12.07.2015 Views

José Eduardo Carvalho Dar vida às margens do Tejo ... - CCDR-LVT

José Eduardo Carvalho Dar vida às margens do Tejo ... - CCDR-LVT

José Eduardo Carvalho Dar vida às margens do Tejo ... - CCDR-LVT

SHOW MORE
SHOW LESS
  • No tags were found...

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Reportagem | Carla AmaroFotografia | Guto Ferreiradar <strong>vida</strong> às<strong>margens</strong> <strong>do</strong> tejoImagem estranha a de um marceneiro num local onde nãoexiste quase nada além de edifícios velhos com fachadasque ameaçam ruir a to<strong>do</strong> o momento. Os avisos afixa<strong>do</strong>snas paredes tornam mais real o risco que até os menosatentos adivinham. O Cais <strong>do</strong> Ginjal, na margem sul <strong>do</strong><strong>Tejo</strong>, ficará reduzi<strong>do</strong> a escombros mais dia menos dia. E é no meiodeste iminente cenário que Ramiro Gonçalves finaliza um móvelde cozinha. «Podem entrar. Aqui não há cão». Esclarecemos que«não somos clientes», que «não queremos encomendar nada».Que o que nos levou à espreitadela foi «a curiosidade de saber o quefaz aqui no meio <strong>do</strong> nada». A resposta é pronta: «Trabalho. Estoua acabar um serviço que fiquei de entregar hoje à tarde».Da mesa onde Ramiro corta a matéria-prima vê-se «o la<strong>do</strong> de lá»,Lisboa. Mas não é por «esta vista» que o artesão mantém a portada marcenaria aberta. É pelo rio. Por ele permanece neste local,isola<strong>do</strong>. «É um privilégio estar a <strong>do</strong>is metros da água». Não háexagero na medição. O <strong>Tejo</strong> fica mesmo a <strong>do</strong>is metros da portada marcenaria de Ramiro. Lisboa surge ao longe, iluminada pelosol que nesta altura <strong>do</strong> ano é fugidio neste pedaço de marginal.Aqui é tempo de sombra e de muito vento. «Aparecem uns raiozitosà hora <strong>do</strong> almoço e vão-se logo embora, não ficam o suficientepara aquecer a gente».A marcenaria de Ramiro fica a meio <strong>do</strong> Cais <strong>do</strong> Ginjal, onde o aban<strong>do</strong>noé mais evidente. Quem sai <strong>do</strong>s barcos da Transtejo e virapara o la<strong>do</strong> direito, percorren<strong>do</strong> o cais até ao fim – talvez por issoo último restaurante se chame Ponto Final, tem a sensação deentrar num cenário fantasmagórico produzi<strong>do</strong> de propósito paraum filme. Aqui se encontram as infraestruturas associadas à pesca<strong>do</strong> bacalhau: a antiga fábrica <strong>do</strong> bacalhau, a antiga fábrica degelo, a antiga fábrica <strong>do</strong>s arrastões e as casas <strong>do</strong>s pesca<strong>do</strong>res quepartiam para a Terra Nova e por lá ficavam durante semanasenquanto não enchessem o barco de peixe – as casas estão emfase de degradação avançada, mas algumas, se não se enganaquem passa e avança a informação, dão abrigo a «emigrantes<strong>do</strong> Leste».Este enquadramento resulta mais esquisito quan<strong>do</strong> ficamos.a saber que foi Ramiro que fez os cenários <strong>do</strong> filme Afirma Pereira,de António Tabucci, com Marcello Mastroianni no papel principale onde entram também Mário Viegas, Joaquim de Almeida,Daniel Auteuil. «Às cinco da manhã eu já andava na rua Augustaa preparar o cenário para as gravações», a tirar todas as referênciaspublicitárias que sugerem esta época e a substituí-los pelosplacards de 1938. «Não pode falhar nada», porque um pequenopormenor fora de época pode estragar tu<strong>do</strong>. Os móveis e o chão| 27

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!