O "ut pictura poesis" e as origens crÃticas da ... - UNESP-Assis
O "ut pictura poesis" e as origens crÃticas da ... - UNESP-Assis
O "ut pictura poesis" e as origens crÃticas da ... - UNESP-Assis
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Sânderson Reginaldo de Mellopoet<strong>as</strong> como pintores julgam representar a ver<strong>da</strong>de, o primeiro pela ilusão dopensamento ao identificar <strong>as</strong> aparentes virtudes de certo personagem àsvirtudes human<strong>as</strong>, o segundo, ao desenhar, faz-se crer ao simples espectadortão bom artífice pelo julgamento <strong>da</strong> articulação de cores e traços, como eluci<strong>da</strong>o episódio de Zêuxis e Parr<strong>as</strong>o. 6 Assim, Platão acredita que o pintor, sendo bomem sua arte, não fará na<strong>da</strong> menos que enganar os espíritos sobre a aparênciareal <strong>da</strong>quilo que representam. Paralelamente, sugere que os poet<strong>as</strong>, compouc<strong>as</strong> afini<strong>da</strong>des com <strong>as</strong> tint<strong>as</strong>, fazem-se crer exímios pintores, ou artesãos,pelo conhecimento <strong>da</strong> imitação ao colorir ca<strong>da</strong> arte pelo correto emprego depalavr<strong>as</strong> e versos. 7 Assim, Platão vê a simetria entre a arte pictórica e a artepoética, pois amb<strong>as</strong> se distanciam <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>de, suscitando uma compreensão doespírito que turva o ver<strong>da</strong>deiro conhecimento. Por o<strong>ut</strong>ro lado, segundo Platão,o poeta imitador e o pintor devem ser considerados hostis à polis, porquemotivam uma moral perversa à vi<strong>da</strong> social, ao postular num mesmo grau deimportância <strong>as</strong>suntos sublimes e vulgares, podendo <strong>as</strong>sim motivar a crença defant<strong>as</strong>i<strong>as</strong>. 8 Nesse <strong>as</strong>pecto, Platão culpa a ignorância humana como coparticipante<strong>da</strong> aceitação do processo de imitação e fingimento d<strong>as</strong> artes, poisse o homem não for capaz de reconhecer a natureza de determina<strong>da</strong> coisa, caivítima <strong>da</strong> sua própria ingenui<strong>da</strong>de.Porém, devemos considerar o idealismo de Platão sobre o conceito demimese. Para o filósofo, o objeto representado é cópia <strong>da</strong> natureza aparente6 Numa disp<strong>ut</strong>a para se averiguar quem era o melhor pintor, conta-se que, quando Zêuxisapresentou a pintura de um cacho de uv<strong>as</strong> a Parr<strong>as</strong>o, rapi<strong>da</strong>mente dois pássaros tentaram bicar<strong>as</strong> supost<strong>as</strong> fr<strong>ut</strong><strong>as</strong>. Em segui<strong>da</strong>, Zêuxis solicitou que Parr<strong>as</strong>o desfizesse o embrulho dopresente, figurado ao lado, vindo este a descobrir que não só o presente se tratava de umsimulacro, m<strong>as</strong> to<strong>da</strong> a cena retrata<strong>da</strong>. Assim, Parr<strong>as</strong>o admite a superiori<strong>da</strong>de de Zêuxis, quenão apen<strong>as</strong> enganara a natureza, m<strong>as</strong> principalmente os olhos de o<strong>ut</strong>ro artista.7 Lembra-nos Bosi que Platão, igualmente no livro d<strong>as</strong> Leis, ao disc<strong>ut</strong>ir que o conhecimento <strong>da</strong>arte é simulacro, designa pelo termo “ícones” (imagens semelhantes aos objetos) tanto pintur<strong>as</strong>quanto poem<strong>as</strong>, <strong>da</strong>nç<strong>as</strong> e melodi<strong>as</strong>. Artes que produzem simulacros são <strong>as</strong> técnic<strong>as</strong> <strong>da</strong> imagem,téchnai eikástikai (Leis, II, 667 c), com <strong>as</strong> su<strong>as</strong> correspondênci<strong>as</strong> e proporções intern<strong>as</strong>, aharmonia e o ritmo (BOSI, 1991, p. 29-30).8 Platão compreende que, se o imitador encanta o interloc<strong>ut</strong>or pelo encadeamento de imagens,logo são na ver<strong>da</strong>de prod<strong>ut</strong>ores de fant<strong>as</strong>m<strong>as</strong>, porque su<strong>as</strong> criações estão longe do belo ou <strong>da</strong>natureza ideal. Desse modo, defende a idéia de que por mais hábil que possa parecer umartista, artesão etc., não p<strong>as</strong>saria de um falsário, charlatão e enganador (fingidor).Miscelânea, <strong>Assis</strong>, vol.7, jan./jun.2010 224