4. (FUVEST-SP) – Leia o trecho de abertura de Memórias de umSargento de Milícias e responda ao que se pede.5. (UNICAMP-SP) – O trecho abaixo pertence ao capítulo XLV(“Empenhos”), de Memórias de um Sargento de Milícias.PORTUGUÊS EEra no tempo do rei.Uma das quatro esquinas que formam as ruas do Ouvidor e daQuitanda, cortando-se mutuamente, chamava-se nesse tempo — Ocanto dos meirinhos —; e bem lhe assentava o nome, porque era aí olugar de encontro favorito de todos os indivíduos dessa classe (quegozava então de não pequena consideração). Os meirinhos de hojenão são mais do que a sombra caricata dos meirinhos do tempo dorei; esses eram gente temível e temida, respeitável e respeitada; for -mavam um dos extremos da formidável cadeia judiciária que envolviatodo o Rio de Janeiro no tempo em que a demanda era entre nós umelemento de vida: o extremo oposto eram os desembargadores.(Manuel Antônio de Almeida,Memórias de um Sargento de Milícias)a) A frase “Era no tempo do rei” refere-se a um período históricodeterminado e possui, também, uma conotação marcada pela inde -ter minação temporal. Identifique tanto o período histórico a que serefere a frase quanto a mencionada conotação que ela tambémapresenta.RESOLUÇÃO:O período histórico a que se refere a frase é o que se inicia com a chegadada família real portuguesa ao Brasil, em 1808, sendo D. João VI o reireferido. A frase “Era no tempo do rei”, para além dessa referênciahistórica, associa-se à abertura formular de contos de fadas e semelhantes— “Era uma vez...” — e, nesse sentido, conota tempo e espaço indeter mi -nados.Isto tudo vem para dizermos que Maria-Regalada tinha um verda -deiro amor ao Major Vidigal; o Major pagava-lho na mesma moeda.Ora, D. Maria era uma das camaradas mais do coração de Maria-Regalada. Eis aí por que falando dela D. Maria e a comadre se mos -tra ram tão esperançadas a respeito da sorte do Leonardo.Já naquele tempo (e dizem que é defeito do nosso) o empenho, ocompadresco, era uma mola real de todo o movimento social.(ALMEIDA, Manuel Antônio de. Memórias de umSargento de Milícias. Cotia, Ateliê Editorial, 2000, p. 319.)a) Explique o “defeito” a que o narrador se refere.RESOLUÇÃO:O “defeito” referido pelo narrador é a ausência de fronteiras nítidas en -tre o interesse público e a vida privada, é a “dialética da malandragem”,expres são que o crítico Antonio Candido consagrou como caracteri za do -ra da diluição dos limites que separam o “mundo da ordem” e o “mundoda desordem”, a lei e a contravenção, o dever funcional e o interessepessoal. Por “empenho”, pode-se entender a troca de favores, o cliente lis -mo, e por “compadresco”, o nepotismo que era “uma mola real de todo omovimento social”, como diz o narrador.b) No trecho aqui reproduzido, o narrador compara duas épocas dife -rentes: o seu próprio tempo e o tempo do rei. Esse proce dimento éraro ou frequente no livro? Com que objetivo o narrador o adota?RESOLUÇÃO:Esse procedimento é frequente no livro, pois um dos objetivos donarrador é confrontar duas épocas — a sua (tempo da enunciação) eaquela em que ocorrem os fatos narrados (tempo do enunciado).b) Relacione o “defeito” com esse episódio, que envolveu o MajorVidigal e as três mulheres.RESOLUÇÃO:Preso pelo terrível Major Vidigal, chefe dos milicianos no Rio de Janeiro,Leonardo deveria ser, nos termos das leis e regulamentos, severamentepunido. Intercedem em seu favor D. Maria, a Comadre e Maria-Rega -lada. As esperanças da tia de Luisinha e da madrinha estavam assentadasna percepção de que o Major Vidigal seria vulnerável ao apelo sensual deMaria-Regalada e ao “verdadeiro amor” que havia entre ambos. E, maisque isso, de que seria capaz de transgredir os seus deveres funcionais, nãopunindo Leonardo e, mais tarde, promovendo-o a sargento, para atenderao pleito da mulher que desejava. O “defeito” que nisso se revela é adiluição da ordem, o “jeitinho”, a superposição da vida e dos interessespessoais aos deveres e obrigações legais. O diálogo (no capítulo XLVI)que se abre com o trecho “— Ora, a lei... O que é a lei, se o Sr. Majorquiser?...” ilustra cabalmente o “defeito” em questão.32 –
MÓDULO 12Literatura e Análise de Textos Literários (VI)As questões de números 1 a 3 baseiam-se num soneto de Antero deQuental (1842-1891) e numa fala de uma personagem de uma peça deMillôr Fernandes (1923).SOLEMNIA VERBA 1Disse ao meu coração: Olha por quantosCaminhos vãos andamos! ConsideraAgora, desta altura fria e austera,Os ermos que regaram nossos prantos...1. (VUNESP-SP) – O soneto “Solemnia Verba” desenvolve-se comoum diálogo entre duas personagens: o eu poemático e seu “coração”.O que simboliza, no poema, a personagem “coração”?RESOLUÇÃO:Em “Solemnia Verba”, o “coração” tem a função de servir como con tra -ponto ao desencanto amargo do eu lírico. É, portanto, símbolo forte daesperança no amor — o Amor maiusculizado e entendido como forçauniversal e esteio da existência, que consegue sobreviver até mesmo àssituações mais inóspitas.PORTUGUÊS EPó e cinzas, onde houve flor e encantos!E noite, onde foi luz de primavera!Olha a teus pés o mundo e desespera,Semeador de sombras e quebrantos! —Porém o coração, feito valenteNa escola da tortura repetida,E no uso do penar tornado crente,Respondeu: Desta altura vejo o Amor!Viver não foi em vão, se é isto a vida,Nem foi demais o desengano e a dor.(QUENTAL, Antero de. Os Sonetos Completos deAntero de Quental. Porto, Livraria Portuense de Lopes,1886, p. 119; primeira edição, disponível na internet em:http://purl.pt/122/1/P160.html.)1 – Solemnia verba: palavras solenes.ATRIZ(Rindo forçosamente depois que os atores saem.)Tem gente que continua achando que a vida é uma piada. Aindabem que tem gente que pensa que a vida é uma piada. Pior é a genteque pensa que o homem é o rei da criação. Rei da criação, eu, hein?Um assassino nato, usufruidor da miséria geral — se você come,alguém está deixando de comer, a comida não dá para todos, não —de que é que ele se ri? De que se ri a hiena? Se não for atropeladoficará no desemprego, se não ficar desempregado vai pegar umenfisema, será abandonado pela mulher que ama — mas ama, hein?—, arrebentado pelos filhos — pelos pais, se for filho —, mordido decobra ou ficará impotente. E se escapar de tudo ficará velho, senil,babando num asilo. Piada, é? Pode ser que haja vida inteligente emoutro planeta, neste, positivamente, não. O homem é o câncer daTerra. Estou me repetindo? Pois é: corrompe a natureza, fura túneis,empesta o ar, emporcalha as águas, apodrece tudo onde pisa. Fiquetranquilo, amigo: o desaparecimento do ser humano não fará amínima diferença à economia do cosmos.(FERNANDES, Millôr. Computa, Computador, Computa.3.ª ed. Rio de Janeiro, Nórdica, 1972, p. 85.)2. (VUNESP-SP) – Os dois textos apresentados identificam-se porexpressar, sob pontos de vista distintos, a decepção e o pessimismo dohomem com relação à vida e ao mundo. Diferenciam-se, todavia, naatitude final que apresentam ante essa decepção. Releia-os, atenta -mente, e explique essa diferença de atitude.RESOLUÇÃO:No primeiro texto, Antero de Quental exprime uma postura orientadapela esperança, pois acredita que a dor constante da vida e a devastaçãogerada pelo homem são compensadas pela perspectiva final da existência,da qual se divisa o grande ideal do Amor.No segundo texto, Millôr Fernandes expressa uma atitude niilista, poisconclui que a espécie humana, extremamente agressiva, canalha emiserável, “não fará a mínima diferença à economia do cosmos” quandodesaparecer.– 33