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A ordem de um tempo: folhetos na coleção Barbosa Machado - Topoi

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A ORDEM DE UM TEMPO: FOLHETOS NA COLEÇÃO BARBOSA MACHADO • 101livro intitulado Juízo da Verda<strong>de</strong>ira Causa do Terremoto. Como se sabe,nesta obra o padre escreveu que os lisboetas eram culpados pelo sismo,castigo divino a punir os maus católicos. A escrita <strong>de</strong> Malagrida baseava-senos sermões que pregou logo após o terremoto. O jesuíta era orador <strong>na</strong>corte <strong>de</strong> D. João V, e seu livro foi publicado com todas as licenças necessárias.Contudo, a história da peque<strong>na</strong> obra foi acompanhada do fortalecimentoda política <strong>de</strong> Sebastião <strong>de</strong> Carvalho e Melo e suas articulações coma própria memória do <strong>de</strong>sastre lisboeta. Em 1759, mesmo ano em que osecretário <strong>de</strong> Estado tor<strong>na</strong>va-se con<strong>de</strong> <strong>de</strong> Oeiras, Malagrida – jesuíta eamigo dos Távoras – foi preso. Em 1761, foi queimado, última vítimamortal da Inquisição lusa. Em 1768, era criada a Real Mesa Censória;quatro anos <strong>de</strong>pois o livro <strong>de</strong> Malagrida era con<strong>de</strong><strong>na</strong>do publicamente, comos piores adjetivos. Um dos censores do novo órgão, <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>do a diminuir opo<strong>de</strong>r do Santo Ofício, era o então bispo <strong>de</strong> Beja, Manuel do Cenáculo,artífice da reconstrução da Real Biblioteca, responsável pela negociação como aba<strong>de</strong> <strong>de</strong> Sever para o ganho da coleção <strong>Barbosa</strong> <strong>Machado</strong>. 45O impacto não foi menor entre os estrangeiros da “república das letras”.O jovem alemão Immanuel Kant, por exemplo, forneceu <strong>um</strong>a explicação<strong>na</strong>tural para os sismos, pela ação <strong>de</strong> gases subterrâneos à crosta terrestre.Contudo, mais famoso tornou-se o poema <strong>de</strong> François Voltaire sobreo <strong>de</strong>sastre <strong>de</strong> Lisboa, contrariando a perspectiva do sábio Leibniz, res<strong>um</strong>ida<strong>na</strong> frase “tudo vai bem”. Da Suíça, Voltaire escreveu:Acorrei, contemplai estas ruí<strong>na</strong>s malfadadas, / Estes escombros, estes <strong>de</strong>spojos,estas cinzas <strong>de</strong>sgraçadas, / Estas mulheres, estes infantes uns nos outrosamontoados / Estes membros dispersos sob estes mármores quebrados/ Cem mil <strong>de</strong>safortu<strong>na</strong>dos que a terra <strong>de</strong>vora / Os quais, sangrando, <strong>de</strong>spedaçados,e palpitantes embora, / Enterrados com seus tetos termi<strong>na</strong>m semassistência / No horror dos tormentos sua lamentosa existência!Aos que explicavam a origem do <strong>de</strong>sastre pelas vias <strong>na</strong>turais ou pelafúria divi<strong>na</strong>, Voltaire respondia com a própria imagem da Lisboa <strong>de</strong>struída:“Lisboa, que não é mais, teve ela mais vícios / Que Londres, que Paris,mergulhadas <strong>na</strong>s <strong>de</strong>lícias? / Lisboa está arrui<strong>na</strong>da, e dança-se em Paris.” 46A sátira mordaz dirigida a Leibniz mereceu do ainda jovem Jean-Jacques Rousseau <strong>um</strong>a carta crítica a Voltaire que, no esplendor da suamaturida<strong>de</strong> intelectual, ainda escreveria a novela Cândido, ou o Otimismo,TOPOI, v. 8, n. 14, jan.-jun. 2007, pp. 77-113.

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