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percentual é de dois por cento; entre os latinose os negros, 7 e 12 por cento. Estasduas categorias étnicas, somadas, compreendem82% do total de casos de transmissãoheterossexual entre homens, naquelepaís.O final do espetáculoEste nosso exercício de numerologia(modismo tão ao gosto de nossa elite dirigente),terá revelado o que se vislum<strong>br</strong>a,mas que se elidiu da discussão: "Magic"Johnson não é apenas uma grande figura esportivaque contraiu o HIV, mas um símbolode uma tendência mundial de disseminaçãoda pandemia, e dos rumos que ela temtomado, dentro da população geral.Todos gostaríamos que a AIDS fosse algopassageiro, e todos esperamos a sua cura oua sua prevenção, logo. No entanto, enquantoisto não sucede, é preciso que tenhamos presentea magnitude deste problema, e evitemosque ele seja minimizado, em qualquercircunstância.A questão da transmissão heterossexual,como foi posta no episódio, vem a ser exatamenteisto - uma tentativa de reduzir o alcanceda epidemia dentro da sociedade. Namedida em que a doençça não atinge heterossexuais,estará restrita portanto aos gruposde risco clássicos, e aqueles que não sejulgam expostos estarão deso<strong>br</strong>igados demedidas preventivas. Uma posição confortável,embora um pouco parecida com a doavestruz (que não é bicho que se tire de cartola).Em outras palavras, a reação de negaçãoclássica. E, no caso específico, com aspectosparticularmente favoráveis àexibição de cenas de machismo explícito.As conseqüências do episódio forammuitas, e seus efeitos, infelizmente, se farãosentir por muito tempo. Em primeiro lugar,houve um grande enfraquecimento daspoucas campanhas educativas que se fazemno País. Baseadas, como devem estar, nasnoções de que deve-se reduzir o número deparceiros e praticar o sexo seguro, e de que atransmissão heterossexual aumenta, a negaçãopública desta torna sem base as recomendaçõesanteriores. Isto atinge principalmente,é claro, os heterossexuais, grupomenos mobilizado para o problema, até omomento, e portanto vítima mais fácil destafalsa controvérsia.Em segundo lugar, sofrem as mulheres (e,por extensão, as crianças). Grupo de posiçãodependente, principalmente em nossa sociedade,não tem a mulher controle absoluto so<strong>br</strong>eo número de parceiras(os) que o seu parceiroteve, ou tem. A solicitação por sua partede sexo com proteção de preservativos, nestecontexto, gera quase sempre conflito e, muitasvezes, a<strong>br</strong>e a possibilidade da violênciaou abandono, em geral com conseqüênciaspara os filhos, se existentes.Numa situação de resistência à adoção depreservativos por parte dos homens, tentarinduzi-los a seu emprego, quando não sejulgam ("cientificamente") sob risco éuma tarefa muito difícil para a mulher, jáque isto será percebido como prova dedesconfiança no comportamento sexual(leia-se, na masculinidade) do parceiro.Por último, concretamente: nas noites edias subsequentes ao anúncio da impossibilidade"técnico-científica" da transmissãomulher-homem, vários, muitos <strong>br</strong>asileiros e<strong>br</strong>asileiras se infectaram. Muitas criançasnascerão com o vírus, ou serão por ele postasem orfandade. Esta situação, que certamentese perpetua, é talvez o mais trágicoresultado da irresponsabilidade - ética,científica, médica e social - de todos os queincorreram naquelas declarações esdrúxulase levianas so<strong>br</strong>e o assunto.Uma constatação surgiu, que poderá serpositiva, caso bem explorada: não houvediscussão científica ou acadêmica da questão.A imprensa médica nacional é lenta,desprestigiada, de pouca penetração, e dominadapelos interesses comerciais dos laboratóriosfarmacêuticos, a que serve, praticamentesem exceções. O descaso so<strong>br</strong>e aquestão da informação na saúde pode servisto se relem<strong>br</strong>amos que, antes de interessar-sepelas aplicações médicas de bicicletase guarda-chuvas, uma das primeiras medidasda administração do Sr. Alceni Guerrano Ministério da Saúde foi colocar em disponibilidadeos profissionais de biblioteconomialotados nos hospitais da rede federal -jáde si carentes de bibliotecas.Isto é também expressão da flagrante fragilidadecientífica de que sofremos, que já semencionou acima, muito bem demonstradapor recente trabalho publicado na revistaAIDS: consultando uma base computadorizadade dados bibliográficos, e analisandoum total de mais de vinte e quatro mil artigosso<strong>br</strong>e HIV/AIDS, publicados entre 1983e 1989, os autores revelam que menos de0,1% o foram em português (contra 2,5% emespanhol), numa clara medida da pouca credibilidadeda nossa ciência(6).Nenhum jornal solicitou a qualquercientista pátrio um artigo qualquer so<strong>br</strong>e oassunto (Um modelo <strong>br</strong>asileiro para a transmissãodo HIV, talvez) para publicação emsuas páginas de opinião, ou em seus cadernosde cunho mais cultural ou intelec-Revivaltual. Poucas, tímidas, foram as cartas demédicos dirigidas aos órgãos de comunicação;estas mesmas, em geral, tibiamenteapologéticas, ou ativamente arrogantes.O conhecimento do estado de portadorde uma pessoa, so<strong>br</strong>e sempre ser um dramapessoal, é algo a ser comunicado apoucos, pelos sabidos riscos sociais e emocionaisque implica para o indivíduo.Por isso, quando uma figura de relevopúblico admite abertamente esse seu estado,admira-se-lhe a coragem, e se aproveitaa comoção pública causada para, por todosos meios e modos possíveis, aumentaro alerta da sociedade so<strong>br</strong>e o problema.No Brasil, no caso de "Magic" Johnson,estas oportunidades foram desperdiçadas,e desapareceram por completo - comonum passe de mágica.1. Chin, J. - Present and Future Dimensions ofthe HIV/AIDS Pandemia. Em G.B. Rossi, E.Beth-Giraldo, L. Chieco-Blanchi, F. Dianzani,G. Giraldo e P. Veroni (editores): Science ChallengingAIDS. Proceedings Gased on the VU InternationalConference on AIDS, Florence, June16-21, 1991. pp. 33-50. Karger, Basiléia, 1992.2. Haseltlne, W.A. - Molecular Biology of lheAIDS Virus: Ten Years of Discovery - fíope forthe Future. Em G.B. Rossi, E. Beth-Giraldo, L.Chieco-Bianchi, F. Dianzani, G. Giraldo e P.Veroni (editores): Science Challenging AIDS.Proceedings Gased on the Vil International Conferenceon AIDS, Florence, June 16-21, 1991. pp.71-106. Karger, Basiléia, 1992.3. Holmberg, S.D., Hornsburgh, CR., Ward,J.W. Jaffe, H.W. Biologic Factors in lhe SexualTransmission of Human Immunodeficiency Virus.Journal of Infectious Diseases 1989; 160:116-125.4. Peterman, T.A., Stoneburner, Allen, J.R. et.ai. - Risit of Human Immunodeficiency VirusTransmission from Heterossexual Adults withTransfusion-Associated Infectious. Journal of theAmerican Medicai Associatlon 1988; 259:55-58.5. Statistics from the Cenlers for Disease Control.AIDS 1991; 5:1545-1547.6. Elfond, J., Bor, R., Summers, P. - Researchinto HIV and AIDS between 1987 and 1990: TheEpidemic Curve. AIDS 1991; 5:1515-1519.Celso Ferreira Ramos FilhoProfessor Adjunto da Faculdade deMedicina da UFRJ e Coordenador Geral doPrograma SIDA/AIDS da UFRJQuarta-feira de cinzas. Ressaca da apoteose nacional. Enquanto no Rio há a consagraçãooficial do enredo Paulicéia Desvairada, em Brasãia o bloco do arrastão na Esplanadados Ministérios continua saindo às ruas: é anunciada a exoneração do diretor daCoordenação de DST/AIDS, esperada desde dezem<strong>br</strong>o, pelo menos. A solidão do ex-diretorera notória e não gratuita. A surpresa, se podemos nos surpreender no país deCanapi, é o retorno de Lair de Macedo Guerra à direção da Coordenação de DST/AIDS,deixando o seu auto-exílio voluntário de quase dois anos em Washington, D.C.De imediato, ficamos na espectativa da reestruturação da Coordenaçção deDST/AIDS para que possamos conjuntamente, num futuro que esperamos seja <strong>br</strong>eve,estabelecer um programa emergencial para o enfrentamenlo global das epidemias deAIDS no Brasil.12

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