após ressecção pulmonar. Desde então, várias<br />

substâncias têm sido utilizadas para induzir a<br />

pleurodese, mas até o momento ainda não existe<br />

um consenso sobre o agente esclerosante ideal. 11<br />

Dentre os produtos já testados, podemos<br />

citar como exemplo a doxiciclina, que se mostrou<br />

eficaz e segura, contudo não é disponível em muitos<br />

países (inclusive no Brasil). 11<br />

O nitrato de prata, que ainda na década de<br />

1980 foi abandonado por motivos não muito claros,<br />

atualmente tem sido objeto de novos estudos<br />

que otimizaram a sua utilização. Aparentemente,<br />

o abandono de tal substância teria sido causado<br />

por aspectos ligados à sua morbidade, a qual se<br />

explicaria pelo uso de altas concentrações (1-10%).<br />

A redução da concentração do nitrato de prata tem<br />

obtido resultados mais seguros e eficazes. 11,12<br />

As copaíbas são árvores do gênero Copaifera<br />

L. (Leguminosae – Caesalpinoideae) que exsudam do<br />

seu tronco um óleo resinoso chamado de óleo de<br />

copaíba. Este gênero ocorre no norte da América<br />

do Sul, principalmente nos Estados brasileiros do<br />

Pará e Amazonas. 1<br />

Na medicina popular, especialmente na<br />

Amazônia brasileira, o óleo de copaíba é utilizado<br />

como cicatrizante, anti-inflamatório e antisséptico,<br />

antitumoral, e como agente para tratar bronquites<br />

e doenças de pele. 13<br />

Algumas atividades da copaíba já foram<br />

estudadas experimentalmente. Um ensaio demonstrou<br />

que o óleo administrado por via oral reduziu<br />

o edema induzido pela carregenina na pata de ratos<br />

e exerceu atividade analgésica ao diminuir o<br />

número de contorções abdominais nos animais<br />

após estímulo doloroso, pela injeção intraperitoneal<br />

de ácido acético. 14 Outros estudos experimentais<br />

demonstraram ainda seu efeito na cicatrização<br />

de feridas cutâneas. 15,16<br />

Um estudo experimental revelou que o produto<br />

da mesma espécie, ao ser aplicado na cavidade<br />

peritoneal, desencadeia irritação, traduzida por<br />

aderências em todos os casos estudados. 17 Levando-se<br />

em consideração que a serosa abdominal assemelha-se<br />

histologicamente à pleural, presumese<br />

que as respostas sejam similares.<br />

No presente estudo o óleo de copaíba mostrou-se<br />

bastante irritante para a cavidade pleural,<br />

com graus de reação inflamatória progressivamente<br />

maiores, nos diferentes tempos do estudo. Em<br />

concordância, Westphal et al (2007) 18 estudaram os<br />

efeitos do óleo de copaíba na pleura e parênquima<br />

pulmonar de ratos e encontrou reação inflamatória<br />

intensa, com espessamento pleural.<br />

No momento, os estudos com óleo de<br />

copaíba e sua ação indutora de pleurodese ainda<br />

são incipientes. Tappin et al (2004) 13 compilaram<br />

dados disponíveis na literatura a respeito dos diferentes<br />

efeitos farmacológicos obtidos na dependência<br />

da composição e concentração do óleo de<br />

copaíba. Por exemplo, há evidência da correlação<br />

entre a atividade anti-inflamatória com os óleos<br />

que apresentam maiores teores de ácidos<br />

diterpênicos em sua composição.<br />

Isto ilustra a gama de variáveis envolvidas<br />

na eficiência desse produto tornando-se necessárias<br />

novas pesquisas, a fim de desvendar os mecanismos<br />

pelos quais a copaíba inicia o processo inflamatório<br />

e quais as concentrações mais apropriadas<br />

buscando melhores resultados.<br />

O talco é classicamente considerado o<br />

esclerosante mais eficaz, já que apresenta diversas<br />

das características citadas de um agente ideal, como<br />

o baixo custo, ampla distribuição, fácil administração,<br />

alta eficácia e baixo índice de efeitos colaterais. 11<br />

Vários estudos têm comprovado o efeito<br />

indutor de pleurodese do talco. Randall (1999) 19<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

53


ESTUDO EXPERIMENTAL DOS EFEITOS DO ÓLEO-RESINA DE COPAÍBA E DO TALCO (SILICATO DE MAGNÉSIO HIDRATADO) NA PLEURA E PARÊNQUIMA PULMONAR DE RATOS<br />

estudou um modelo experimental de pleurodese<br />

em coelhos e constatou que o talco foi moderadamente<br />

efetivo na sua indução, o mesmo observado<br />

em outro experimento, quando comparado com<br />

o nitrato de prata. 12<br />

Há evidências, contudo, de que o talco pode<br />

induzir a Síndrome da Angústia Respiratória Aguda<br />

(Sara) em até 8% dos pacientes, com mortalidade<br />

em torno de 1%. O mecanismo ainda não é conhecido,<br />

mas especula-se que resulte da absorção<br />

sistêmica de pequenas partículas do produto determinando<br />

maior risco de complicações à distância.<br />

20,21,22,23 Pode ainda estar envolvido em outras<br />

complicações menos frequentes, como: dor, febre,<br />

hipoxemia, hipotensão, arritmia cardíaca e<br />

empiema pleural. 24,25,26,27,28<br />

Neste trabalho, constatamos que o talco foi<br />

levemente irritante para a cavidade pleural, com<br />

médias de grau de reação inflamatória que variaram<br />

desde 0,66 ± 0,26 no tempo de 48 horas até<br />

resposta máxima obtida no grupo de 504 horas com<br />

média de 1,83 ± 0,49.<br />

CONCLUSÃO<br />

No presente estudo, os grupos tratados com<br />

copaíba apresentaram reação mais intensa quando<br />

comparados aos resultados obtidos com os grupos<br />

tratados pelo talco. A copaíba revelou-se uma<br />

substância esclerosante promissora por provocar<br />

fortes alterações inflamatórias. Muitos animais tratados<br />

pelo fitoterápico, entretanto, apresentaram<br />

perda ponderal e houve alta mortalidade no grupo<br />

de sacrifício em 504 horas.<br />

AGRADECIMENTOS<br />

Agradecemos ao Instituto Nacional de Pesquisas<br />

na Amazônia, Inpa, pelo fornecimento dos<br />

animais e estrutura necessária à realização do experimento.<br />

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diagnosis & treatment. New York: McGraw-Hill,<br />

2004, p. 294-9.<br />

Endereço profissional<br />

Universidade Federal do Amazonas, <strong>Hospital</strong><br />

Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong>, Serviço de Cirurgia<br />

Torácica. Rua Apurinã, 4 – Praça 14 –<br />

69010-130 – Manaus-AM – Brasil Telefone: (92)<br />

3621-6500 (ramal 6504); 9122-3356<br />

Órgão financiador da pesquisa<br />

Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do<br />

Amazonas – Fapeam<br />

revistahugv<br />

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v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


EDUARDO ABRAM KAUFFMAN, LUIZ CARVALHO NETO, LÍVIO MARTINS TEIXEIRA, CLAUDIA MARINA PUGA BARBOSA OLIVEIRA, JÚLIO CÉSAR SIMAS RIBEIRO<br />

REFLUX<br />

UXO LARIN<br />

ARINGOF<br />

GOFARÍN<br />

ARÍNGEO: ESTUDO<br />

PROSPECTIV<br />

OSPECTIVO O CORREL<br />

ORRELACION<br />

CIONANDO ACHADOS À<br />

VIDEOLARIN<br />

ARINGOSC<br />

GOSCOPIA OPIA E ENDOSCOPIA OPIA DIGESTIV<br />

TIVA<br />

ALTA<br />

LARINGOPHARINGEAL REFLUX: PROSPECTIVE STUDY THAT COMPARES VIDEOLAYNGOSCOPY AND<br />

UPPER ENDOSCOPY FINDS<br />

Eduardo Abram Kauffman*, Luiz Carvalho Neto**, Lívio Martins Teixeira***,<br />

Claudia Marina Puga Barbosa Oliveira****, Júlio César Simas Ribeiro ****<br />

RESUMO: Introdução: A doença do refluxo gastroesofágico tem duas manifestações clínicas distintas reconhecidas:<br />

o refluxo gastroesofágico clássico e o refluxo com manifestações extraesofagianas (incluindo o refluxo laringofaríngeo).<br />

Objetivos: Estudar as alterações nas mucosas laríngea, esofágica e gástrica em pacientes com quadro<br />

clínico compatível RLF. Pacientes e métodos: Estudo prospectivo clínico não controlado, onde foram incluídos<br />

58 pacientes. Todos os pacientes realizaram a videolaringoscopia e endoscopia digestiva alta (EDA). Resultados:<br />

A avaliação videolarigoscópica evidenciou alterações em 49 (84,5%) pacientes. A EDA mostrou que 51<br />

(87,9%) pacientes tinham gastrite e 8 (13,8%) tinham esofagite. Os principais sintomas encontrados foram queimação<br />

em garganta (72,4%), globus faríngeo (67,2%) e pigarro (60,3%). Conclusão: A comparação entre as alterações<br />

esofagianas, gástricas e laríngeas permitiu sugerir que a mucosa laríngea é frequentemente mais acometida que a<br />

mucosa esofágica.<br />

Palavras-chave: Doença do refluxo gastroesofágico, refluxo laringofaríngeo, endoscopia digestiva alta,<br />

videolaringoscopia.<br />

ABSTRACT: Introduction: Gastroesophageal reflux disease has two distinct clinical forms: classical<br />

gastroesophageal reflux 9GER) and reflux with extra-esophageal manifestation (including laryngophaygeal reflux).<br />

Objective: Studying changes into laryngeal, esophageal and gastric mucosae of LPR patients. Patients and<br />

methods: Prospective uncontrolled clinical study which has includede 58 patients. All patients were submitted to<br />

videolaryngoscopy and upper endoscopy (UE). Results: Videolaryngoscopy evaluation showed changes in 49<br />

patients (84,5%). UE showed that 51 patients (87,9%) had gastritis and 8 (13,8%) had esophagitis. Main symptoms<br />

were burning throat (72,4%), globus pharyngeous (67,2%) and throat clearing (60,3%). Conclusion: The comparison<br />

between esophageal, gastric and laryngeal mucosae suggests that laryngeal mucosae is more frequently involved<br />

in LPR than esophageal mucosae.<br />

Keywords: Gastroesophageal reflux disease, laryngopharyngeal refluxo, upper endoscopy, videolaryngocopy.<br />

INTRODUÇÃO<br />

Do ponto de vista clínico, definimos a Doença<br />

do Refluxo Gastroesofágico (DRGE) como<br />

uma afecção crônica decorrente do refluxo de parte<br />

do conteúdo gástrico (e, por vezes, gastroduodenal)<br />

para o esôfago. Os principais sintomas da<br />

DRGE são pirose, regurgitação e dor subesternal.<br />

Deve-se ressaltar que a inexistência desses sintomas<br />

não descarta a possibilidade de DRGE, as-<br />

*<br />

Mestre em otorrinolaringologia, professor assistente da <strong>Ufam</strong>.<br />

**<br />

Médico gastroenterologista.<br />

***<br />

Médico otorrinolaringologista.<br />

****<br />

Acadêmico do 6º ano de Medicina da <strong>Ufam</strong><br />

.<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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REFLUXO LARINGOFARÍNGEO: ESTUDO PROSPECTIVO CORRELACIONANDO ACHADOS Ã VIDEOLARINGOSCOPIA E ENDOSCOPIA DIGESTIVA ALTA<br />

sim como a sua intensidade não auxilia no diagnóstico<br />

de esofagite. O diagnóstico deve ser suspeitado<br />

de forma quase patognomônica pelos sinais<br />

e sintomas descritos, especialmente em relação<br />

à pirose e à regurgitação. Além disso, a<br />

endoscopia digestiva alta e a pHmetria de 24h<br />

(padrão ouro) devem ser solicitadas em situações<br />

específicas. 3,7,16 Entretanto, a maioria dos pacientes<br />

com sintomas sugestivos de DRGE (pirose,<br />

regurgitação ácida) não necessita de nenhum exame<br />

investigatório inicialmente, sendo o diagnóstico<br />

determinado pela prova terapêutica com uma<br />

droga inibidora da bomba de prótons (IBP), lembrando<br />

que a prova terapêutica pode ser realizada<br />

em pacientes com idade inferior a 40 anos e<br />

sem sinais de alerta. Uma resposta satisfatória<br />

praticamente sela o diagnóstico (melhora considerável<br />

dos sintomas nas primeiras 4 semanas de<br />

tratamento). 11,14<br />

Estudos recentes comprovam que a DRGE<br />

tem duas manifestações clínicas distintas: sua forma<br />

clássica que cursa com esofagite e é denominada<br />

simplesmente de Doença do Refluxo<br />

Gastroesofágico (DRGE); e sua manifestação<br />

extraesofágica, que pode cursar apenas com sintomas<br />

altos, incluindo a síndrome denominada Refluxo<br />

Laringofaríngeo (RLF), além de broncoespasmo,<br />

asma, etc. O termo laringofaríngeo, portanto,<br />

não significa que o refluxo ocorre apenas nesta região,<br />

mas sim que acomete principalmente o epitélio<br />

dessa topografia anatômica, que tem características<br />

próprias. Apenas 18% dos pacientes com<br />

sintomatologia compatível com RLF têm esofagite<br />

de refluxo. 1,5 Cerca de 80% das queixas de garganta<br />

tem refluxo associado. 17,18<br />

Os principais sinais evidenciados pela<br />

videolaringoscopia são edema e hiperemia de laringe,<br />

hiperemia e hiperplasia linfoide em parede posterior<br />

da faringe, alterações interaritenoideas, úlceras<br />

de contato na glote, granuloma laríngeo, pólipos<br />

de laringe, edema de Reinke, estenose subglótica e<br />

laringite hipertrófica. Os principais sintomas são<br />

disfonia, tosse, sensação de globus faríngeo, pigarro,<br />

hipersalivação, odinofagia, disfagia alta,<br />

queimação em garganta e garganta seca. 3,9,10,17<br />

O tratamento do RFL visa à eliminação dos<br />

fatores propiciadores, sugerindo ao paciente mudança<br />

nos hábitos alimentares e hábitos de vida.<br />

Faz-se também necessária, na maioria dos casos, a<br />

terapia medicamentosa. O tratamento inicial deve<br />

ser feito com bloqueadores da bomba de prótons,<br />

em duas doses diárias, por no mínimo 12 semanas.<br />

1,5 O tratamento cirúrgico é indicado em casos<br />

que não responderam às medidas terapêuticas usuais<br />

e que apresentem esofagite de Barret, estenoses<br />

ou processos hemorrágicos. Casos de aspirações<br />

frequentes com rouquidão ou estenose subglótica<br />

podem também requerer intervenção cirúrgica. O<br />

tratamento cirúrgico mais utilizado é a fundoplicatura<br />

do estômago. 1,6,9,10<br />

OBJETIVOS<br />

Estudar as alterações nas mucosas<br />

esofágica, gástrica e laríngea em pacientes com<br />

quadro clínico compatível com Refluxo Laringofaríngeo<br />

(RLF), bem como descrever a<br />

sintomatologia geral desses pacientes.<br />

PACIENTES E MÉTODOS<br />

Trata-se de um estudo prospectivo clínico<br />

não controlado, onde foram incluídos 58 pacientes<br />

adultos com idade variando entre 21 e 78 anos,<br />

com média de 39,17 anos, sendo 42 mulheres e 16<br />

homens. Foram atendidos no Ambulatório Araújo<br />

Lima, da Universidade Federal do Amazonas, no<br />

período compreendido entre agosto de 2005 e maio<br />

de 2007. Os pacientes precisavam apresentar queixas<br />

crônicas (maior que três meses) sugestivas de<br />

Refluxo Laringofaríngeo (disfonia, tosse, sensação<br />

de globus faríngeo, pigarro, hipersalivação,<br />

odinofagia, disfagia alta, queimação em garganta<br />

e garganta seca). Esses pacientes foram encaminhados<br />

do Serviço de Gastroenterologia ou do próprio<br />

Serviço de Otorrinolaringologia para um ambulatório<br />

específico de RLF, criado para esta pesquisa.<br />

Na primeira consulta, o paciente recebia<br />

omeprazol, sendo orientado a utilizar a medicação<br />

por 4 semanas, realizando assim a prova tera-<br />

58<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


pêutica com um IBP, que é uma forma de se confirmar<br />

o diagnóstico de RGE patológico. A consulta<br />

consistia de história clínica e exame físico, juntamente<br />

com os dados pessoais do paciente. Em<br />

seguida, os pacientes eram encaminhados para<br />

realização da EDA e videolaringoscopia (realizavam<br />

os dois exames na mesma semana da primeira<br />

consulta). As endoscopias digestivas foram realizadas<br />

por diversos profissionais e todas foram<br />

fotografadas. A videolaringoscopia foi realizada<br />

com laringoscópio flexível Penthax de 3,5 mm de<br />

diâmetro acoplada à microcâmera e sistema de<br />

vídeo VHS para gravação do exame, sendo todos<br />

eles realizados pelo mesmo profissional.<br />

Os pacientes que obtiveram uma boa melhora<br />

dos sintomas nas 4 primeiras semanas de tratamento<br />

e que realizaram os dois exames complementares<br />

foram incluídos na pesquisa. Os critérios<br />

de exclusão adotados foram uma resposta<br />

insatisfatória ao teste terapêutico com omeprazol,<br />

a não realização dos dois exames complementares<br />

e os pacientes fumantes. Ao todo foram atendidos<br />

105 pacientes e, desses, apenas 58 foram incluídos<br />

na pesquisa.<br />

Todos os pacientes assinaram termo de consentimento<br />

livre a esclarecido aprovado pelo Comitê<br />

de Ética da Universidade Federal do Amazonas.<br />

Os pacientes foram tratados clinicamente,<br />

com orientações dietéticas e posturais, omeprazol<br />

(40 mg/dia, dividido em duas tomadas diárias,<br />

uma pela manhã, em jejum, e outra antes do jantar)<br />

por um período mínimo de 8 semanas. A recuperação<br />

clínica foi estabelecida pela melhora das<br />

queixas e achados laringoscópicos.<br />

RESULTADOS<br />

Dos 105 pacientes estudados, 58 foram incluídos<br />

na amostra final. A avaliação por meio da<br />

endoscopia digestiva alta mostrou que dos 58 pacientes<br />

avaliados apenas 7 (12,1%) apresentaram<br />

exame normal, ou seja, sem alterações esofágicas<br />

ou gástricas; 19 (32,7%) tinham gastrite leve; 28<br />

(48,3%) tinham gastrite moderada; e 4 (6,9%) tinham<br />

gastrite acentuada.<br />

Os resultados da EDA também mostraram<br />

que 21 (36,2%) pacientes tinham hérnia hiatal; 8<br />

(13,8%) tinham esofagite grau I de Allison; 3 (5,2%)<br />

apresentavam duodenite erosiva; 3 (5,2%) apresentavam<br />

divertículo de Zencker; 2 (3,4%) apresentavam<br />

um pseudodivertículo bulbar; 4 (6,9%) apresentavam<br />

deformidade pilórica. A biópsia da mucosa gástrica<br />

mostrou que 13 (22,4%) dos pacientes tiveram pesquisa<br />

positiva para Helicobacter pylori.<br />

A avaliação videolaringoscópica mostrou<br />

que em 49 (84,5%) pacientes foram achados sinais<br />

de edema e hiperemia da laringe posterior e/ou<br />

alterações nas cordas vocais. Em 9 (15,5%) dos pacientes<br />

não foram encontradas alterações, ou seja,<br />

o exame apresentou-se normal.<br />

Dos 49 pacientes com alterações à<br />

videolaringoscopia, 3 (6,1%) não apresentaram alterações<br />

na EDA; 39 (79,5%) apresentaram um tipo<br />

de gastrite; 20 (40,8%) apresentaram hérnia hiatal;<br />

12 (24,5%) apresentaram pesquisa positiva para<br />

Helicobacter pylori; 6 (12,2%) apresentaram<br />

esofagite; 3 (6,1%) apresentaram duodenite erosiva,<br />

2 (4,1%) apresentaram divertículo de Zencker; e 2<br />

(4,1%) apresentaram pseudodivertículo bulbar.<br />

A sintomatologia referida pelos 58 pacientes<br />

constou queimação em garganta, referida por<br />

42 (72,4%) dos pacientes; globus faríngeo, referido<br />

por 39 (67,2%) dos pacientes; tosse seca, citada por<br />

37 (63,8%) dos pacientes; disfonia, referida por 37<br />

(63,8%) dos pacientes; caseum, em 37 (63,8%) dos<br />

pacientes; pigarro, referido por 35 (60,3%) dos pacientes;<br />

sintomas dispépticos, referido por 32<br />

(55,2%) dos pacientes; hipersalivação, referida por<br />

18 (31%) dos pacientes; dor de garganta, referida<br />

por 30 (51,7%) dos pacientes; disfagia, referida por<br />

28 (48,3%) dos pacientes; glossodínia, referida por<br />

25 (43,1%) dos pacientes; halitose, em 24 (41,4%)<br />

dos pacientes; pirose, referida por 22 (38,9%) dos<br />

pacientes; aftas, em 11 (19%) dos pacientes;<br />

odinofagia, referida por 9 (15,5%) dos pacientes;<br />

problemas dento-gengivais, em 8 (13,7%) dos pacientes;<br />

e dispnéia, em 6 (10,3%) dos pacientes.<br />

O tempo médio de tratamento clínico<br />

medicamentoso foi de 3 meses, sendo que em 52<br />

(89,6%) dos pacientes houve remissão completa<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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REFLUXO LARINGOFARÍNGEO: ESTUDO PROSPECTIVO CORRELACIONANDO ACHADOS Ã VIDEOLARINGOSCOPIA E ENDOSCOPIA DIGESTIVA ALTA<br />

dos sintomas. Apenas 6 (10,4%) dos pacientes não<br />

apresentaram remissão completa dos sintomas,<br />

mesmo sendo tratados por período superior a 4<br />

meses.<br />

O período de seguimento médio após cessar<br />

o tratamento medicamentoso por remissão do<br />

quadro foi de dois meses. Até o momento da redação<br />

deste trabalho, nenhum dos pacientes tratados<br />

clinicamente apresentou recidiva; porém todos<br />

mantêm uma certa restrição dietética e cuidados<br />

com hábitos e vícios que estimulam o refluxo.<br />

DISCUSSÃO<br />

Os achados do presente estudo sugerem que<br />

uma anamnese bem sedimentada tem grande<br />

chance de correlação com DRGE. A comparação<br />

entre alterações nas mucosas laríngea e esofágica<br />

deixa claro que, ao contrário do que sugere Eckley<br />

et al., as alterações no RLF não acometeram preferencialmente<br />

as mucosas laríngea, faríngea e cavidade<br />

oral. 9,10 Ao todo, 51 (97,9%) dos pacientes<br />

apresentaram pelo menos um tipo de alteração na<br />

EDA, ao passo que 49 (84,4%) dos pacientes apresentaram<br />

pelo menos um tipo de alteração na<br />

videolaringoscopia. De fato, não vimos um predomínio<br />

por alterações “altas”, ou seja, ao nível da<br />

região laringofaríngea. Supomos que a DRGE<br />

pode, sim, cursar com manifestações atípicas, mas<br />

há também um comprometimento clássico, ou seja,<br />

o paciente com RLF apresenta frequentemente um<br />

acometimento em nível esofágico e/ou gastroduodenal,<br />

que frequentemente é assintomático.<br />

O dano exclusivamente esofágico mostrouse<br />

presente em apenas 3 (5,1%) dos pacientes confirmando<br />

os dados da literatura, 9,10 que afirmam<br />

que a mucosa respiratória tem um epitélio bem<br />

menos afeito às agressões dos ácidos do estômago.<br />

Os pacientes com RLF geralmente têm<br />

motilidade esofágica normal ou próxima do normal,<br />

ao contrário do que ocorre com os pacientes<br />

com esofagite que apresentam desmotilidade<br />

esofágica frequente. 6,7,9,10<br />

Dentre os sintomas encontrados, destaque<br />

para queimação em garganta, referida por 72,4%<br />

dos pacientes; globus faríngeo, referido por 67,2%<br />

dos pacientes; tosse seca, citada por 63,8% dos pacientes;<br />

disfonia, referida por 63,8% dos pacientes;<br />

caseum, em 63,8% dos pacientes; e pigarro, referido<br />

por 60,3% dos pacientes. O globus faríngeo é<br />

também citado por Woo e é defendido como um<br />

sintoma inespecífico de irritação laríngea em cuja<br />

etiologia a DRGE tem grande participação. Dos 58<br />

pacientes, vimos que em 27 (50%) há mais de 6 sintomas<br />

presentes, ou seja, os sintomas dessa doença<br />

assumiram uma importância tão grande que, na<br />

maioria das situações, fazem com que os exames<br />

complementares seja meros coadjuvantes para estabelecer<br />

o diagnóstico.<br />

Os conhecimentos sobre refluxo laringofaríngeo<br />

se encontram em evolução, desde seu diagnóstico<br />

até seu tratamento. Hoje se sabe que há alterações<br />

detectadas ao exame histológico que não<br />

são revelados à endoscopia e a pHmetria de 24<br />

horas. A maioria dos autores prefere o uso empírico<br />

de drogas como teste terapêutico e ferramenta<br />

propedêutica. A transposição dessas medidas terapêuticas<br />

para o RLF ainda não está totalmente<br />

elucidada, contudo, ao não se dispor de meios adequados<br />

para uma completa investigação, o melhor<br />

é se optar pelo início do tratamento. 14<br />

Estudos mais complexos e com amostras<br />

maiores, com um grupo controle, fornecerão resultados<br />

mais fidedignos. Podemos, contudo, afirmar<br />

que pacientes com sintomas crônicos de disfonia,<br />

globus, tosse seca, hipersalivação, pigarro, disfonia<br />

e queimação em garganta devem ser objetos de<br />

investigação acurada, tendo eles a sugestiva associação<br />

com RLF.<br />

CONCLUSÃO<br />

Os resultados do presente trabalho sugerem<br />

uma forte correlação entre sintomas otorrinolaringológicos<br />

e doença do refluxo gastroesofágico, que<br />

é uma patologia do sistema digestivo muitas vezes<br />

subdiagnosticada em nosso meio. Os autores<br />

concluem que há suspeita forte para se chegar ao<br />

diagnóstico de DRGE em pessoas com manifestações<br />

tão atípicas como tosse seca, pigarro e disfonia.<br />

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v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


A comparação entre as alterações<br />

esofagianas e laríngeas permitiu sugerir que a<br />

mucosa laríngea é frequentemente mais acometida<br />

que a mucosa esofágica. Os pacientes com sintomas<br />

crônicos sugestivos de RLF devem ser objetos<br />

de investigação acurada.<br />

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REFLUXO LARINGOFARÍNGEO: ESTUDO PROSPECTIVO CORRELACIONANDO ACHADOS Ã VIDEOLARINGOSCOPIA E ENDOSCOPIA DIGESTIVA ALTA<br />

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Oct.<br />

Dados para correspondência:<br />

Eduardo Abram Kauffman<br />

Rua Franco de Sá, 3.º andar, salas 308/309,<br />

Edifício Amazon Trade Center<br />

São Francisco – Manaus-AM – CEP 69079-210<br />

Agradecimento à Fapeam.<br />

20. WOO, P. Association of esophageal reflux and<br />

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revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

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LUIZ CARLOS DE SOUZA MENEZES, ALESSANDRO MAGNO DE FIGUEIREDO LACERDA, SIMY LAREDO<br />

PREVENÇÃ<br />

ÇÃO DE FATORES CAUS<br />

USAIS DE DOENÇAS<br />

OSTEOMUSCULARES EM TRABALHADORES QUE<br />

EXERCEM ATIVID<br />

TIVIDADES NA POSIÇÃO O SENTAD<br />

ADA<br />

PREVENTION OF CAUSAL FACTORS OF MUSCULOSKELETAL DISEASES IN WORKERS ENGAGED IN<br />

ACTIVITIES IN THE SITTING POSITION<br />

Luiz Carlos de Souza Menezes * , Alessandro Magno de Figueiredo Lacerda ** , Simy Laredo **<br />

RESUMO: Várias são as causas que podem modificar a saúde do ser humano. Entre elas existem as provenientes<br />

da inter-relação com o local de trabalho. Nesse ambiente, as variáveis causais do fenômeno de adoecimento são<br />

abrangentes, pois existem diversos aspectos a serem considerados: os ruídos, as vibrações, a iluminação, os diversos<br />

tipos de escalas de turno e postura adotada pelo trabalhador que são considerados fatores estressores. Eles<br />

podem fazer com que o indivíduo desenvolva adaptações que serão responsáveis pela gênese de doenças<br />

osteomusculares e que pode surgir uma perda da eficiência da atividade juntamente com a presença de alterações<br />

posturais. Outros fatores importantes, que podem predispor o trabalhador a situações de risco para a sua saúde, são<br />

as inter-relações com o meio social onde o indivíduo está inserido. Assim, o objetivo deste artigo é demonstrar a<br />

importância da prevenção dos fatores causais e individuais de doenças osteomusculares em trabalhadores que<br />

exercem suas funções na posição sentada e o papel do profissional fisioterapeuta como agente de ações preventivas<br />

de patologias relacionadas às atividades laborais.<br />

Palavras-chave: Transtornos traumáticos cumulativos. Prevenção de acidentes. Fisioterapia.<br />

ABSTRACT: There are several causes that can modify the human health. Among them exist the growing out of<br />

interrelation with the work place. In this environment, the various causes of the languish phenomenonare<br />

accomplished, because there are several aspects to be considered: the noise, the vibration, the illumination, the<br />

several kinds of shift scale and the stance adopted by the worker that are considered factors of stress. They can do<br />

whereupon the body develops adaptation that will be responsible for the genesis of musculoskeletal diseases<br />

genesis and that grow up an efficiency lost in the activity together the presence of postural alteration. Other important<br />

factors that can predispose the worker in health danger situations are the inter-relationship with the social<br />

environment where the individual is embedded. Thus, the objective of this article is to demonstrate the importance<br />

of the prevention of causal factors and musculoskeletal individual diseases in workers engaged in their duties in<br />

the sitting position and the physiotherapeutic professional enrolment as agents of preventive pathologic actions<br />

related to the laboratorial activities.<br />

Keywords: Cumulative trauma disorder. Accident prevention. Physiotherapy.<br />

INTRODUÇÃO<br />

Diversas podem ser as causas que podem<br />

modificar a saúde do ser humano. Entre elas existem<br />

as provenientes da inter-relação com o local<br />

de trabalho. Nesse ambiente, o indivíduo poderá<br />

realizar atividades laborais que, para a sua execução,<br />

a posição sentada deve ser adotada. Nesse<br />

local, as variáveis causais do fenômeno de<br />

adoecimento são abrangentes, pois existem diversos<br />

aspectos a serem considerados que podem afetar<br />

a saúde, a segurança e o conforto das pessoas<br />

*<br />

Bacharel em Fisioterapia.<br />

**<br />

Professores orientadores.<br />

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PREVENÇÃO DE FATORES CAUSAIS DE DOENÇAS OSTEOMUSCULARES EM TRABALHADORES QUE EXERCEM ATIVIDADES NA POSIÇÃO SENTADA<br />

envolvidas com essas atividades. O objetivo deste<br />

artigo foi demonstrar a importância da prevenção<br />

dos fatores causais e individuais de doenças<br />

osteomusculares em trabalhadores que exercem<br />

suas funções na posição sentada e o papel do profissional<br />

fisioterapeuta como agente de ações preventivas<br />

de patologias relacionadas às atividades<br />

laborais.<br />

METODOLOGIA<br />

O método de abordagem utilizado na pesquisa<br />

foi o indutivo, com abordagem indireta de<br />

fonte secundária.<br />

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA<br />

Com o desenvolvimento da sociedade, o<br />

homem buscou ações que levassem a sua sobrevivência.<br />

À medida que evoluía nessa atividade básica<br />

e percebendo a ampliação de suas necessidades,<br />

iniciou processos de relacionamento que resultaram<br />

na formação do trabalho, que é definido 1<br />

como uma atividade cujo objetivo principal é a<br />

produção de riqueza e que várias foram as formas<br />

históricas da formação dessa atividade, entre elas:<br />

o escravismo, o feudalismo e o capitalismo.<br />

Aliado a esse evento histórico é observada<br />

a construção de avanços tecnológicos que permitiram<br />

a instalação do processo de trabalho. Ao<br />

mesmo tempo surgiram fatores inerentes aos ambientes<br />

de trabalho que levavam a afetar a saúde,<br />

a segurança e o conforto das pessoas envolvidas<br />

com essas atividades.<br />

Atualmente, a sociedade industrial segue<br />

uma outra direção, na qual está baseada a informação.<br />

Uma das principais consequências em relação<br />

aos riscos ocupacionais é que, para determinadas<br />

categorias, ocorreu uma redução à exposição<br />

a diversos fatores que punham em risco a saúde<br />

do trabalhador. Entretanto, surgiram novas situações<br />

de risco: novos processos de produção induzem<br />

ao uso excessivo e a repetição de movimentos<br />

que afetam determinados grupos musculares,<br />

o que acaba por gerar as doenças do sistema músculo-esquelético.<br />

Outra característica pode ser qualificada<br />

numa nova definição do trabalhador: ele é<br />

considerado o homem ou a mulher que pode exercer<br />

determinada atividade para a sua manutenção<br />

e de seus dependentes, não importando sua forma<br />

de inserção no mercado de trabalho ou nos setores<br />

formais da economia. Podem receber remuneração<br />

ou não, quer trabalhe como aprendiz ou estagiário.<br />

Também são inclusos aqueles trabalhadores<br />

que estão, temporariamente ou em definitivo,<br />

afastados dos seus núcleos laborais. 2<br />

Dentro desse contexto, o homem é considerado<br />

o elemento fundamental na produção de bens<br />

e prestação de serviço na sociedade, enfrentando<br />

fatores que perturbam a sua saúde. Estes podem<br />

lhe trazer desconforto e restrição em suas atividades<br />

sociais e familiares. Entre os constantes desafios<br />

enfrentados diariamente existe o contato com<br />

riscos ocupacionais que apresentam características<br />

físico-químico-biológicas. Além dos fatores<br />

ambientais, surge o estabelecimento da organização<br />

do tempo de trabalho que, por diversas razões,<br />

começa a ser introduzida na forma de turnos de<br />

trabalho. Essa nova situação pode evoluir para um<br />

dos constituintes de fatores causais para doenças<br />

e tem sido apontado como uma contínua fonte de<br />

problema de saúde e de perturbação sociofamiliar. 3<br />

Atualmente, as vibrações, a iluminação, a temperatura<br />

e os ruídos são considerados como fatores<br />

que podem provocar alterações no ambiente de<br />

trabalho. 4-5 Com relação às posturas e os movimentos<br />

executados no decorrer das atividades, eles são<br />

determinados pelo espaço físico no qual o corpo<br />

está inserido, pelas características das informações<br />

a serem captadas e pelas ações a serem executadas.<br />

6 No ambiente de trabalho, o indivíduo poderá<br />

realizar atividades na posição sentada. Nessa<br />

posição, ele obtém uma vantagem em relação à<br />

posição de pé, pois o corpo fica mais bem apoiado<br />

em diversas superfícies: o piso, o assento, o encosto,<br />

braços da cadeira e a mesa. 4 Entretanto, estudos<br />

indicam que a posição mais danosa é a posição<br />

sentada, pois a pressão sobre o disco<br />

intervertebral da terceira vértebra lombar (L3) é<br />

menor na posição em pé, recebendo uma sobre-<br />

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LUIZ CARLOS DE SOUZA MENEZES, ALESSANDRO MAGNO DE FIGUEIREDO LACERDA, SIMY LAREDO<br />

carga de 70 kg, enquanto que na posição sentada<br />

reta, sem suporte, chega a 100 kg e que na posição<br />

sentada a pressão intradiscal diminui quando o<br />

indivíduo senta sem apoio de tronco, mas com as<br />

costas retas e com os braços apoiados sobre as coxas.<br />

Ao se aumentar a inclinação do encosto ocorre<br />

uma diminuição da pressão discal, e que essa<br />

pressão também diminui ao se utilizar um apoio<br />

na região lombar. 7<br />

Se o indivíduo realiza atividades sentadas<br />

que mantenham uma postura incorreta por longos<br />

períodos, as alterações posturais serão<br />

potencializadas, com um aumento na pressão<br />

intradiscal de até 70%. Com isso, podem predispor<br />

maiores índices de desconforto gerais como<br />

dor, sensação de peso e parestesias em diferentes<br />

partes do corpo, podendo fazer surgir processos<br />

degenerativos, como a hérnia de disco. 8<br />

No trabalho em que não pode haver nenhuma<br />

alternância da postura, estes se tornam cansativos<br />

porque os mesmos grupos musculares estarão<br />

sempre sobre tensão. 6 Dessa forma, o homem em<br />

situação de trabalho não pode ser comparado a um<br />

modelo mecânico do tipo transformação de energia,<br />

ou a um modelo informatizado de tratamento<br />

de dados. 9 Ele não deveria ser analisado simplesmente<br />

como mais um instrumento dentro da cadeia<br />

de produção. Ele é a parte importante dentro de toda<br />

a sequência de produção, seja industrial, comercial<br />

ou de serviço público. A execução do trabalho irá<br />

exigir-lhe de alguma forma o desenvolvimento de<br />

estratégias que lhe permitam chegar ao final de sua<br />

jornada com sua cota preestabelecida alcançada.<br />

Mas é necessário observar quais foram os caminhos<br />

que buscou ou quais as condições oferecidas pelo<br />

local de trabalho que lhe permitiram chegar até a<br />

resolução dessas metas.<br />

Outro aspecto é quando se analisam variabilidades<br />

como: a idade, sua origem, sua formação<br />

profissional, suas tradições culturais. Na atualidade,<br />

é facilmente observado que fatores como alimentação,<br />

moradia, vícios sociáveis e o nível econômico<br />

também podem interferir na qualidade de<br />

serviço que o trabalhador está oferecendo à empresa<br />

na qual está ligado. Assim, o indivíduo-padrão<br />

não existe e tampouco a tarefa-padrão da ‘organização<br />

científica do trabalho’. 9<br />

Nesse contexto, surgiu uma nova visão de<br />

saúde ocupacional. Essa preocupação é evidente<br />

por meio da Norma Técnica do Instituto Nacional<br />

de Seguridade Social (INSS) pela sua Ordem de<br />

Serviço/INSS n.º 606/1998, 10 que estabelece Fatores<br />

de Risco para Doenças Osteomusculares Relacionadas<br />

ao Trabalho (Dort), que apresenta as seguintes<br />

características importantes em relação a<br />

exposição:<br />

• Região anatômica exposta aos fatores de<br />

risco;<br />

• Intensidade de fatores de risco;<br />

• Organização temporal da atividade – duração<br />

do ciclo de trabalho, distribuição das pausas<br />

ou estrutura de horários;<br />

• Tempo de exposição aos fatores de risco.<br />

A estação de trabalho passou a ser considerada,<br />

também, como uma participante dos grupos<br />

de fatores de risco, porque as suas dimensões podem<br />

induzir o trabalhador a adotar posturas ou<br />

métodos de trabalho que podem causar ou mesmo<br />

agravar lesões osteomusculares. Essas posturas inadequadas<br />

apresentam, então, três mecanismos que<br />

podem ser causadores desses distúrbios: os limites<br />

da amplitude articular, a força da gravidade que<br />

oferece uma carga suplementar sobre articulações e<br />

músculos e, também, lesões mecânicas sobre os diferentes<br />

tecidos. Também é considerado que a carga<br />

ostemuscular pode ser entendida como uma carga<br />

mecânica, que poderá levar a um estado de tensão,<br />

pressão, fricção ou irritação em determinado<br />

local do corpo. Associado a esses fatores, existe o<br />

estabelecimento de posturas estáticas pelo trabalhador<br />

durante a execução de suas atividades, a monotonia,<br />

tanto fisiológica quanto psicológica, as exigências<br />

cognitivas e os fatores organizacionais e<br />

psicossociais ligados ao trabalho. 10<br />

Para compreendermos a organização fisiológica<br />

do corpo e a gênese da instalação dos esquemas<br />

adaptativos, compensatórios e das formações<br />

das patologias que se instalam é preciso defi-<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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PREVENÇÃO DE FATORES CAUSAIS DE DOENÇAS OSTEOMUSCULARES EM TRABALHADORES QUE EXERCEM ATIVIDADES NA POSIÇÃO SENTADA<br />

nir que a estrutura corporal obedece a três leis:<br />

do equilíbrio, da economia e do conforto. No esquema<br />

fisiológico, o equilíbrio é prioritário, e as<br />

soluções adotadas são econômicas. O esquema de<br />

funcionamento, sendo fisiológico, é certamente<br />

confortável. 11<br />

O National Institute for Ocupacion Safety<br />

and Helt (NIOSH) afirma que evidências científicas<br />

mostram relação consistente entre distúrbios<br />

músculo-esqueléticos e certos fatores físicos relacionados<br />

ao trabalho, especialmente em níveis de<br />

exposição elevados. 12 Em patologias que envolvem<br />

a região do pescoço, base do crânio e dos ombros o<br />

quadro clínico é caracterizado por dores na região<br />

posterior, que piora com movimentos e tensão com<br />

irradiação para o braço. Podem ocorrer pontos de<br />

dor miofascial. A contração estática em associação<br />

com fatores estressantes, que decorre da organização<br />

do trabalho, parece exercer um papel importante<br />

na origem de dores que atingem a musculatura<br />

cervical, paravertebral e da cintura escapular. 10<br />

Para a execução de atividades na posição<br />

sentada deve-se levar em consideração que uma<br />

nova forma de posicionamento é adquirida. Se os<br />

músculos dos membros inferiores não são ativados<br />

de forma contínua, isso não significa que o trabalhador<br />

estará isento de sofrer comprometimentos<br />

na sua saúde. As cadeias musculares irão buscar<br />

novas formas de trabalho para consumar as atividades<br />

que lhes são impostas, principalmente<br />

quando o indivíduo executa atividades motoras<br />

finas e que lhe exigem a atenção visual. A movimentação<br />

constante, sem pausa ou com adaptações<br />

das amplitudes articulares, comprometendo<br />

de forma insidiosa músculos, ligamentos e articulações,<br />

provavelmente irão ocasionar o surgimento<br />

de doenças relacionadas com a postura adotada<br />

pelo trabalhador.<br />

São citados como patologias relacionadas à<br />

postura sentada: síndrome dolorosa miofascial,<br />

síndrome cervicobraquial e lombalgia. As lesões<br />

no ombro que têm relação com as alterações<br />

posturais na posição sentada: capsulite adesiva do<br />

ombro, síndrome do manguito rotatório, tendinite<br />

calcificante do ombro, bursite, entre outras. 10<br />

DISCUSSÃO<br />

Não se pode desmembrar o agente causal<br />

da patologia laboral daquele que é o principal envolvido<br />

nessa questão: o trabalhador, pois analisar<br />

a nocividade do trabalho e no trabalho é analisar<br />

a situação que a produziu, e como o trabalhador<br />

reagiu a essa situação. 9 No campo das ciências<br />

ambientais e do risco, o conceito de prevenção técnica<br />

de riscos que envolvem estratégias que visam<br />

evitar a ocorrência de determinado fato não desejável,<br />

como os acidentes ou as doenças relacionadas<br />

ao trabalho, é mais abrangente que o conceito<br />

de prevenção normalmente utilizado pelo campo<br />

da Saúde Pública, aproximando-se ao conceito<br />

amplo de promoção da saúde. 13<br />

Em função dessas considerações, torna-se<br />

necessário o oferecimento de orientações que visem<br />

à proteção aos trabalhadores e que recomendações<br />

possam ser levadas aos demais participantes<br />

da cadeia produtiva, pois, muitas vezes, o estágio<br />

de adoecimento passa por sintomatologias e<br />

sinais quase imperceptíveis na sua gênese. Para<br />

isso, faz-se necessário a observação de aspectos que<br />

estão ligados diretamente ao seu ambiente laboral,<br />

analisando e discutindo se a organização, o<br />

gerenciamento e as estratégias propostas para a efetiva<br />

função do trabalhador não irão apresentar desvios,<br />

falhas ou incoerências no seu planejamento e<br />

execução.<br />

Nesse contexto, a presença ativa do profissional<br />

fisioterapeuta como agente de prevenção<br />

de patologias relacionadas ao trabalho é perfeitamente<br />

viável, entre outros motivos pelos conhecimentos<br />

pertinentes à sua formação profissional;<br />

os conceitos de globalidade durante a fase<br />

de avaliação do indivíduo por ele tratado, no qual<br />

é observado o intrincado mecanismo associativo<br />

e causal de alterações corporais que as cadeias<br />

musculares podem acarretar; a utilização do Diagnóstico<br />

Cinesiológico Funcional – considerada<br />

a intervenção diagnóstica específica do profissional<br />

fisioterapeuta, que identifica as disfunções<br />

apresentadas pelo paciente tratado; as variadas<br />

técnicas que pode utilizar para alcançar os seus<br />

66<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


LUIZ CARLOS DE SOUZA MENEZES, ALESSANDRO MAGNO DE FIGUEIREDO LACERDA, SIMY LAREDO<br />

objetivos terapêuticos e os recursos de baixo custo<br />

de que dispõe podem perfeitamente inseri-lo<br />

dentro de uma equipe profissional que busque o<br />

cuidado e atendimento ao trabalhador, transformando-o<br />

em um agente importante na saúde<br />

pública, atuando, também, na prevenção de fatores<br />

que podem causar limitação laboral e social<br />

de indivíduos que executam suas funções na posição<br />

sentada e que participam da formação de<br />

riquezas e patrimônios da sociedade.<br />

CONCLUSÃO<br />

Pode-se, assim, afirmar que indivíduos que<br />

executam atividades laborais na posição sentada<br />

podem apresentar alterações na sua normalidade<br />

estrutural em razão das atividades executadas<br />

e que os estágios de adoecimento nesses profissionais<br />

passam por sintomatologias e sinais<br />

quase imperceptíveis na sua gênese. Por isso, fazse<br />

necessário a observação de aspectos que estão<br />

ligados diretamente ao seu ambiente laboral,<br />

como a postura adotada pelo trabalhador e sua<br />

relação com os ruídos, as vibrações, a iluminação,<br />

diversos tipos de escalas de turno e a estação<br />

de trabalho, analisando e discutindo se a organização<br />

do gerenciamento e das estratégias propostas<br />

para a efetiva função do trabalhador não apresenta<br />

desvios, falhas ou incoerências no seu planejamento<br />

e execução, e que nesse contexto o profissional<br />

fisioterapeuta ta,mbém pode ser considerado<br />

como um agente de ações preventivas de<br />

patologias relacionadas ao trabalho.<br />

REFERÊNCIAS<br />

1 DELIBERATO, P. C. P. Fisioterapia Preventiva.<br />

Fundamentos e Aplicações. São Paulo: Manole, 2002,<br />

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São Paulo: Edgar Blücher, 2004, p. 85-111.<br />

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7 BRACCIALLI, L. M. P.; VILARTA, R. Aspectos<br />

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8 ZAPATER, A. R.; SILVEIRA, D. M.; VITTA, A.;<br />

PADOVANI, C. R.; SILVA, J. C. P. Postura Sentada:<br />

a eficácia de um programa de educação para<br />

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internet] 2004 [cited 2007 jan. 14]; 9 (1) Available<br />

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9 ASSUNÇÃO, A. A.; LIMA, F. P. A. Contribuição<br />

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e eliminação da nocividade do trabalho. In: MEN-<br />

DES, R. Editor. Patologia do Trabalho. 2. ed. São<br />

Paulo: Atheneu, 2005, p. 1.768-89.<br />

10 MINISTÉRIO DA SAÚDE DO BRASIL. Doenças<br />

Relacionadas ao Trabalho. Manual de Procedimentos<br />

para os Serviços de Saúde. Brasília: Editora<br />

MS, 2001.<br />

11 BUSQUET, L. As cadeias musculares. Tronco.<br />

Coluna Cervical. Membros Superiores. São Paulo:<br />

Edições Busquet, 2001, p. 25.<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

67


PREVENÇÃO DE FATORES CAUSAIS DE DOENÇAS OSTEOMUSCULARES EM TRABALHADORES QUE EXERCEM ATIVIDADES NA POSIÇÃO SENTADA<br />

12 ASSUNÇÃO, A. A.; ALMEIDA, I. M. Doenças<br />

osteomusculares relacionadas com o trabalho:<br />

membro superior e pescoço. In: MENDES, R. Editor.<br />

Patologia do Trabalho. 2.ª ed. São Paulo:<br />

Atheneu, 2005, p. 1.502-39.<br />

13 PORTO, M. F. S.; MATTOS, U. A. O. Estratégias<br />

de prevenção, gerenciamento de riscos e mudança<br />

tecnológica. In: MENDES, R. Editor. Patologia<br />

do Trabalho. 2. ed. São Paulo: Atheneu, 2005,<br />

p. 1.722.<br />

68<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


MIRIAM RAQUEL ARDIGÓ WESTPHAL, NATASHA DA SILVA LEITÃO<br />

AVALIA<br />

ALIAÇÃ<br />

ÇÃO DOS PROTOC<br />

OCOL<br />

OLOS OS DE HIGIENE BUCAL<br />

NAS UNIDADES DE TERAPIA INTENSIVA DE HOSPI-<br />

TAIS PÚBLICOS E PRIVADOS<br />

*<br />

EVALUATION OF THE PROTOCOLS OF ORAL HYGIENE IN THE INTENSIVE CARE UNITS OF PUBLIC<br />

AND PRIVATE HOSPITALS<br />

Miriam Raquel Ardigó Westphal ** , Natasha da Silva Leitão ***<br />

RESUMO: Objetivo: Avaliar os protocolos preconizados para a higiene bucal de pacientes internados e intubados<br />

nas Unidades de Terapias Intensivas. Métodos: Trata-se de um estudo não-experimental descritivo que utilizou<br />

questionários, composto por perguntas fechadas e abertas. A amostra foi de 154 profissionais (55 médicos, 33<br />

enfermeiros e 66 técnicos/auxiliares) de quatro hospitais públicos e privados. Resultados: Afirmaram haver protocolo<br />

de higienização bucal para pacientes internados: 43,6% (24/55) dos médicos, 45,5% (15/33) dos enfermeiros e<br />

39,4% (26/66) dos auxiliares/técnicos, sendo 45,8% de instituições públicas e 39% privadas; e para pacientes<br />

intubados, 32,7% (18/55) dos médicos, 48,5% (16/33) dos enfermeiros e 31,8% (21/66) dos auxiliares/técnicos,<br />

sendo 34,7 e 36,6% de hospitais públicos e privados, respectivamente. A mediana da frequência de higiene bucal<br />

para todos os pacientes foi de três vezes, independente da profissão ou instituição. Os procedimentos mais usados,<br />

para pacientes internados nas instituições públicas e privadas, respectivamente, foram a escovação dental (45,5%<br />

e 28,1%), colutórios (18,2 e 21,9%), e para os pacientes intubados, foi o swab (68 e 70% ). O cloreto de cetilpiridino foi<br />

o colutório mais usado para pacientes internados (27,3 e 46,9%) e intubados (32 e 56,7%). Conclusão: Não há<br />

diferença entre a conduta de higiene bucal dos hospitais públicos e privados; e os protocolos adotados não estão de<br />

acordo com a literatura científica atual. Portanto, é essencial o desenvolvimento de programas educacionais e<br />

implementação de protocolos de higiene bucal na rotina hospitalar, visto que é um método eficaz na prevenção da<br />

pneumonia nosocomial e associada à ventilação mecânica.<br />

Palavras-chave: Higiene. Biofilme. Periodontite. Pneumonia.<br />

ABSTRACT: Objective: To evaluate the protocols recommended for oral care of patients hospitalized and intubated<br />

in the intensive care units. Methods: This is a non-experimental descriptive study that used questionnaires, consisting<br />

of closed and open questions. The sample of 154 professionals (55 doctors, 33 nurses and 66 technicians / assistants)<br />

from four public and private hospitals. Results: They said there was memorandum of oral hygiene in hospitalized<br />

patients: 43.6% (24/55) of doctors, 45.5% (15/33) of nurses and 39.4% (26/66) of assistants / technicians, and<br />

45.8% of public institutions and 39% private, and for intubated patients, 32.7% (18/55) of doctors, 48.5% (16/33) of<br />

nurses and 31.8% (21/66 ) of assistants / technicians, and 34.7 and 36.6% of public and private hospitals,<br />

respectively. The median frequency of oral hygiene for all patients was three times, regardless of profession or<br />

institution. The procedures most used for inpatients in public and private institutions, respectively, were brushing<br />

teeth (45.5% and 28.1%), colutórios (18.2 and 21.9%) and for patients intubated, was the swab (68 and 70%). The<br />

cetilpiridino chloride was used to colutório more inpatients (27.3 and 46.9%) and intubated (32 and 56.7%).<br />

Conclusion: There is no difference between the conduct of oral hygiene of public and private hospitals, and the<br />

protocols used are not in accordance with current scientific literature. Therefore, it is essential to the development of<br />

educational programs and implementation of protocols and oral hygiene in the hospital routine, since it is an<br />

effective method for prevention of nosocomial pneumonia and associated with mechanical ventilation.<br />

*<br />

Artigo elaborado com base na dissertação/tese de Miriam Raquel Ardigó Westphal, intitulada “AVALIAÇÃO DAS ATITUDES E CONHECIMENTO DOS PROFISSIONAIS DAS<br />

UNIDADES DE TERAPIA INTENSIVA SOBRE A RELAÇÃO ENTRE HIGIENE BUCAL, DOENÇA PERIODONTAL E PNEUMONIA” – Centro de Pós-Graduação/Centro de Pesquisas<br />

Odontológicas São Leopoldo Mandic, <strong>2008</strong> (154).<br />

**<br />

Especialista em Endodontia e Periodontia, Mestre em Periodontia, Professora auxiliar de Periodontia /<strong>Ufam</strong>. Rua Franco de Sá, 230, salas 406-407, Ed. Atrium, São Francisco<br />

– Manaus-AM. E-mail: mwestphal2109@hotmail.com – fone: (92) 3611-1133.<br />

***<br />

Odontóloga. Rua Via-Láctea, 1.085, sala 1.700, Ed. Palácio Adrianópolis – Conj. Morada do Sol. E-mail: natashaleitão@hotmail.com – fone: (92) 3236-2770.<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

69


AVALIAÇÃO DOS PROTOCOLOS DE HIGIENE BUCAL NAS UNIDADES DE TERAPIA INTENSIVA DE HOSPITAIS PÚBLICOS E PRIVADOS<br />

INTRODUÇÃO<br />

À medida que se desenvolvem estudos nas<br />

diversas áreas, aumentam os conhecimentos sobre<br />

o corpo humano e as doenças que o acometem.<br />

Apesar de as pesquisas estarem em fases iniciais,<br />

surgem fortes evidências da relação entre<br />

as patologias bucais e as morbidades sistêmicas.<br />

Dentre as doenças que apresentam evidências<br />

científicas da sua relação com a higiene bucal<br />

e doenças periodontais (DP), estão as pneumonias<br />

bacterianas. 1,2,3<br />

A pneumonia é uma infecção do parênquima<br />

pulmonar causada por uma grande variedade<br />

de agentes infecciosos, incluindo bactérias,<br />

micoplasma, fungos, parasitas e vírus, sendo considerada<br />

uma infecção de risco, especialmente, nas<br />

pessoas idosas e nos pacientes imunocomprometidos.<br />

4 Usualmente, é classificada como pneumonia<br />

associada à comunidade hospitalar (PAH) ou<br />

nosocomial e associada à ventilação mecânica<br />

(PAVM). Esta determinação é importante, pois os<br />

patógenos e as medidas preventivas são diferentes<br />

para os três tipos. 2,4<br />

A pneumonia nosocomial ocorre após 48<br />

horas da admissão hospitalar, sua prevalência varia<br />

entre diferentes estudos, de 10 a 65% e 27 a 50%<br />

a taxa de mortalidade. 5 Maiores índices de óbito<br />

podem ocorrer quando causada por determinados<br />

agentes etiológicos, como P. aeruginosa, Klebsiella<br />

pneumonie, Acinetobacter sp., Escherichia coli, Serratia<br />

sp., Enterobacter sp. e Staphylococcus aureus resistentes<br />

à meticilina. 2,5,6<br />

Para o desenvolvimento da PAH há a necessidade<br />

de que os patógenos alcancem o trato<br />

respiratório inferior e sejam capazes de vencer os<br />

mecanismos de defesa do sistema respiratório, que<br />

inclui os mecânicos (reflexo glótico e da tosse, sistema<br />

de transporte mucociliar), humorais<br />

(anticorpos e complemento) e celulares (leucócitos,<br />

neutrófilos e linfócitos). 4<br />

A PAVM surge entre 48-72 horas após a<br />

intubação endotraqueal e a instituição da ventilação<br />

mecânica invasiva. Nas Unidades de Terapia<br />

Intensiva (UTI) é a infecção mais comum e sua<br />

incidência pode variar de 9 a 68%, dependendo<br />

do método de diagnóstico utilizado e da população<br />

estudada. Sua alta letalidade varia de 33 a<br />

71% e a relação entre caso e fatalidade pode atingir<br />

até 55%. 4 A prevalência é de 2,5 a 34,4 casos<br />

de pneumonia por 1.000 dias de respiração artificial<br />

e de 3,2 casos por 1.000 dias em pacientes<br />

não ventilados. 7<br />

O impacto negativo de infecções bucais, e<br />

principalmente a DP, na saúde sistêmica, é proveniente<br />

da disseminação de microrganismos e de<br />

seus subprodutos na corrente sanguínea levando<br />

a um quadro de bacteremia. 8,9 Outro fator importante<br />

no processo patogênico da DP é o ambiente<br />

inflamatório existente, que estimula a resposta de<br />

defesa do organismo induzindo a migração de<br />

leucócitos para a área afetada. Simultaneamente,<br />

ocorre a liberação de mediadores químicos inflamatórios,<br />

provenientes das próprias células de defesa<br />

ou dos tecidos danificados. Citocinas (ex.: ILs<br />

e TNF), derivados do ácido aracdônico (ex.: PGs e<br />

leucotrienos [LTs]), metaloproteinases (MMPs)<br />

(ex.: colagenases e elastases) e proteínas da fase<br />

aguda da inflamação (ex.: proteína C-reativa) são<br />

alguns dos principais mediadores químicos da inflamação.<br />

10<br />

Outras possíveis formas de contaminação<br />

são ingestão e inalação. Essas duas possibilidades<br />

foram levantadas por estudos que apontaram a<br />

cavidade bucal como possível reservatório para<br />

bactérias causadoras de pneumonias. 2,3,11<br />

A cavidade bucal sofre contínua colonização<br />

e apresenta uma microbiota muito vasta, nela<br />

se encontra praticamente a metade de todos os microrganismos<br />

presentes no corpo humano. De forma<br />

geral, é constituída de bactérias anaeróbias estritas,<br />

aeróbias facultativas e espiroquetas, com<br />

aproximadamente 500 espécies bacterianas<br />

identificadas. 12 A microbiota bucal depende de<br />

vários fatores externos como tabagismo, o uso de<br />

álcool, antibióticos ou corticosteroides; a permanência<br />

em ambiente hospitalar; o estado<br />

nutricional; e a higiene bucal do paciente. Além<br />

disso, fatores intrínsecos, como a idade, modificam<br />

a flora bucal por alteração na imunidade local e<br />

70<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


MIRIAM RAQUEL ARDIGÓ WESTPHAL, NATASHA DA SILVA LEITÃO<br />

sistêmica, bem como seleção de espécies<br />

bacterianas. 13<br />

A associação entre a colonização do biofilme<br />

dental e a infecção hospitalar tem sido abordada<br />

em vários estudos e diversos mecanismos de<br />

plausibilidade biológica são propostos para justificar<br />

esta inter-relação. 2,3,11,14<br />

Scannapieco & Mylotte (1996), 14 em uma<br />

revisão de literatura, concluíram que as bactérias<br />

bucais poderiam participar da patogênese das infecções<br />

respiratórias por vários mecanismos como:<br />

a) aspiração de patógenos bucais (Porphyromonas<br />

gingivalis (Pg) e Aggregatibacter actinomycetemcomtans<br />

(Aa)) para o pulmão; b) enzimas presentes<br />

na saliva e associadas às DPs, podem modificar<br />

a superfície da mucosa e promover adesão e<br />

colonização dos patógenos respiratórios; c)<br />

enzimas associadas à DP podem destruir a película<br />

salivar sobre as bactérias patogênicas; d) as<br />

citocinas originárias dos tecidos periodontais podem<br />

alterar o epitélio respiratório e promover infecção<br />

pelos patógenos respiratórios.<br />

A DP ou a falta de higiene bucal podem resultar<br />

em uma grande concentração de patógenos<br />

bucais na saliva, e vários outros estudos têm demonstrado<br />

que os dentes e outras superfícies orais<br />

podem servir como reservatório de colonização e<br />

crescimento de patógenos respiratórios. 2,11,14,15,16<br />

Inúmeras recomendações têm sido feitas<br />

para reduzir a incidência de pneumonia<br />

nosocomial. Sendo assim, um controle rígido da<br />

infecção correspondente ao ponto crítico da prevenção.<br />

Uma vigilância sobre os patógenos potenciais,<br />

a identificação dos pacientes de risco, um<br />

grupo preparado para orientação, lavagem das<br />

mãos, uso de gorros e luvas de proteção tiveram<br />

impacto positivo na redução da incidência de PAH.<br />

Uma atenção adicional para com a higiene bucal<br />

deve ser considerada. 11,16<br />

Segundo Scannapieco (2006), 2 os métodos<br />

de higiene bucal em pacientes com respiração artificial<br />

é tão efetivo quanto à descontaminação seletiva<br />

do trato digestivo, que usa a aplicação tópica<br />

de antibióticos sobre as superfícies do trato<br />

gastrointestinal, incluindo a cavidade bucal, para<br />

reduzir a transferência de bactérias e a contaminação<br />

respiratória; e ainda tem como vantagem ser<br />

de baixo custo e diminuir o risco de resistência<br />

bacteriana. Estudos recentes indicam que o procedimento<br />

de higiene bucal é relevante na prevenção<br />

da colonização bucal pelos patógenos respiratórios<br />

potenciais. 1,2,6,11,17,18<br />

Os protocolos emitidos pela American<br />

Association of Critical Care Nurses (AACN) defenderam<br />

como cuidados bucais a utilização do<br />

swab, escovação dentária e aspiração de secreções<br />

bucais. O Centers for Disease Control and<br />

Prevention (CDC) recomenda que se desenvolvam<br />

e implementem programas de higiene bucal. 7<br />

A adoção de protocolos integrados de prevenção<br />

e tratamento multidisciplinar nos pacientes<br />

de UTI é essencial. Isso deve ocorrer especialmente<br />

em pacientes portadores de DP, por representar<br />

uma carga infecciosa e inflamatória significativa<br />

e servir de reservatório crônico para transferência<br />

de bactérias e/ou produtos do seu metabolismo.<br />

2,11 Portanto, diante das evidências científicas,<br />

a proposta do presente trabalho foi avaliar,<br />

por intermédio de questionário, a existência um<br />

programa de higiene bucal e quais os procedimentos<br />

adotados pelos profissionais da área de saúde<br />

nos serviços nas UTIs.<br />

MATERIAIS E MÉTODOS<br />

Trata-se de um estudo não-experimental<br />

descritivo com objetivo de avaliar o protocolo preconizado<br />

para a higiene bucal de pacientes internados<br />

e intubados das UTIs. Para o desenvolvimento<br />

da pesquisa foi utilizado questionários,<br />

composto por perguntas fechadas e abertas. A inclusão<br />

de questões abertas favoreceu a preservação<br />

da multiplicidade de informações, evitando o<br />

direcionamento das respostas e a distorção da real<br />

situação. Todas as questões cuja resposta foi positiva<br />

foram associadas a uma questão aberta, as<br />

quais foram posteriormente analisadas e codificadas<br />

como certas, erradas ou não-respondidas.<br />

Para que a amostra fosse estatisticamente<br />

representativa, foi utilizada uma proporção de<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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AVALIAÇÃO DOS PROTOCOLOS DE HIGIENE BUCAL NAS UNIDADES DE TERAPIA INTENSIVA DE HOSPITAIS PÚBLICOS E PRIVADOS<br />

50%, precisão de 6% e erro amostral de 10%. Portanto,<br />

a população do estudo incluiu 154 profissionais<br />

de quatro UTIs, sendo duas instituições públicas<br />

(n=72) e duas do serviço privado de saúde<br />

(n=82); divididos em três categorias assim distribuídos:<br />

55 médicos (35,7%), 33 enfermeiros (21,4%)<br />

e 66 técnicos/auxiliares de enfermagem (42,9%).<br />

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética<br />

em Pesquisa da Universidade Federal do Amazonas<br />

(<strong>Ufam</strong>) com o número 071/2006 e para sua<br />

execução pela direção das quatro UTIs estudadas.<br />

Após a seleção aleatória da população em estudo,<br />

cujas características preenchiam os critérios de inclusão<br />

e exclusão da pesquisa, foi apresentado aos<br />

participantes o termo de consentimento livre e esclarecido,<br />

conforme as especificações da Resolução<br />

n.º 196/1996, do Conselho Nacional de Saúde.<br />

Todos os participantes preencheram um<br />

cadastro profissional, com informações como tempo<br />

de atividade, área de atuação e métodos de higiene<br />

bucal preconizados nas instituições de trabalho<br />

para pacientes internados nas UTIs e ventilados<br />

mecanicamente.<br />

Os dados foram apresentados por meio de<br />

tabelas de frequências, nas quais foram calculadas<br />

as frequências absolutas simples e relativas para<br />

os dados qualitativos, médias, mediana e desviopadrão<br />

para os dados quantitativos. Na análise de<br />

associação, foi utilizado o teste do qui-quadrado<br />

de Pearson ou teste exato de Fisher, e na comparação<br />

para duas médias utilizou-se o teste t, de<br />

Student, e para mais de duas médias a Análise de<br />

Variância (Anova).<br />

RESULTADOS<br />

A amostra pesquisada foi constituída 154<br />

profissionais que preenchiam os quesitos necessários<br />

para participar do estudo, sendo 55 do gênero<br />

masculino (35,7%) e 99 do gênero feminino<br />

(64,3%). A idade média foi de 35,4 ± 8,2 meses,<br />

sendo 55 médicos (35,7%), 33 enfermeiros (21,4%)<br />

e 66 técnicos/auxiliares de enfermagem (42,9%),<br />

sendo que 38 trabalhavam no <strong>Hospital</strong> Universitário<br />

Getúlio <strong>Vargas</strong> – <strong>HUGV</strong> (24,7%), 34 no <strong>Hospital</strong><br />

Pronto-Socorro 28 de Agosto – HPS (22,1%),<br />

41 no Instituto de Medicina Intensiva – IMI<br />

(26,6%) e 41 no <strong>Hospital</strong> Unimed – HU (26,6%).<br />

Quanto à formação escolar, 117 foram em instituições<br />

de ensino na rede pública (76%) e 37 em<br />

instituições privadas (24%), com tempo médio de<br />

experiência que variou de 10,2 ± 6,5.<br />

De acordo com a Tabela 1, podemos analisar<br />

que, quando inquiridos da existência de um<br />

protocolo nas instituições em que trabalham para<br />

a higiene bucal de pacientes internados nas UTIs,<br />

responderam positivamente 33 (45,8%) da rede pública<br />

e 32 (39%) da privada, sendo 24 (43,6%) médicos,<br />

15 (45,5%) enfermeiros e 26 (39,4%) técnicos/auxiliares<br />

de enfermagem. Quanto à existência<br />

de um protocolo para os pacientes intubados,<br />

podemos analisar que 25 (34,7%) servidores das<br />

instituições públicas e 30 (36,6%) dos hospitais privados<br />

responderam positivamente, no qual 24<br />

(43,6%) eram médicos, 15 (45,5%) enfermeiros e 26<br />

(39,4%) técnicos/auxiliares. Comparando-se as categorias<br />

profissionais e instituições entre si, não<br />

houve diferença estatisticamente significante.<br />

Dentre os métodos higiene bucal de pacientes<br />

internados nas UTIs e intubados encontramse<br />

escovação com creme dental, bochecho, uso do<br />

swab (gaze com espátula). Quando analisado a<br />

frequência com que a higiene era realizada nos<br />

pacientes em estudo, a mediana (3,0) foi igual para<br />

os três grupos de profissionais e entre as instituições<br />

(Tabela 2).<br />

Em relação ao tipo de colutório usado nos<br />

protocolos de higiene bucal, 57,6% dos funcionários<br />

das instituições públicas e 43,8% da rede privada<br />

não responderam a questão. Os colutórios<br />

mencionados foram: a clorexidine, bicarbonato de<br />

sódio e Cepacol, ® sendo este o mais usado entre os<br />

profissionais e nas instituições analisadas, tanto<br />

para pacientes internados (Gráfico 1) quanto para<br />

os intubados (Gráfico 2). Não houve diferença estatística<br />

entre as profissões e UTIs pesquisadas.<br />

DISCUSSÃO<br />

Tendo em vista a gravidade e peculiaridades<br />

a que o paciente internado na UTI está sujei-<br />

72<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


MIRIAM RAQUEL ARDIGÓ WESTPHAL, NATASHA DA SILVA LEITÃO<br />

to e da necessidade de cuidados de excelência,<br />

ressalva-se a importância das equipes de saúde<br />

exercer suas atividades em conjunto, por meio da<br />

multidisciplinariedade. Vários estudos analisaram<br />

as atitudes e conhecimentos dos enfermeiros;<br />

11,18,19,20 técnicos de enfermagem 3,18 e fisioterapeutas<br />

19 sobre higiene bucal em pacientes hospitalizados<br />

ou institucionalizados, e como não foram<br />

encontrados dados referentes aos médicos<br />

intensivistas, decidiu-se, portanto, envolver em<br />

nosso estudo profissionais da área médica<br />

(35,7%), de enfermagem (21,4%) e técnicos/auxiliares<br />

de enfermagem (42,9%), de quatro Unidades<br />

de Saúde da cidade de Manaus-AM.<br />

Apesar do conhecimento de que o procedimento<br />

de higiene bucal são efetivos para a redução<br />

da colonização da orofaringe pelos patógenos respiratórios,<br />

1,2,6,16,17,18 a implementação de planos coordenados,<br />

que incluem intervenções de<br />

higienização bucal, não é uma prática comum nas<br />

UTIs. 6 Podemos observar em nosso estudo que 45,8%<br />

dos funcionários das unidades públicas e 39% dos<br />

hospitais privados afirmaram haver protocolo para<br />

pacientes internados e para pacientes intubados:<br />

34,7 e 36,6%, respectivamente. Estes dados são coerentes<br />

com os resultados do estudo realizado por<br />

Sole et al. (2003), 19 onde se concluiu que das 27 instituições<br />

de saúde no Reino Unido estudadas, apenas<br />

48% tinham políticas de higiene bucal.<br />

Os protocolos emitidos pela AACN preconizaram<br />

como cuidados bucais a utilização do swab,<br />

escovação dentária e aspiração de secreções bucais.<br />

Os protocolos de higiene bucal publicados<br />

recentemente incluem, além desses procedimentos,<br />

uma avaliação bucal e bochechos com<br />

colutórios em um intervalo de duas a seis horas. 21,22<br />

Entretanto, os procedimentos que estavam incluídos<br />

nos protocolos das instituições analisadas<br />

para pacientes internados nas UTIs públicas e<br />

privadas era a escovação dental (45,5 e 28,1%) e<br />

uso de colutórios (18,2 e 21,9%), para os pacientes<br />

em ventilação mecânica, o método mais usado<br />

foi o swab no qual foi citado por 68 e 70% dos<br />

entrevistados das UTIs públicas e privadas, respectivamente.<br />

Fitch et al. (1999) 21 afirmaram ser o swab,<br />

dentre as intervenções bucais, o mais comum nas<br />

UTIs. Os resultados de um estudo realizado por<br />

Cutler & Davis (2005) 23 são similares aos nossos,<br />

pois a higiene bucal era realizada principalmente<br />

por swab. Para Adams (1996) 24 e Pearson (2006), 25<br />

este método não é efetivo na remoção do biofilme<br />

dental e provavelmente não reduz risco de PAVM.<br />

Rello et al. (2007) 20 avaliaram o tipo e a<br />

frequência dos cuidados bucais nas UTIs europeias.<br />

A higiene era realizada uma vez por dia (20%),<br />

duas vezes (31%) ou três vezes (37%). O procedimento<br />

consistia na limpeza da cavidade bucal<br />

(88%), com swab (22%), escova de dente (41%),<br />

hidratantes (42%) e principalmente com<br />

clorexidina (61%). Em um estudo realizado por<br />

Grap et al. (2006), 18 75% dos profissionais afirmaram<br />

realizá-la duas ou três vezes por dia para pacientes<br />

não intubados e 72% cinco vezes por dia<br />

ou mais para pacientes intubados. A mediana obtida<br />

da frequência de higiene bucal dos pacientes<br />

internados e intubados em nosso estudo foi três<br />

vezes, independente da profissão ou instituição de<br />

trabalho.<br />

Atualmente, muitos agentes químicos estão<br />

sendo utilizados e testados em várias formulações<br />

para combater o biofilme dental, dentre eles podemos<br />

citar o peróxido de hidrogênio, 25 bicarbonato<br />

de sódio, 24 cloreto de cetilpiridino 26,27 e óleos essenciais,<br />

27 PVPI, 17 clorexidina. 1,17,27,28 Entretanto,<br />

somente dois agentes para tratamento da gengivite<br />

e controle do biofilme são aceitos pela ADA: o<br />

digluconato de clorexidina e os colutórios como a<br />

base de óleos essenciais. 29 Em nosso trabalho, o<br />

colutório mais usado nos protocolos das UTIs, para<br />

o controle do biofilme dental, foi o Cepacol. ®<br />

O bicarbonato de sódio foi referido como<br />

parte dos procedimentos de higiene bucal usados<br />

nos protocolos dos pacientes internados por 9,1 e<br />

3,1%, da rede pública e privada, respectivamente.<br />

Para os pacientes intubados é usado por 4% nas<br />

unidades públicas e 3,3% nas privadas. Entretanto,<br />

segundo Adams (1996), 24 o bicarbonato de sódio<br />

e o peróxido de hidrogênio, mesmo sendo eficazes<br />

na remoção do biofilme, podem causar quei-<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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AVALIAÇÃO DOS PROTOCOLOS DE HIGIENE BUCAL NAS UNIDADES DE TERAPIA INTENSIVA DE HOSPITAIS PÚBLICOS E PRIVADOS<br />

maduras superficiais, se não diluído adequadamente.<br />

O agente que mostrou os resultados mais<br />

positivos quanto à ação inibidora do biofilme é a<br />

clorexidina, atingindo a eficácia terapêutica preconizada<br />

pela ADA (2001), 29 sendo, portanto, considerado<br />

o padrão áureo e o antisséptico de escolha.<br />

Rello et al. (2007) 20 avaliaram o tipo dos cuidados<br />

bucais nas UTIs europeias e observaram que a<br />

clorexidina (61%) era o colutório mais usado. Em<br />

nosso estudo foi citada como parte do protocolo<br />

de higiene bucal de pacientes internados nas instituições<br />

públicas e privados por 3 e 3,1%, respectivamente.<br />

O CDC preconiza o uso de clorexidina a<br />

0,12% em duas situações: durante o período préoperatório<br />

de pacientes que foram submetidos à<br />

cirurgia cardíaca e em todos os pós-operatórios de<br />

pacientes em estado crítico de saúde e/ou pacientes<br />

com alto risco de pneumonia. 7 Vários estudos<br />

comprovaram, porém, a eficácia do antisséptico na<br />

prevenção das PHs e PAVMs. 1,5 Entretanto, a<br />

clorexidine não é utilizada nos protocolos para<br />

pacientes ventilados mecanicamente nas UTIs<br />

pesquisadas.<br />

Apesar da ineficácia do cloreto de<br />

cetilpiridino sobre bactérias gram-negativas e<br />

micobactérias, 26 e de estudos comprovarem que o<br />

colutório é um bom conservante de Mycobacterium<br />

tuberculosis; 26,30 o Cepacol ® foi o colutório mais utilizado<br />

na rede pública e privada, para a higiene<br />

bucal de pacientes internados (27,3 e 46,9%) e<br />

intubados (32 e 56,7%).<br />

Pitten & Kramer (2001) 26 descreveram que<br />

a aplicação de cloreto de cetilpiridino em uma concentração<br />

de 0,05% resulta em uma redução imediata<br />

na contagem bacteriana de 2,0 a 2,5 em uma<br />

escala logarítmica (sendo adequado para > 99%)<br />

com uma efetividade bactericida por um período<br />

de uma hora após a aplicação. Em contrapartida,<br />

a clorexidina apresenta melhores características<br />

como a substantividade de 12 horas, eficiência,<br />

estabilidade e segurança. 28 Considerando o exposto,<br />

o uso da clorexidine seria mais adequado e não<br />

o Cepacol, ® já que nos protocolos usados nas instituições<br />

avaliadas a frequência dos procedimentos<br />

de higiene bucal tem a mediana de três vezes<br />

ao dia, portanto com intervalos de oito horas.<br />

Segundo a literatura, a disponibilidade de<br />

escovas dentárias apropriadas e a qualidade dos<br />

colutórios e swab fornecidos pelos hospitais podem<br />

também influenciar no procedimento de higiene<br />

bucal em UTIs. Além desses obstáculos, as<br />

condições do hospital, tais como a falta de protocolos,<br />

equipamentos e prioridade do procedimento,<br />

afetam o tipo e a qualidade do cuidado bucal<br />

dado por enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem.<br />

19 Durante o presente estudo foi observado<br />

que nas UTIs públicas e privadas os dispositivos<br />

de higiene bucal como creme dental, escova<br />

dentária e colutórios eram solicitados aos familiares<br />

dos pacientes, pois a higiene bucal não faz<br />

parte dos procedimentos prioritários das instituições<br />

e dos convênios de saúde.<br />

Diante do exposto, as administrações dos<br />

hospitais devem estar ciente da importância da<br />

formação de uma equipe multidisciplinar nas UTIs<br />

e da necessidade de implementação de programas<br />

de prevenção e promoção de saúde bucal em<br />

pacientes criticamente doentes, para que estes tenham<br />

um tratamento integral e humanizado.<br />

CONCLUSÃO<br />

Podemos concluir que não houve diferença<br />

estatística entre os profissionais e as instituições<br />

em relação ao protocolo de higiene bucal e<br />

para a frequência da execução dos procedimentos,<br />

e que ela está abaixo do preconizado na literatura.<br />

Os métodos de higiene bucal mais usados<br />

em pacientes internados foram a escovação com<br />

creme dental e bochechos; e para os pacientes<br />

submetidos à ventilação mecânica foi o uso de<br />

swab. O colutório mais utilizado é o cloreto de<br />

cetilperidino para a higiene bucal dos pacientes<br />

internados e intubados. Portanto, é essencial a<br />

implementação de protocolos de higiene bucal na<br />

rotina hospitalar, visto que é um método eficaz<br />

na prevenção da pneumonia nosocomial e associada<br />

à ventilação mecânica.<br />

74<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


MIRIAM RAQUEL ARDIGÓ WESTPHAL, NATASHA DA SILVA LEITÃO<br />

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75


AVALIAÇÃO DOS PROTOCOLOS DE HIGIENE BUCAL NAS UNIDADES DE TERAPIA INTENSIVA DE HOSPITAIS PÚBLICOS E PRIVADOS<br />

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MIRIAM RAQUEL ARDIGÓ WESTPHAL, NATASHA DA SILVA LEITÃO<br />

Tabela 1 – Protocolo para Higienização Bucal dos Pacientes Internados e Intubados em relação à<br />

Profissão e às Instituições<br />

Profissão<br />

Instituição de Trabalho<br />

Variáveis (n=154)<br />

Aux./Tec.<br />

Pública Privada<br />

Médico Enfermeiro<br />

p*<br />

Enfermagem p* (n=117) (n=37)<br />

(n=55) (n=33)<br />

(n=66)<br />

n % n % n % n % n %<br />

Protocolo de HB em<br />

pacientes<br />

24 43,6 15 45,5 26 39,4 0,466 33 45,8 32 39,0 0,674<br />

INTERNADOS/UTI<br />

Qual (n = 65) ** **<br />

Escovação com creme<br />

dental<br />

5 20,8 11 73,4 8 30,8 15 45,5 9 28,1<br />

Bochechos 6 25,0 2 13,3 5 19,2 6 18,2 7 21,9<br />

Swab - - - - 3 11,5 2 6,1 1 3,1<br />

Escovação/Bochechos 11 45,9 2 13,3 4 15,4 5 15,1 12 37,5<br />

Não respondeu 2 8,3 - - 6 23,1 5 15,1 3 9,4<br />

Protocolo de HB em<br />

pacientes<br />

18 32,7 16 48,5 21 31,8 0,281 25 34,7 30 36,6 0,701<br />

INTUBADOS/UTI<br />

Qual (n = 57) ** **<br />

Escovação com creme 3 16,7 - - - - - - 3 10,0<br />

dental<br />

Bochechos 3 16,7 1 6,3 - - 3 12,0 1 3,3<br />

Swab 10 55,6 13 81,3 15 71,4 17 68,0 21 70,0<br />

Escovação/Bochechos 1 5,6 2 12,5 2 9,5 1 4,0 4 13,3<br />

Não respondeu 1 5,6 - - 4 19,0 4 16,0 1 3,3<br />

*p-valor em negrito itálico indica associação estatisticamente significante ao nível de 5%<br />

* *Não foi possível aplicar a Estatística de Teste pois mais de 20% dos valores esperados são menores que 5.<br />

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AVALIAÇÃO DOS PROTOCOLOS DE HIGIENE BUCAL NAS UNIDADES DE TERAPIA INTENSIVA DE HOSPITAIS PÚBLICOS E PRIVADOS<br />

Tabela 2 – Frequência de Higiene Bucal em pacientes Internados e Intubados em relação à Profissão e às<br />

Instituições<br />

Profissão<br />

Instituição de Trabalho<br />

Variáveis (n=154)<br />

Freqüência HB em<br />

pacientes<br />

Médico<br />

(n=55)<br />

Enfermeiro<br />

(n=33)<br />

Aux./Tec.<br />

Enfermagem<br />

(n=66)<br />

p*<br />

Pública<br />

(n=117)<br />

Privada<br />

(n=37)<br />

0,660*** 0,804**<br />

INTERNADOS/UTI:<br />

Média ± DP 2,7 ± 0,8 2,9 ± 0,7 2,9 ± 0,6 2,8 ± 0,7<br />

2,8 ±<br />

0,6<br />

Mediana 3,0 3,0 3,0 3,0 3,0<br />

Amplitude 1 - 4 2 – 4 2 – 4 1 - 4 1 – 4<br />

p*<br />

Freqüência HB em<br />

pacientes<br />

INTUBADOS/UTI:<br />

Média ± DP 2,4 ± 1,0 3,0 ± 0,7 3,2 ± 0,4 3,1 ± 0,8<br />

2,7 ±<br />

0,7<br />

Mediana 3,0 3,0 3,0 3,0 3,0<br />

0,063***<br />

Amplitude 1 - 4 2 – 4 3 – 4 1 - 4 1 – 4<br />

*p-valor em negrito itálico indica associação estatisticamente significante ao nível de 5%<br />

Gráfico 1 – Colutórios utilizados pelos profissionais para HB de pacientes internados em UTIs em relação à<br />

profissão.<br />

78<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


MIRIAM RAQUEL ARDIGÓ WESTPHAL, NATASHA DA SILVA LEITÃO<br />

Gráfico 2 – Colutórios utilizados pelos profissionais para HB de pacientes intubados, em relação à profissão.<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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80<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


EDUARDO ABRAM KAUFFMAN, JÚLIO CÉSAR SIMAS RIBEIRO, CLÁUDIA MARINA PUGA BARBOSA OLIVEIRA<br />

REFLUX<br />

UXO LARIN<br />

ARINGOF<br />

GOFARÍN<br />

ARÍNGEO: UMA MANIFESTAÇÃ<br />

ÇÃO<br />

ATÍPIC<br />

TÍPICA DA DOENÇA DO REFLUX<br />

UXO<br />

GAS<br />

ASTR<br />

TROESOF<br />

OESOFÁGIC<br />

GICO CLÁSSIC<br />

ÁSSICA<br />

LARYNGOPHARYNGEAL REFLUX: AN ATYPICAL MANIFESTATION OF CLASSIC GASTROESOPHAGEAL<br />

REFLUX DISEASE<br />

Eduardo Abram Kauffman * , Júlio César Simas Ribeiro ** , Cláudia Marina Puga Barbosa Oliveira ***<br />

RESUMO: A Doença do Refluxo Gastroesofágico tem duas manifestações clínicas distintas: Refluxo Gastroesofágico<br />

patológico ou DRGE clássica e Refluxo Laringofaríngeo (RLF) com sintomas respiratórios e/ou laríngeos que<br />

acabam trazendo os pacientes à atenção do otorrinolaringologista. Os principais sintomas são disfonia, tosse,<br />

sensação de globus faríngeo, pigarro, hipersalivação, odinofagia, disfagia alta, queimação em garganta e garganta<br />

seca. O tratamento é basicamente clínico e deve buscar a eliminação dos fatores propiciadores, com mudança nos<br />

hábitos alimentares e de vida. Faz-se também necessária, na maioria dos casos, a terapia medicamentosa, inicialmente<br />

com bloqueadores da bomba de prótons. Apesar da alta frequência, uma vez que cerca de 80% das queixas de<br />

garganta têm refluxo associado; a doença laringofaríngea ainda é subdiagnosticada.<br />

Palavras-chave: Doença do Refluxo Gastroesofágico, Refluxo Laringofaríngeo, manifestação atípica.<br />

ABSTRACT: The Gastroesophageal Reflux Disease has two different clinical manifestations: the pathological<br />

Gastroesophageal Reflux or classic GERD and the Laryngopharyngeal Reflux (LPR) with respiratory and/or<br />

laryngeal symptoms which call the otorhinolaryngologist’s attention. The main symptoms are dysphonia, cough,<br />

pharyngeal globus, throat clearing, sialorrhoea, odynophagia, upper dysphagia, burning sensation in the throat<br />

and throat dryness. Treatment is basically clinical and must mind precipitation factors, changes in eating habits<br />

and in life. Medical management with proton pump inhibitors is also needed in most cases. Despite the high<br />

occurence, as around 80% of throat complaints are related to reflux, the laryngopharyngeal disease still isn’t<br />

properly detected.<br />

Keywords: Gastroesophageal Reflux Disease, Laryngopharyngeal Reflux, atypical manifestation.<br />

A porção alta do tubo digestivo é composta<br />

por boca, orofaringe, laringe, esôfago, estômago e<br />

duodeno. O alimento, ao ser ingerido, percorre<br />

sequencialmente essas regiões, utilizando como<br />

propulsão a força da gravidade e o peristaltismo.<br />

Ao chegar ao estômago e ao duodeno, sofre ação<br />

do conteúdo gástrico e duodenal, composto por<br />

enzimas e ácidos capazes de digerir os alimentos,<br />

para posteriormente serem absorvidos. 20<br />

Existem mecanismos que impedem que o<br />

alimento se movimente de maneira retrógrada por<br />

esse tubo. Os principais são os esfíncteres<br />

esofágicos inferior e superior. Quando há incompetência<br />

desses esfíncteres ocorre um fenômeno<br />

chamado refluxo alimentar, onde o conteúdo gastroduodenal,<br />

responsável pela digestão do alimento<br />

ingerido, percorre o caminho inverso, atingindo<br />

as regiões esofágica, laríngea e faríngea. 15 Esse<br />

*<br />

Mestre em Otorrinolaringologia.<br />

**<br />

Acadêmico do 6.º ano de Medicina, <strong>Ufam</strong>.<br />

***<br />

Acadêmica do 6.º ano de Medicina, <strong>Ufam</strong>.<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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REFLUXO LARINGOFARÍNGEO: UMA MANIFESTAÇÃO ATÍPICA DA DOENÇA DO REFLUXO GASTROESOFÁGICO CLÁSSICA<br />

refluxo alimentar ocorre fisiologicamente durante<br />

o dia, principalmente após refeições volumosas –<br />

quando evita a hiperdilatação do estômago – e<br />

durante o sono – quando é favorecido pela posição<br />

em decúbito. 20 Ele pode, porém, se tornar patológico<br />

quando há exposição prolongada do conteúdo<br />

ácido sobre mucosas não especializadas em<br />

recebê-lo, como no esôfago, laringe e faringe. 8,10,13<br />

Os esfíncteres esofágicos, já citados, são<br />

importantes mecanismos antirrefluxo e o esfíncter<br />

esofágico inferior (EEI), situado entre o esôfago<br />

distal e o estômago, é o principal deles. Se esse<br />

esfíncter se tornar incompetente, com tônus basal<br />

muito baixo ou com relaxamentos transitórios frequentes<br />

(mecanismo mais comum), ocorre o refluxo<br />

gastroesofágico (RGE), podendo se transformar<br />

em Doença do Refluxo Gastroesofágico (DRGE),<br />

quando causa lesões esofágicas. 2,14,19<br />

Do ponto de vista clínico, definimos a<br />

DRGE como uma afecção crônica decorrente do<br />

refluxo de parte do conteúdo gástrico (e por vezes,<br />

gastroduodenal) para o esôfago, acarretando<br />

um espectro de sintomas esofágicos e/ou<br />

extraesofágicos, frequentemente associados a lesões<br />

teciduais (ex.: esofagite). Os principais sintomas<br />

da DRGE são pirose, regurgitação e dor<br />

subesternal. Deve-se ressaltar que a inexistência<br />

desses sintomas não descarta a possibilidade de<br />

DRGE, assim como a sua intensidade não auxilia<br />

no diagnóstico de esofagite. O diagnóstico deve ser<br />

suspeitado de forma quase patognomônica pelos<br />

sinais e sintomas descritos, especialmente em relação<br />

à pirose e à regurgitação. Além disso, a<br />

endoscopia digestiva alta e a pHmetria de 24h (padrão<br />

ouro) devem ser solicitadas em situações específicas.<br />

3,6,14,17<br />

Entretanto, a maioria dos pacientes com sintomas<br />

sugestivos de DRGE (pirose, regurgitação<br />

ácida) não necessita de nenhum exame<br />

investigatório inicialmente, sendo o diagnóstico<br />

determinado pela prova terapêutica com uma droga<br />

inibidora da bomba de prótons (IBP). Uma resposta<br />

satisfatória praticamente sela o diagnóstico<br />

(melhora considerável dos sintomas nas primeiras<br />

quatro semanas de tratamento). 11<br />

A primeira associação entre doença laríngea<br />

e refluxo gastroesofágico foi relatada por Coffin<br />

em 1903, especulando que a “eructação de gases<br />

do estômago” e hiperacidez são responsáveis por<br />

sintomas em muitos de seus pacientes com “catarro<br />

pós-nasal”. Segundo ele, este problema era negligenciado<br />

porque muitos desses pacientes não<br />

tinham sintomas gastrintestinais. Cherry e<br />

Margulus, em 1968, relataram três casos de pacientes<br />

com úlcera de contato na laringe e refluxo<br />

esofágico significante evidenciado nos estudos com<br />

bário. 7,11 Estudos subsequentes têm estimado que<br />

10% dos tossidores crônicos, 5 a 10% dos pacientes<br />

com rouquidão, 25 a 50% dos pacientes com<br />

sensação de globus, e um pequeno mas definido<br />

grupo com câncer laríngeo tem DRGE como fator<br />

etiológico primário. 18<br />

Os estudos de pesquisadores, como<br />

Kouffman e Oson, acabaram por mostrar que a<br />

DRGE, apesar de ser causada pelo mesmo mecanismo,<br />

tem duas manifestações clínicas distintas:<br />

sua forma clássica, que cursa com esofagite e é denominada<br />

simplesmente de Doença do Refluxo<br />

Gastroesofágico (DRGE); e sua manifestação<br />

atípica, que pode cursar apenas com sintomas altos,<br />

sendo denominada Refluxo Laringofaríngeo<br />

(RLF). Portanto, o termo laringofaríngeo não significa<br />

que o refluxo ocorre apenas nesta região, mas<br />

sim que acomete principalmente o epitélio dessa<br />

topografia anatômica, que tem características próprias.<br />

Neste caso, apenas 18% dos pacientes com<br />

sintomatologia compatível com RLF têm esofagite<br />

de refluxo. 1,5<br />

No início da década de 80, se o médico relatasse<br />

que o problema de garganta de seu paciente<br />

tinha origem no estômago, arrancariam risos dos<br />

colegas. O episódio é verídico e ocorreu com o pesquisador<br />

americano James Kaufman. Hoje, as pesquisas<br />

nessa área já estão bem avançadas, até mesmo<br />

no Brasil. Estatísticas mundiais mostram que o<br />

Dr. Kaufman estava certo: cerca de 80% das queixas<br />

de garganta têm refluxo associado. Apesar disso,<br />

são poucos os otorrinolaringologistas que aplicam<br />

em seus consultórios as “novas ideias”. Isso<br />

ocorre porque a forma clássica da doença sempre<br />

82<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


EDUARDO ABRAM KAUFFMAN, JÚLIO CÉSAR SIMAS RIBEIRO, CLÁUDIA MARINA PUGA BARBOSA OLIVEIRA<br />

foi diagnosticada sem dificuldades, mas nunca relacionada<br />

aos sintomas “altos”. 15<br />

A mudança na forma de enfrentar o RFL<br />

ocorreu após o acesso às fibras óticas na prática<br />

clínica, utilizada como instrumento de diagnóstico<br />

para detectar partes queimadas na garganta,<br />

principalmente na entrada do esôfago. 5,6<br />

O mecanismo patogênico nos diferentes tipos<br />

de refluxo é o mesmo: a ação química do conteúdo<br />

gástrico na mucosa laríngea; porém não é<br />

consenso que o RLF é uma manifestação atípica<br />

da DRGE. 10<br />

A prevalência de distúrbios relacionados<br />

com a sintomatologia compatível com o RLF na prática<br />

otorrinolaringológica é estimada em 4 a 10% e a<br />

prevalência de RLF em pacientes com alterações<br />

vocais e desordens laríngeas atinge 50 a 78%. 19<br />

Pacientes com RLF geralmente possuem<br />

lesões que podem ser evidenciadas por meio de<br />

videolaringoscopia (geralmente o primeiro exame<br />

solicitado), como edema e hiperemia de laringe,<br />

hiperemia e hiperplasia linfoide em parede posterior<br />

da faringe, alterações interaritenoideas (laringite<br />

posterior), úlceras de contato na glote,<br />

granuloma laríngeo, pólipos de laringe, edema de<br />

Reinke, estenose subglótica e laringite hipertrófica.<br />

Os achados mais comuns são o edema glótico e a<br />

laringite posterior. Os principais sintomas são<br />

disfonia, tosse, sensação de globus faríngeo, pigarro,<br />

hipersalivação, odinofagia, disfagia alta,<br />

queimação em garganta e garganta seca. 3,8,9,15<br />

O tratamento clínico deve buscar a eliminação<br />

dos fatores propiciadores. É sugerido ao paciente<br />

mudança nos hábitos alimentares e hábitos<br />

de vida. Faz-se também necessária, na maioria<br />

dos casos, a terapia medicamentosa. O tratamento<br />

inicial deve ser feito com bloqueadores da<br />

bomba de prótons, em duas doses diárias, por no<br />

mínimo 12 semanas. 1,5<br />

O tratamento cirúrgico é indicado quando<br />

o paciente não tem melhora significativa com o tratamento<br />

clínico e é pouco utilizado em casos que<br />

apresentam com sintomatologia laringofaríngea<br />

isolada. É indicado em casos que não responderam<br />

às medidas terapêuticas usuais e que apresentem<br />

esofagite de Barret, estenoses ou processos<br />

hemorrágicos. Casos de aspirações frequentes<br />

com rouquidão ou estenose subglótica podem<br />

também requerer intervenção cirúrgica. O tratamento<br />

cirúrgico mais utilizado é a fundoplicatura<br />

do estômago, que promove aumento na tensão<br />

do esfíncter esofágico inferior (EEI). 1,5,20<br />

Portanto, trata-se de uma enfermidade recente<br />

e ainda de difícil diagnóstico. Atualmente o<br />

que se vê de concreto é que temos uma patologia<br />

laringofaríngea frequente, porém ainda subdiagnosticada.<br />

O especialista, ao deparar-se com pacientes<br />

portadores de queixas laringológicas crônicas<br />

sem melhoras aos tratamentos médicos convencionais,<br />

deve obrigatoriamente incluir dentre<br />

suas suspeitas diagnósticas o RLF. O diagnóstico<br />

correto e precoce alertará o paciente e o médico<br />

sobre potenciais prejuízos a médio e longo prazos<br />

e a necessidade de tratamento.<br />

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revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


EDUARDO KAUFFMAN, DOMINGOS LIMA, LUIZ PASSOS, ALETÉIA ANUNCIAÇÃO, CLAUDIA OLIVEIRA, JÚLIO RIBEIRO<br />

RINOSSINUSITE CRÔNICA EM PACIENTES COM<br />

LÚPUS – ERITEMATOSO SISTÊMIC<br />

TÊMICO<br />

CHRONIC RHINOSINUSITIS IN SYSTEMIC LUPUS – ERYTHEMATOSUS PATIENTS<br />

Eduardo Abram Kauffman*, Domingos Sávio Nunes de Lima**, Luiz Fernando Passos***, Aletéia Cristina Fonseca de<br />

Anunciação****, Claudia Marina Puga Barbosa Oliveira*****, Júlio César Simas Ribeiro*****<br />

Resumo: Introdução: O manejo clínico do LES, por meio de corticoterapia, pode levar os pacientes a vários<br />

estágios de imunossupressão. A rinossinusite tem sido relatada com frequência em pacientes imunossuprimidos.<br />

Objetivos: Estudar a prevalência de rinossinusite nos pacientes portadores de LES e descrever os sinais/sintomas<br />

otorrinolaringológicos desse grupo de pacientes. Pacientes e métodos: Estudo transversal, onde foram incluídos<br />

96 pacientes com LES [critérios para a classificação do American College of Rheumatology (ACR)]. Resultados:<br />

Dentre os 96 pacientes incluídos, 25 (26%) foram diagnosticados como portadores rinossinusite crônica<br />

tendo como principais sintomas a obstrução nasal em 21 (84%), espirros em 21 (80%), anosmia em 19 (76%),<br />

cefaleia em 19 (76%) e dor facial em 6 (24%). Os 25 pacientes com LES e diagnóstico de rinossinusite faziam uso de<br />

prednisona. Conclusão: A prevalência de rinossinusite crônica foi de 26%, todos esses pacientes faziam uso de<br />

prednisona no período da consulta otorrinolaringológica.<br />

Palavras-chave: Rinossinusite, lúpus eritematoso sistêmico, prevalência.<br />

Abstract: Introduction: Systemic lupus erythematosus (SLE) clinical management throughout corticosteroid<br />

therapy may lead patients to various levels of immunesupression. Rhinosinusitis has been described frequently<br />

in immunesupressed patients. Objective: To study rhinosinusistis prevalency in SLE patients and describing<br />

otorhinolaryngological signs/symptons of these patients. Patients and Method: A transversal study, including<br />

96 SLE patients [American College of Rheumatology (ACR) classification. Results: Between 96 patients included,<br />

25 (26%) were diagnosed with chronic rhinosinusistis criteria and your most important symtoms were nasal<br />

obstrucction in 21 (41%), sneezing in 21 (80%), anosmia in 19 (76%), headache in 19 (76%) and facial pain in 6<br />

(24%). The 25 SLE patients diagnosed with chronic rhinosinusitis were using prednisone. Conclusion: The<br />

prevalency of chronic rhinosinusitis was 26%, and all patients were using prednisone at the time of<br />

otorhinolaryngological exam.<br />

Keywords: Rhisosinusitis, Systemic lupus erythematosus, Prevalency.<br />

INTRODUÇÃO<br />

O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma<br />

doença inflamatória crônica, multissistêmica, de<br />

causa desconhecida e natureza autoimune, caracterizada<br />

pela presença de diversos autoanticorpos.<br />

Evolui com as mais variadas manifestações clínicas<br />

e com períodos de exacerbação e remissão. 1,17<br />

A prevalência no sexo feminino é nove vezes maior<br />

que no sexo masculino, principalmente durante<br />

a idade fértil. 1<br />

A fisiopatologia do LES caracteriza-se por<br />

formação de imunocomplexos constituídos por<br />

autoanticorpos e auto ou heteroantígenos que se<br />

depositam na parede de vasos de pequenos e médios<br />

calibres, em território e microcirculação, pro-<br />

*<br />

Mestre em otorrinolaringologia. Professor assistente da <strong>Ufam</strong>.<br />

**<br />

Médico reumatologista e doutor em medicina.<br />

***<br />

Médico reumatologista e doutor em biotecnologia.<br />

****<br />

Residente (R2) de Clínica Médica do <strong>HUGV</strong>.<br />

*****<br />

Acadêmico do 6º ano de medicina da <strong>Ufam</strong>.<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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RINOSSINUSITE CRÔNICA EM PACIENTES COM LÚPUS - ERITEMATOSO SISTÊMICO<br />

duzindo ao final um processo de vasculite leucocitoclástica,<br />

com necrose da parede vascular e dos<br />

tecidos, gerando alterações estruturais e funcionais<br />

em vários órgãos ou sistemas, como o ósteo-articular<br />

e o renal. 1,3<br />

Em 1959, Scarpelli et al 18 publicaram o primeiro<br />

caso de envolvimento das vias aéreas relacionada<br />

ao LES. 14 Em 1976, Smith et al 19 mostraram<br />

ulcerações, estenoses e edema da articulação<br />

cricoaritenoidea em dois pacientes com LES. 15<br />

A rinossinusite é uma afecção comum entre<br />

pacientes imunossuprimidos, particularmente naqueles<br />

com imunossupressão avançada (geralmente<br />

infectados pelo HIV), 12 e temos nos pacientes portadores<br />

de LES uma população imunossuprimida,<br />

em função da corticoterapia a qual eles são submetidos<br />

para obtenção do controle da doença. 3,9,10 Pode<br />

clinicamente ser definida como uma resposta inflamatória<br />

da membrana mucosa que reveste a cavidade<br />

nasal e os seios paranasais, podendo em ocasiões<br />

entender-se para o neuroepitélio e osso<br />

subjacente. Trata-se de uma afecção relativamente<br />

comum, afetando até 20% da população, Pode ser<br />

classificada em aguda, subaguda e crônica, referindo<br />

a duração dos sintomas. 8,16<br />

O termo rinossinusite é mais utilizado atualmente<br />

já que a rinite e a sinusite são, frequentemente,<br />

doenças em continuidade. A rinite existe<br />

isoladamente, mas a sinusite sem a rinite é de ocorrência<br />

rara.<br />

A prevalência da rinossinusite crônica nos<br />

Estados Unidos é estimada em 14% da população<br />

geral. 22,23 Não existe um levantamento epidemiológico<br />

brasileiro, mas provavelmente deve ser semelhante<br />

ao americano. 5,23<br />

Uma anamnese bem detalhada, complementada<br />

com achados radiológicos e endoscópicos<br />

permite uma excelente avaliação dos pacientes com<br />

suspeita de rinossinusite. 8,16,21<br />

A alta morbidade e eventual mortalidade<br />

associadas às complicações das rinossinusites justificam<br />

a avaliação cuidadosa dos casos de<br />

sinusopatias agudas ou crônicas, assim como a<br />

pronta investigação quando a evolução clínica não<br />

é satisfatória. Tais complicações podem ser orbitárias,<br />

intracranianas ou ósseas.<br />

O manejo clínico das rinossinusites é frequentemente<br />

satisfatório. Os agentes terapêuticos<br />

incluem antibióticos, descongestionantes,<br />

mucolíticos, sprays ou irrigação nasal e corticoesteroides.<br />

O tratamento cirúrgico é indicado em casos<br />

de obstrução mecânica comprovada ou em casos<br />

onde há frequente infecção residual após um<br />

manejo clínico adequado. 8,12,20<br />

OBJETIVOS<br />

Estudar a prevalência de rinossinusite nos<br />

pacientes portadores de LES, atendidos no Ambulatório<br />

Araújo Lima da Universidade Federal do<br />

Amazonas, bem como citar os principais sinais/<br />

sintomas otorrinolaringológicos e comorbidades<br />

apresentadas por esse grupo de indivíduos.<br />

PACIENTES E MÉTODOS<br />

Estudo transversal desenvolvido no Ambulatório<br />

Araújo Lima da Universidade Federal do<br />

Amazonas, no período de agosto de 2006 a dezembro<br />

de 2007.<br />

Foram incluídos 96 pacientes com idade variando<br />

entre 18 e 61 anos, com média de 38,25 anos,<br />

sendo 90 (93,75%) mulheres e 6 (6,25%) homens.<br />

Todos os pacientes tinham no mínimo quatro critérios<br />

para a classificação de LES de acordo com o<br />

ACR.<br />

Os pacientes foram escolhidos de forma aleatória,<br />

independente de apresentarem queixas<br />

otorrinolaringológicas. A escolha dos pacientes era<br />

feita enquanto eles aguardavam atendimento no<br />

ambulatório de LES.<br />

Foram incluídos os pacientes maiores de 18<br />

anos, com no mínimo um ano de diagnóstico de<br />

LES, tendo ao final obtido pacientes com tempo<br />

de diagnóstico variando de 1 a 18 anos, com média<br />

de 6,62 anos. Foram excluídos os pacientes com<br />

menos de um ano de diagnóstico de LES e os pacientes<br />

com sintomas compatíveis com rinossinusite<br />

crônica que não realizaram a tomografia computadorizada<br />

(TC).<br />

A avaliação seguiu um protocolo preestabelecido<br />

que consistia de anamnese, exame físico<br />

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revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

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EDUARDO KAUFFMAN, DOMINGOS LIMA, LUIZ PASSOS, ALETÉIA ANUNCIAÇÃO, CLAUDIA OLIVEIRA, JÚLIO RIBEIRO<br />

otorrinolaringológico (otoscopia, rinoscopia,<br />

oroscopia e palpação facial) e, em casos compatíveis<br />

com rinossinusite, tomografia computadorizada<br />

(TC).<br />

O diagnóstico de rinossinusite baseou-se<br />

nos parâmetros descritos nos Consensos Americano<br />

e Latino-americano de Rinossinusites, 19,21 ou<br />

seja, valorizados tempo de evolução, sintomas (febre,<br />

dor facial, tosse, congestão nasal e rinorreia<br />

purulenta) e tomografia computadorizada (TC).<br />

Todos os pacientes tinham dois fatores maiores<br />

(obstrução nasal, secreção nasal, cefaleia, dor ou<br />

pressão facial e distúrbio olfatório) ou um fator<br />

maior e dois menores (febre, halitose, tosse e<br />

irritabilidade) por mais de três meses e tomografia<br />

computadorizada evidenciando opacificação de<br />

um ou mais seios paranasais e do complexo óstiomeatal.<br />

Todos os pacientes assinaram termo de consentimento<br />

livre e esclarecido, aprovado pelo Comitê<br />

de Ética da Universidade Federal do Amazonas.<br />

RESULTADOS<br />

Durante o período de agosto de 2006 a novembro<br />

de 2007, foram estudados 104 pacientes,<br />

sendo incluídos na amostra 96 pacientes. Os 96<br />

pacientes incluídos tinham a idade variando entre<br />

18 e 58 anos, com média de 38,25 anos, sendo 90<br />

(93,7%) mulheres e 6 (6,3%) homens. Os indivíduos<br />

excluídos não realizaram a tomografia<br />

computadorizada ou tinham menos de um ano de<br />

diagnóstico de LES.<br />

Dentre os 96 pacientes incluídos, 25 (26%)<br />

foram diagnosticados como portadores de<br />

rinossinusite crônica. A tomografia computadorizada<br />

evidenciava, em todos os pacientes,<br />

opacificação de um ou mais seios paranasais e do<br />

complexo óstio-meatal.<br />

Os sinais/sintomas encontrados nos 96 pacientes<br />

com LES, em avaliação clínica direcionada<br />

a queixas otorrinolaringológicas, foram: cefaleia<br />

em 68 (70,8%), obstrução nasal em 36 (37,5%), espirros<br />

em 33 (34,4%), caseum em 30 (31,2%), pigarro<br />

em 26 (27%), náuseas em 24 (25%), dor facial<br />

em 21 (21,9%), anosmia em 18 (18,7%), tosse em 18<br />

(18,7%), halitose em 15 (15,6%), otalgia em 13<br />

(13,5%), disfagia em 12 (12,5%), pressão nos ouvidos<br />

em 10 (10,4%), globus faríngeo em 10 (10,4%),<br />

sangramento nasal em 8 (8,3%), odinofagia em 6<br />

(6,2%), febre em 4 (6,2%) e dor dentária em 3 (6,2%).<br />

As principais comorbidades apresentadas<br />

pelos 96 pacientes foram: hipertensão arterial<br />

sistêmica (HAS) em 29 (30,2%), insuficiência renal<br />

crônica (IRC) em 12 (12,5%), dislipidemia em 9<br />

(9,3%), cardiopatia em 9 (9,3%), diabetes mellitus<br />

(DM) em 8 (8,3%), asma em 7 (7,3%), glaucoma em<br />

5 (5,2%), fibromialgia em 5 (5,2%) e acidente<br />

vascular cerebral (AVC) em 4 (4,2%).<br />

Dos 96 pacientes com LES, 66 (68,75%) estavam<br />

fazendo uso de prednisona, 24 (25%) estavam<br />

fazendo uso de cloroquina, 18 (18,75%) estavam<br />

fazendo uso de azatioprina e 15 (15,6%) faziam<br />

uso de metotrexate.<br />

Dos 25 pacientes com diagnóstico de<br />

rinossinusite crônica, 25 (100%) faziam uso de<br />

prednisona, 14 (56%) faziam uso de cloroquina, 12<br />

(48%) faziam uso de azatioprina e 2 (8%) faziam<br />

uso de metotrexate. Durante a avaliação clínica, os<br />

pacientes relatavam apenas a medicação que estavam<br />

fazendo uso no momento.<br />

DISCUSSÃO<br />

Como as prevalências de rinossinusite crônica<br />

variam conforme o estágio de imunossupressão<br />

do paciente, o grupo de pacientes com LES acaba<br />

tornando-se um grupo heterogêneo, pois as<br />

doses das drogas imunossupressoras variam conforme<br />

o estágio de exacerbação e/ou remissão da<br />

doença, lembrando que o LES apresenta períodos<br />

de atividade e inatividade. 15 A relação rinossinusite/imunossupressão<br />

pode ser melhor estabelecida<br />

em grupos homogêneos, como os pacientes transplantados.<br />

O ponto-chave é reconhecer a maior<br />

prevalência de rinossinusite crônica em pacientes<br />

imunossuprimidos e ao mesmo tempo perceber<br />

que os corticoesteroides que, por vezes, são utilizados<br />

no tratamento da rinossinusite acabam se<br />

relacionando à própria etiologia da doença.<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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RINOSSINUSITE CRÔNICA EM PACIENTES COM LÚPUS - ERITEMATOSO SISTÊMICO<br />

Em nosso estudo encontramos uma<br />

prevalência de 26% de rinossinusite crônica entre<br />

os 96 pacientes com diagnóstico de LES. Estudos<br />

nacionais e internacionais evidenciam prevalências<br />

que variam de 8 a 72% em pacientes com doenças<br />

autoimunes, HIV ou imunossuprimidos por uso<br />

de corticoides e demais drogas imunossupressoras.<br />

3,5,13,14,33 A prevalência da rinossinusite crônica<br />

nos Estados Unidos é estimada em 14% da população<br />

geral. 31,33 Não existe um levantamento epidemiológico<br />

brasileiro, mas provavelmente deve<br />

ser semelhante ao americano. 6,33<br />

Em todos os pacientes diagnosticados com<br />

rinossinusite crônica os sintomas tinham mais de<br />

quatro meses de evolução. As dúvidas diagnósticas<br />

foram poucas, fazendo com que o diagnóstico fosse<br />

essencialmente clínico, sendo solicitado a<br />

tomografia computadorizada apenas para confirmação<br />

da hipótese diagnóstica. A tomografia<br />

computadorizada dos 25 pacientes demonstrou<br />

presença de sinusopatia, ou seja, aumento de espessura<br />

da mucosa ou áreas de opacificação nos<br />

seios acometidos. A tomografia computadoriza<br />

oferece uma avaliação objetiva, quantificando a<br />

extensão do processo nasossinusal, sendo um exame<br />

de grande valia em nossa pesquisa, apesar de<br />

dispensável como método diagnóstico.<br />

Dos 96 pacientes com LES, 66 (68,75%) estavam<br />

fazendo uso de prednisona, 24 (25%) estavam<br />

fazendo uso de cloroquina, 18 (18,75%) estavam<br />

fazendo uso de azatioprina e 15 (15,6%) faziam<br />

uso de metotrexate. Dos 25 pacientes com diagnóstico<br />

de rinossinusite crônica, 25 (100%) faziam<br />

uso de prednisona, 14 (56%) faziam uso de<br />

cloroquina, 12 faziam uso de azatioprina (48%) e 2<br />

(8%) faziam uso de metotrexate. Durante a avaliação<br />

clínica, os pacientes relatavam apenas a medicação<br />

que estavam fazendo uso no momento. Merece<br />

atenção o fato de todos os pacientes com diagnóstico<br />

de rinossinusite crônica estarem fazendo<br />

uso de prednisona, ao passo que ela é, por vezes,<br />

utilizada como tratamento das sinusopatias.<br />

Nosso estudo parece ser, até o momento, o<br />

único que avaliou a presença de rinossinusite em<br />

pacientes com LES. Talvez a terapia imunossupressora<br />

ou até mesmo uma manifestação do próprio<br />

LES seja responsável por essa prevalência de 26%<br />

de rinossinusite crônica. Interessante notarmos que<br />

embora esse tipo de avaliação não tenha sido feita<br />

por outros autores, a rinossinusite crônica traz<br />

grandes incômodos aos pacientes com LES. O médico<br />

otorrinolaringologista deve estar atento à alta<br />

prevalência de rinossinusite crônica nos pacientes<br />

com LES.<br />

CONCLUSÃO<br />

Pudemos observar a presença de rinossinusite<br />

crônica em 26% dos 96 pacientes com LES incluídos<br />

na pesquisa. Dos 25 pacientes com rinossinusite<br />

crônica, os 25 (100%) faziam uso de<br />

prednisona no período da consulta otorrinolaringológica.<br />

O médico otorrinolaringologista deve estar<br />

atento à alta prevalência de rinossinusite crônica<br />

nos pacientes com LES.<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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RINOSSINUSITE CRÔNICA EM PACIENTES COM LÚPUS - ERITEMATOSO SISTÊMICO<br />

Dados para correspondência:<br />

Eduardo Abram Kauffman<br />

Rua Franco de Sá, 3.º andar, salas 308/309,<br />

Edifício Amazon Trade Center, São Francisco.<br />

Manaus-AM – CEP 69079-210<br />

Agradecimento à Fapeam.<br />

90<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


ÂNGELO KEPPE, HELTON BATISTA DE OLIVEIRA, IONE RODRIGUES BRUM<br />

ÉTICA EM PESQUISA CLÍNICA COM SERES HUMANOS<br />

– ARTIGO DE REVISÃO<br />

ETHICS IN CLINICAL RESEARCH WITH HUMAN BEIGNS – REVISION ARTICLE<br />

Ângelo Keppe * , Helton Batista de Oliveira * , Ione Rodrigues Brum **<br />

RESUMO: O que nos leva a realizar uma pesquisa é a necessidade de respondermos a uma pergunta sob determinada<br />

situação a qual não temos conhecimento ou ainda temos dúvida. O pesquisador é intuído pela necessidade<br />

do novo, do saber do comprovar e, dessa forma, fornecer resultados à comunidade, que permitem contínua<br />

mudança no nosso dia-a-dia. Ao pretendermos realizar um trabalho de pesquisa devemos compor um cenário<br />

que compreende o objetivo da pesquisa, o objeto da pesquisa e o pesquisador. Esses cuidados permitem ajustarmos<br />

todos os componentes do trabalho e não termos por algum motivo que descontinuá-lo. Esta revisão de artigos<br />

atualizados pretende mostrar os princípios éticos da pesquisa clínica, esclarecendo especialmente dúvidas<br />

quanto ao objeto (sujeito) da pesquisa clínica e a autoria de um trabalho científico.<br />

Palavras-chave: Ética em pesquisa, autoria de trabalhos científicos, pesquisa clínica.<br />

ABSTRACT: The need to answer a question about a topic which we don’t have enough experience is what make<br />

us to perform a study. The researcher is inspired for the necessity of modifying the knowledge and provides<br />

results for the community to change our day by day. When we intend to perform a study we ought to compose<br />

scenery formed by the objective, the subjective of the study and the researcher. These procedures allow us to<br />

adjust all the study components to avoid the discontinuation of the study for any reason. This review aims to<br />

demonstrate the ethical principles of the clinical research, particularly doubts on the research subjective and the<br />

scientific research authors.<br />

Keywords: Ethics in clinical research, scientific papers authors, clinical research.<br />

Na prática clínica atual e na pesquisa clínica,<br />

a maioria dos procedimentos profiláticos, diagnósticos<br />

e terapêuticos envolve riscos e encargos.<br />

O objetivo principal da pesquisa clínica envolvendo<br />

seres humanos é melhorar os procedimentos<br />

profiláticos, diagnósticos e terapêuticos, e<br />

entender a etiologia e patogênese da doença. Até<br />

mesmo os melhores métodos profiláticos, diagnósticos<br />

e terapêuticos comprovados devem ter, continuamente,<br />

sua eficácia, eficiência, acessibilidade<br />

e qualidade testadas por meio de pesquisas. 1<br />

Pesquisa clínica é restrita por padrões éticos<br />

que promovem o respeito por todos os seres<br />

humanos e protegem sua saúde e direitos. 1 Pesquisa<br />

clínica envolvendo seres humanos inclui pesquisa<br />

com material humano identificável ou dados<br />

identificáveis. 2<br />

A autoria de projetos, artigos e livros são<br />

uma das questões éticas que mais tem gerado preocupações<br />

nos últimos tempos. A omissão de autores,<br />

a inclusão indevida e o uso indevido de material<br />

de pesquisa são fatos extremamente desagradáveis<br />

e preocupantes, porém presentes em todos<br />

os países do mundo que realizam pesquisas. 3<br />

O International Committee of Medical Journal<br />

Editors, criado em janeiro de 1978, em Vancouver,<br />

*<br />

Residentes de Ginecologia e Obstetrícia do HUFM/<strong>Ufam</strong>,<br />

**<br />

Chefe do Serviço de Tocoginecologia do HUFM/<strong>Ufam</strong>,<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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ÉTICA EM PESQUISA CLÍNICA COM SERES HUMANOS – ARTIGO DE REVISÃO<br />

tem por objetivo o estabelecimento de critérios comuns<br />

para a publicação de artigos científicos na<br />

área da saúde. 3<br />

No Brasil, os aspectos éticos envolvidos em<br />

atividades de pesquisa que envolva seres humanos<br />

estão regulados pelas diretrizes e normas de<br />

pesquisa em seres humanos, pela Resolução n.º<br />

196/96, do Conselho Nacional de Saúde,<br />

estabelecida em outubro de 1996. Essas diretrizes<br />

foram detalhadas para pesquisas envolvendo novos<br />

fármacos, medicamentos, vacinas e testes diagnósticos<br />

por outra Resolução (n.º 251/97), de<br />

agosto de 1997. Novas resoluções estão sendo elaboradas<br />

para tratar de outras áreas temáticas especiais.<br />

4 Esta revisão de artigos atualizados pretende<br />

mostrar os princípios éticos da pesquisa clínica,<br />

esclarecendo especialmente dúvidas quanto ao<br />

objeto (sujeito) da pesquisa clínica e a autoria de<br />

um trabalho científico.<br />

AUTORIA DA PESQUISA<br />

A Lei do Direito Autoral estabelece, em seu<br />

artigo 6, que “São obras intelectuais as criações do<br />

espírito, de qualquer modo exteriorizadas, tais<br />

como: I – os livros, brochuras, folhetos, cartasmissivas<br />

e outros escritos; II – as conferências,<br />

alocuções, sermões e outras obras da mesma natureza<br />

(...)”. Dessa forma, a atribuição de crédito à<br />

autoria de um trabalho independe do modo de apresentação,<br />

seja ela um artigo, livro, tema livre com<br />

apresentação oral ou em mural, ou até mesmo nas<br />

suas formas mais iniciais, como projeto de pesquisa<br />

ou carta indicando achados iniciais. O que importa<br />

é que cada um dos autores assuma a responsabilidade<br />

profissional, pública e social pela sua obra. 3<br />

Todas as pessoas designadas como autores<br />

devem estar qualificadas para tal. Cada autor, em<br />

particular, deve ter participação suficiente no trabalho<br />

para tomar a responsabilidade pública pelo<br />

seu conteúdo. Os créditos de autoria devem estar<br />

baseados somente em contribuições substanciais<br />

para (a) concepção, planejamento, análise ou interpretação<br />

dos dados; (b) redação do artigo ou sua<br />

revisão intelectual crítica; (c) responsabilidade pela<br />

aprovação final para publicação. Todas as condições<br />

(a, b e c) devem ser cumpridas. A participação<br />

apenas na obtenção de fundos ou na coleta de dados<br />

não justificam autoria. 3<br />

A não inclusão de autores é um fato corriqueiro,<br />

porém grave. Todos os autores devem sempre<br />

ser incluídos, não deve haver omissão de nenhum<br />

participante que preencha os critérios de autoria.<br />

Este é um dever moral, baseado na fidelidade<br />

que deve existir entre os membros do grupo que<br />

efetivamente realizaram o projeto de pesquisa. 3<br />

Os critérios de autoria são também abordados<br />

em vários outros Códigos de Ética de diferentes<br />

profissões de saúde. O Código de Ética Médica,<br />

5 em seu artigo 137, propõe que é vedado ao médico<br />

“publicar em seu nome trabalho científico do<br />

qual não tenha participado; atribuir-se autoria exclusiva<br />

de trabalho realizado por seus subordinados<br />

ou outros profissionais, mesmo quando executados<br />

sob sua orientação”.<br />

Segundo a Lei n.º 9.610/98, no artigo 102, o<br />

titular cuja obra seja fraudulentamente<br />

reproduzida, divulgada ou de qualquer forma utilizada,<br />

poderá requerer a apreensão dos exemplares<br />

reproduzidos ou a suspensão da divulgação,<br />

sem prejuízo da indenização cabível. 6<br />

Na área da orientação de trabalhos de pósgraduação,<br />

existem grandes controvérsias sobre a<br />

obrigatoriedade da citação do professor orientador<br />

como autor. Alguns alunos, especialmente em nível<br />

de doutorado, necessitam de tão pouco auxílio,<br />

que podem ser considerados autores únicos de<br />

seus trabalhos. Essa situação ocorre mais frequentemente<br />

na área de ciências humanas, onde a produção<br />

é mais pessoal e depende menos do trabalho<br />

realizado por uma equipe de pesquisa. Na área<br />

da pesquisa em ciências biológicas e da saúde, por<br />

exemplo, esta situação é mais difícil de ocorrer. A<br />

pesquisa nesta área é um trabalho colaborativo e<br />

cooperativo entre membros de uma equipe de pesquisa<br />

e até mesmo entre equipes de pesquisa. O<br />

importante é sempre verificar, basicamente, a adequação<br />

dos três critérios de autoria, já descritos<br />

anteriormente, ao trabalho produzido. 3<br />

92<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


ÂNGELO KEPPE, HELTON BATISTA DE OLIVEIRA, IONE RODRIGUES BRUM<br />

Vale ressaltar que não cabe mais a caracterização<br />

indiscriminada de que o primeiro nome<br />

citado é o do autor e, que os demais citados, a partir<br />

deste, sejam denominados de coautores, como<br />

se tivessem tido uma participação secundária. Com<br />

o objetivo de preservar a justiça, o critério utilizado<br />

para estabelecer a sequência deve ser discutido<br />

pela equipe de pesquisadores e citado, no próprio<br />

trabalho, como nota de rodapé, indicando as atribuições<br />

de cada um dos autores na realização do<br />

projeto. 3 Observando-se os artigos científicos publicados<br />

em periódicos, tanto nacionais quanto estrangeiros,<br />

nota-se um número grande de autores<br />

(autor e coautores). O número de colaboradores,<br />

por artigo, vem crescendo nos últimos anos.<br />

“É mais prudente acreditar que a inflação da<br />

coautoria seja explicada pelo fortalecimento do<br />

trabalho de equipe, do que por outros motivos<br />

como, por exemplo, para hipervalorização dos<br />

serviços... ou mesmo para citação contínua do<br />

chefe de um serviço”. 7<br />

“É necessário entender que a inclusão como<br />

coautor de um artigo pressupõe envolvimento importante<br />

na sua realização, conhecimento de seu<br />

conteúdo e participação na sua redação. Por outras<br />

palavras, o coautor é corresponsável pelo trabalho<br />

e responde por ele”. 7<br />

Não existe nenhuma indicação universalmente<br />

aceita e utilizada sobre a ordem de citação<br />

dos autores. A maneira mais tradicional propõe<br />

que o primeiro autor citado é o responsável pela<br />

obra, enquanto que o último seria o orientador do<br />

trabalho como um todo. Essas regras, contudo, têm<br />

sido alteradas. Muitos autores, com tradição em<br />

pesquisa, cedem o seu lugar para assistentes e bolsistas,<br />

com o objetivo de que estes possam tornarse<br />

mais conhecidos e sentirem-se mais comprometidos<br />

com o projeto. 3<br />

A coautoria deve ser dada apenas àqueles<br />

que contribuíram intelectual e cientificamente, de<br />

maneira significativa, na execução do trabalho.<br />

Todos os autores devem participar na redação e<br />

editoração do manuscrito, receber cópia do manuscrito<br />

e concordar em compartilhar a responsabilidade<br />

pelos resultados. 7<br />

A inclusão indevida de autores é outra grave<br />

questão. Como já foi dito anteriormente, os autores<br />

planejam, executam e escrevem. Amigos, colegas,<br />

chefes, bolsistas e estagiários não se tornam<br />

autores apenas em função dessas relações. Essa tradição<br />

inadequada pode e deve ser evitada utilizando-se<br />

regras claras para o estabelecimento do critério<br />

de autoria desde o início do planejamento do<br />

projeto. 3 A autoria indevida é uma forma de fraude<br />

muito difundida. Muitas vezes pessoas são incluídas<br />

como autores sem que tenham tido nenhuma<br />

participação na pesquisa. A autoria pressupõe responsabilidade<br />

intelectual pela pesquisa. Os autores<br />

são solidariamente responsáveis pela sua produção<br />

científica assumida publicamente por intermédio<br />

da divulgação de resultados. A autoria<br />

indevida ou fraudulenta pode levar a situações extremamente<br />

desagradáveis como a de ter que retratar<br />

publicações. 7<br />

As atividades científicas, assim como todas<br />

as demais, não estão imunes a situações desonestas.<br />

A fraude pode ocorrer em várias etapas da pesquisa,<br />

desde o planejamento, execução até, principalmente,<br />

na sua divulgação. As diferentes formas<br />

de fraude em pesquisa envolvem a autoria<br />

indevida, a não citação de fontes, a coleta inadequada,<br />

o tratamento de dados feito de forma incorreta.<br />

8 Outra forma de fraude em ciência é o plágio<br />

de dados ou informações. Considera-se plágio<br />

quando uma pessoa se apropria e utiliza-se de dados<br />

ou informações de outro pesquisador, sem atribuir-lhe<br />

a autoria. O plágio pode ser sutil ou grosseiro.<br />

O mais comum é a utilização de materiais já<br />

publicados por outros autores, sem citar a fonte.<br />

Um dos plágios mais condenáveis é o realizado por<br />

uma pessoa ao ser revisor de artigos para periódicos<br />

científicos. O revisor tem acesso privilegiado<br />

aos dados e informações, antes de sua publicação<br />

e divulgação para a comunidade científica. Esse<br />

tipo de acesso já possibilitou inúmeras situações<br />

condenáveis de apropriação indevida. 8<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

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ÉTICA EM PESQUISA CLÍNICA COM SERES HUMANOS – ARTIGO DE REVISÃO<br />

OBJETO DA PESQUISA (SUJEITO)<br />

Os princípios básicos da bioética são: a<br />

não-maleficência, a beneficência (riscos e benefícios),<br />

a justiça e, sobretudo, a autonomia (autodeterminação),<br />

respeitando-se o sigilo, a privacidade,<br />

a autoestima. 10<br />

Segundo a Resolução n.º 196/96, merecem<br />

destaque os seguintes pontos: o respeito devido à<br />

dignidade humana exige que toda pesquisa se processe<br />

após consentimento livre e esclarecido dos sujeitos,<br />

indivíduos ou grupos que por si e/ou por<br />

seus representantes legais manifestem a sua<br />

anuência à participação na pesquisa; o sujeito da<br />

pesquisa tem de ser esclarecido da liberdade de se<br />

recusar a participar ou retirar seu consentimento,<br />

em qualquer fase da pesquisa, sem penalização<br />

alguma e sem prejuízo ao seu cuidado e toda pesquisa<br />

envolvendo seres humanos deverá ser submetida<br />

à apreciação de um comitê de ética em pesquisa<br />

(CEP). 10<br />

Cabe ao pesquisador apresentar o protocolo,<br />

devidamente instruído ao CEP, aguardando o<br />

pronunciamento deste, antes de se iniciar uma<br />

pesquisa. 10<br />

O consentimento informado obtido de forma<br />

correta e legítima fundamenta o ato médico ou<br />

de pesquisa como justo e unicamente correto. 11 A<br />

liberdade do sujeito se recusar a participar ou retirar<br />

seu consentimento, em qualquer fase da pesquisa,<br />

sem penalização alguma e sem prejuízo ao<br />

seu cuidado, 10 é um fato que deve ser claramente<br />

exposto e pontuado no consentimento informado.<br />

No interesse de consolidar o uso e a prática<br />

do consentimento informado no Brasil, seria conveniente<br />

uma revitalização da classe médica nas<br />

novas dimensões éticas da profissão levantadas nas<br />

últimas décadas. Do mesmo modo, a adequada<br />

preparação e funcionamento das comissões de ética,<br />

comitês de ética hospitalar ou comitês de<br />

bioética e comitês de ética na pesquisa com seres<br />

humanos – a denominação desses organismos não<br />

é o mais importante – contribuiria eficazmente no<br />

aprimoramento dessa e de outras práticas e atitudes<br />

que enobrecem o exercício da Medicina e<br />

prestigiam a saúde de uma nação. 11 O fundamental<br />

é reconhecer que as pessoas sempre possuem<br />

dignidade, independentemente de sua idade ou capacidade,<br />

merecendo, dessa forma, todo o nosso<br />

respeito e cuidado para com as informações a elas<br />

pertinentes. 9<br />

É comum obtermos do prontuário os elementos<br />

necessários à pesquisa, nesses casos vale<br />

ressaltar que: os documentos com as informações<br />

obtidas com ou sobre o paciente são armazenados<br />

no prontuário; o prontuário é um arquivo, em papel<br />

ou informatizado, cuja finalidade é facilitar a<br />

manutenção e o acesso às informações que os pacientes<br />

fornecem, durante o atendimento, seja em<br />

uma área de internação ou ambulatorial, bem como<br />

os resultados de exames e procedimentos realizados<br />

com finalidade diagnóstica ou de tratamento;<br />

o prontuário é de propriedade do paciente. O hospital<br />

ou outra instituição de saúde detém a guarda<br />

destes documentos visando preservar o histórico<br />

de atendimento de cada paciente. 9<br />

Para as atividades de pesquisa, como já dito,<br />

o pesquisador somente pode acessar o prontuário<br />

após ter elaborado um projeto e ele ter sido aprovado<br />

pelo comitê de ética em pesquisa.<br />

No <strong>Hospital</strong> de Clínicas de Porto Alegre<br />

(RS) foi baixada uma norma específica sobre este<br />

tema, que obriga os pesquisadores a assinarem um<br />

termo de compromisso para uso de dados. Este documento<br />

formaliza o dever de preservar os dados<br />

e o anonimato dos pacientes estudados – este procedimento<br />

foi adotado, posteriormente, em outras<br />

instituições. 9<br />

CONCLUSÃO<br />

Atualmente a deontologia médica não é<br />

mais um assunto que diz respeito somente à profissão<br />

médica e sim um interesse da sociedade, já<br />

que a saúde das pessoas tem se tornado uma preocupação<br />

de cunho social. Parafraseando França:<br />

“além da questão técnica do que se pode fazer,<br />

surge a questão ética do que se deve fazer”. 12 A<br />

antiga concepção de que o médico sabe o que é<br />

melhor para o paciente vem sendo posta à prova e<br />

94<br />

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ÂNGELO KEPPE, HELTON BATISTA DE OLIVEIRA, IONE RODRIGUES BRUM<br />

o paciente deseja saber o que e o porquê de tudo<br />

que nele é feito. Nesse contexto, é importante que<br />

saibamos agir sempre de acordo com os preceitos<br />

éticos vigentes e estarmos atentos às constantes<br />

transformações na sociedade que também imprimem<br />

mudanças, ao longo dos anos, na conduta<br />

ética dos profissionais médicos, principalmente no<br />

que diz respeito aos sujeitos de uma pesquisa.<br />

REFERÊNCIAS<br />

1. Bioética e Ética na Ciência [página na Internet].<br />

Porto Alegre: © Goldim 1997-<strong>2008</strong>. [atualizado em<br />

28/10/<strong>2008</strong>; citado em 20/8/2007] Declaração de<br />

Helsinque. Disponível em: http://<br />

www.bioetica.org.br/legislacao/<br />

outras_diretrizes/integra. html<br />

2. Universidade Federal de São Paulo [página na<br />

Internet]. São Paulo: Unifesp © 2006-<strong>2008</strong>. [atualizado<br />

em 6/11/<strong>2008</strong>; citado em 20/8/2007] Declaração<br />

de Helsinque. Disponível em: http://<br />

www.unifesp.br/reitoria/orgaos/comites/etica/<br />

helsinque.doc<br />

3. Bioética e Ética na Ciência [página na Internet].<br />

Porto Alegre: © Goldim, 1997-<strong>2008</strong>. [atualizado<br />

em 1.º/4/2007; citado em 20/8/2007] Aspectos<br />

Éticos, Legais e Morais relacionados à Autoria na<br />

Produção Cientifica. Disponível em: http://<br />

www.ufrgs.br/bioetica/autor.htm<br />

4. Bioética e Ética na Ciência [página na Internet].<br />

Porto Alegre: © Goldim, 1997-<strong>2008</strong>. [atualizado<br />

em 21/8/2005; citado em 20/8/2007] Ética Aplicada<br />

à Pesquisa em Saúde. Disponível em: http:/<br />

/www.ufrgs.br/bioetica/biopesrt.htm<br />

5. Conselho Federal de Medicina – Código de Ética<br />

Médica – Resolução CFM n.º 1.246/88, 5.ª edição.<br />

Brasília, 2003.<br />

6. Brasil. Lei n.º 9.610/98, de 19/2/1998 – Regula<br />

os Direitos Autorais, e dá outras providências.<br />

7. GOLDENBERG, S. Publicação do Trabalho Científico:<br />

Compromisso Ético. São Paulo, 2001. Disponível<br />

em: http://www.metodologia.org/<br />

saul_etica.pdf<br />

8. Bioética e Ética na Ciência [página na Internet].<br />

Porto Alegre: © Goldim, 1997-<strong>2008</strong>. [atualizado<br />

em 17/1/2002; citado em 20/8/2007] Fraude em<br />

Pesquisa Científica. Disponível em: http://<br />

www.ufrgs.br/bioetica/fraude.htm<br />

9. COSTA, S. I. F.; OSELKA, G.; GARRAFA, V.<br />

Conselho Federal de Medicina. Iniciação à<br />

Bioética. Brasília, 1998, p. 302.<br />

10. Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Resolução<br />

n.º 196, de 10 de outubro de 1996. Aprova as<br />

Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisas<br />

envolvendo Seres Humanos. Brasília: Diário<br />

Oficial da União, n.º 201, p. 21.082, 16 out.<br />

1996, seção 1.<br />

11. CLOTET, J. O consentimento informado nos<br />

comitês de ética em pesquisa e na prática médica:<br />

conceituação, origens e atualidade. <strong>Revista</strong><br />

Bioética [serial on Internet], 1995, v. 3 [citado<br />

em 17/2/<strong>2008</strong>]. Disponível em: http://<br />

www.portalmedico.org.br/revista/bio1v3/<br />

consentimento.html<br />

12. Medicina Legal [página na Internet] © França,<br />

2003-2006. [citado em 25/4/<strong>2008</strong>]<br />

Deontologia Médica e Bioética (2000). Disponível<br />

em: http://www.medicinalegal.com.br/a50.htm<br />

revistahugv<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

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CRISTIANO PAIVA, LUÍS SABINO, RODRIGO KREBS, RENATO ALBUQUERQUE, MARILISE KATSURAYAMA, CASSIO ANDREONI, VALDEMAR ORTIZ<br />

ANGIOMIOLIPOMA RENAL COM TROMB<br />

OMBO O TUMORAL<br />

EM VEIA CAVA A INFERIOR: RELATO DE CASO<br />

RENAL ANGIOMYOLIPOMA WITH INFERIOR VENA CAVA TUMOUR THROMBUS: CASE REPORT<br />

Cristiano Silveira Paiva * , Luís Alexandre Sabino ** , Rodrigo Krebs *** , Renato Sant’Ana de Albuquerque **** ,<br />

Marilise Katsurayama ***** , Cassio Andreoni ****** , Valdemar Ortiz *******<br />

RESUMO: O angiomiolipoma renal é um tumor mesenquimal benigno raro, constituído por tecido adiposo,<br />

vasos sanguíneos e células musculares que ocorre em apenas 0,3% da população geral e 40-80% dos pacientes<br />

com síndrome de esclerose tuberosa. Representa somente 2 a 6,4% de todos os tumores de rim, com nítida predominância<br />

no sexo feminino. Raros casos de angiomiolipoma envolvendo a veia renal ou veia cava inferior foram<br />

descritos. Relatamos um caso de angiomiolipoma com extensão para veia cava inferior, comportamento característico<br />

do carcinoma de células renais.<br />

Palavras-chave: Rim, angiomiolipoma, veia cava inferior, trombo.<br />

ABSTRACT: The renal angiomyolipoma is an uncommum benign mesenchymal tumor containing fatty tissue,<br />

blood vessels and muscular cells, that occurs in up 0,3% of the general population and in 40-80% patients with the<br />

tuberous sclerosis syndrome. It represents only 2 to 6,4 % of all kidney tumors, with a typical female predominance.<br />

Rare cases of angiomyolipoma involving the renal vein or inferior vena cava have been found. We report a case of<br />

angiomyolipoma extending into the inferior vena cava, a characteristic behavior of renal cell carcinoma.<br />

Keywords: Kidney, angiomyolipoma, inferior vena cava, thrombus.<br />

INTRODUÇÃO<br />

Usualmente o angiomiolipoma (AML) é um<br />

tumor renal de evolução benigna e lenta taxa de<br />

crescimento, composto por diferentes proporções<br />

de tecido muscular, adiposo e vasos sanguíneos. 1-<br />

3<br />

Representa apenas 2 a 6,4% de todos os tumores<br />

renais, sua incidência variada de aproximadamente<br />

0,3% na população geral e de 40-80% nos portadores<br />

de Síndrome da Esclerose Tuberosa (SET), com<br />

nítida predominância no sexo feminino (relação<br />

4:1) e ocorre geralmente entre a 5.ª e 6.ª décadas da<br />

vida. 1,4<br />

Casos com envolvimento de veia cava inferior<br />

(VCI) por trombo são raramente descritos. 1,3<br />

Relatamos um caso de AML no rim direito com<br />

trombo tumoral invadindo a veia cava inferior que<br />

foi removido cirurgicamente com sucesso.<br />

RELATO DE CASO<br />

Paciente do sexo feminino, 43 anos, encaminhada<br />

à nossa instituição após diagnóstico de<br />

massa renal à direita compatível com AML; queixando-se<br />

de dor em flanco direito havia dois anos<br />

com piora do quadro fazia duas semanas. A paci-<br />

*<br />

Doutor em Urologia pela Escola Paulista de Medicina – EPM Universidade Federal de São Paulo – Unifesp.<br />

**<br />

Ex-fellowship em Laparoscopia e Endourologia da Universidade Federal de São Paulo – Unifesp.<br />

***<br />

Fellowship em Laparoscopia e Endourologia da Universidade Federal de São Paulo – Unifesp.<br />

****<br />

Acadêmico do curso de Medicina da Universidade Federal do Amazonas – <strong>Ufam</strong>.<br />

*****<br />

Acadêmica do curso de Medicina da Universidade Federal do Amazonas – <strong>Ufam</strong>.<br />

******<br />

Professor doutor e chefe do Serviço de Laparoscopia e Cirurgia Minimamente Invasiva da Universidade Federal de São Paulo – Unifesp.<br />

*******<br />

Professor titular da disciplina de Urologia da Universidade Federal de São Paulo – Unifesp.<br />

revistahugv<br />

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v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

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ANGIOMIOLIPOMA RENAL COM TROMBO TUMORAL EM VEIA CAVA INFERIOR: RELATO DE CASO<br />

ente não possuía antecedentes de doenças neurológicas,<br />

nem história pregressa ou familiar de SET.<br />

Os exames físicos e laboratoriais eram normais. A<br />

ultrassonografia (US) de abdome revelou massa<br />

sólida, volumosa e hiperecogênica em rim direito,<br />

sugestiva de AML. A tomografia computadorizada<br />

(TC) de abdome confirmou a hipótese de AML,<br />

em função da presença de uma massa (5 x 6 x 4,5<br />

cm) na porção central do rim direito com grande<br />

quantidade de tecido gorduroso (- 65 HU), além<br />

de um de trombo com as mesmas características<br />

na VCI (Figura 1), não aderido à parede vascular<br />

conforme evidenciou o color duplex.<br />

A paciente foi submetida à nefrectomia radical<br />

direita e cavotomia com remoção completa<br />

do trombo tumoral por acesso transperitoneal, a<br />

qual ocorreu sem complicações. A paciente evoluiu<br />

sem intercorrências, recebendo alta hospitalar<br />

no 4.º dia pós-operatório.<br />

No exame macroscópico do rim direito, foram<br />

confirmados os achados tomográficos (Figura<br />

2). A análise histopatológica confirmou o diagnóstico<br />

de AML com ausência de atipias, componente<br />

epitelióde perivascular ou comprometimento dos<br />

linfonodos hilares (Figura 3). Após 24 meses da cirurgia,<br />

a paciente encontrava-se assintomática e<br />

sem evidências de recorrência da lesão.<br />

DISCUSSÃO<br />

O AML é associado com carcinoma de células<br />

renais (CCR) em 2% da população em geral e<br />

em 26% de pacientes com SET. 4 Antes do<br />

surgimento do US, aproximadamente 25% apresentavam-se<br />

com surgimento de dor súbita abdominal<br />

ou em flanco em razão da ruptura espontânea<br />

do tumor e hemorragia subsequente. Sintomas<br />

foram relatados em 68 a 80% dos pacientes com<br />

tumor de até 4 cm ou maiores; destes, 20% estavam<br />

em choque hipovolêmico em sua apresentação<br />

inicial. 5 Apesar de sua natureza benigna, o<br />

AML pode invadir o tecido perirrenal, linfonodos,<br />

veia renal e veia cava por crescimento agressivo. 4<br />

Envolvimento da veia renal e VCI são raramente<br />

reportados na literatura.<br />

Se possível, a nefrectomia parcial com a máxima<br />

preservação do tecido renal é recomendada<br />

em tumores sintomáticos menores que 4 cm. 3,4<br />

Além do mais, este procedimento é realizado em<br />

tumores medindo mais que 4 cm e possuindo um<br />

risco de ruptura espontânea com possível hemorragia<br />

fatal. 4<br />

Na revisão de literatura foram encontrados<br />

27 casos de AML com extensão para VCI, incluindo<br />

este caso. Desses, 22 (81,4%) eram mulheres, 4<br />

(14,8%) eram homens, e em um caso o sexo não foi<br />

mencionado. A idade variou de 16 a 75 anos com<br />

média de 46,03 anos e a associação com SET foi<br />

encontrada em 4 casos (14,8%). Vinte pacientes<br />

(74%) apresentaram algum sintoma, onde a dor em<br />

flanco foi a mais frequente (44,4%).<br />

Em relação às características do tumor, o diâmetro<br />

médio foi de 9,2 cm, o lado direito foi o<br />

mais acometido e a posição central da massa foi a<br />

mais comumente observada. A extensão vascular<br />

do trombo foi evidenciada na veia renal, VCI infra<br />

e supradiafragmática em 2 (7,4%), 23 (85,2%) e 2<br />

(7,4%) casos, respectivamente. 3<br />

A combinação de US e TC foi a mais usada<br />

no diagnóstico. A TC detectou o trombo tumoral<br />

comprometendo a VCI em todos os casos pelo fato<br />

de o seu coeficiente de atenuação ser semelhante<br />

ao da massa renal (- 48 HU pré-contraste e 20 HU<br />

pós-contraste), indicando a natureza da lesão. 3,6<br />

A nefrectomia por acesso transperitoneal ou<br />

lombotomia associada à cavotomia e retirada do<br />

trombo foi o tratamento escolhido em 24 pacientes<br />

(88,8%), não sendo relatadas complicações ou<br />

óbitos durante o procedimento. 3<br />

Dois pacientes que possuíam SET com lesões<br />

múltiplas e bilaterais e um paciente cujo estado<br />

clínico impossibilitava a cirurgia (11,1%) foram<br />

somente acompanhados. Controle realizado (US e/<br />

ou TC) de seis meses a dois anos, após o diagnóstico,<br />

não apresentou alterações no tamanho ou extensão<br />

do trombo tumoral indicando que essa conduta<br />

pode ser utilizada em casos selecionados. 3<br />

A escolha do procedimento cirúrgico dependeu<br />

das categorias baseadas na extensão<br />

cefálica do trombo tumoral. Tradicionalmente no<br />

98<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

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CRISTIANO PAIVA, LUÍS SABINO, RODRIGO KREBS, RENATO ALBUQUERQUE, MARILISE KATSURAYAMA, CASSIO ANDREONI, VALDEMAR ORTIZ<br />

trombo supra-hepático (nível IV) o bypass<br />

cardiopulmonar é usado, em trombos infra-hepáticos<br />

(níveis I, II e III) e a cirurgia é realizada sem<br />

bypass por acesso abdominal. Neste caso (nível II),<br />

o procedimento foi realizado por incisão de<br />

Chevron com isolamento abaixo da VCI, junção<br />

cavoatrial, VCI infrarrenal e a veia renal<br />

contralateral. O trombo tumoral foi removido completamente<br />

por meio de cavotomia longitudinal.<br />

A manobra de Pringle foi usada para reduzir o<br />

sangramento das veias hepáticas. A VCI foi fechada<br />

com sutura contínua. As complicações mais<br />

importantes deste tipo de cirurgia são sangramento<br />

maciço e tromboembolismo pulmonar, ambos evitados<br />

com as manobras mencionadas.<br />

Nenhuma alteração no tumor ou trombo foi<br />

detectada na TC ou US realizadas no controle de 6<br />

meses após 2 anos do diagnóstico, indicando que<br />

esse tipo de tratamento pode ser realizado em casos<br />

específicos. 4 A média do diâmetro dos tumores<br />

nessa revisão foi de 9,2 cm, sendo o lado direito<br />

o mais afetado. 3 Tamanhos maiores (acima de 9<br />

cm), localização central e do lado direito do tumor<br />

mostraram-se ser fatores contribuintes de AML<br />

envolvendo veia renal ou VCI. 4<br />

Concluímos que a presença de envolvimento<br />

venoso por trombo em decorrência de um AML<br />

é rara e normalmente não ultrapassa o nível do<br />

diafragma. Ocorrendo mais frequentemente em<br />

mulheres na 5. a década de vida e deve ser considerada<br />

nos tumores maiores que 9 cm. Apenas 15%<br />

dos casos estão associados à SET, sendo a<br />

nefrectomia com trombectomia o tratamento mais<br />

indicado.<br />

REFERÊNCIAS<br />

1. LUCA, S.; TERRONE, C.; ROSSETTI, S. R.<br />

Management of renal angiomyolipoma: a report<br />

pf 53 cases. Br J Urol., 83:215-218, 1999.<br />

2. HARITHARAN, T.; SRITHARAN, S.; BHIMIJI,<br />

S. Renal angiomyolipoma with inferior vena caval<br />

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3. ISLAM, A. H. M.; EHARA, T.; KATO, H.;<br />

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in a patient with tuberous sclerosis. Urol. Radiol.,<br />

9:152-154, 1987.<br />

ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA:<br />

Contato: Dr. Cristiano Silveira Paiva, Rua<br />

Paraíba, 1.501/302 – Adrianópolis, 69057-020<br />

Manaus-AM,<br />

E-mail: ctpaiva@uol.com.br,<br />

Tels.: 3642-6477/ 8114-0160<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

99


100 revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


CRISTIANO PAIVA, MARILISE KATSURAYAMA, RENATO ALBUQUERQUE, JONAS MENEZES, ANDRÉ MANCINI, WALID KHALIL,<br />

ÍTALO CORTEZ, PETRUS OLIVA, GIUSSEPE FIGLIOULO, EDSON SARKIS<br />

NÓDUL<br />

ÓDULO TESTICUL<br />

TICULAR MALIGNO SUBMETIDO À CI-<br />

RUR<br />

URGIA PRESERVADORA DE ÓRGÃO – RELATO DE<br />

CASO E REVISÃO DE LITERATURA<br />

TURA<br />

MALIGN TESTICULAR NODULE UNDERWENT TO ORGAN´S PRESERVATIVE SURGERY: CASE REPORT<br />

AND LITERATURE REVIEW<br />

Cristiano Paiva*, Marilise Katsurayama**, Renato Albuquerque**, Jonas Menezes***, André Mancini***, Walid Khalil*,<br />

Ítalo Cortez****, Petrus Oliva*****, Giussepe Figlioulo******, Edson Sarkis*******<br />

RESUMO: O câncer de testículo representa a malignidade de maior frequência em homens jovens, sendo os tumores<br />

de células germinativas os mais comuns. O tratamento padrão para o câncer testicular ainda é a orquiectomia<br />

radical, resultando em infertilidade e dependência de substituição androgência por toda a vida, além do estresse<br />

psicológico em função da castração numa idade jovem. Nesses casos, a cirurgia conservadora de órgão vem sendo<br />

descrita por vários grupos com a finalidade de evitar tais complicações, sendo realizada em diversos centros<br />

renomados. Relatamos um caso de seminoma clássico submetido à Cirurgia Preservadora de Órgão.<br />

Palavras-chave: Câncer de testículo, orquiectomia radical, seminoma, Cirurgia Preservadora de Órgão.<br />

ABSTRACT: Testis cancer represents the higher frequency of malignancy in young men, and the germ cell tumors<br />

of the most common. The standard treatment for testicular cancer is still the radical orchiectomy, resulting in<br />

infertility and dependence on androgen replacement for life, in addition to the psychological stress due to castration<br />

at a young age. In these cases, the organ’s conservative surgery has been described by several groups in order to<br />

avoid such complications, being held in various renowned centers. We report a case of classic seminoma submitted<br />

to Organ’s Preservative Surgery.<br />

Keywords: testis cancer, radical orchiectomy, seminoma, Organ’s Preservative Surgery<br />

INTRODUÇÃO<br />

Embora represente apenas 1% de todos os<br />

cânceres masculinos, o câncer de testículo (CaT)<br />

continua ser a malignidade mais comum na população<br />

masculina entre 15 a 35 anos e sua incidência<br />

aumentou de 3,7/100.000 homens em 1975 para<br />

5,4/100.000 em 2001, de acordo com a revisão recente<br />

do National Cancer Institutte Seer. 1,2 Os tumores<br />

de células germinativas são os mais comuns,<br />

representando 90 a 95% dos casos. A apresentação<br />

bilateral é encontrada em 2 a 3% dos casos<br />

diagnosticados de CaT. 3 Avanços terapêuticos<br />

têm resultado na melhora da sobrevida de 83%<br />

em 1970 para 96% no século 21. 4<br />

A maioria dos pacientes com CaT (61-78%)<br />

tem doença no estágio clínico I (neoplasia confinada<br />

ao testículo) com marcadores normais após<br />

orquiectomia, estes estarão livres de doença em<br />

100% dos casos após cinco anos de seguimento. 5,6<br />

Cerca de metade dos pacientes são diagnosticados<br />

com histologia de tumores seminomatosos e a outra<br />

metade pelos não-seminomatosos. 7<br />

O CaT frequentemente se apresenta como<br />

um aumento do volume testicular ocasionado por<br />

uma massa sólida, endurecida e indolor ou é des-<br />

* Doutor em urologia pela Escola Paulista de Medicina – EPM/Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP<br />

** Acadêmicos de Medicina da <strong>Ufam</strong><br />

***Residentes de Urologia do <strong>HUGV</strong><br />

****Mestre em Urologia – <strong>Hospital</strong> das Clínicas/FMUSP<br />

*****Pós-graduando (Doutorando) pela Escola Paulista de Medicina – EPM/Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP<br />

******Professor da Disciplina de Urologia da Universidade Estadual do Amazonas<br />

*******Professor Titular de Urologia da Universidade Federal do amazonas<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

101


NÓDULO TESTICULAR MALIGNO SUBMETIDO Ã PRESERVADORA DE ÓRGÃO – RELATO DE CASO E REVISÃO DE LITERATURA<br />

coberto de forma incidental em um exame de ultrassonografia<br />

escrotal realizada para diagnóstico<br />

de varicocele e/ou orquialgia. A ultrassonografia<br />

de alta resolução e a ressonância magnética de<br />

bolsa testicular podem detectar pequenas massas<br />

sólidas intratesticulares; no entanto, essas lesões<br />

não podem ser distinguidas de forma segura quanto<br />

à sua natureza maligna ou benigna. 8,9,10<br />

A orquiectomia radical ainda é o tratamento<br />

padrão recomendado para o tratamento do CaT.<br />

Nos casos de CaT bilateral, a orquiectomia radical<br />

leva a um impacto negativo na qualidade de vida,<br />

pois resulta em infertilidade e dependência de<br />

substituição androgênica por toda a vida, além do<br />

estresse psicológico em decorrência da castração<br />

numa idade jovem, sendo este último considerado<br />

a maior complicação a longo prazo. Nesses casos,<br />

a cirurgia conservadora de órgãos vem sendo<br />

descrita por vários grupos com a finalidade de evitar<br />

tais complicações. 3,11<br />

RELATO DO CASO<br />

Paciente E.O.F., 17 anos, com quadro de dor<br />

testicular esquerda, havia 9 meses que evoluiu com<br />

piora da dor, acompanhada por disúria e irradiação<br />

para o testículo direito, sem outros sintomas.<br />

Ao exame físico, apresentava testículos tópicos, de<br />

volume normal, fibroelásticos, de superfície lisa e<br />

indolor. Marcadores tumorias alfafeto proteína,<br />

beta-HCG e DHL normais. Realizada ultrassonografia<br />

de bolsa testicular com doppler que revelou<br />

varicocele grau I à esquerda e imagem de aspecto<br />

nodular heterogênea com pequenos focos de<br />

calcificações de permeio, medindo 0,4 x 0,4 cm,<br />

localizada em topografia do polo inferior do testículo<br />

direito. Diante da possibilidade de neoplasia<br />

testicular foi realizada orquiectomia parcial direita<br />

com o uso de microscópio cirúrgico<br />

(magnificação de 10 vezes). O acesso cirúrgico foi<br />

realizado por meio de inguinotomia direita com<br />

isolamento do funículo espermático e do testículo,<br />

seguido de controle vascular do cordão<br />

espermático (Figuras 1A e 1B). O testículo direito<br />

foi submetido a congelamento por 10 minutos e<br />

em seguida foi realizada enucleação microcirúrgica<br />

do nódulo testicular com margens livres à congelação<br />

transoperatória (Figuras 2A e 2B). Reconstrução<br />

do testículo remanescente com<br />

orquidopexia e fechamento das incisões cirúrgicas<br />

escrotal e inguinal (Figuras 3A e 3B). A análise<br />

anatomopatológica demonstrou um nódulo testicular<br />

medindo 0,5 x 0,5 x 0,4 cm, composto por<br />

seminoma clássico e margens cirúrgicas livres.<br />

Após o 30.º DPO, os marcadores tumorais permaneceram<br />

normais e a tomografia de abdome não<br />

demonstrou linfonodomegalia retroperitoneal; o<br />

paciente foi então encaminhado para radioterapia<br />

para complementação de tratamento.<br />

DISCUSSÃO<br />

Tumores testiculares de células germinativas<br />

representam a maior frequência de tumores sólidos<br />

em homens jovens. De acordo com os registros<br />

regionais de câncer na Europa, cerca de 90%<br />

dos pacientes apresentam doença em estágio inicial<br />

(TNM estágios I-IIB). 5,6 Em um estudo realizado<br />

com 338 casos de CaT tratados no seu serviço,<br />

Cooper e colaboradores verificaram que destes 161<br />

pacientes (48,8% da amostra) eram portadores de<br />

seminoma, o mesmo tipo histológico encontrado<br />

no paciente deste relato. 12<br />

O tratamento padrão para o câncer testicular<br />

com testículo contralateral normal é a<br />

orquiectomia por acesso inguinal, a qual permite<br />

um diagnóstico histopatológico preciso. 7 Lesões<br />

intratesticulares representam um problema clínico<br />

especial. O diagnóstico exato raramente pode<br />

ser feito pelas técnicas de imagem já descritas, fazendo-se<br />

necessária a análise histopatológica para<br />

confirmação diagnóstica. Nos casos de lesões benignas,<br />

no entanto, a orquiectomia radical passa a<br />

ser um tratamento agressivo e, pelo menos em lesões<br />

intratesticulares, todo esforço deve ser feito<br />

para se realizar uma cirurgia conservadora de órgão.<br />

13 A técnica original da cirurgia preservadora<br />

de órgão foi publicada em 1995 por Weissbach,<br />

sendo então executada em pacientes portadores de<br />

tumor maligno em testículo único e que se encai-<br />

102 revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


CRISTIANO PAIVA, MARILISE KATSURAYAMA, RENATO ALBUQUERQUE, JONAS MENEZES, ANDRÉ MANCINI, WALID KHALIL,<br />

ÍTALO CORTEZ, PETRUS OLIVA, GIUSSEPE FIGLIOULO, EDSON SARKIS<br />

xam nos critérios propostos pela Associação<br />

Europeia de Urologia descritos no quadro a seguir.<br />

14,15<br />

Indicações para cirurgia preservadora de órgãos 15<br />

Testículo único;<br />

Lesão com volume < 2 cm ou ~30% do volume testicular;<br />

Radioterapia adjuvante do parênquima testicular remanescente<br />

com 20 Gy;<br />

Valores pré-operatórios da testosterona sérica normais;<br />

Conhecimento do paciente e do urologista sobre os riscos<br />

e benefícios desta conduta;<br />

Conhecimento do paciente e do urologista sobre a necessidade<br />

de acompanhamento posterior do paciente;<br />

Experiência do urologista com esta técnica.<br />

A ressecção tumoral não segue os princípios<br />

da cirurgia radical, o que leva a dúvidas pelo<br />

fato de o testículo não ser um órgão vital. As maiores<br />

preocupações convergem para a recidiva local,<br />

doença residual multifocal, metástase sistêmica<br />

e extravasamento regional de células tumorais, preocupações<br />

que podem ser evitadas por cuidados<br />

técnicos especiais. O cirurgião deve estar familiarizado<br />

com os princípios oncológicos da cirurgia<br />

de CaT e ter um conhecimento profundo da anatomia<br />

vascular do testículo e conceitos básicos de<br />

microcirurgia. O controle vascular prévio do cordão<br />

espermático e um cauteloso isolamento e<br />

ressecção do tumor previnem de forma efetiva a<br />

disseminação sistêmica e extravasamento regional<br />

de células tumorais. Segundo Miller (1990), a<br />

recorrência local pode ser prevenida efetivamente<br />

com a radioterapia adjuvante no pós-operatório<br />

sobre o tecido testicular remanescente numa dose<br />

padrão de 18 Gy. Esta complementação se faz necessária<br />

baseada no fato de que esses tumores são<br />

radiossensíveis e podem estar associados à<br />

neoplasia intratubular (TIN), além da multifocalidade.<br />

16 Recentemente, alguns trabalhos demonstram<br />

que a cirurgia conservadora de órgão repre-<br />

senta uma modalidade inovadora de tratamento do<br />

CaT com vantagens endócrinas, psicológicas e de<br />

fertilidade para os pacientes. Aliado a esses fatores,<br />

a qualidade de vida tem se tornado cada vez mais<br />

importante para o paciente e para o médico. 3,17<br />

A orquiectomia parcial, portanto, é possível<br />

de ser realizada em pacientes selecionados com<br />

diagnóstico de CaT, porém a radioterapia pós-operatória<br />

é necessária para minimizar a recorrência<br />

local, sem prejuízo da produção endócrina do testículo<br />

que permanece normal em 85% dos casos.<br />

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FIGURAS<br />

1 A 1 B<br />

Figuras 1 A: Isolamento e controle vascular do funículo espermático<br />

1 B: Exposição e fixação do testículo<br />

104 revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


CRISTIANO PAIVA, MARILISE KATSURAYAMA, RENATO ALBUQUERQUE, JONAS MENEZES, ANDRÉ MANCINI, WALID KHALIL,<br />

ÍTALO CORTEZ, PETRUS OLIVA, GIUSSEPE FIGLIOULO, EDSON SARKIS<br />

2A<br />

2 B<br />

Figuras 2A e 2B: Dissecção microcirúrgica do polo inferior do testículo.<br />

3A<br />

3 B<br />

Figuras 3A e 3B: Reconstrução do testículo remanescente com orquidopexia e fechamento das incisões cirúrgicas escrotal<br />

e inguinal.<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


FERNANDO LUIZ WESTPHAL, LUIZ LIMA, MARIA DUARTE, JOSÉ NETTO, MÁRCIA SILVA, DIEGO CARVALHO, JOÃO GENU<br />

LESÃO DE TRAQUEIA MEDIASTIN<br />

TINAL POR ARMA DE<br />

FOGO: RELATO DE CASO<br />

MEDIASTINAL TRACHEA INJURY BY FIREARM: CASE REPORT<br />

Fernando Luiz Westphal * , Luiz Carlos de Lima ** , Maria Socorro Cardoso Duarte *** , José Corrêa Lima Netto **** , Márcia dos<br />

Santos da Silva ***** , Diego Monteiro de Carvalho ****** , João Marcelo Rodrigues Genu *******<br />

RESUMO: O trauma é uma das principais causas de morte e invalidez no mundo, no qual o acometimento<br />

torácico no paciente politraumatizado determina 20% dos óbitos. Dentre os traumatismos torácicos, a lesão da<br />

árvore traqueobrônquica é rara, com incidência entre 0,3 e 1%. É relatado um caso de ferimento cervical por arma<br />

de fogo na junção cérvico-torácica, transfixante em mediastino, com lesão traqueal. O paciente foi estabilizado e<br />

subsequentemente submetido à cervicotomia em colar, traqueorrafia e drenagem pleural bilateral. A evolução foi<br />

satisfatória com acompanhamento em Centro de Terapia Intensiva e alta em bom estado geral.<br />

Palavras-chaves: Traumatismo torácico; ferimento mediastinal; lesão traqueobrônquica; cervicotomia.<br />

ABSTRACT: Trauma is one of the main causes of death and disability in the world and the chest involvement<br />

determine about 20% of deaths. In this context, the association between chest trauma and injury of the<br />

tracheobronchial tree is rare, with incidence between 0.3 and 1%. It reported a case of cervical transfix injury by<br />

firearm in mediastinum with tracheal injury. The patient was stabilized and subsequently submitted to cervicotomy,<br />

tracheorhaphy and bilateral pleural drainage. The final result was satisfactory under monitoring in the Intensive<br />

Care Center and discharge in good condition.<br />

Keywords: Thoracic trauma; mediastinal injury; tracheobronchial injury; cervicotomy.<br />

INTRODUÇÃO<br />

Atualmente, o trauma figura como um dos<br />

principais responsáveis por morte e invalidez no<br />

mundo, em especial na população jovem, sendo a<br />

terceira maior causa de óbito nos EUA e a primeira<br />

quando se considera a idade abaixo dos 40<br />

anos. 1,2 O acometimento do tórax no paciente<br />

politraumatizado chega a determinar 20% das<br />

mortes por trauma e mais de 30% de todos os<br />

tipos de lesão. Cerca de um terço dos pacientes<br />

com lesões graves no tórax morre antes de chegar<br />

ao hospital, enquanto outros 20% morrem<br />

tardiamente por complicações pleuro-pulmonares.<br />

1,2,3,4 É sempre importante definir as características<br />

do mecanismo traumático. Nas lesões produzidas<br />

por arma de fogo, os projéteis de massa<br />

elevada e alta velocidade produzem grande li-<br />

*<br />

Doutor em Medicina. Professor-adjunto da Disciplina de Clínica Cirúrgica da Universidade Federal do Amazonas – <strong>Ufam</strong> – e da Universidade do Estado do Amazonas – UEA<br />

– Manaus (AM) Brasil.<br />

**<br />

Doutor em Medicina. Cirurgião torácico do Serviço de Cirurgia Torácica do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong> – <strong>HUGV</strong> – Manaus (AM), Brasil.<br />

***<br />

Doutora em Medicina. Professora-adjunta da Disciplina de Pneumologia da Universidade Federal do Amazonas – <strong>Ufam</strong> – Manaus (AM), Brasil.<br />

****<br />

Especialista em Cirurgia Torácica. Médico assistencial no Serviço de Cirurgia Torácica do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong> – <strong>HUGV</strong> – Manaus (AM), Brasil.<br />

*****<br />

Acadêmica de Medicina da Universidade Federal do Amazonas – <strong>Ufam</strong> – Manaus (AM), Brasil.<br />

******<br />

Acadêmico de Medicina da Universidade do Estado do Amazonas – UEA – Manaus (AM), Brasil.<br />

*******<br />

Acadêmico de Medicina do Centro Universitário Nilton Lins – UNL – Manaus (AM), Brasil.<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

107


LESÃO DE TRAQUEIA MEDIASTINAL POR ARMA DE FOGO: RELATO DE CASO<br />

beração de energia cinética, a qual se dissipa nos<br />

tecidos e produz sérios danos. Além do mecanismo,<br />

as consequências clínicas dependem do local<br />

da lesão, da presença ou não de lesões associadas<br />

e de doenças subjacentes. Essas informações são<br />

úteis para caracterizar situações específicas e graves<br />

que podem estar presentes. 5,6<br />

O trauma torácico com lesão traqueobrônquica<br />

é raro e sua incidência mundial varia entre<br />

0,3 a 1%. 7 O objetivo deste relato é apresentar um<br />

caso de ferimento transfixante de mediastino com<br />

lesão traqueal.<br />

RELATO DO CASO<br />

Paciente do sexo masculino, de 35 anos,<br />

trazido pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência<br />

– Samu ao <strong>Hospital</strong> Pronto-Socorro 28 de<br />

Agosto, Manaus-AM, consciente, referindo<br />

dispneia, dor cervical e torácica. Ao exame físico,<br />

foram verificados ferimentos por projétil de arma<br />

de fogo (FAF), com orifícios de entrada em região<br />

lateral esquerda da zona I do pescoço (Figura 1),<br />

escapular direita, lombar esquerda, antebraço<br />

distal esquerdo, sem orifícios de saída. Apresentava-se<br />

hipocorado (+/4+), sudoreico, com<br />

hemoptise, abdome doloroso à palpação e murmúrio<br />

vesicular diminuído à esquerda.<br />

Como conduta imediata, foi realizada aspiração<br />

de vias aéreas superiores, administração<br />

de O 2<br />

úmido, drenagem torácica fechada sob selo<br />

d’água à esquerda com dreno n.º 32, reposição<br />

de volume com Ringer Lactato (2.000 ml EV, além<br />

dos 1.000 ml EV feitos em ambulância), sondagem<br />

vesical e tentativa de sondagem nasogástrica,<br />

desencorajada após piora do quadro de insuficiência<br />

respiratória e aparecimento de enfisema subcutâneo<br />

cervical e facial. Feito ultrassom rápido<br />

(Fast) de abdome e pericárdio, negativos para presença<br />

de líquido.<br />

Paciente conduzido ao centro cirúrgico,<br />

onde foi realizada intubação orotraqueal e<br />

indicada cervicotomia em colar (Figura 2), sendo<br />

encontrada lesão transfixante em terço médio de<br />

traqueia, com orifício de entrada à esquerda e<br />

saída à direita (Figuras 3a e 3b). Realizado<br />

desbridamento da ferida, traqueorrafia com<br />

Categut cromado 3, drenagem pleural bilateral e<br />

laparotomia exploradora (sem presença de lesão<br />

de órgãos abdominais), seguido de admissão no<br />

Centro de Terapia Intensiva (CTI). Evoluiu sem<br />

complicações, com retirada de drenos no 5.º dia<br />

de pós-operatório, com alta no 17.º em bom estado<br />

geral.<br />

DISCUSSÃO<br />

A árvore traqueobrônquica possui topografia<br />

que anatomicamente lhe confere proteção natural<br />

anterior, posterior e lateralmente, pela mandíbula<br />

e esterno, pela coluna vertebral e pelas costelas,<br />

respectivamente. Dessa forma, a lesão da<br />

traqueia ou do brônquio principal torna-se algo<br />

incomum, mas potencialmente fatal que, frequentemente,<br />

não é notada ao exame inicial. 7,8<br />

A lesão da árvore traqueobrônquica possui<br />

múltiplas causas e, de acordo com o mecanismo<br />

do trauma, pode ser classificada em fechada<br />

ou penetrante, sendo a segunda a mais prevalente<br />

na traqueia cervical, em vista de sua maior exposição.<br />

Ferimentos por projéteis de arma de fogo,<br />

arma branca, estrangulamentos, queimaduras,<br />

cáusticas e iatrogênicas figuram entre as principais<br />

etiologias. 7,8,9<br />

As manifestações clínicas no trauma penetrante<br />

dependem do intervalo decorrido entre<br />

o trauma e o diagnóstico, da localização e do tamanho<br />

da ferida, da integridade da pleura<br />

mediastinal e dos tecidos adjacentes e das lesões<br />

torácicas associadas. 8,9,10 No trauma penetrante,<br />

manifestações clínicas como estridor, alteração na<br />

qualidade da voz, disfagia, taquidispneia,<br />

hemoptise e a observação de ferida na topografia<br />

da árvore respiratória podem gerar a suspeita da<br />

lesão. 8,11,12 No caso apresentado, além do quadro<br />

de insuficiência respiratória, também foram observados<br />

enfisema subcutâneo e hemoptise.<br />

A broncoscopia é o método diagnóstico de<br />

escolha para lesões traqueobrônquicas. A<br />

tomografia computadorizada (TC) e o raio X tam-<br />

108 revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


FERNANDO LUIZ WESTPHAL, LUIZ LIMA, MARIA DUARTE, JOSÉ NETTO, MÁRCIA SILVA, DIEGO CARVALHO, JOÃO GENU<br />

bém auxiliam na investigação, em especial na<br />

ocorrência de pneumotórax, hemotórax, pneumomediastino,<br />

pneumopericárdio, fraturas de ossos<br />

do tórax e enfisema subcutâneo, comumente associados<br />

nesse tipo de lesão. 13 Neste paciente, o<br />

diagnóstico e a indicação cirúrgica foram clínicos,<br />

pois não havia material necessário para realizar<br />

broncoscopia nem tampouco a TC.<br />

A abordagem inicial ao paciente<br />

traumatizado segue o protocolo proposto pelo<br />

Advanced Trauma Life Support (ATLS), o qual<br />

sugere a sistematização do atendimento por meio<br />

do ABCDE. A manutenção das vias aéreas é prioridade<br />

no atendimento inicial do paciente vítima<br />

de trauma. Quando necessário, deve-se realizar<br />

laringoscopia direta com aspiração de secreções ou<br />

corpos estranhos e acesso definitivo às vias aéreas<br />

por intermédio de intubação orotraqueal. O paciente<br />

com lesão traqueobrônquica e sinais de insuficiência<br />

respiratória deve ser intubado, quer seja<br />

para garantir vias aéreas pérvias ou para iniciar o<br />

tratamento cirúrgico. 9,12,14,15<br />

Pacientes com trauma penetrante por arma<br />

de fogo exigem uma avaliação cuidadosa de todas<br />

as estruturas adjacentes, pois há danos teciduais<br />

além das margens da lesão e maior número de<br />

anéis traqueais lesados, gerando mais complicações.<br />

11,16 Nos traumatismos que acometem a região<br />

cervical, deve-se analisar o pescoço sob o ponto de<br />

vista ântero-posterior e crânio-caudal. Lesões penetrantes<br />

do triângulo anterior que ultrapassam o<br />

músculo platisma têm maior probabilidade de<br />

comprometer órgãos e vasos aí localizados. Com<br />

base na localização em sentido crânio-caudal, o<br />

pescoço é dividido em 3 zonas horizontais, sendo<br />

as lesões da zona I (da clavícula à cartilagem<br />

cricoide) as que cursam com maior mortalidade e<br />

maior dificuldade de acesso; as da zona II (cartilagem<br />

cricoide ao ângulo da mandíbula), as mais<br />

comuns e de melhor prognóstico, e zona III (do<br />

ângulo da mandíbula à mastoide), sendo a menos<br />

comum. 11,16,17,18 As lesões da zona I podem alcançar<br />

o mediastino, como neste caso.<br />

A via de acesso para abordagem cirúrgica<br />

depende da localização da lesão e de outras que<br />

possam estar associadas, sendo individualizadas<br />

para cada paciente. A incisão cervical permite, além<br />

de uma boa visualização da traqueia, manipulação<br />

das lesões associadas com menor morbidade<br />

que a abordagem torácica, sendo a incisão em colar,<br />

utilizada neste caso, a mais comumente realizada,<br />

a incisão transversa é alternativa e ambas<br />

podem ser ampliadas longitudinalmente ao<br />

esterno para acesso de ferimentos na traqueia<br />

mediastinal em seu terço médio, carina e mesmo<br />

brônquios. A toracotomia posterolateral direita,<br />

indicada em lesões de traqueia terminal, permite<br />

acessá-la em toda sua extensão torácica, além do<br />

brônquio principal direito e a porção proximal do<br />

brônquio principal esquerdo. O sucesso do reparo<br />

depende da tensão na linha de sutura e suprimento<br />

vascular da lesão, que devem ser observados.<br />

7,8,11,12,15,16,17,18,19,20<br />

Na ocorrência de lesões associadas, é fundamental<br />

a identificação e tratamento precoces,<br />

como no caso de pneumotórax, em que o procedimento<br />

preconizado é a drenagem intercostal em<br />

selo d’água. No trauma abdominal, toda lesão por<br />

arma de fogo com violação da cavidade peritoneal<br />

tem indicação de exploração cirúrgica, uma vez que<br />

em mais de 90% dos casos existe lesão intra-abdominal<br />

significativa. 9,14<br />

Embora seja um acontecimento raro, o trauma<br />

associado à lesão traqueobrônquica, por seu<br />

alto nível de gravidade, exige do profissional médico<br />

um alto índice de suspeição em via de melhores<br />

resultados no atendimento à vítima.<br />

Além da identificação precoce, da rotina do<br />

Suporte Avançado de Vida no Trauma e de uma<br />

técnica cirúrgica adequada, o sucesso na evolução<br />

desses casos sustenta-se no acompanhamento pósoperatório<br />

em Centro de Terapia Intensiva (CTI) e<br />

em acompanhamento ambulatorial da capacidade<br />

pulmonar e função respiratória.<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

109


LESÃO DE TRAQUEIA MEDIASTINAL POR ARMA DE FOGO: RELATO DE CASO<br />

ANEXOS<br />

Figura 1: Orificio de entrada do projétil de arma de fogo em<br />

região lateral esquerda da zona I do pescoço<br />

Figura 2: Cervicotomia em colar<br />

A<br />

B<br />

Figura 3: Identificação dos orifícios de entrada (a) e saída (b), respectivamente<br />

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Livingstone, 2002, 8: p. 120-138.<br />

Trabalho realizado na Universidade Federal do<br />

Amazonas – <strong>Ufam</strong><br />

ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA<br />

Fernando Luiz Westphal<br />

Rua Apurinã, 4 – Praça 14 de Janeiro – 69010-<br />

130<br />

Manaus, AM – Brasil. Telefone: (92) 3621-6582<br />

E-mail: f.l.westphal@uol.com.br<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

111


112 revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


LUIZ LIMA, SILAS JÚNIOR, FAUSTO SANTOS, ÁLVARO SOEIRO, JAVIER PERDOMO, FERNANDO WESTPHAL, JOSÉ NETTO, INGRID LIMA<br />

COMPLIC<br />

OMPLICAÇÃ<br />

ÇÃO TARDIA DA CIRUR<br />

URGIA DE BENTALL<br />

ALL-<br />

DEBON<br />

ONO: O: RELATO DE CASO<br />

LATER COMPLICATION AFTER BENTALL-DE BONO PROCEDURE: CASE REPORT<br />

Luiz Carlos de Lima * , Silas Fernandes Avelar Júnior ** , Fausto Vieira dos Santos ** , Álvaro Bernardo Soeiro ** , Javier Cruz<br />

Perdomo ** , Fernando Luiz Westphal *** , José de Lima Netto **** , Ingrid Loureiro de Queiroz Lima *****<br />

RESUMO: Introdução: A cirurgia de Bentall-DeBono é um procedimento para substituição da valva aórtica em<br />

casos de aneurisma na aorta ascendente com ectasia valvar aórtica. Embora seja considerada uma técnica com<br />

bons resultados a longo prazo, algumas complicações podem surgir e, por esse motivo, ao longo dos anos algumas<br />

modificações surgiram tentando sanar possíveis complicações. Objetivo: Relatar uma complicação tardia da<br />

cirurgia de Bentall-DeBonno. Relato de caso: Paciente do sexo masculino, 62 anos, apresentou quadro de tontura<br />

e síncope repentino após pequena caminhada. Não apresenta comorbidades e, após realização de ecocardiografia<br />

e tomografia de tórax, foi constatado dilatação da aorta ascendente e sinais de dissecção distal. Informa que, há 14<br />

anos, submeteu-se a uma cirurgia de correção de aneurisma e troca de valva aórtica pela técnica de Bentall-<br />

DeBonno.<br />

Palavras-chave: Reoperação, dissecção aórtica, aneurisma.<br />

ABSTRACT: Introduction: Bentall-DeBono is a procedure for substitution of the aortic valve in cases of aneurism<br />

of the ascending aorta with aortic valve ectasia. Although been considered a safe technique with good long-term<br />

results, some complications may occur, and, as a result, some modifications were developed through the years<br />

intending to solve complications may occure. Objective: To report a long-term complication of Bentall-DeBono’s<br />

procedure. Case Report: Male, 62 years old, presented dizziness and sudden loss of conscience after short walk.<br />

No co morbidities were associated and, 14 years before, he was summit to a cardiac surgery, with Bentall-DeBono’s<br />

technique. After echocardiography and thoracic CT, an augmentation in the ascending aorta diameter and signs<br />

of distal dissection were observed. Announced that, for 14 years, submitted to surgery for correction of an aneurysm<br />

and aortic valve by the exchange of technical Bentall-DeBonno.<br />

Keywords: Re-operation, aortic dissection, aneurism.<br />

INTRODUÇÃO<br />

Em 1968, Bentall e DeBono descreveram um<br />

procedimento cirúrgico para substituição completa<br />

da valva aórtica em casos de aneurisma na aorta<br />

ascendente com ectasia valvar aórtica. Em seu relato,<br />

a raiz da aorta proximal estava muito envolvida<br />

com o processo patológico. O anel da valva<br />

aórtica estava muito dilatado e a parede extremamente<br />

fina abaixo do anel, tornando impossível<br />

unir a parede aórtica acima das coronárias à prótese<br />

aórtica, optando-se então, naquele momento,<br />

suturar diretamente a prótese valvar ao tubo de<br />

Teflon. Dois orifícios foram feitos no local dos<br />

*<br />

Doutor em Medicina, cirurgia cardíaca, <strong>Hospital</strong> Português Beneficente do Amazonas.<br />

**<br />

Especialista em cirurgia cardíaca, <strong>Hospital</strong> Português Beneficente do Amazonas.<br />

***<br />

Doutor em Medicina, cirurgia torácica, <strong>Hospital</strong> Português Beneficente do Amazonas.<br />

****<br />

Especialista em Cirurgia Torácica, <strong>Hospital</strong> Português Beneficente do Amazonas.<br />

*****<br />

Acadêmica de Medicina da Universidade Federal do Amazonas.<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

113


COMPLICAÇÃO TARDIA DA CIRURGIA DE BENTALL-DEBONO: RELATO DE CASO<br />

óstios coronarianos, os quais foram então<br />

recanalizados, dessa vez por meio do lúmen do<br />

tubo. A parede da aorta foi suturada próximo aos<br />

orifícios no tubo de Teflon, reincorporando-se então<br />

os óstios coronários à nova aorta. 1<br />

Esse procedimento sofreu algumas modificações<br />

durante os anos, a maior parte destas relacionada<br />

à reimplantação da artéria coronária e a<br />

realização da anastomose distal, 2 podendo-se citar<br />

as modificações realizadas por Cabrol, 1981, 3 o<br />

procedimento de Piehler, 1984, 4 e a técnica do botão<br />

coronariano de Carrel, 1980. 5 O uso de condutos<br />

valvulados para aorta ascendente e valva<br />

aórtica é hoje o método mais difundido de tratamento<br />

cirúrgico e técnica de escolha para diversas<br />

condições patológicas, dentre elas dissecção da<br />

aorta ascendente com insuficiência aórtica. 2,6,7<br />

Dentre as indicações mandatórias para a<br />

cirurgia de substituição da aorta ascendente citamse<br />

condições de urgência, como a dissecção aguda<br />

do segmento ascendente da aorta e patologias associadas,<br />

ruptura espontânea e hematoma<br />

intramural, bem como a destruição do anel aórtico<br />

por endocardite infecciosa. Outras indicações ditas<br />

eletivas são a dilatação aórtica na síndrome de<br />

Marfan, dissecções crônicas e, uma causa em ascensão:<br />

aterosclerose severa na aorta ascendente. 7<br />

Mesmo sendo a técnica mais difundida no<br />

mundo e considerado método de escolha para tratar<br />

doenças na aorta ascendente e patologias associadas,<br />

observam-se complicações clássicas descritas<br />

na literatura. Dentre as mais comuns encontram-se<br />

sangramento pós-operatório aumentado e<br />

formação de pseudoaneurisma nas linhas de sutura.<br />

Procedimentos de Bentall modificados são em<br />

geral mais seguros. 8 A técnica de Cabrol facilita a<br />

anastomose entre o óstio da coronária e o enxerto<br />

por utilizar o enxerto vascular para reconstruir a<br />

artéria coronária. Esta técnica possui rota redundante<br />

para circulação coronariana, mas apresenta<br />

o risco de êmbolo na artéria coronária, 9 bem como<br />

o risco de dano na coronária esquerda, na circunflexa<br />

e oclusão destas artérias por tensão. 8<br />

As modificações à técnica clássica de Bentall<br />

e DeBonno têm como objetivo evitar esssas complicações<br />

e melhorar os resultados a curto e longo<br />

prazos. Somando-se a isso, o aumento do uso de<br />

conduto biológico como homoenxertos e<br />

autoenxertos pulmonares aumentaram significativamente<br />

o número de substituições da raiz da<br />

aorta. Consequentemente, um maior número de<br />

pacientes necessitará de reoperação da raiz aórtica<br />

com reaproximação da artéria coronária a um novo<br />

conduto. Informações disponíveis sobre essas<br />

reoperações e resultados clínicos são limitadas. 10<br />

Soma-se a isso, ainda, o grupo de pacientes<br />

acometidos pela síndrome de Marfan, que possuem<br />

como maior manifestação cardiovascular doença<br />

da aorta ascendente proximal característica<br />

de ectasia ânulo-aórtica, frequentemente complicado<br />

por dissecção aórtica, demonstrarem na literatura<br />

maior necessidade de reoperação por<br />

reesternotomia por diversas razões, incluindo<br />

pseudoaneurismas na anastomose aórtica distal ou<br />

anastomose da artéria coronária, endocardite na<br />

prótese valvar aórtica, trombose valvar e vazamento<br />

paravalvular. 11<br />

O objetivo deste trabalho é descrever uma<br />

complicação a longo prazo da cirurgia de Bentall-<br />

DeBonno.<br />

RELATO DE CASO<br />

Paciente do sexo masculino, 62 anos, procurou<br />

pronto atendimento referindo sensação de<br />

tontura e obnubilação, seguida de síncope. Possui<br />

história pregressa de cirurgia de correção de<br />

aneurisma de aorta ascendente pela técnica de<br />

Bentall-DeBonno havia 15 anos.<br />

Foi realizada tomografia computadorizada<br />

da aorta e ecocardiograma trastorácico que mostraram<br />

sinais de aneurisma da aorta ascendente e<br />

dissecção. Foi submetido a tratamento cirúrgico em<br />

24 de julho de 2007, tendo sido encontrado envolvimento<br />

da parede do aneurisma na cirurgia anterior.<br />

Após abertura, foi encontrada deiscência total<br />

da anastomose distal da aorta ascendente e óstio<br />

coronariano (Figura 1), dissecção do arco aórtico e<br />

restrição da mobilidade da prótese metálica da<br />

valva aórtica colocada anteriormente. O paciente<br />

114 revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>


LUIZ LIMA, SILAS JÚNIOR, FAUSTO SANTOS, ÁLVARO SOEIRO, JAVIER PERDOMO, FERNANDO WESTPHAL, JOSÉ NETTO, INGRID LIMA<br />

não fazia uso de anticoagulante oral. Foi realizada<br />

substituição da aorta ascendente por tubo valvado<br />

de Dacron, reimplante dos óstios coronarianos e<br />

substituição do hemi-arco (Figura 2). Paciente evoluiu<br />

bem no pós-operatório, recebendo alta hospitalar<br />

no décimo dia, estando sob acompanhamento<br />

ambulatorial atualmente.<br />

DISCUSSÃO<br />

A cirurgia de Bentall e suas variantes foram<br />

as técnicas de escolha para colocação de enxerto<br />

composto da aorta ascendente e valva aórtica<br />

em uma variedade de condições patológicas, 8 favorecendo-se<br />

em especial os pacientes com<br />

síndrome de Marfan, que morriam prematuramente<br />

por ruptura aórtica causada tanto por ectasia<br />

ânulo aórtica como por dissecção aórtica. Esses<br />

pacientes puderam ser diagnosticados e tratados<br />

com um procedimento que lhes trouxe qualidade<br />

e expectativa de vida. 12 Contudo, dada a complexidade<br />

dos casos de paciente que a ela se submetem,<br />

é preciso considerar a existência das complicações<br />

a longo prazo.<br />

Conforme observado por Apaydin et al<br />

(2002), em um estudo com 86 pacientes<br />

no período de 1994 a 2001, houve mortalidade<br />

6,9% (6 pacientes). Dentre os fatores de risco<br />

para mortalidade a curto prazo foram descritos a<br />

presença de calcificação e estenose da valva aórtica,<br />

insuficiência renal e insuficiência cardíaca após a<br />

operação. Fatores preditivos de morbidade incluem<br />

dissecção aguda, parada circulatória, transfusão<br />

de sangue e plasma fresco em mais que duas<br />

unidades, tempo de pinçamento e circulação<br />

extracorpórea (acima de 90 e 140 min) e procedimentos<br />

associados. 8<br />

No estudo de Raanani et al (2001), foram<br />

observados no período de 1980 a 1999 um total de<br />

31 pacientes submetidos à substituição da aorta ascendente<br />

que necessitaram de reoperação. Destes,<br />

94% eram do sexo masculino, e o intervalo entre o<br />

primeiro procedimento e a reoperação foi de 61±<br />

41 meses. As indicações para reoperação foram falência<br />

da valva biológica em 17 (55%), endocardite<br />

ativa da prótese valvar em 12 (39%) e falso<br />

aneurisma em 2 (6%). A mortalidade operatória foi<br />

de 3%. 10 O paciente em questão neste relato desenvolveu<br />

deiscência total da anastomose distal e dissecção<br />

proximal do arco aórtico encontrado à exploração<br />

cirúrgica, com deiscência da anastomose<br />

dos óstios coronarianos. A capa da parede do<br />

aneurisma que envolvia o tubo de Dacron ®<br />

reconstituído na cirurgia anterior é que mantinha<br />

a integridade da aorta proximal.<br />

De acordo com Tabayashi et al (1998), as<br />

principais complicações da técnica clássica de<br />

Bentall e DeBonno são sangramento da<br />

anastomose, vazamento paravalvular e formação<br />

aneurismática da parede aórtica. Em seu estudo,<br />

20 pacientes foram submetidos à cirurgia clássica<br />

de Bentall e, destes, 3 apresentaram compressão<br />

do enxerto, dois apresentaram pseudoaneurisma<br />

de óstio coronário e um, pseudoaneurisma em linha<br />

de sutura distal.<br />

No estudo de Scafuri et al (2000), os autores<br />

consideram o procedimento de Bentall e DeBonno<br />

como de risco moderado com bons resultados.<br />

Durante o período de 1991 a 1998, 44 pacientes submetidos<br />

à cirurgia de Bentall, quatro (9%) foram a<br />

óbito, quatro apresentaram sangramento pós-operatório<br />

necessitando reoperação e, durante seguimento<br />

após dois anos, sete pacientes foram a óbito,<br />

dos quais três foram por falência cardíaca, um<br />

por acidente vascular encefálico e os outros três,<br />

morte súbita.<br />

Na análise de Silva et al (<strong>2008</strong>), com 39 pacientes,<br />

os achados clínicos cirúrgicos demonstraram<br />

a presença de aneurisma de aorta ascendente em<br />

19 (48,5%) pacientes, ectasia ânulo-aórtica em 12<br />

(31%), ectasia ânulo-aórtica associada à dissecção<br />

tipo B em um (2,5%) doente, dissecção aguda da<br />

aorta tipo A em quatro (10,5%) pacientes e dissecção<br />

tipo A associada a aneurisma da aorta descendente<br />

em dois (5%). Os mesmos autores relatam<br />

ainda a evolução a longo prazo dos doentes operados.<br />

Dos 37 pacientes que sobreviveram, quatro<br />

foram a óbito após um ano de cirurgia. Dois deles<br />

por acidente vascular cerebral, o terceiro, dissec-<br />

revistahugv<br />

– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong><br />

115


COMPLICAÇÃO TARDIA DA CIRURGIA DE BENTALL-DEBONO: RELATO DE CASO<br />

ção tipo B, e, ainda, um paciente apresentou formação<br />

aneurismática na aorta na porção tóracoabdominal;<br />

foi operado, mas por complicações renais<br />

foi a óbito 3 dias após a cirurgia.<br />

Kouchoukos et al (1991) descreveram uma<br />

série de 168 pacientes submetidos à cirurgia para<br />

substituição da aorta ascendente e valva aórtica em<br />

continuidade, sendo ectasia ânulo-aórtica a indicação<br />

mais comum para a cirurgia (84 pacientes).<br />

Dentre 105 pacientes operados com a técnica clássica<br />

de Bentall, em um tempo médio de 47 meses,<br />

nove desenvolveram pseudoaneurisma necessitando<br />

de reoperação, e cinco (56%) sobreviveram.<br />

Num acompanhamento dos pacientes até oito anos,<br />

nenhuma nova complicação ou presença de<br />

pseudoaneurisma na linha de sutura foi observada.<br />

Conforme descrito no estudo de David et al<br />

(2004), a substituição da raiz aórtica tornou-se uma<br />

operação comum e, consequentemente, o risco operatório<br />

diminuiu em locais com grande volume de<br />

cirurgias. Entretanto, a reoperação da substituição<br />

da raiz aórtica após uma primeira cirurgia permanece<br />

uma operação desafiadora. Nestas cirurgias<br />

deve-se considerar não apenas o que deve ser feito<br />

para corrigir o problema na raiz da aorta e outras<br />

regiões do coração, mas também a condição<br />

geral do paciente e habilidade de sustentar uma<br />

grande cirurgia. A mortalidade em geral para<br />

reoperação da substituição da raiz aórtica é descrita<br />

como sendo menor que 10% em séries<br />

publicadas, mas certamente existe uma variação<br />

na seleção dos pacientes.<br />

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Figura 2: Correção cirúrgica com substituição do hemi-arco aórtico.<br />

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– <strong>Revista</strong> do <strong>Hospital</strong> Universitário Getúlio <strong>Vargas</strong><br />

v. 7. n. 1-2 jan./dez. – <strong>2008</strong>

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