entrevista | binho e chivitzentre oMUSEUe a RUATEXTO sabrina duranFOTOS claus lehmannPrimeiro, o Estado enquadrou os artistas. Foram 11 detidos nodia 3 de abril de 2011, todos levados para a delegacia, ainda sujosde tinta, acusados de crime ambiental por estar grafitandoas pilastras que sustentam os trilhos do metrô sobre a AvenidaCruzeiro do Sul, na zona norte de São Paulo. Seis meses depois,o mesmo Estado dava àqueles artistas a tinta e a estrutura necessáriaspara que finalizassem as obras. Em meados de outubro,surgia do cinza das pilastras o 1º Museu Aberto de ArteUrbana do Brasil (Maau), com 35 colunas e 68 obras gráficasde puro reconhecimento ao grafite paulistano. Trabalharam ali58 artistas durante duas semanas, entre eles Binho Ribeiro, 40anos, e Chivitz, 34, idealizadores do projeto. O Maau começoua ganhar forma durante as oito horas em que os dois, além dosoutros nove, passaram na delegacia tentando provar à políciaque, ao contrário do que dizia o artigo 65 da Lei de Crimes Ambientais,grafite não era o mesmo que pichação – no dia 25 demaio, a presidente Dilma Rousseff assinava a Lei nº 12.408, quedescriminaliza o grafite. Amigos de longa data e parceiros deesqueite, hip-hop, spray e tinta látex, Binho e Chivitz, expoentesda arte urbana no Brasil e com prestígio no exterior, abriram umprecedente inédito: colocaram para conversar o poder públicoe a rua. Com esse diálogo, conseguiram substituir por cores eformas o cinza chapado da cidade malcuidada.Como foi o contato de vocês com o poder público?BINHO: No próprio dia 3 de abril, ainda na delegacia, agente já era manchete no UOL e havia mais de 200 postssobre a nossa detenção. Graças à minha conexão, knowhowe crédito, e também do Chivitz, obtivemos uma repercussãoque rapidamente chegou ao conhecimentodo secretário de Cultura do Estado [Andrea Matarazzo],de Regina Monteiro, da SP Urbanismo [presidente dacomissão de proteção à paisagem urbana da SecretariaMunicipal de Desenvolvimento Urbano], e da presidênciado Metrô. Foi uma combinação muito importante decredibilidade e vontade política.CHIVITZ: Fomos detidos por volta do meio-dia e liberadosumas 8 da noite. Na delegacia, formalizamosum pouco o projeto. Depois fomos para casa, ligamoso Skype e fizemos uma reunião. Ficamos a noite inteiraescrevendo o projeto e juntando imagens. No dia seguinte,a gente se encontrou às 8 da manhã no centroda cidade e fomos atrás de apoio. Nossa intenção era sópintar esse lugar superdeteriorado. Antigamente haviaumas pilastras pintadas aqui, mas de uns anos para cátudo ficou cinza.BINHO: Fomos para a SP Urbanismo e aprovamos umpré-projeto. A gente somou tudo o que tinha de credibilidadee contatos para fazer o projeto acontecer.CHIVITZ: Foi essa credibilidade que nos tranquilizou.No dia em que a gente estava se programando para pintar,o Binho falou: “A gente vai ser preso”. Eu disse: “Imagina,mano, você é o Binho, cara...” [risos].
A repercussão negativa da prisãode Binho e Chivitz foi o estopim paraque o poder público mudasse suapostura em relação ao grafiteBINHO: A gente convocou fotógrafos para registrar omomento do enquadro. Temos esse material. O Chivitzestá coordenando a criação de um documentário sobretoda a história, inclusive com a participação do secretáriode Cultura. Vamos mostrar os dois lados, os artistascontraventores e o poder público.Foi uma guinada radical na postura do poder públicoem relação à arte de rua?BINHO: Essa disposição política em fazer uma açãocom a gente foi inédita. É a primeira vez que vejo umprojeto underground se transformando em algo patrocinadopelo governo. Oficialmente, o espaço foidecretado museu pelo próprio secretário. Isso é pioneirono mundo.CHIVITZ: O grafite nunca entra num museu ou galeria.O que entra é o trabalho do artista de rua. É difícil levarpara o museu a efemeridade que a rua tem, e aqui [noMuseu Aberto] a gente conquistou isso.BINHO: Esse espaço fica entre o museu e a rua.Vocês pretendem dar continuidade ao Maau?CHIVITZ: Nos próximos anos queremos abrir o projetopara que seja um edital para a cidade. Em 2011 nãotivemos tempo. Foi uma ação regional porque, claro,conquistamos isso com essa galera e quisemos valorizartodo mundo, desde os [artistas] mais novos até os maisantigos. No futuro, vamos fazer um trabalho educacional,realizar oficinas para ver quem realmente mereceparticipar do projeto.Como foi feita a curadoria?BINHO: Nossa curadoria foi separada em três partes: selecionamosalguns dos principais nomes dessa cultura11CONTINUUM10